terça-feira, 7 de maio de 2013

Análise: Teste de fogo será já em dezembro


CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA
 
O novo diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio), o brasileiro Roberto Azevêdo, enfrentará seu primeiro teste de fogo já em dezembro, apenas três meses depois de tomar posse.
Será durante a 9ª Conferência Ministerial da organização, agendada para Bali, na Indonésia. 

Conferências Ministeriais são a instância suprema da OMC, o que faz com que cada uma delas se transforme num colossal happening e num quebra-cabeças quase impossível de administrar. 

É simples explicar o porquê: a conferência tem que produzir um documento de consenso entre os 159 países-membros, desde gigantes como a China até o pobre Paraguai, e ainda conviver com um punhado de Organizações Não-Governamentais que fazem o máximo de ruído possível nos corredores, com inevitáveis reflexos entre os delegados. 

Para completar, a OMC cuida de praticamente tudo o que o mundo comercializa transfronteiriçamente, de aviões a parafusos, de agricultura a serviços. 

Se cada conferência ministerial é esse espetáculo, a de Bali será particularmente relevante porque o mundo "está se aproximando de 20 anos de estagnação no 'front' das negociações comerciais", como fez questão de lembrar Azevêdo, no pronunciamento com que apresentou sua candidatura, em fevereiro. 

Ajuda-memória: a OMC substituiu o GATT (Acordo Geral de Tarifas e Comércio), em 1995, logo depois de terminar a chamada Rodada Uruguai, o mais abrangente pacote de liberalização comercial até hoje aprovado. 

De 1995 para cá, tudo o que a OMC conseguiu fazer foi lançar, em 2001, a Rodada Doha, que derrrubaria os muros protecionistas remanescentes da Rodada Uruguai. Doha deveria ser concluída em cinco anos, mas já se passaram 12, e nada aconteceu. 

É por isso que, na própria OMC, funcionários qualificados dizem que o novo DG (como é tratado o diretor-geral na peculiar língua falada no casarão às margens do lago Leman que abriga a instituição) terá que atualizar o sistema ou vê-lo murchar. 

É claro que a conferência de Bali não conseguirá destravar Doha. Mas é importante, como deixou claro Azevêdo, que "ganhos materiais muito tangíveis" em Bali "reforçarão nossa confiança em que, na OMC, ainda podemos dialogar uns com os outros de um modo construtivo e produtivo". 

O que, exatamente, são "ganhos materiais muito tangíveis" é um tema em aberto, para ser debatido a partir da posse do novo chefe da OMC. 

O grande desafio, na prática, será o de demonstrar que a OMC não é apenas o xerife do comércio global, velando pela boa aplicação das normas já definidas. Cuidar do acervo é relevante, claro, mas é muito mais importante olhar para a frente e desemperrar o modo negociador. 

Ainda mais que está na horizonte a negociação entre os dois gigantes do comércio (Estados Unidos e União Europeia) para um acordo comercial que, se concretizado, levaria a OMC à beira da irrelevância. 

Como diz Hermínio Blanco, o candidato derrotado por Azevêdo, "as inovações nas regras para eliminar obstáculos ao comércio entre Estados Unidos e Europa estão bem avançadas e superarão, com folga, as regras que foram estabelecidas pela OMC 20 anos atrás". 

Brasileiro bate mexicano e é o novo diretor-geral da OMC



BERNARDO MELLO FRANCO
ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA (SUÍÇA)
NATUZA NERY
FLÁVIA FOREQUE
DE BRASÍLIA

O brasileiro Roberto Azevêdo, 55, foi eleito nesta terça-feira como diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio). É a primeira vez em que um latino-americano é eleito para um mandato completo de quatro anos.

Na última fase da disputa, Azevêdo derrotou o mexicano Herminio Blanco, 62, e trouxe ao Brasil uma de suas maiores vitórias diplomáticas. A decisão foi tomada em Genebra com a participação dos 159 países que integram a entidade. 

A presidente Dilma Rousseff e o Itamaraty fizeram campanha intensa pelo brasileiro desde dezembro de 2012. O chanceler Antonio Patriota já recebeu a notícia da vitória, e a delegação do México já reconheceu a derrota. 

O placar da votação ainda não foi divulgado. Ontem, a União Europeia decidiu votar em bloco a favor do México, e com isso o Brasil contabilizou ter perdido cerca de 12 votos. Mesmo assim, conforme fontes diplomáticas, os votos mostram que o brasileiro conta com uma grande margem de representatividade e teve vitória "inequívoca". 

