terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Novo CPC permite abusos interpretativos do juiz, dizem advogados



Ao dar poderes ao juiz para ponderar qual norma (e não princípio) deve prevalecer em caso de conflito entre leis, o novo Código de Processo Civil — que aguarda sanção da presidente Dilma Rousseff — dá margem a abusos interpretativos e fundamenta uma ordem jurídica baseada na subjetividade. Essa é a opinião de diversos advogados ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico.

A regra criticada está no artigo 486, parágrafo 2º, do projeto, que tem a seguinte redação: “No caso de colisão entre normas, o juiz deve justificar o objeto e os critérios gerais da ponderação efetuada, enunciando as razões que autorizam a interferência na norma afastada e as premissas fáticas que fundamentam a conclusão”.



As críticas ao dispositivo começaram a proliferar após o jurista Lenio Streck fazer uma análise detalhada da questão em sua coluna de 8 de janeiro na ConJur. "O malsinado dispositivo servirá para que o juiz ou tribunal escolha, de antemão, quem tem razão, ideológica-subjetivamente", escreveu. Na conclusão, o colunista pede que Dilma vete essa norma.
O advogado e professor de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da USP Antônio Cláudio da Costa Machado concorda com Streck. Ele explica que a ponderação só pode ser feita quando há conflito entre princípios constitucionais ou direitos fundamentais e ataca a generalização da técnica interpretativa.  
“A ponderação é um princípio que vem do Direito alemão para uma situação muito específica, que é quando estão em rota de colisão princípios constitucionais ou direitos fundamentais. Só para essa situação é que a ponderação serve, porque, quando se trata de legislação infraconstitucional, é o “tudo ou nada”: ou se aplica a norma X, ou se aplica a norma Y. Não dá pra aplicar as duas ao mesmo tempo. (...) O princípio da ponderação não permite ao juiz pegar dois dispositivos da legislação infraconstitucional, fazer um meio-termo entre os dois e aplicar, entende? Isso é um absurdo”, critica Costa Machado.
Para o professor da USP, o dispositivo dá poderes excessivos ao juiz: “Isso é uma abertura para uma discricionariedade judicial que não pode existir. O juiz se pauta na lei, e ele interpreta a lei com as ideias de razoabilidade e proporcionalidade. Mas tudo isso serve para o juiz interpretar a lei, não para ele criar a lei. Esse dispositivo inteiro é uma porta aberta à criação judicial. O juiz com base numa regra dessas vai fazer o que quiser”.
O processualista ainda afirma que o veto ao parágrafo 2º do artigo 486 — tal como pedido por Streck — não seria suficiente, uma vez que o código inteiro “dá margem a voos interpretativos” dos magistrados.
De acordo com o advogado José Miguel Garcia Medina (foto), sócio do Medina & Guimarães Advogados, a redação imprecisa põe nos ombros dos doutrinadores a tarefa de delimitar os poderes interpretativos do juiz.

“A 'ponderação', de fato, tem conduzido a arbitrariedades. O uso da expressão, no texto do novo CPC, a meu ver, não foi feliz. Cumpre a nós, na doutrina, explicar que 'ponderar' não significa 'escolher arbitrariamente'. Trata-se de interpretar ao aplicar, o que significa identificar de modo preciso os limites entre os direitos em conflito, a fim de apresentar uma solução racional para a questão levada ao Judiciário”, elucida Medina.

O especialista em Direito Processual Civil Eduardo Arruda Alvim, sócio do Arruda Alvim e Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica, também se mostrou preocupado com a questão.

“Soa-me preocupante a banalização do assunto, estampada em um preceito de lei ordinária. É assunto que toca muito mais com a doutrina do que com o legislador. Com relação às regras é ainda mais preocupante, porque não é o caso de falar-se em ponderação quando estão em pauta regras, pois estas aniquilam-se umas às outras. O dispositivo, portanto, além de indevidamente abrangente, trata um assunto de extrema delicadeza, e que não faz parte do cotidiano, como algo corriqueiro. Pode, portanto, dar margem a desmandos e interpretações distorcidas, gerando muita confusão”, opina Arruda Alvim.

