Brasília e Rio de Janeiro - O ministro da Fazenda nomeado do Brasil, Joaquim Levy, prometeu adotar uma disciplina fiscal mais rigorosa sem dar detalhes sobre como reduzirá os níveis de dívida do país. O real caiu frente ao dólar.

Levy, ex-executivo do Banco Bradesco SA e ex-secretário do Tesouro, foi nomeado pela presidente Dilma Rousseff ontem para restaurar a confiança do investidor. Dilma não participou do anúncio.

Os investidores saúdam a nomeação de Levy para o lugar de Guido Mantega e entendem ser um indicador de que Dilma está disposta a desfazer as políticas que reduziram o crescimento e aumentaram a inflação e que ameaçam o status de grau de investimento do Brasil. 

O economista, que estudou na Universidade de Chicago, disse que reduzirá o déficit orçamentário mais amplo visto em uma década de forma suficiente para diminuir a dívida do país em termos de porcentagem do produto interno bruto.

“Alcançar essas metas é fundamental para o aumento da confiança na economia brasileira e criará a base para a retomada do crescimento econômico”, disse Levy, 53, em seu primeiro discurso após a nomeação.

O real, que teve a maior recuperação entre as principais moedas do mundo nos quatro dias anteriores de negociação, registra um segundo dia consecutivo de declínio e caía 0,7 por cento, para 2,5489 por dólar americano, às 10:02 da manhã, em meio à baixa nos preços do petróleo. O Ibovespa ampliava os prejuízos de ontem, caindo 0,02 pro cento.

Levy disse a repórteres em Brasília que não tem pressa de anunciar medidas.


‘Não cumpriu’


“Suas palavras foram boas; se elas serão convertidas em boas políticas é outra questão”, disse Jankiel Santos, economista-chefe do Banco Espírito Santo de Investimento, em entrevista por telefone, de São Paulo.

“Mantega também prometeu quatro anos de superávits completos, mas não cumpriu. Eu sou como São Tomé, só vou acreditar quando isso acontecer”.

Dilma também nomeou o ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda Nelson Barbosa para o lugar de Miriam Belchior no Ministério do Planejamento e Orçamento e disse que Alexandre Tombini continuará como presidente do Banco Central. 

Belchior e Mantega, que permanecerão em seus cargos por enquanto, trabalharão em conjunto com a nova equipe para desenvolver políticas para o segundo mandato de Dilma.

Levy, ex-chefe de gestão de ativos do Bradesco, segundo maior banco da América Latina, disse que buscará um superávit orçamentário antes do pagamento de juros de 1,2 por cento do PIB no ano que vem e pelo menos 2 por cento do PIB em 2016 e 2017. 

O chamado superávit primário do Brasil encolheu para 0,61 por cento do PIB no período de 12 meses até setembro, menor nível registrado desde 2002.


Mais verossímil


Mantega, ministro da Fazenda do Brasil com maior tempo no cargo, pediu ao Congresso a redução da meta deste ano, de 1,9 por cento do PIB. Desde que Dilma assumiu, em janeiro de 2011, a dívida interna bruta subiu de 53,4 por cento para 61,7 por cento do PIB.

Diferentemente de Mantega, Levy está anunciando uma meta mais verossímil, que foca em reduzir a dívida bruta em vez da dívida líquida, disse Carlos Kawall, economista-chefe do Banco J. Safra SA em São Paulo. Mantega usou como referência a dívida líquida, que exclui os mais de R$ 386 bilhões (US$ 153 bilhões) em dívidas emitidas desde 2008 para financiar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.

A propensão de Levy para cortar gastos rendeu a ele o apelido “Edward Mãos de Tesoura”, uma referência ao filme de 1990 de Tim Burton com o mesmo nome, quando foi secretário estadual da Fazenda do Rio de Janeiro. 

Durante sua gestão, de 2007 a 2010, o rating de crédito do estado foi elevado para o grau de investimento pela Standard Poor’s.

Durante o mandato de Levy no Tesouro nacional, o Brasil reduziu sua dívida bruta de 76,7 por cento do PIB para 67,8 por cento. 

Ele emitiu os primeiros títulos soberanos do Brasil denominados em reais e melhorou o perfil da dívida do país estendendo sua maturidade e diminuindo a participação de bonds ligados a moedas estrangeiras.


‘Movimento radical’


“Se você olha a história de Levy, você pode esperar um movimento radical na condução da política fiscal”, disse Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil SA, em entrevista por telefone, de São Paulo. 

“A primeira impressão é que o governo Dilma de fato passará por uma mudança significativa, o que é bastante bem-vindo, dado que o país está flertando com o risco de perder seu status de grau de investimento”.

Como ministro da Fazenda ele terá a tarefa de revigorar o crescimento, projetado em 0,3 por cento neste ano, e ao mesmo tempo diminuir uma inflação acima da meta e controlar o maior déficit orçamentário em mais de uma década.

O crescimento mais lento e um déficit orçamentário mais amplo levaram a Moody’s Investors Service em setembro a reduzir a perspectiva de crédito do Brasil para negativo. 

A Moody’s classifica o Brasil como Baa2, dois níveis acima do grau especulativo. Esse movimento veio seis meses depois que a Standard Poor’s reduziu a classificação do Brasil pela primeira vez em mais de uma década, para o nível mais baixo de grau de investimento.

“Mais que nomes, o que precisamos no Brasil é de uma política”, disse Álvaro Marangoni, sócio na assessoria de investimentos Quadrante Investimentos Ltda, por telefone, de São Paulo. 

“Nós precisamos entender para onde a política monetária e fiscal está indo, qual é a visão de médio e longo prazo do governo em relação a isso”.