O resultado será anunciado oficialmente na quarta-feira (8) e a nomeação de Azevêdo será oficializada no dia 14, durante reunião do Conselho Geral da OMC. Ao todo, nove candidatos concorreram à sucessão do francês Pascal Lamy, dono do cargo há oito anos. Azevêdo assume o posto em setembro.
Nesta terça-feira, os três embaixadores que integram a comissão de seleção do novo diretor-geral se reuniram com as delegações do Brasil e do México para antecipar o resultado da disputa.

Fabrice Coffrini - 31.jan.2013/AFP
O embaixador do Brasil na OMC, Roberto Azevêdo, anuncia candidatura à diretoria-geral da OMC, em janeiro Leia mais
 
Representante permanente do Brasil na OMC desde 2008, Azevedo conta com reputação de hábil negociador. Ele foi chefe de delegação em litígios importantes vencidos pelo Brasil na OMC, como nos casos dos subsídios ao algodão contra os EUA e ao açúcar contra a União Europeia (UE). 

Participou de quase todas as conferências ministeriais desde o lançamento, em 2001, das negociações de Doha sobre a liberalização do comércio mundial. 

Mesmo respeitado em círculos diplomáticos por sua capacidade de construir consenso, Azevêdo foi criticado por seus esforços para levar a OMC a discutir o impacto de flutuações cambiais sobre o comércio. 

HISTÓRICO
 
O diplomata começou a carreira no Itamaraty em 1984 e foi o principal assessor econômico do então chanceler Luiz Felipe Lampreia de 1995 a 1997. Participou, em 2001, da criação da Coordenação-Geral de Contenciosos do Itamaraty, que dirigiu por quatro anos. 

Em 2005, ele se tornou o chefe do departamento econômico do ministério e, de 2006 a 2008, foi subsecretário geral de assuntos econômicos. 

Foi em 2009, quando já estava à frente da representação na OMC, que o órgão autorizou o Brasil a retaliar os EUA pelos subsídios ao algodão. 

O Brasil ganhou papel predominante na OMC a partir de 2003, durante o governo Lula (2003-2010), e se tornou um dos maiores negociadores junto da UE, do Japão, da China, da Índia, dos EUA e da Austrália.
O país defende um enfoque gradual para derrubar barreiras comerciais e um grande papel para o governo na regulação do comércio, o que já provocou queixas de países ricos, como os EUA e o Japão, e de companheiros emergentes, como a China e a Coreia do Sul.

Os investimentos da União e a “Lei de Murphy”


7 de maio de 2013
Autor: Gil Castello Branco

Gil Castello Branco 
 
Em teste sobre os efeitos da desaceleração rápida nos pilotos das aeronaves, os sensores falharam e frustraram os resultados esperados pelo engenheiro aeroespacial Edward Murphy. Descoberto o erro, foi cunhado o adágio: “Se alguma coisa tem a mais remota chance de dar errado, certamente dará”. Ao que parece, existe forte correlação entre a chamada “Lei de Murphy” e os investimentos públicos no Brasil.

Nos últimos 18 anos, por exemplo, o porcentual médio de execução dos investimentos da União foi de apenas 60%. De cada R$ 10 autorizados, apenas R$ 6 foram efetivamente pagos. O montante aplicado, incluindo as empresas estatais, beirou 3% do PIB.

A execução pífia dos investimentos públicos está relacionada ao emaranhado de leis, decretos, portarias, bem como às exigências, prazos e fiscalizações do Ministério Público, do Ibama, da Funai, do Iphan, da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU). Acrescente-se à burocracia a formação inadequada dos gestores públicos, o que resulta na má qualidade dos projetos, dos editais e das próprias obras. A corrupção e os interesses políticos também contribuem para a inapetência governamental. Afinal, como impedir o surgimento de problemas em vários empreendimentos quando a empreiteira que mais recebia recursos do Orçamento da União é declarada inidônea? Como evitar lentidão nas obras rodoviárias, se a cada ano um novo ministro assume nos Transportes?

Há 20 dias, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou aos jornalistas do Estadão Raquel Landim e João Villaverde que “os investimentos irão bombar em 2014″. A previsão não causou euforia nos agentes econômicos, tendo em vista as frequentes discrepâncias entre as expectativas do ministro e a realidade. No entanto, a futurologia sugere que o governo já “jogou a toalha” no ano em curso.