 

Na visão de Arruda Alvim (foto), o dispositivo deve ser vetado para não prejudicar a intenção do legislador de que o juiz fundamente suas decisões, algo especificado, principalmente, no parágrafo 1º do artigo 486. “Há — e isso é louvável — uma preocupação do novo CPC no sentido de dirigir o juiz a fundamentar adequadamente a decisão. Vários dispositivos foram redigidos nesse sentido, sendo esse um deles. Mas, este, pelas razões apontadas, merece o veto. O dispositivo realmente dá um poder desmesurado ao juiz, e desdiz tudo o que o parágrafo 1º do artigo 486 especifica com muito cuidado”, argumenta o advogado.

Membro da comissão de juristas que assessorou a Câmara dos Deputados na elaboração do novo CPC, Dierle Nunes, sócio do Camara, Rodrigues, Oliveira & Nunes Advocacia, discorda das avaliações de Lenio, Costa Machado, Medina e Arruda Alvim. Segundo ele, a leitura isolada do dispositivo encobre o verdadeiro objetivo dele, que é de evitar abusos interpretativos.

“O artigo 486 é um dos dispositivos mais relevantes do Novo CPC, e seu objetivo é exatamente o de tentar coibir abusos no momento da fundamentação. A leitura do professor Lenio é uma das possíveis, uma vez que as premissas do novo CPC coíbem o aludido aumento dos poderes judiciais. Porém, a leitura do parágrafo 2º somente pode ser feita em conformidade com premissas do contraditório dinâmico, que impede decisões de surpresa (artigo 10), da teoria normativa da cooperação (artigo 6º) e do próprio artigo 486, caput, e parágrafo 1º. Creio que a leitura isolada do dispositivo deve ser abandonada, pois contrariaria os referidos comandos da parte geral do código”, sustenta Nunes.

Clique aqui para ver todas as alterações feitas no projeto do Novo CPC.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Decisão de acordo bilateral deve partir do Brasil, avisa a UE

Por Assis Moreira | Valor
 
 
GENEBRA  -  A discussão sobre uma negociação de acordo comercial diretamente entre a União Europeia e o Brasil depende basicamente de uma decisão política do lado brasileiro, deixou claro a nova comissária europeia de comércio, Cecilia Malmström nesta quinta-feira.

Recentemente, uma pesquisa mostrou que várias empresas europeias e brasileiras consideram que, até pelo seu atraso, as negociação birregional  UE-Mercosul podem não ter êxito. E que vale tentar um acordo bilateral entre Brasil e UE, que consideram como "menos pesado" e mais capaz de fornecer resultados "em um futuro previsível".

Por sua vez, a comissária de comércio, ao ser indagada sobre a questão, sorriu, balançou a cabeça e sinalizou que depende de o Brasil tomar uma eventual iniciativa, para o tema ser avaliado por Bruxelas. Ela lembrou que o mandato atual da UE é para negociar com o Mercosul.

O diretor-geral da Comércio, Jean-Luc Demarti, disse que não partiria de Bruxelas uma iniciativa de acordo diretamente com o Brasil, para a 'UE não ser acusada de ter quebrado o Mercosul'.

O fato, para importantes negociadores, é que, apesar de acenos da presidente Dilma Rousseff de novo ao bloco do Cone Sul, o sentimento é de que não dá para o Brasil esperar muito a Argentina arrumar sua economia e um dia decidir avançar em acordo de liberalização com outros parceiros importantes.

Alem disso, esses negociadores notam que a Tarifa Externa Comum  (TEC) do Mercosul hoje é uma fantasia, com 50% de exceções. O Uruguai é um membro cada vez menos convencido de que faz bom negócio permanecendo no bloco.

