Ao refletir sobre as
constantes notícias de corrupção, investigações em andamento e Comissões
de Compliance sendo constituídas em empresas enormes, como ocorreu com a
Petrobrás no final do ano passado
[1],
é inevitável tentar imaginar o alto custo das multas, das diligências
internas e do processo de defesa a que estarão sujeitas as empresas
atualmente investigadas por desvio de verbas e favorecimento ilícito em
concorrências públicas.
Ao povo brasileiro, paira a inédita curiosidade dividida entre o
sentimento de revolta pela costumeira impunidade e de que as recentes
investigações conduzidas pela SEC (Comissão de Valores Mobiliários)
norte-americana envolvendo empresas nacionais como Petrobrás e Embraer,
que sempre foram motivo de orgulho para um povo tão sofrido, finalmente
trarão alguma responsabilidade àqueles que entendem que os fins
justificam os meios.
O jeitinho brasileiro não é mais um motivo de orgulho nacional, ao
passo que a visão de que é normal tirar vantagem de qualquer situação e
que pequenos delitos não são tão graves tem se mostrado obsoleta. A
maioria da população anseia pela punição dos grandes corruptores, sendo
o passo natural consequente a visão de que também são errados pequenos
delitos, como furar fila, furtar sinal de TV a cabo e transgredir normas
de trânsito .
Sobretudo, ninguém quer se ver como contrário à integridade ou como
conivente com a corrupção instalada nesse país, e é isso que parece
nutrir tal sentimento de satisfação com as investigações iniciadas e
punições que hão de ser aplicadas, ainda que isso ocorra antes fora do
Brasil.
O que poucas empresas perceberam é que, como em outros países, a
maior consequência será o dano à imagem corporativa. Isso porquê o povo
brasileiro, de forma nunca antes vista, está incomodado com a corrupção
que permeia o país, desde pequenos até grandes delitos, em todas as
camadas sociais.
Assim, mais que as pesadas multas,o que fatalmente será a grande
propaganda da Lei 12.846/13 será o prejuízo imaterial. A empresa
corruptora deverá arcar com os custos de publicações da decisão
administrativa sancionadora em editais, meios de comunicação de grande
circulação e em seu próprio sítio eletrônico, tudo isso de forma
cumulativa, como determinado no artigo 24 do decreto regulamentador da
lei, publicado em 18 de março de 2015 no Diário Oficial da União sob o
número 8.420.
O primeiro capítulo do livro “Advocacia Corporativa – Desafios e Reflexões”, escrito por André Gustavo de Oliveira
[2], tem duas felizes frases que merecem citação:
“Dentro
do universo corporativo o Compliance está inserido em cada parafuso de
uma fábrica, em cada folha de papel de um escritório e principalmente em
cada ato de um gestor. O Compliance se desdobra ao mesmo tempo em que
se enfronha nas atividades mais puras e mais complexas de uma empresa,
desde a relação empresa e trabalhador até o relacionamento com as mais
altas autoridades de um país.”
Não há como se negar que caberá ao Conselho de Administração das
empresas sujeitas à lei acima mencionada os deveres de cautela,
estabelecendo Programas de Compliance (no artigo 41e subsequentes da lei
denominados como “programas de integridade”) para tentar evitar
deslizes e, caso mesmo assim eles ocorram, minimizar suas consequências.
A antiga prática de fazer vista grossa aos ilícitos diários será aos
poucos descontinuada no Brasil, inclusive pela criação do “Cadastro
Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas” e do “Cadastro Nacional de
Empresas Punidas”. Tais ferramentas, sem sombra de dúvida,
desestimularão a prática de atos contrários à Lei. Aliás, é bem provável
que a existência de Programas de Compliance seja um dos fatores de
decisão para a contratação ou não de fornecedores e parceiros
comerciais, como já ocorre no mercado financeiro, que antes da lei
12.846/13 já era bem regulamentado por diretrizes internacionais,
derivadas do FCPA e da SOX, leis norte-americanas de aplicação global.
A má conduta de empregados e terceiros ocasionará, além da multa
minuciosamente calculada segundo as orientações dos artigos 17 a 23 do
decreto antes mencionado, prejuízos que não poderão ser mensurados.
Excelente exemplo é o que ocorreu na Siemens. Quando o escândalo
estourou na Alemanha em 2006 muitos dos empregados da companhia se
envergonharam dos ilícitos apontados como se sobre eles mesmos tivesse
recaído a culpa pelos atos praticados em outras partes do planeta. Esse
remorso subconsciente é compreensível, sobretudo por parte daqueles
outrora orgulhosos por pertencerem a um conglomerado gigante e
amplamente presente no cotidiano da maioria dos países do globo e que,
em muitos casos, fizeram toda ou grande parte de suas carreiras na
empresa.
Em um caso mais próximo e recente, diversos funcionários da Petrobrás
protestaram contra a imagem negativa gerada pela série de denúncias
relacionadas aos desvios de verba da estatal brasileira
[3].
Isso apenas comprova que o maior prejuízo é o imaterial. Não há quem
queira trabalhar em uma empresa com fama de corrupta, sendo impossível
se exigir comprometimento e empenho de trabalhadores que se sentem
cúmplices de desvios de caráter de tamanha seriedade.
Como mencionado diversas vezes e em diferentes módulos do Curso
Preparatório de Compliance da LEC, é extremamente difícil reter talentos
em ambientes corporativos dominados por comportamentos antiéticos, já
que o trabalhador tem a impressão de que seus esforços e empenho estão
sendo indiretamente direcionados para sentidos que ele próprio
desaprova.
Marcos Assi já levantava o problema no Jornal do Brasil
[4] em 2012, muito antes da publicação da lei 12.846/13, quando seu artigo circulou com o título
“Quando os controles internos, a supervisão e a índole falham, quem paga a conta?“.
É extremamente importante que as empresas tenham consciência do que
está em jogo quando são iniciadas investigações por desvio de conduta.
Os danos causados à moral da empresa e de seus trabalhadores são de
difícil mensuração e seus efeitos são, muitas vezes, devastadores.
Recuperar-se de tamanho impacto não é tarefa fácil, portanto, o
melhor método é a prevenção. Ao agir de forma adequada à lei brasileira e
às regras de compliance, a empresa terá escolhido não apenas fazer o
que é certo, mas também proteger sua moral e imagem, preservando seus
empregados, executivos e terceiros. Este é o único caminho a seguir.
http://www.lecnews.com/web/o-dano-a-imagem-corporativa-sob-a-lei-12-84613/