Encerrado o primeiro quadrimestre, o marasmo continua. E não faltou planejamento. No final do ano passado, o governo editou a Medida Provisória n.º 598, criando créditos extraordinários de R$ 42,5 bilhões, e inscreveu R$ 71,8 bilhões de restos a pagar de investimentos, criando autorização legislativa para os gastos mesmo sem a aprovação do Orçamento de 2013.

De janeiro a abril, contudo, foram investidos pela administração direta R$ 12,3 bilhões, o que corresponde a somente 11% do previsto para o exercício. O valor é superior ao que foi aplicado no início de 2012, mas inferior aos desembolsos nos mesmos períodos em 2011 e 2010. No Ministério dos Transportes, desconsiderada a inflação, os pagamentos são os menores dos últimos três anos. Curiosamente, até o momento, o ministério “campeão” não é, como costuma ser, o dos Transportes, das Cidades ou da Integração. A pasta que mais investiu foi a da Educação, com R$ 2,9 bilhões, sendo quase meio bilhão de reais proveniente de restos a pagar do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), destinados à aquisição dos ônibus rurais escolares que estão sendo entregues pela presidente Dilma, pessoalmente, em solenidades com os prefeitos.

Será mesmo que os investimentos irão bombar em 2014? Entre o otimismo de Mantega e o pessimismo de Murphy, façam as suas apostas. 
 

Em relação aos investimentos das empresas estatais, o “espírito animal” dos dirigentes também ainda não se manifestou. Como a transparência das estatais deixa a desejar, os últimos dados disponíveis ainda são do primeiro bimestre, período insuficiente para caracterizar tendência para todo o exercício. No entanto, nesses dois primeiros meses, foram aplicados R$ 13,7 bilhões, o que representa crescimento real de somente 2,5% em relação aos meses de janeiro e fevereiro de 2012. A título de comparação, em valores atualizados, os investimentos do conjunto das estatais em 2010 atingiram R$ 15,6 bilhões, ou seja, 14% a mais do que o montante deste ano.

Em alguns casos a situação é crítica. Apesar do “engarrafamento” de navios e das enormes filas de caminhões nos portos brasileiros, do orçamento de R$ 1,5 bilhão autorizado para as Companhias Docas – dos Estados do Maranhão, Rio de Janeiro, Espírito Santo, São Paulo, Bahia, Rio Grande do Norte, Ceará e Pará -, escassos R$ 26,4 milhões foram investidos no primeiro bimestre, o que correspondeu a 1,8% do total. Dentre as oito Companhias Docas – responsáveis por 18 dos 34 portos do país -, a metade nem sequer realizou investimentos este ano.

Em meio a discussões sobre possíveis apagões durante a realização da Copa das Confederações e da Copa do Mundo, o Grupo Eletrobrás, que abrange 19 empresas no setor de energia elétrica, investiu no primeiro bimestre apenas 6,6% dos R$ 10,2 bilhões autorizados para 2013. A empresa Furnas – Centrais Elétricas, que garante o fornecimento de energia em área onde estão situados 63% dos domicílios brasileiros, investiu somente R$ 89,4 milhões. O montante equivale a 7,5% do R$ 1,2 bilhão previsto para 2013.

Na Petrobrás e na Infraero os investimentos também andam de lado. Na maior estatal brasileira, dos R$ 89,3 bilhões orçados para este ano, foram utilizados até fevereiro R$ 12,6 bilhões, montante apenas 1% maior em valores constantes do que os R$ 12,4 bilhões desembolsados no mesmo período em 2012. Na Infraero, da dotação de R$ 1,5 bilhão prevista para 2013, só R$ 92,5 milhões foram aplicados. Assim, é natural que os aeroportos brasileiros estejam fora da lista dos cem melhores do mundo, constatação da qual ninguém duvida.

Desta forma, resta ao governo a aceleração dos processos de concessões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, em alguns casos com horizonte de 25 a 30 anos. Os entraves, porém, são imensos e os cronogramas dificilmente serão cumpridos. Basta verificar que a primeira concessão de rodovia no governo Dilma, num trecho da BR-101, só foi assinada no mês passado, depois de acirrada polêmica judicial que durou um ano. A medida provisória dos portos sofreu 150 alterações no Congresso, desfigurando a concepção inicial do governo. Nesse cenário, será mesmo que os investimentos irão bombar em 2014? Entre o otimismo de Mantega e o pessimismo de Murphy, façam as suas apostas.

