Pelo menos 50% do déficit da indústria de fundos de pensão
brasileira vem de planos de previdência de empresas estatais. Ou seja,
parte da conta pode sobrar para os cofres públicos justamente no momento
em que o governo precisa conter gastos. A Caixa Econômica Federal deve
começar a fazer aportes extras em um de seus planos em breve e os
Correios terão que aumentar as contribuições adicionais que já faz desde
2013.
Os fundos de pensão que estão no negativo têm um déficit de R$ 27,6
bilhões, segundo os últimos dados da Previc, de junho deste ano. Só as
fundações dos funcionários da Caixa (Funcef), da Petrobras (Petros), do
BNDES (Fapes) e dos Correios (Postalis) têm, juntas, planos que somam
déficits de R$ 14,6 bilhões, segundo levantamento do
Valor sobre os últimos dados disponíveis das entidades.
Pelas regras dos fundos de pensão, resultados deficitários devem ser
equacionados de forma paritária entre empresas e participantes. Ou seja:
meio a meio. E, claro, isso tem preocupado os funcionários,
especialmente quem já está aposentado e terá seu benefício reduzido.
A regra do setor determina que planos que tenham déficit igual ou
inferior a 10% de seu patrimônio por três anos consecutivos devem
apresentar um plano de resolução do passivo no ano subsequente - quando
participantes e patrocinadora precisam colocar mais dinheiro no plano.
Se o déficit for superior a 10%, deve ser resolvido no exercício do ano
seguinte.
O cenário, pelo menos no curto prazo, não deve melhorar. A Abrapp,
associação que reúne os fundos de pensão, estima que, na média, as
fundações não atinjam suas metas de rentabilidade este ano, ficando
abaixo dela em 1,5 ponto percentual. A meta de 2014 é de em torno de
12%, equivalente a IPCA mais 5,5%.
A associação destaca que há uma diferença entre o déficit conjuntural
e o estrutural. "A maioria das entidades que se encontra no total de R$
27 bilhões apresenta déficit conjuntural provocado eminentemente pela
combinação, em 2013, da queda na taxa de juros básicos que levou a
normativo que obrigou as fundações a redução de suas taxas atuariais,
com a precificação dos títulos públicos federais", disse a Abrapp em
nota, destacando que há outro grupo de fundações que registram superávit
de R$ 35 bilhões - a maior parte da Previ, que tem saldo positivo de R$
25 bilhões.
Em 2013, a rentabilidade dos fundos de pensão foi de 3,28%, ante meta
de 11,63%. "Resultado bem diferente do histórico. No acumulado de 2005 a
junho de 2014 a rentabilidade do setor é 243% e a meta, de 186%",
ressaltou a associação. A Abrapp lembra que a nova regra de mensuração
do ativo e do passivo, que agora considera o prazo médio do fluxo de
pagamento dos benefícios de cada entidade, vai modificar parte dos
números de déficit e superávit.
A Funcef, terceiro maior fundo de pensão do país, vai elaborar, em
2015, o plano de equacionamento do déficit de seu maior plano, o que
exigirá contribuições extras. A fundação não bate a meta de
rentabilidade desde 2011. Mas naquele ano o superávit do ano anterior
cobriu o resultado negativo. O déficit, de R$ 4,9 bilhões até setembro,
equivale a 11% dos ativos do plano, de R$ 46,7 bilhões. Neste ano, o
retorno médio dos ativos investidos está em 5,7% até setembro, ante meta
de retorno de 8,9%.
Em eventos com participantes, o presidente da Funcef, Carlos Caser,
disse que o desempenho da fundação segue impactado pelo baixo retorno
dos investimentos em renda variável - a fundação tem 30% dos ativos em
ações. Ele afirma, porém, que a fundação tem capacidade para honrar os
compromissos com os participantes, tanto no momento como no futuro. "Não
há que se preocupar quanto a isso, a Funcef está sólida", disse.
Procurada, a Funcef disse que vai se pronunciar depois que tiver os números de 2014 fechados.
Já a fundação dos Correios, a maior do país em número de
participantes, tem saldo negativo de R$ 2,7 bilhões até setembro. Como o
valor equivale a mais de 50% dos ativos do plano, de R$ 5,1 bilhões, a
fundação terá que equacioná-lo já no próximo ano. Tanto os Correios
quanto os funcionários já fazem aportes adicionais ao plano de benefício
definido, o maior da fundação, desde o ano passado para cobrir o
resultado negativo de R$ 985 milhões de 2012 e 2011.
Procurado, o Postalis informou que "haverá, sim, aumento da
contribuição no próximo ano e os estudos atuariais estão sendo
elaborados para finalização do novo plano de equacionamento".
Já nos casos de Petros e Fapes não será necessário, por ora, fazer
aportes extras. Segunda maior fundação do país, a Petros apresentou
déficit de R$ 2,3 bilhões em 2013, valor que subiu para R$ 5,5 bilhões
até setembro deste ano. Já a Fapes vai apresentar déficit pela primeira
vez neste ano. O saldo negativo da fundação do BNDES era de R$ 1,3
bilhão até novembro.
Em nota, a Petros explica que o surgimento do déficit no ano passado
ocorreu por vários fatores, entre eles o mau desempenho da bolsa de
valores e dos títulos de renda fixa, "o que afetou todo o segmento de
previdência complementar". A fundação ainda cita a mudança da tábua de
mortalidade de seu principal plano, o que aumentou os compromissos em
cerca de R$ 1,054 bilhão.
"A Petros já estuda medidas para reversão do déficit, o que vai
depender das mudanças no cenário econômico, da aprovação das políticas
de investimentos da fundação para o próximo quinquênio e da relação
[entre] risco, retorno e liquidez de cada investimento disponível no
mercado", informou a Petros.
O fundo de pensão lembra que uma das medidas é a que altera a regra
de cálculo da meta de rentabilidade dos ativos das fundações, "que é
importante para evitar que os fundos registrem déficits irreais devido à
volatilidade da taxa básica de juros". A Petros está analisando os
impactos da nova regras sobre os seus números.
A Fapes informou que os resultados recentes "refletem a conjuntura da
economia e a volatilidade do mercado observadas no ano, fatos que
caracterizam como conjuntural o resultado deficitário que vier a ser
apresentado". A fundação diz que "no próximo exercício, caso a
conjuntura econômica apresente um desempenho positivo, como se espera,
este resultado deficitário poderá ser parcial ou integralmente
revertido".