Comissária da UE quer regras anticorrupçao com Mercosul

Presidenta Dilma Rousseff durante cerimônia de Abertura da XLVII Cúpula do Mercosul e Estados Associados. (Paraná, Província de Entre Rios - Argentina - 17/12/2014 (Foto: Roberto Stuckert Filho/PR)
Por Assis Moreira | Valor
 
GENEBRA  -  A comissária de comércio da União Europeia (UE), Cecilia Malmström, chamou nesta quinta-feira a corrupção de 'uma doença' e sinalizou que uma das prioridades de Bruxelas na negociação com o Mercosul será a inclusão de regras nas licitações públicas,  que são conhecidas como regras "anticorrupção".

Em sua primeira visita a Genebra, na sexta semana no cargo, a nova negociadora comercial chefe europeia respondeu a vontade sobre o impacto dos escândalos no Brasil na confiança de investidores europeis e da própria Comissao Europeia.

Ela disse que não julgaria 'a natureza' dos escândalos no Brasil, mas que em geral casos de corrupção 'não são bons para a confiança e não só do Brasil, mas de todos". Acrescentou que 'a corrupção não é ruim apenas para a economia. Mas ela também causa dano para a confiança, legitimidade ou na relação dos cidadãos e de outros sobre o país". Para a comissária, corrupção não é apenas uma questão econômica, como também política', daí a prioridade que o governo brasileiro diz estar dando a esse problema. 

Companhias europeias são responsáveis por 45% do Investimento Estrangeiro Direito (IED) no Brasil. Por sua vez, 53% dos investimentos brasileiros no exterior foram destinados a países europeus. A UE é um dos principais parceiros comerciais do Brasil.

Cecilia Malmström reiterou que a UE quer bom acesso ao mercado do Mercosul, e que isso inclui acesso ao mercado de compras governamentais, e portanto para empreiteiras europeias no Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela. A negociação de um acordo birregional, se avançar, deve estabelecer também regras para garantir as transparencias nos contratos.

Existe um Acordo de Compras Governamentais, na Organizaçao Mundial do Comércio (OMC), com participação restrita de países. O Brasil nunca quis aderir a esse que é chamado um do principais instrumentos anticorrupçao no comércio mundial. Mas o país tem negociado no tema de compras governamentais com os europeus.

Para a comissária europeia, e há 'muitas razões' pelo atraso na retomada negociação UE-Mercosul, mas evitou apontar culpados. Ela repetiu a posição europeia de que o mais importante agora é que os países do Mercosul disseram que querem se engajar na negociação do acordo birregional.

Como outras autoridades europeias, a comissária de comércio reiterou que Bruxelas quer se assegurar sobre a dimensão das ofertas de liberalização do Mercosul, ante de 'retomada de reais negociações'. 'Queremos ver se as ofertas tem o mesmo nível de ambição de abertura dos respectivos mercados, para ver se é necessária calibrá-las'', afirmou. 'Precisamos ainda de detalhes de parte do Mercosul, antes de avaliar o que mudou em relação a oferta de 2004', avisou.

A comissária europeia declarou-se otimista sobre a retomada da Rodada Doha, elogiou a reaproximação EUA-Cuba, insistiu que os problemas da Russia atualmente nada tem a ver com o embargo ocidental e sim com falta de reformas que não foram feitas por Moscou.

Carolyn, a 'arma secreta' do Facebook


Por Gustavo Brigatto | De São Paulo
Luis Ushirobira/ValorCarolyn Everson, do Facebook: desde sua chegada, em 2011, receita quadruplicou
 
Pouca gente já ouviu falar de Carolyn Everson. Talvez por isso, a executiva americana de 42 anos possa ser considerada uma espécie de "arma secreta" na estratégia de crescimento do Facebook.

Enquanto o fundador da rede social Mark Zuckerberg, cuida da parte estratégica e seu braço direito, a diretora de operações Sheryl Sandberg toca o dia a dia do negócio, é Carolyn quem faz o meio de campo da companhia com o mercado publicitário. Em outras palavras, é ela quem faz com que o dinheiro dos anunciantes seja colocado na rede social. Na verdade, foi a executiva quem construiu as pontes que ligam os dois mundos e acelerou exponencialmente o avanço do Facebook nos últimos anos.