Fonte: O Estado de S. Paulo, 06/05/2013

Distribuição definirá futuro da Eletrobras








 Por Rodrigo Polito | Do Rio

A solução definitiva para o negócio de distribuição de energia é fundamental para o sucesso do ousado, porém pouco detalhado, plano diretor da Eletrobras 2013-2017, que prevê investimentos de R$ 52,4 bilhões e redução de custos de 30%, para encarar a nova realidade do setor, após o impacto da prorrogação das concessões. A avaliação é de especialistas consultados pelo Valor sobre a iniciativa da estatal, cujo valor de mercado atual é de R$ 7,88 bilhões, o mais baixo dos últimos anos e oito vezes e meio menor que o seu patrimônio líquido, de R$ 67 bilhões.

"É essencial que a empresa melhore o nível de rentabilidade das distribuidoras. Até porque o nível de rentabilidade das geradoras e transmissoras da companhia não é mais o mesmo, devido à renovação das concessões. Essas áreas não terão mais capacidade para suprir o déficit das distribuidoras", disse a analista Karina Freitas, da Concórdia.


De acordo com a Ativa Corretora, a melhor saída seria a venda dos ativos de distribuição, que registraram prejuízo de R$ 1,3 bilhão e Ebitda (lucro antes de juros impostos, depreciações e amortizações) negativo em R$ 343 milhões em 2012.

Os últimos sinais dados pelo comando da estatal, porém, é de que isso não deve ocorrer em curto prazo. "Eu diria que se tudo ficar como está, que é uma possibilidade, o compromisso é que em 2015 elas [distribuidoras] deem lucro. Em 2014 estarão quase equilibradas", afirmou o presidente José da Costa Carvalho.

Embora também defenda uma rápida solução para o problema das distribuidoras, o coordenador do Grupo de Estudos do Setor de Energia Elétrica (Gesel), da UFRJ, professor Nivalde Castro, vê dificuldades para a Eletrobras se desfazer desses ativos. "Existe um forte componente político inserido no setor elétrico e no tema da privatização, que dificulta essa definição", avaliou.

Outro ponto que atrapalha a venda dos ativos é a indefinição com relação ao prazo de concessão dessas distribuidoras. O contrato delas vence em 2015, mas a Eletrobras já manifestou à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) o interesse em prorrogá-los, como fez com os ativos de geração e transmissão.

"Nossa expectativa é que se renovem todas as concessões das distribuidoras sob nossa gestão", informou a estatal em nota. A Aneel tem até 2015 para recomendar, ou não, a prorrogação da concessão das distribuidoras ao Ministério de Minas e Energia.

Até o fim de junho, a Eletrobras deverá concluir e apresentar ao conselho de administração um estudo de reestruturação do negócio de distribuição. "Essas empresas [distribuidoras] já vêm dando uma melhora de resultados significativa, mas sem dúvida nenhuma é preciso, pela necessidade de capitalização de recursos, que a gente faça a análise de alternativas para a reestruturação dessas empresas", disse o diretor de Distribuição da Eletrobras, Marcos Aurélio Madureira.

Uma das propostas em estudo é a venda de uma fatia nessas empresas para companhias privadas. "Estamos em fase de análise. Acredito que possa haver alguma incorporação de algum participante. Mas é algo que ainda é prematuro", explicou Madureira.

Castro, do Gesel/UFRJ, é favorável a essa alternativa. "Assim a Eletrobras continuaria acionista dessas empresas, porque algumas delas têm um potencial econômico muito bom. O ideal é que ela tivesse uma participação minoritária, de até 49%, até para livrar a empresa das obrigações da Lei 8.666 [Lei de licitações]".

Situadas no Amazonas, Acre, Alagoas, Piauí, Rondônia e Roraima, as distribuidoras da Eletrobras atendem 3,6 milhões de clientes, ou 5% do total do mercado. Em área atendida, porém, a Eletrobras responde por cerca de 30% do mercado de distribuição, o que revela a baixa densidade de sua área de atuação. Para se ter uma ideia, a Light, que atende apenas a região metropolitana do Rio de Janeiro, tem 3,9 milhões de consumidores.

