Hoje vejo a velha roda do lado de fora da gaiola e fico pensando, para que fui fugir da gaiola?…
Olho para o lado vejo hamsters felizes girando a roda como se não
houvesse amanhã, suas gaiolas, muitas douradas são equipadas com um
monte de tralha, quanto mais bonita e vistosa a gaiola, mais rápido gira
a roda. Impressiona ver o hamster cansado se jogar da roda no sofá e
ligar o Imbecilizador, onde uma programação audiovisual o leva para um
mundo de sonhos e consumo, que mostra o quanto é bom consumir, consumir,
consumir… Veja como são belos e felizes os hamster consumistas, veja só
aquele hamster do lado, diz a esposa, eles tem um cagador turbo, grande
e confortável, e nos aqui neste cagador pequeno, você não tem vergonha
não?!
Vendo isto o hamster olha para o relógio e pula na roda de volta e
corre como se fosse alcançar o próprio rabo, um desespero por um
cagador… Chega finalmente o cagador novo na gaiola de nosso amigo
hamster, um hamster sério e trabalhador que não tem tempo para muita
prosa. Hoje é domingo, e o hamster vai tomar uma cervejinha e ver um
futebol, afinal ele merece. Chega em casa bêbado e acorda de ressaca com
a cabeça latejando toma um “estupidex” e vai para a roda, gira como
ninguém, mas dai começa a pensar, para que pensar??? O hamster para,
toma uma birita a volta para a roda, acha o maior barato girar junto com
ela, toma outra e decide girar a roda ao contrario e logo toma um
esporro do Bank hamster. Como assim, girar ao contrário, você tem noção
do perigo que é ser diferente? Consuma, consuma! O bom e nobre hamster
volta a girar a roda novamente, a esposa hamster respira aliviada, pois
já esta pensando em pintar a gaiola de ouro. O cagador turbo já
“orkutizou”, chique agora é ter a gaiola dourada, é o novo conceito em
moradia diz a esposa hamster. Conceito do caralho! Resmunga o marido
hamster pensando em como foi divertido girar a roda ao contrário, ria da
cara do Bank hamster.
Neste
domingo foi diferente, o hamster não foi tomar cerveja e nem assistir
futebol, ficou apenas contemplando a roda pensativo… Preocupada a
esposa hamster o reprimiu: Você não sabe que pensar é perigoso?! Em
seguida ligou o Imbecilizador para tentar distrair o marido hamster,
este bateu a porta e saiu sem dizer para onde ia. Mais tarde ele voltou
com um livro debaixo do braço: “A roda” de Hamster Max. A esposa
hamster aos prantos ajoelhou na frente do marido e implorou para que ele
devolvesse aquele livro, ela lembrou o fim trágico de todos que
provaram daquela droga. Olha a miséria meu amor, eles abandonaram a roda
e ficam debatendo e estudando o tempo todo, nem mesmo possuem uma roda
na gaiola, quando muito uma gaiola, são uns verdadeiros perdedores! A
esposa implorou e o marido fingiu aceitar. Mais tarde ele pegou as
ferramentas e montou um dispositivo na roda, agora ele pode pedalar e
ler enquanto faz a roda girar, a esposa morria de vergonha afinal os
maridos das amigas dela corriam elegantemente dentro da roda, já o nosso
hamster parecia um pensador pedalando e debochando…
Nosso hamster saiu novamente e comprou livros e mais livros, lia e
pedalava sem parar, a pobre esposa não sabia mais onde enfiar a cara. O
hamster comecou a pensar novamente, a esposa coitada, não podia comprar
aquela ração “premium plus ultra du kacete”, teve de comer milho. O
nosso hamster, resolveu sair e bateu de gaiola em gaiola convocando os
vizinhos para conversar sobre uma idéia que ele teve.
No dia seguinte a esposa hamster acordou assustada pois tinham um
monte de hamster na frente da gaiola, e o marido falou, fica calma vamos
nos mudar, e começaram a alinhas as gaiolas, colocando uma ao lado da
outra, mas o pesadelo estava por vir…. bom pelo menos para a visão
consumista da esposa hamster, para o nosso heroi um sonho sendo posto em
prática… Ela comeca a ver que os outros hamsters estavam retirando a
roda de suas gaiolas e colocando na frente e enchendo de terra…. chegam
na gaiola de nosso hamster e ele encontra a esposa de malas prontas,
dizendo você decide: ou a roda ou eu! Não preciso dizer que a Sra
Hamster teve de ir para a casa da mãe dela. Enquanto isto os hamsters
plantavam nas velhas rodas nosso heroi havia criado uma comunidade capaz
de suprir-se sem a necessidade de girar a roda indefinidamente, ele
percebeu que consumia um monte de bobagem inúteis, que na pratica ele
não necessitava. O Imbecilizador foi trocado por um Inteligentador
conectado na Internet. Pouco a pouco a idéia maluca de nosso heroi
peludo foi sendo disseminada, o tempo vago agora era preenchido com
leituras, debates e a produção de conteúdo para seus blogs, sem contar
que tinham tempo de fazer o mais importante, de compartilhar amor e
afeto e ver os filhotes crescerem e participar disto, sem ter de
terceirizar com babas e escola como no passado.
