O Vale do Jequitinhonha (MG) está se consolidando como um protagonista na indústria global de energia limpa ao atrair companhias interessadas na exploração desse mineral, que é vital para baterias elétricas e componentes eletrônicos
Reserva Grota do Cirilo, da Canadense Sigma Lithium: líder em extração de lítio no Brasil (Crédito:Washington Alves)
O Brasil tem uma das matrizes energéticas menos poluentes do mundo, mas ainda engatinha na fabricação de baterias elétricas, que vão compor as frotas do futuro. A produção ainda é pequena, assim como a exploração de minerais essenciais à transição para a energia verde. Isso, no entanto, começa a mudar, e numa das regiões mais carentes do País: o Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. A área vem se destacando como uma área promissora para a produção de lítio, concentrando 85% do metal já identificado no País. A região tem atraído investimentos e recebeu a instalação de grandes mineradoras internacionais, como a canadense Sigma Lithium, a americana Atlas, a australiana Latin Resoucers, a canadense Lithium Ionic e a australiana Si6 Metals.
Apenas em 2023, de acordo com o Ministério de Minas e Energia (MME), a extração de lítio em Minas Gerais atingiu o valor de comercialização de R$ 1,4 bilhão. Isso significa que toda a produção registrada em 2022 deve ser ultrapassada em breve.
O setor cresceu 436,16% entre 2021 e 2022. “O Brasil e Minas Gerais oferecem um atraente ambiente de negócios, com destaque para a energia renovável. Além disso, o estado propicia uma estrutura estabelecida em mineração”, ressalta Mauro Lopes, Country Manager da Latin Resoucers, que em 2017 adquiriu suas primeiras licenças na região.
Até 2030 o Brasil deve receber R$ 15 Bi de investimento para a produção de lítio e derivados
O lítio – ou “ouro branco”, como é conhecido – tem se tornado um protagonista na indústria global de energia limpa. Apesar de concentrar cerca de 60% das reservas globais, a América Latina não refina nem um terço do mineral.
Segundo o Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), o Brasil ocupa o quinto lugar no ranking de produção, extraindo cerca de 300 toneladas de lítio por ano. A Austrália é a líder com 42 mil toneladas por ano.
A corrida do lítio promete impactar o Jequitinhonha. Os municípios de Araçuaí e Itinga são os primeiros a extrair o mineral em larga escala e estão se beneficiando financeiramente com a exportação.
Com a primeira remessa de 30 mil toneladas de lítio para a China, destinadas à produção de baterias para carros elétricos e componentes eletrônicos, os municípios envolvidos devem receber até R$ 86,2 milhões em três meses.
“É notável o marco alcançado com o início da produção da Sigma Lithium, que realizou um embarque histórico no mês de julho”, diz Eduardo Miguel Lobo da Gama, engenheiro de minas e CEO da Minery, marketplace que conecta mineradores a compradores.
Sediada no Canadá, a Sigma Lithium é proprietária da mina Grota do Cirilo, onde está hoje a maior reserva de lítio do Brasil. O governo mineiro estima que a extração desse mineral pela empresa gere R$ 115 milhões em royalties apenas em 2023.
Com a expansão da unidade da companhia, a previsão é que esse valor chegue a R$ 305 milhões por ano. “Com o volume de interesse internacional no País se mantendo estável, como indicam os índices atuais, acredita-se que possamos conquistar um lugar no Top 3 global em alguns anos”, avalia engenheiro de minas.
Vale do Jequitinhonha concentra 85% do lítio do Brasil
Desafios
Como essa perspectiva positiva, o Vale do Jequitinhonha já é chamado de “vale do lítio” e está se consolidando como um protagonista na indústria global de energia limpa.
Os investimentos no setor são estimados em cerca de R$ 15 bilhões até 2030. Mas ainda existem desafios para essa expansão. Entre eles está o financiamento.
“É
preocupante observar que temos menos empresas de mineração brasileiras
listadas na B3 em comparação com a Toronto Stock Exchange, no Canadá.”
Eduardo Miguel Lobo da Gama, engenheiro de minas e CEO da Minery
Com isso, há a necessidade de atrair capital estrangeiro para viabilizar o desenvolvimento de novos projetos minerais.
Outro ponto importante destacado pelo especialista é a rigorosa legislação ambiental do Brasil, que pode intimidar potenciais investidores interessados no lítio.
“A falta de clareza nas regras e a reputação internacional de um licenciamento ambiental demorado, obscuro e moroso aumentam as incertezas e dificultam o planejamento”, diz Gama.
À medida que o Brasil busca se posicionar na guerra do lítio, é evidente que a batalha não será apenas por recursos naturais, mas também por uma modernização na burocracia e por uma visão mais competitiva, que torne o País um player global na energia renovável.