Desde sua chegada, em fevereiro de 2011, a receita da companhia saltou de US$ de 2 bilhões para quase US$ 8 bilhões no ano passado. Em 2014, a rede social responderá por 7,75% dos US$ 146 bilhões que devem ser investidos globalmente em publicidade digital, um avanço de dois pontos percentuais em relação ao ano passado, segundo a empresa de pesquisa eMarketer. No 3º trimestre, a publicidade respondeu por 92% da receita da companhia - em 2011 eram 83%. "Nos últimos quatro anos evoluímos de uma plataforma social, onde as empresas constroem suas marcas bases de fãs, para uma plataforma de mídia, que gera resultados de negócios para os anunciantes", disse a vice-presidente de soluções globais de marketing do Facebook ao Valor.

O caminho ainda é longo para alcançar o Google, que detém um terço da publicidade digital no mundo. Mas três aspectos da estratégia da companhia podem ajudá-la a reduzir mais rapidamente essa distância: o foco em dispositivos móveis, nos anúncios no formato de vídeo e a exibição de anúncios fora do ambiente do Facebook. Este último passo, aliás, pode ser considerado um dos mais interessantes da companhia.

Mesmo com 1,35 bilhão de usuários - quase 70% dos internautas no mundo - o Facebook sofre por ser um ambiente fechado. Ao contrário do Google, que é acessado quando o internauta está em busca de alguma coisa, portanto mais suscetível ao impacto da publicidade, no Facebook, os usuários precisam acessar suas contas, para então ver os anúncios. Com a possibilidade de vender anúncios fora de suas cercas, o Facebook aumenta o impacto que uma campanha pode ter. "Podemos ajudar os anunciantes a fazer publicidade direcionada e encontrar pessoas de verdade fora do Facebook [usando os dados que são coletados dos usuários da rede]", disse Carolyn.

Em sua segunda visita ao Brasil, ela se reuniu com publicitários para discutir ideias e levantar sugestões de novos funcionalidades e formatos de anúncios. O conselho de clientes foi criado em 2011 e funciona no Reino Unido, Brasil, Índia e como um bloco único para os países da Europa, África e Oriente Médio. "Ela conduz muito bem esse diálogo com o mercado", disse um executivo que participou do encontro.

Carolyn tem um currículo recheado com passagens pela Microsoft, Disney e MTV. Foi no canal de música que ela ouviu falar pela primeira vez do Facebook. Em 2005, quando comandava a área de publicidade da MTV, ela se interessou pela rede social que começava a se tornar popular entre os jovens e chegou a sugerir sua aquisição pela MTV. As negociações chegaram a acontecer, mas não resultaram em um acordo. "Talvez tenha sido melhor assim", disse a executiva.

Assim como Sheryl Sandberg, Carolyn é uma defensora do aumento da presença das mulheres no mercado de tecnologia. "Elas são apenas 18% dos formandos em ciência da computação nos Estados Unidos", ressaltou. Para estimular isso, ela faz encontros e também acompanha a carreira de algumas profissionais da companhia. "Acredito que as mulheres podem ter uma carreira e cuidar da família. Não é um, ou outro", disse a mãe de gêmeas. Ela destaca, no entanto, que essa questão não é apenas das mulheres. "Também estímulo os homens da minha equipe a passar tempo com a família", completou.

Conselheira de diversas empresas, Carolyn ainda acha tempo para fazer trabalho voluntário. Antes de chegar ao Brasil, ela passou 10 dias com as filhas de 12 anos no Equador ajudando a construir casas para famílias carentes. "Tento mostrar a elas que o mundo não é só a vida que temos nos Estados Unidos", disse.
No mundo da publicidade, ela disse acreditar que o cenário de restrição de verbas por conta da turbulenta situação econômica global não é um problema para os planos de crescimento do Facebook. "Dá para fazer publicidade eficiente com menos verba", disse.

A Medida Provisória 656/2014 enriquece ainda mais os donos de cartórios


 Manual sobre como conservar documentos foi elaborado pelo CNJ



 
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A MP 656, no inciso IV do artigo 54, estabelece o procedimento da concentração das ações judiciais na matrícula do imóvel, sendo a cobrança deste procedimento estabelecido no art. 56, § 1º.