Um dos maiores problemas enfrentados pelas distribuidoras da Eletrobras é o elevado índice de perdas. Em 2012, porém, a estatal conseguiu reverter a trajetória de alta das perdas. O índice médio caiu de 34,28% para 31,01%, em relação a 2011. Segundo a empresa, a melhoria foi obtida pelo aumento dos investimentos nessas empresas, para R$ 1 bilhão, no ano passado. Para 2013, a companhia prevê investir R$ 1,5 bilhão em distribuição.

Outro ponto positivo é o crescimento do consumo nas áreas atendidas por essas distribuidoras. Segundo Carvalho Neto, enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) e o consumo de energia no país cresceram 0,9% e 3,5%, respectivamente, em 2012, a média do mercado elétrico das seis distribuidoras da Eletrobras aumentou 12,1%. "Isso se deve a um crescimento econômico maior do que a média brasileira, mas também a uma redução das perdas", disse o executivo.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Mais Chile e menos Argentina

 
 
 
Por Samy Dana e Leonardo de Siqueira Lima
 
O ano era 1973, a ditadura de Augusto Pinochet começava no Chile e, nas décadas seguintes, o país passaria pela maior transformação econômica de sua história.

Os "Chicago Boys", como eram conhecidos os 25 jovens economistas chilenos recém-chegados da Escola de Chicago, foram os pioneiros a colocar em prática o pensamento neoliberal, antecipando no Chile em quase uma década medidas que só mais tarde seriam adotadas por Margaret Thatcher no Reino Unido e por Ronald Reagan nos Estados Unidos.

Para eles, a ideia mercantilista baseada na busca incessante de um superávit comercial já não atendia mais às necessidades do capitalismo. A crença agora era de que o neoliberalismo tornava a economia mais competitiva, e por meio da livre concorrência os preços, as margens e a inflação iriam cair.

Para tanto, foram tomadas algumas medidas: primeiro as privatizações, em seguida a abertura comercial em conjunto com o rigor fiscal. Mas, como tudo na vida, todo benefício tem seu custo.

Subir 0,25 a Selic ou 0,50 é importante para ancorar as expectativas de inflação no curto prazo. Mas no longo prazo são a competitividade da indústria e os incentivos ao setor privado que reduzirão os preços e farão o país crescer de maneira digna

Essas medidas liberais demoraram a surtir efeitos e o ajuste provocou em um primeiro momento inflação, desemprego e outros problemas sociais. O remédio foi amargo nos dezessete anos seguintes (1973-1990) com o PIB crescendo menos do que nos anos anteriores ao golpe.

Apesar disso, 20 anos depois, de 2006 a 2010, a então presidente do Chile, Michelle Bachelet, intensificou essas reformas liberais. Continuou a mínima intervenção estatal na economia e no mercado de trabalho; intensificou a abertura econômica; adotou medidas contra o protecionismo; se manteve contra os impostos excessivos e se posicionou contra o controle de preços por parte do Estado. Resumindo, defendeu com unhas e dentes os princípios econômicos do capitalismo.

Foi exatamente nesse período que o amargor dos anos 70 deu lugar ao maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita da América Latina, com uma economia crescendo por volta dos 4,0% ao ano e uma inflação de apenas 1,9% de 2009 a 2012. Em termos de comparação, nesse mesmo período, o Brasil atingiu míseros 2,7% e inflação média de 5,6%.

Na contramão do Chile estão nossos hermanos argentinos. Com um governo cada vez mais populista e intervencionista, Cristina Kirchner vem desenhando um manual de tudo o que não deve ser feito em termos econômicos com um país. Após 10 anos de kirchnerismo, que começou com Néstor Kirchner em 2003, Cristina não fala em outra coisa senão restringir as importações, aumentar o controle de capital e manter (via caneta) o controle de preço. Em resumo, em vez de curar a febre, o governo argentino decidiu quebrar o termômetro.

Por um tempo funcionou, mas o que era uma popularidade alta foi transformado em um pífio crescimento de apenas 2,4%, com uma inflação exorbitante de 32%. Obra do acaso?

Talvez não. Medidas populares podem ser artifícios políticos para contentar a população no curto prazo. Um governo que protege a indústria nacional a qualquer custo equivale a uma mãe que mima seu filho até os 40 anos achando que essa é a solução para os problemas do mundo. O resultado disso já sabemos: assim como a mãe fica com um filho dependente e despreparado para vida, o governo cria uma indústria não competitiva e dependente de intervenções.

