CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
COLUNISTA DA FOLHA
O novo diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), o
brasileiro Roberto Azevêdo, enfrentará seu primeiro teste de fogo já em
dezembro, apenas três meses depois de tomar posse.
Será durante a 9ª Conferência Ministerial da organização, agendada para Bali, na Indonésia.
Conferências Ministeriais são a instância suprema da OMC, o que faz com
que cada uma delas se transforme num colossal happening e num
quebra-cabeças quase impossível de administrar.
É simples explicar o porquê: a conferência tem que produzir um documento
de consenso entre os 159 países-membros, desde gigantes como a China
até o pobre Paraguai, e ainda conviver com um punhado de Organizações
Não-Governamentais que fazem o máximo de ruído possível nos corredores,
com inevitáveis reflexos entre os delegados.
Para completar, a OMC cuida de praticamente tudo o que o mundo
comercializa transfronteiriçamente, de aviões a parafusos, de
agricultura a serviços.
Se cada conferência ministerial é esse espetáculo, a de Bali será
particularmente relevante porque o mundo "está se aproximando de 20 anos
de estagnação no 'front' das negociações comerciais", como fez questão
de lembrar Azevêdo, no pronunciamento com que apresentou sua
candidatura, em fevereiro.
Ajuda-memória: a OMC substituiu o GATT (Acordo Geral de Tarifas e
Comércio), em 1995, logo depois de terminar a chamada Rodada Uruguai, o
mais abrangente pacote de liberalização comercial até hoje aprovado.
De 1995 para cá, tudo o que a OMC conseguiu fazer foi lançar, em 2001, a
Rodada Doha, que derrrubaria os muros protecionistas remanescentes da
Rodada Uruguai. Doha deveria ser concluída em cinco anos, mas já se
passaram 12, e nada aconteceu.
É por isso que, na própria OMC, funcionários qualificados dizem que o
novo DG (como é tratado o diretor-geral na peculiar língua falada no
casarão às margens do lago Leman que abriga a instituição) terá que
atualizar o sistema ou vê-lo murchar.
É claro que a conferência de Bali não conseguirá destravar Doha. Mas é
importante, como deixou claro Azevêdo, que "ganhos materiais muito
tangíveis" em Bali "reforçarão nossa confiança em que, na OMC, ainda
podemos dialogar uns com os outros de um modo construtivo e produtivo".
O que, exatamente, são "ganhos materiais muito tangíveis" é um tema em
aberto, para ser debatido a partir da posse do novo chefe da OMC.
O grande desafio, na prática, será o de demonstrar que a OMC não é
apenas o xerife do comércio global, velando pela boa aplicação das
normas já definidas. Cuidar do acervo é relevante, claro, mas é muito
mais importante olhar para a frente e desemperrar o modo negociador.
Ainda mais que está na horizonte a negociação entre os dois gigantes do
comércio (Estados Unidos e União Europeia) para um acordo comercial que,
se concretizado, levaria a OMC à beira da irrelevância.
Como diz Hermínio Blanco, o candidato derrotado por Azevêdo, "as
inovações nas regras para eliminar obstáculos ao comércio entre Estados
Unidos e Europa estão bem avançadas e superarão, com folga, as regras
que foram estabelecidas pela OMC 20 anos atrás".