Traduzindo: o autor de qualquer ação judicial (trabalhista, juizado especial, penal, etc.) para ser considerado diligente, deverá percorrer todos os cartórios de registros de imóveis de sua cidade fazendo pesquisas para localizar bens dos réus e depois promover as averbações dessas ações nas matrículas de seus imóveis. Para efeito de pagamento ao cartório de registro de imóveis, esta averbação é considerada sem valor declarado.

Os donos de cartórios de registro de imóveis, além de ganhar grandes somas de dinheiro com todas essas pesquisas de bens, averbações nas matrículas dos imóveis, foram contemplados também com a exigência de mais uma certidão para a lavratura do contrato de compra e venda de imóveis – a certidão de propriedade (artigo 59).

Todos nós sabemos que as receitas dos cartórios de registro de imóveis são milionárias. Dou como exemplo as receitas do ano 2013 de dois cartórios, divulgadas pelo Conselho Nacional de Justiça:

Registro de Imóveis da 1a Zona de Porto Alegre – R$16.064.090,00
1º Oficio de Registro de Imóveis de São Paulo – R$ 14.400.194,00

Para se ter uma ideia do quanto a MP 656/2014 ajudará aos donos de cartórios ficarem mais ricos, basta refletirmos sobre os seguintes pontos:

1. Até agosto de 2014, tramitava no TJ/SP 20.258. 821 ações (conforme o Comunicado nº 1090/2014 da Corregedoria Geral-TJ/SP);

2. O valor da averbação sem valor declarado cobrado em São Paulo (item 2.1 da tabela da ARISP) é de R$ 20,14 por ato;

3. Como a baixa da averbação também será cobrada, o autor da ação pagará, no mínimo, R$ 40,28 por ação averbada no cartório. Eu digo "no mínimo" porque qualquer alteração durante a tramitação da ação judicial (retificações, redistribuições, inclusão e/ou exclusões de nomes, etc) deverá ser averbada e paga pelo autor de qualquer ação judicial:

4. Considerando apenas as ações em curso na Justiça Estadual de São Paulo, os autores de ações judiciais arcarão com uma despesa de dois bilhões de reais, que está sendo direcionada, pela MP 656, aos donos cartórios de registros de imóveis. O montante desse valor é muito maior, pois neste cálculo não se levam em conta as ações das justiças federal e trabalhista.

Venina está depondo no Ministério Público em Curitiba

 
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Por Juliano Basile | Valor
 
CURITIBA  -  A geóloga Venina Velosa da Fonseca está depondo, nesta sexta-feira, junto à força tarefa da Operação Lava-Jato que investiga os esquemas de desvios de dinheiro da Petrobras. Ela está sendo ouvida por procuradores da República ao lado de seu advogado, Ubiratan Mattos.

O depoimento de Venina deve trazer novas informações a respeito das irregularidades na Petrobras. A geóloga conduziu uma auditoria na área de comunicação da Diretoria de Abastecimento da estatal em que descobriu desvios de pelo menos R$ 58 milhões. O dinheiro foi repassado a empresas da área de comunicação que não prestaram os serviços. Venina tem documentos, cópias de e-mails e notas fiscais comprovando essas irregularidades. Todo esse material será entregue à força tarefa.

O esquema de desvios na área de comunicação do Abastecimento foi descoberto por Venina quando Paulo Roberto Costa comandava essa diretoria na estatal, entre 2008 e 2009. Venina era subordinada a Paulo Roberto e foi reclamar com o então chefe a respeito do esquema. Na ocasião, ele apontou o dedo para o retrato do presidente Lula e perguntou se ela estava “querendo derrubar todo mundo”. Acusado de diversas irregularidades, Costa foi preso e fez um acordo de delação premiada com o Ministério Público no qual se comprometeu a entregar provas dos crimes em troca de redução de pena.

