Tim Rue/Bloomberg
São Paulo – Esta foi a semana na qual o dólar chegou a bater em R$ 4,25, de longe a maior cotação da história da moeda.
Agora voltou para R$ 3,90 - ainda assim uma desvalorização histórica do real, que só ficou atrás do rublo russo nos últimos 12 meses.
Perde o consumidor brasileiro, que vê a inflação
subir e seu poder de compra minguar. Também ficam vulneráveis empresas
com dívida em dólar ou que precisam importar matéria-prima.
A parte boa é que o dólar alto acelera o ajuste das contas externas. O
gasto dos turistas no exterior em agosto caiu pela metade em relação a
agosto de 2014 e a remessa de lucros desabou (também efeito da
recessão).
A última projeção é que o déficit em conta corrente caia quase 40%
este ano. Até agosto, o efeito vem mais da queda de 22% das importações
do que das exportações, que também caíram, mas menos: 16%.
No setor de manufatura, o real fraco tende a estimular a troca por insumos nacionais e deixar os produtos brasileiros mais em conta na comparação internacional.
Em 2014, a balança comercial brasileira teve seu primeiro déficit desde 2000. Mas a projeção para 2015 foi revisada recentemente pelo Banco Central de saldo de US$ 3 bilhões para US$ 12 bilhões.
Será então que a chamada “desvalorização competitiva” pode tirar o país da crise através do setor externo?
Instabilidade e defasagem
A resposta é não. O impacto é real e positivo, mas fica diluído em um
cenário de desvalorização generalizada das outras moedas emergentes e
comércio exterior fraco. A incerteza é grande em relação a China, nosso
principal parceiro comercial.
“Exportação depende principalmente do que está acontecendo com o
comércio internacional e com os preços de commodities – e nenhum dos
dois está ajudando muito”, diz o consultor Alexandre
Schwartsman, ex-Diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.
Além disso, ninguém começa (ou volta) a exportar da noite para o dia -
especialmente com instabilidade da própria cotação, das regras do jogo e
da economia como um todo.
“Muito do impulso viria de investimentos na produção de bens para
exportar - e não tem muita gente querendo investir agora”, diz Bernardo
Guimarães, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). No 2º trimestre
do ano, o investimento teve o maior tombo desde 1996.
O governo lançou em junho um plano de incentivo às exportações mais
estratégico do que financeiro, visto pelo mercado como positivo. Mas o
Reintegra, programa que devolve créditos para quem exporta, tem uma alíquota que muda o tempo todo.
De qualquer forma, o efeito do câmbio é defasado, já que anos de moeda
sobrevalorizada fizeram o exportador perder mercado, contatos e
relações.
“O cara que vendia sapato para China há 10 anos hoje não vende nada;
agora, vai ter que ir em uma feira, estabelecer contatos, mandar
amostras. Se perdeu a cultura exportadora”, diz Alberto Ramos, diretor
para América Latina do Goldman Sachs.
Estudos do Goldman apontam que quanto maior o período de câmbio
sobrevalorizado, maior é o tempo de resposta depois da volta para um
patamar mais alto.
Fechamento
Também não ajuda que o Brasil passou muito tempo apostando no
multilateralismo enquanto o mundo caminhava para acordos bilaterais.
Nosso último tratado de livre-comércio foi com Israel, em 2010. Não
estamos há tanto tempo sem um novo desde o início do Mercosul em 1992 e
só agora aparecem sinais promissores no caminho, como o avanço das negociações com a União Europeia,
A economia brasileira é a mais fechada do G-20, segundo estudo recente
da Câmara de Comércio Mundial. As exportações são apenas cerca de 12% do
nosso PIB, contra 24% na Índia e 32% na Espanha.
Elas tendem a ajudar mais agricultura e indústria em uma economia em que
predominam serviços: “Achar que o Brasil vai sair dessa exportando é
algo muito remoto. É pedir para uma formiguinha carregar um elefante”,
diz Schwartsman.
Edmar Bacha, um dos pais do Plano Real, disse que “o câmbio foi
inventado por Deus para humilhar os economistas”. Mas tão arrogante
quando achar que dá para prever seu comportamento é achar que ele define
tudo:
“O ganho via câmbio dá algum impulso para se reequilibrar, mas é sempre
efêmero e nunca funciona no longo prazo. Nenhum país fica competitivo se
empobrecendo: a única forma de fazer isso é sendo mais produtivo”,
conclui Ramos.