A corrida presidencial
abre um novo capítulo na história do país: pela primeira vez em décadas,
nenhum dos partidos tradicionais estará presente na decisão
Marine Le Pen e Emmanuel Macron, candidatos à
presidência da França: segundo turno acontece em 7 de maio (Jeff J
Mitchell; Sylvain Lefevre/Getty Images)
São Paulo – A
França caminha
para o 2º turno de sua eleição presidencial depois de um primeiro turno
no qual o cenário mais provável, segundo analistas, se consolidou:
agora, a disputa será entre o centrista
Emmanuel Macron (Em Marcha!), o queridinho do mercado financeiro, e a líder da extrema direita
Marine Le Pen (Frente Nacional).
O mundo só conhecerá o novo presidente, ou nova presidente, da França
em 7 de maio, quando os eleitores voltam às urnas. Abaixo, entenda o
que significa o resultado desse 1º turno e o que acontece nas
eleições daqui em diante.
Balanço geral
A corrida presidencial abre um novo capítulo na história política do
país. Uma fase que revelou a derrota do establishment, já que pela
primeira vez em décadas nenhum dos dois partidos tradicionais (Os
Republicanos e Partido Socialista) estará presente no 2º turno.
Enquanto o conservador François Fillon terminou sua campanha com
19,9% dos votos, o socialista Benoit Hamon, colega de partido do atual
presidente
François Hollande, alcançou um resultado pífio ao obter apenas 6,4% da preferência dos eleitores.
O desempenho de ambos partidos, combinados, foi desastroso: 26,3%. Em
2007, republicanos e socialistas receberam 66% do total dos votos da
corrida presidencial e, em 2012, essa percentagem foi de 55,8%.
Os números sinalizam o rechaço dos eleitores às propostas e
aspirações de outrora. Por outro lado, expressam o fortalecimento dos
candidatos que representam visões radicalmente opostas sobre o futuro da
França.
Para Marta Lorimer, pesquisadora da
London School of Economics (LSE),
a disputa entre uma candidata nacionalista e protecionista, Le Pen,
contra um liberal pró-Europa, Macron, sugere que uma terceira divisão
política, uma que vai além da discussão entre a direita e a esquerda,
está prestes a emergir no país, independentemente do resultado.
“Teremos uma grande mudança de rumo na política francesa e também na europeia”, prevê.
Surpresa
“A recomposição da esquerda francesa começou”, crê Thomas Vitiello, pesquisador da
LSE,
em um post de análise do resultado das eleições. Na sua percepção, o
desempenho do establishment foi impactado pelo surgimento de dois
movimentos: o centrista Em Marcha!, de Macron, e o “França Insubmissa”,
de Jean Luc-Melénchon, da esquerda radical.
“Hamon não conseguiu impedir que os votos dos sociais-liberais fossem
para Macron e sequer conseguiu competir com Melénchon. Esse último
criou sua campanha meses antes e conseguiu dominar questões como
distribuição de riqueza e transição ecológica, problemas antigos e novos
da esquerda”, avaliou o pesquisador, que prevê a vitória do centrista.
Contudo, lembra Vitiello, as atenções do mundo logo estarão nas
eleições parlamentares, cujos resultados são geralmente desfavoráveis
para novos atores políticos que tem de lutar para transitar
politicamente entre seus membros.
“A crise no Partido Socialista e a improvável maioria centrista nas
eleições de junho vão rearranjar as cartas da recomposição da esquerda”,
avalia. “Se essas cartas estarão mais para a esquerda, com o ‘França
Insubmissa’, ou ao centro, com o ‘Em Marcha!’, veremos.”
Quando será o 2º turno?
O 2º turno acontece no próximo dia 7 de maio.
Quem são os candidatos?
De um lado está Emmanuel Macron, que lidera do “Em Marcha!”.
Ex-banqueiro e ex-ministro da Economia, tem 39 anos e é candidato a um
cargo eletivo pela primeira vez. Foi filiado ao Partido Socialista até
2009.
Do outro lado está Marine Le Pen, que encabeça desde 2010 a extrema
direita no Frente Nacional, partido fundado por seu pai, Jean-Marie.
Advogada e com 48 anos de idade, Le Pen vem tentando transformar a
imagem de seu partido do discurso racista e anti-semita para o
mainstream.
Quais os seus posicionamentos sobre a União Europeia?
Macron prevê o fortalecimento da União Europeia (
UE)
e da relação entre França e Alemanha. Analistas avaliam que uma
possível vitória de Macron seria problemática para o Reino Unido, que já
iniciou o processo de desligamento do bloco e começa agora a negociar
os termos da saída.
Já Le Pen deseja renegociar os termos da filiação da França com a UE,
que chama de “fracasso”. Sua ideia é a de abandonar a zona do Euro e
transformar o bloco em uma aliança sem moeda comum e sem livre-trânsito.
Caso contrário, pretende realizar um referendo nos moldes do Brexit.
Quais as suas visões sobre imigração e islamofobia?
Macron é um defensor de um sistema aberto de imigração e já condenou
políticas discriminatórias contra os muçulmanos, embora tenha se
manifestado com cuidado e sem muitos detalhes sobre o tema.
Le Pen, por sua vez, tem essas duas questões como recorrentes em seu
discurso e já desferiu comentários racistas contra os muçulmanos,
especificamente. Seu plano é o e limitar a
imigração em
até 10 mil pessoas por ano e pretende suspender a imigração
imediatamente, além de aumentar os impostos para empresas que
contratarem estrangeiros.
Quais as suas propostas para política externa?
Nesse tema, Macron é também vago e se pronuncia com cautela. No
entanto, já se posicionou favorável às intervenções na Síria. De acordo
com Phillipe, pesquisador da
Brookings Institution,
o centrista precisará demonstrar liderança nessas questões e deve
contar com o ministro da Defesa, Jean-Yves Le Drian, como principal
mentor.
Le Pen deseja fortalecer os laços com a Rússia e condenou as sanções
impostas ao país em razão dos conflitos na Ucrânia. Além disso, é contra
a intervenção internacional na guerra da Síria e pretende retirar a
França como país membro da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico
Norte).
O que dizem as pesquisas de opinião?
Até o momento,
as pesquisas indicam
a vitória de Macron com certa folga. De acordo com projeções da
Opinionway produzidas nesta segunda-feira, o centrista tem 61% das
intenções de voto contra 39% da nacionalista.