Mais do que isso, entra-se em uma armadilha com cada vez mais pressões populares e, à medida que atende essas demandas, o governo isola comercialmente o país, Em outras palavras, o remédio além de não surtir efeito, agrava o problema.


Mas porque toda essa comparação? Os veículos de mídia e nossos governantes sempre discutem à exaustão se o Copom deve aumentar em 0,25 ou 0,50 a taxa de juros base da economia para controlar a inflação.

A grande questão é que tanto 0,25 como 0,50 não podem ser os problemas centrais do país, a discussão dos motivos do crescimento baixo e inflação a longo prazo está praticamente desconectada da taxa de juros. E infelizmente, o modelo brasileiro adotado está mais para a já comprovada ineficiente política argentina do que para a próspera visão chilena.

As notícias não animam. Um estudo feito pelo Banco Mundial mostra que o Brasil é o país mais fechado do G-20 e que desde 2008 vem intensificando essas medidas protecionistas.

O governo exagera ao sustentar a qualquer preço as ineficiências das empresas "ad eternum", mas também contribui pra isso. Um exemplo disso é o tempo necessário para abrir uma empresa no Brasil de 119 dias. A um custo médio de R$ 2.038. Já nosso vizinho, o Chile aprovou uma lei em que a abertura de empresas passa a ser feita em um único dia, pela internet, sem papelada e a custo zero.

Talvez isso explique o porquê temos o segundo Ipad mais caro do mundo, atrás apenas dos nossos hermanos argentinos. Sem contar o Ipad, ainda sofremos com a banda larga e os automóveis mais caros também. Para ilustrar como sofremos com isso, uma Ferrari 458 Spider no Brasil custa US$ 950 mil - com esse dinheiro um americano compra o mesmo carro (US$ 250 mil), um apartamento (US$ 350 mil) e ainda um helicóptero (US$ 350 mil).

Portanto, subir 0,25 a Selic ou 0,50 é claramente importante para ancorar as expectativas de inflação no curto prazo. Mas no longo prazo será a competitividade da indústria e os incentivos ao setor privado que irão tornar os preços mais baratos e farão o país crescer de maneira digna.

Assim como no Chile, uma saída para promover o desenvolvimento é apostar na fórmula empreendedorismo e inovação para não deixar morrer a iniciativa privada e a livre concorrência. Posto de outra forma, precisamos de mais Chile e menos Argentina para o Brasil.


Samy Dana é professor da Escola de Economia da FGV
Leonardo de Siqueira Lima é economista da FGVre4

BC ressuscita resgate de bancos com dinheiro público


Não será por falta de compromisso (e nem de dinheiro) que uma nova lei para minimizar os danos provocados por bancos em dificuldade deixará de existir. Hoje, no Seminário Internacional sobre Regimes de Resolução no Sistema Financeiro Brasileiro, que acontece em Brasília, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, fez um diagnóstico dos aspectos mais relevantes do anteprojeto do novo marco legal da resolução bancária no país e teve o apoio imediato do senador Lindbergh Farias (PT-RJ). Lindbergh, presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, além de assegurar que o Congresso vai trabalhar para dar uma tramitação rápida da proposta do BC, informou que o presidente do Senado, Renan Calheiros, também se comprometeu em colocar a proposta em votação com a maior velocidade possível. 

O BC prioriza o uso de recursos da própria instituição, de seus acionistas ou grandes credores e grandes depositantes no socorro às instituições em dificuldades. Mas conseguiu ressuscitar a possibilidade de resgate das instituições problemáticas com dinheiro público, proibido desde 2001 pela Lei de Responsabilidade Fiscal . 

Um dos artigos da própria LRF abria a possibilidade da volta do uso de recursos públicos, desde que regulamentado por uma legislação especial. Com o anteprojeto da Lei do Regime de Resolução Sistema Financeiro Nacional é feita a regulamentação da LRF, reabrindo a possibilidade de uso de recursos públicos.