Mas o Bank hamster não estava gostando nada disto, as redes de
imbecilização falavam diariamente dos perigos da Internet e do
compartilhamento. Precisavam calar os hamsters revolucionários! Os Bank
hamsters discutiram várias estratégias e começaram a coloca-las em
prática, primeiro junto com a rede de imbecilização tentaram confundir
as pessoas. Diziam que os hamsters revolucionários eram produtores de
“ratotóxicos”, e em nome da segurança trabalharam o mito de que as
sementes plantadas em casa eram perigosas e poderiam ate mesmo produzir
alucinações, por isto quem as consumia eram diferentes, agiam diferente,
pensavam! Não colou! Muita gente estava trocando o Imbecilizador pelo
Inteligentador e viram que a rede de imbecilizacao estava mentindo.
Maldita Internet pensavam os Bank Hamsters, temos de eliminar a
concorrência!
Os velhos e gordos Bank hamsters reuniram se em seu covil para
discutir formas de parar estes hamsters revolucionarios. Chegaram a
conclusão de que o maior perigo não eram aquelas tribos de hamsters “sem
rodas”, poder estava mesmo é na Internet. Descobriram que os hamsters
comuns usavam seus inteligentadores conectados à interner com a mesma
eficiência dos imbecilizadores e sua rede decadente.
Perceberam
que apenas os velhos hamsters, eram os poucos ainda controlados pelo
sistema de imbecilização. Iniciaram a mais implacável campanha contra os
Inteligentadores e a Internet, inventaram o “vicio em internet”, e para
dar consistência ao factóide mostravam hamsters que haviam abandonado a
roda por causa da Internet. Mostravam hamsters esclarecidos como sendo
uma terrível consequência do excesso de informação, teve ate mesmo o
Hamster Keen que escreveu um livro criticando os “sem roda” conectados,
tentando provar que o modelo imbecilizante era melhor.
Vendo que não estavam surtindo efeito, os Bank hamsters se reuniram
novamente, desta vez teremos de ser mais efetivos, temos de pensar numa
forma de usar dogmas inquestionáveis para ter motivos para controlar a
Internet, e dai surgiram os “maleficios” da rede foi um tal de falar em
pedofilia e que hamsters velhinhos perdiam suas economias por causa de
golpes virtuais. Isto parece ter colado, mas será o benedito que
ninguém parou para pensar que não existe pedofilia na Internet, e que os
velhinhos são vitimas do desconhecimento e não da Internet. O que tem
na Internet é pornografia infantil, resultado de um crime de pedofillia
cometido em algum lugar, combater a pornografia infantil somente não vai
resolver o problema. A Universidade de Hamstarvard fez um estudo
mostrando que o aliciamento de menores pela Internet era insignificante,
e mesmo assim as vitimas em geral já foram vitimas de aliciamento
presencial. A culpa não era da Internet e sim dos pais hamsters, que so
se preocupavam em rodar a roda, e terceirizavam a criação dos filhotes!
Se não fosse isto teriam tempo de conversar com seus filhotes para
orienta-los na Internet, mas como se eles mesmo não sabem usa-la?
Os Bank hasmters estavam conseguindo avançar, disseminaram medo,
incertezas e dúvidas. Novas leia para “proteger” os filhotes e o
hamsters velhos surgiam, e eram combatidas pelos “sem rodas”, que
passaram a usar a rede como um canal de contra-informação.
Mais uma vez os Bank hamsters se reuniram no covil, desta vez
decidiram montar um verdadeiro plano de guerra, contrataram os melhores
especialistas em Internet para desenvolver suas estratégias, perceberam
que tinham de atuar em novas arenas, pois na legislativa era complicado,
pois os “sem roda” sempre conseguiam ser ouvidos. Descobriram que
regulamentar era mais fácil do que legislar, pois regulamento não
precisa ser debatido. Mudaram de foco, na verdade abriram outras
frentes, descobriram a governança da Internet, agora precisavam de uma
forma de centraliza-la, assim tomariam o controle da Internet antes
mesmo que os “Sem roda” pudessem fazer alguma coisa. E assim decidiram
juntar esforços com as empresas de telecomunicações, dando a elas mais
lucro em troca de mais controle da rede. Só bastava agora colocar o
plano em prática.
Bank hamsters do mundo todo decidiram formar acordos internacionais
para controlar a Internet, o controle é importante contra os “sem
roda”. Redes sociais encantadoras foram cooptadas por reunir milhares
ou até milhões de hamsters, formando verdadeiros jardins murados…. uma
vez posicionados, em todas as arenas, os planos foram postos em pratica
de forma simultânea, como se fosse uma verdadeira guerra, uma guerra
desproporcional e com o objetivo de controlar o que antes era livre, uma
guerra que tem por objetivo perpetuar o modelo da roda, o modelo que já
não faz mais sentido. Não tem logica girar a roda continuamente, não
queremos mais isto, fala o hamster revolucionario. Os ataques dos Bank
hamsters são implacáveis, ao ponto do nosso revolucionário olhar para o
lado e pensar: Quero voltar a ser um hamster burro, lobotomizado, não
porque eu concorde com isto, mas porque já estou cansado desta guerra
insana. Ao mesmo tempo percebe que sua mente não é mais a mesma, que
agora ele é dono da própria subjetividade, e uma verdadeira dissonância
cognitiva toma conta de seu corpo e sua alma, que o captura de seu
momento de vacilo, para retornar a luta, a construção de um ideal, de um
novo mundo do mundo dos hamsters sem roda…
.
Nota: Este texto foi criado num momento em que eu estava com um
bloqueio de escrita, e brincando no Twitter produzi este texto, em
pequenas pilulas de 140 caracteres em poucas horas.
João Carlos Caribé
http://entropia.blog.br/2012/04/20/saudades-da-gaiola-dourada/