Brasileiro criticou
carta enviada pelos europeus em março que pede a inclusão de novos
compromissos ambientais e sanções no texto do acordo de livre comércio
entre os dois blocos. Itamaraty ainda prepara contraproposta.O
presidente Luiz Inácio Lula da Silva chamou de “ameaça” as novas
demandas feitas pela União Europeia (UE) para a finalização de um acordo
de livre comércio com o Mercosul. A declaração foi feita nesta
sexta-feira (23/06) na Cúpula para um Novo Pacto Financeiro Global, em
Paris, ao lado do anfitrião do evento, o presidente francês Emmanuel
Macron.
“Estou doido para fazer um acordo com a União Europeia, mas não é
possível. A carta adicional que foi feita pela UE não permite que se
faça um acordo. Nós vamos fazer a resposta e vamos mandar a resposta.
Mas é preciso que a gente comece a discutir.”
“Não é possível que tenhamos uma parceria estratégica e haja uma
carta adicional fazendo ameaça a um parceiro estratégico. Como é que a
gente vai resolver isso?”, questionou Lula, referindo-se a uma carta
(side letter) enviada pela UE ao Mercosul em março que pede a inclusão
no texto de mais compromissos ambientais e sanções por descumprimento.
Essa carta da UE foi preparada ainda em um contexto de preocupações
com o compromisso do então governo Jair Bolsonaro em combater o
desmatamento, mas também de pressão de setores da agropecuária europeia
receosos com o possível aumento das importações do Mercosul.
Lula já havia criticado em outras oportunidades as novas demandas da
UE para fechar o acordo. Em 12 de junho, ao receber em Brasília Ursula
von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, o braço executivo da UE,
Lula expressou “preocupações” do Brasil com a carta. “A premissa que
deve existir entre parceiros estratégicos é a da confiança mútua e não
de desconfiança e sanções”, afirmou ele na ocasião.
Von der Leyen, por sua vez, disse que o bloco aguarda com expectativa
a resposta do Mercosul, “para saber onde temos que dar um passo em
direção um ao outro”. O Itamaraty está preparando sua contraproposta e
deve remetê-la à UE ainda neste mês, segundo noticiou o portal G1. Em 29
e 30 de junho, haverá uma reunião entre representes do Mercosul e da UE
em Buenos Aires, quando o tema deve ser discutido.
Na reunião com Von der Leyen, Lula também manifestou incômodo com a
lei antidesmatamento aprovada em abril pelo bloco europeu que bane
importação de produtos oriundos de áreas desmatadas da Amazônia, e disse
que ela tem efeitos extraterritoriais “que modificam o equilíbrio do
acordo”.
Por outro lado, o petista deseja modificar um dispositivo do acordo
sobre compras governamentais, que autorizaria empresas europeias a
participarem de licitações públicas nos países do Mercosul em condições
de igualdade com as empresas locais. Segundo o brasileiro, isso
prejudicaria as pequenas e médias empresas no Brasil.
Pacto negociado desde 1999
O acordo entre Mercosul e UE vem sendo negociado desde 1999. Em 2019,
foram finalizadas as negociações comerciais e, em 2021, foram fechadas
as negociações que dizem respeito a aspectos políticos e de cooperação. O
acordo está agora em fase de revisão, para ser assinado.
O pacto precisa ser ratificado pelos parlamentos de todos os países
dos dois blocos para entrar em vigor. A negociação envolve 31 países, o
que poderá levar anos e enfrentar resistências.
Em seu discurso, Lula se referiu à construção da UE como um
patrimônio democrático da humanidade. “Depois de duas guerras mundiais,
vocês conseguirem construir a União Europeia, conseguirem fazer um
Parlamento, conseguirem viver com divergência, mas discutindo as coisas
democraticamente. É uma coisa que eu quero para a América do Sul”.
“Queremos criar novos blocos para negociar com a UE. E aí, me
desculpem Banco Mundial e FMI [Fundo Monetário Internacional],
precisamos rever o funcionamento. É preciso ter mais dinheiro, é preciso
ter novas direções, mais gente participando da direção. Não podem ser
os mesmos.”
“Querido companheiro Macron, obrigado por essa reunião. E se prepare
porque estou com mais vontade de brigar nesses próximos três anos em que
vou presidir o Brasil. Obrigado e boa sorte”, finalizou.
Passagem pela Itália
Antes de desembarcar em Paris, Lula cumpriu uma agenda de dois dias
em Roma, na Itália, onde se reuniu com o presidente Sergio Matarella e
com a primeira-dama Giorgia Meloni. Com Matarella, o brasileiro discutiu
as relações bilaterais e o acordo de livre-comércio Mercosul-UE.
Lula também visitou o papa Francisco, no Vaticano, onde discutiram temas como combate à fome e guerra na Ucrânia.
Ainda na Itália, o presidente encontrou o prefeito de Roma, Roberto
Gualtieri, de centro-esquerda, que visitou o petista quando ele estava
preso em Curitiba, em julho de 2018.
md/bl (EBC, ots)