O anteprojeto do BC procura assegurar a continuidade dos serviços e da estrutura financeira necessária ao bom funcionamento da economia real em caso de problema de solvência em alguma instituição sistemicamente importante com o uso de novos mecanismos para lidar com a situação. Entre eles está o modelo atualmente em fase de intensa discussão internacional depois de sua adoção na reestruturação da dívida da Grécia e no resgate aos bancos do Chipre (“bail-in”). Com esse regime, a ideia é fazer com que um banco insolvente seja recapitalizado com recursos do seu próprio passivo, sem a necessidade de aportes do governo. É o oposto do “bail-out”, que esteve diariamente no noticiário da crise de 2008 e que levou o Tesouro de diversos países a situações críticas em função dos gigantescos recursos públicos injetados no sistema financeiro.

Outra possibilidade prevista no marco regulatório é a criação de “empresas ponte” para receber ativos e passivos da instituição em liquidação. Dessa forma, a autoridade consegue buscar uma solução do tipo “good bank” e “bad bank”, no qual os ativos bons são separados dos podres e vendidos. Mais uma ferramenta é o  “temporary stay”, no qual o BC suspende a exigibilidade de créditos contra a instituição que está sob intervenção.

O projeto também traz instrumentos da Lei de Falências para dentro do arcabouço legal do BC. Entre eles está a criação do Conselho de Credores, que avaliaria as propostas do liquidante, reduzindo, assim, questionamentos jurídicos posteriores sobre a venda de ativos. Ainda está prevista uma figura de “não sucessão” de ônus, ou seja, o comprador da chamada “parte boa” de uma instituição não sucede os passivos da “antiga instituição”.

Em tempo: o presidente da CAE, senador Lindbergh Farias (PT-RJ), também pretende acelerar as discussões sobre o projeto substitutivo do senador Francisco Dornelles (PP-RJ) pela autonomia formal do BC, estabelecendo mandato de seis anos para os diretores da autarquia e condicionando demissões e/ou substituições desses diretores pelo presidente da República à aprovação prévia pelo Senado. A proposta de Dornelles compõe o primeiro projeto de lei complementar que regulamenta a estrutura do Sistema Financeiro Nacional (STN). Esse projeto, se aprovado pelo Congresso, substituirá a Lei 4.595, de dezembro de 1964, que até hoje regula o funcionamento do sistema financeiro.S

Solidez do sistema financeiro e perspectivas da economia atraem bancos estrangeiros

 
 
 
A confiança no sistema financeiro nacional contribui para aumentar o interesse de bancos estrangeiros em criar subsidiárias no Brasil e aproveitar as oportunidades de negócios, disse nesta segunda-feira (6/5) o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini. 

Tombini participou da abertura do Seminário Internacional sobre Regimes de Resolução no Sistema Financeiro Brasileiro.

Segundo Tombini, estão em análise no BC 18 pedidos de instituições estrangeiras de 14 países, interessadas em constituir subsidiária no Brasil.

“Some-se a isso a autorização já concedida a 8 instituições nos últimos 2 anos”, disse.De acordo com o presidente do BC, o sistema financeiro brasileiro tem elevado nível de capital, de liquidez e de provisão e é resistente a choques.

Ele destacou ainda que os bancos estrangeiros interessados no Brasil também confiam no modelo de regulação e nas práticas de supervisão das instituições financeiras adotadas no país.Além disso, para Tombini, o Brasil é uma “economia com estabilidade macroeconômica e com boa perspectiva de crescimento para os próximos anos”. 
 
“Possuímos um setor industrial abrangente, uma agricultura pujante e produtiva, e um setor de serviços em expansão”, acrescentou.Tombini citou ainda a inclusão social e financeira, “com a expansão da base de clientes bancários e o incremento significativo de todos os tipos de transação financeira”. 
 
“O governo também está empenhado em criar condições para ampliar os investimentos na nossa economia. Já foram adotadas medidas para simplificar o sistema tributário, para reduzir impostos e custos incidentes sobre os investimentos e a produção e para aumentar a produtividade e a competitividade de nossa economia”, ressaltou. 
 
O presidente do BC também citou as concessões ao setor privado nos segmentos de portos, aeroportos, rodovias e ferrovias.Na avaliação de Tombini, a inclusão social e financeira e os esforços para aumentar a produtividade e a competitividade da economia ampliam as oportunidades de negócio. 
 
“Isso se reflete positivamente também no sistema financeiro. Por isso, os bancos já instalados no Brasil estão permanentemente adaptando seus modelos de negócio para atender a essas demandas e aproveitar essas oportunidades”.
 
  Fonte: Agência Brasil