Esse esquema envolveu o desvio de verbas para o PT da Bahia, o grupo político do então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli. Em 3 de abril de 2009, Venina enviou um e-mail pedindo ajuda para Graça Foster, então diretoria de Gás e Energia, para concluir um texto sobre as descobertas que fez de desvios milionários na área de comunicação. A mensagem foi enviada às 3h50 daquele dia, o mesmo do relatório final da comissão. Graça não respondeu.

A Petrobras informou, em nota, que demitiu o funcionário responsável pelos desvios, Geovanne de Morais. No entanto, como ele estava sob licença médica, a estatal manteve-o no cargo por mais quatro anos. Ao verificar que Geovanne não foi demitido, Venina obteve um parecer jurídico determinando o desligamento do funcionário, mesmo sob licença médica. Ela encaminhou esse parecer aos superiores, pois achava absurdo que o funcionário pego em desvios continuasse sob a folha de pagamento da estatal. Mas Geovanne não foi desligado de imediato. Demorou mais de quatro anos, informação atestada em nota recente da própria Petrobras.

Venina deve apresentar provas desse e de outros casos. A geóloga batalhou contra a aprovação de aditivos que elevaram os custos da refinaria Abreu e Lima, em 2009, e denunciou desvios feitos por negociadores de combustível de navio em unidades da Petrobras no exterior. Ao todo, ele obteve mais de mil comunicações entre “traders” e esse material está sendo encaminhado ao Ministério Público.

Banca empresarial decidiu defender Venina


Por Juliano Basile | Valor
Vitor Salgado / Valor

BRASÍLIA  -  Mandada para Cingapura, com duas filhas pequenas, o salário cortado em cerca de 40%, destituída de suas funções, separada do marido, diagnosticada com distúrbio de ansiedade e com a empresa pela qual trabalhou durante 24 anos afastando-a de suas funções e se negando a custear até a sua passagem de volta ao Brasil, Venina Velosa da Fonseca, a geóloga que denunciou por cinco anos irregularidades na Petrobras, enfrentou ainda uma dificuldade adicional.

Ela precisava de um advogado para obter os seus direitos junto à estatal justamente no momento em que a imensa maioria das grandes bancas do Rio de Janeiro e de São Paulo está comprometidas com a defesa de empresários e das companhias suspeitas de envolvimento no desvio de verbas da estatal.

“Nossa decisão de representar Venina levou em conta não somente a situação difícil em que ela se encontra, mas também a nossa indignação quanto ao que está ocorrendo no país”, afirmou Ubiratan Mattos, advogado que abraçou a defesa da geóloga.

Ubiratan é sócio de uma banca de São Paulo que possui grandes empresas em sua carteira de clientes — o escritório Mattos Muriel Kestener Advogados. São 150 profissionais dos quais 70 são advogados e 30 são estagiários. A banca atua na área do direito empresarial e fez muitos casos na área de compliance, antes mesmo da promulgação da Lei Anticorrupção, em janeiro deste ano. Ubiratan já foi presidente do Instituto Brasileiro de Relações de Concorrência e Consumo (Ibracc), entidade que reúne os principais advogados das companhias bilionárias que enfrentam processos no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Ele está acostumado a atuar em processos envolvendo valores altíssimos.

Quando Venina o procurou, o advogado logo percebeu que aquela não era uma causa cujo objetivo seria o retorno financeiro. “Evidentemente que o que está em jogo não são honorários altos, mas os valores éticos que devem pautar a atividade empresarial”, afirmou. “Nesse caso, nós nos solidarizamos com a parte mais vulnerável. Nós decidimos que a primeira medida a tomar é garantir o emprego dela na Petrobras.”

A banca não está atuando de graça, mas combinou com Venina um valor “que coubesse em seu orçamento”. “Nós fizemos uma reunião de sócios para avaliação do caso da Venina, e seu potencial conflito com a defesa de outros clientes”, revelou o sócio Marcelo Muriel. “Concluímos não haver nenhuma incompatibilidade, já que a Venina tem contra si a alta direção da Petrobrás, e não as empresas. Além disso, ela está do lado da ética e da transparência, valores que estão no nosso DNA e com os quais nossos clientes se identificam e exercitam no dia a dia, com a nossa ajuda”, completou.