Emergentes buscam espaço na ‘disputa por cérebros’. No
Brasil, a demanda por engenheiros qualificados levanta questões sobre a
dificuldade de conseguir vistos de trabalho no país. A burocracia do
país ainda é considerada um obstáculo para empresas locais e
internacionais.
A migração de profissionais
altamente qualificados ficou conhecida como “fuga de cérebros” – já
que, em geral, eles deixavam países em desenvolvimento para aumentar o
valor da força de trabalho das nações mais ricas.
Mas atualmente, para os governos dos países em desenvolvimento, a
perda de cérebros é um fator cada vez maior de preocupação, na medida em
que o crescimento econômico exige maiores contingentes de profissionais
com todos os níveis de qualificação.
“Se o tipo de habilidades requeridas pelo novo momento econômico
destes países muda, é mais difícil depender do treinamento doméstico.
Leva tempo – muitas vezes anos – para treinar pessoas que trabalhem em
profissões de alta qualificação”, diz o correspondente de economia do
Serviço Mundial da BBC, Andrew Walker.
Por conta disso, os Brics e outros países do Leste Europeu e da Ásia
começam a adotar políticas de atração de profissionais estrangeiros em
paralelo a programas que buscam trazer de volta os talentos perdidos.
No Brasil, a demanda por engenheiros qualificados em todos os setores
– especialmente ligados à exploração de petróleo, após a descoberta do
pré-sal – também levanta questões sobre a dificuldade de conseguir
vistos de trabalho no país.
Em entrevista à BBC Brasil, o presidente do BID (Banco Interamericano
de Desenvolvimento), Luis Alberto Moreno, disse que os países
latino-americanos carecem de mão de obra qualificada e devem estimular a
imigração de estrangeiros para alavancar o crescimento econômico.
Em 2012, cerca de 73 mil estrangeiros obtiveram vistos temporários ou
permanentes para trabalhar no Brasil, mas a burocracia do país ainda é
considerada um obstáculo para empresas locais e internacionais.
Atualmente, cerca de 214 milhões de pessoas são migrantes internacionais, vivendo e trabalhando em países estrangeiros.
Dentro desse contingente, os migrantes altamente qualificados são uma
minoria cada vez mais considerada como um “trunfo” para países
desenvolvidos, onde o envelhecimento da população causa preocupações com
a reposição da força de trabalho.
O movimento é provavelmente mais conhecido em relação aos
profissionais de saúde que, de acordo com a OCDE, estão em falta em todo
o mundo há mais de dez anos.
Mas recentemente, a disputa por estrangeiros também engloba outros
grupos de profissionais, especialmente nos setores de tecnologia da
informação e de engenharia.
“As profissões de STEM (ciência, tecnologia, matemáticas e
engenharias, na sigla em inglês) são as mais procuradas
internacionalmente no momento”, afirma Thomas Liebig, analista da
Divisão Internacional de Migração da OCDE, à BBC Brasil.
“Os países precisam desses profissionais para subir mais degraus na
escada de talentos e levar suas economias para o próximo nível”,
acrescenta Liebig.
“Se você tem este tipo de profissionais, eles ajudam a garantir que
as pessoas com menor qualificação também terão empregos, porque
contratá-los garante que as grandes empresas poderão expandir sua
produção. É o que se chama de efeito circular.”
Migração reversa
Nos últimos anos, China e Índia, os dois maiores exportadores de
talentos do mundo, desenvolveram programas que priorizam a atração de
seus próprios cidadãos e descendentes de volta para o país, como
profissionais no topo da cadeia ou empreendedores.
Impossibilitado de oferecer salários competitivos, o governo da
África do Sul criou um programa para aproveitar a “diáspora” de talentos
para treinar os profissionais que ficaram no país.
Especialistas em TI indianos que foram trabalhar no Vale do Silício,
na Califórnia, também ajudaram a criar uma indústria de serviços de
computação em franco crescimento na Índia. A cidade de Bangalore, no sul
do país, ganhou o nome de “Vale do Silício indiano”.
Na contramão dessa abordagem, países como Canadá, Austrália, Nova
Zelândia e Grã-Bretanha – alguns dos destinos mais tradicionais para
imigrantes qualificados – se tornaram mais seletivos.
Na Grã-Bretanha e em outros membros da União Europeia, o grande fluxo
de imigrantes qualificados gerou protestos de setores que temem pelo
aumento do desemprego entre nativos, especialmente após a crise
econômica.
Na prática, o aumento da seletividade significa a adoção de políticas
para garantir que, cada vez mais, os profissionais estrangeiros já
cheguem ao país com ofertas de emprego e sejam encaminhados a regiões
onde a demanda por profissionais altamente qualificados é maior –
geralmente mais longe das capitais.
O risco para estes países é a perda de talentos na medida em que
nações fora do eixo e menos atingidos pelo revés econômico oferecem
condições mais atraentes para os profissionais.
De acordo com a OCDE, os países asiáticos fornecedores de mão de obra
qualificada tendem a absorver nos próximos anos cada vez mais os seus
talentos.
Integração cultural é desafio para profissionais imigrantes
“O que eu mais gosto de viver e trabalhar no Brasil é que consigo me
identificar com a mentalidade dos meus amigos locais. Todos nós somos de
países em desenvolvimento, então temos uma compreensão mútua das
culturas dos nossos países. Se eu digo para alguém na Europa que
chineses comem carne de cachorro, por exemplo, eles ficaram enojados,
mas no Brasil, eles só dizem: ‘Ah, é uma cultura diferente’. Fiquei
muito surpreso.
Mas é muito difícil encontrar emprego e conseguir um visto de
trabalho aqui. Muitos de meus colegas estrangeiros (da universidade
brasileira) queriam ficar para trabalhar, mas muito poucos conseguiram
por causa da competição com estudantes locais. Estudantes brasileiros
geralmente passam dois ou três anos estagiando em empresas locais e eles
também falam muitas línguas.
A burocracia é um dos obstáculos aqui. Eu ainda tenho que resolver a
situação do meu visto de trabalho. Minha empresa chinesa pediu à sua
distribuidora brasileira para me ajudar a conseguir um visto me
contratando diretamente. Senão, eu teria que viajar de volta para a
China a cada três meses porque minha empresa não está registrada no
Brasil como negócio local.
Meu conselho aos profissionais migrantes que vem ao Brasil é que,
primeiramente, falem a língua. Em segundo lugar, leva tempo para fazer
bons amigos. Os brasileiros em geral são muito amigáveis e
hospitaleiros, então é fácil fazer amigos, mas é preciso muito mais
tempo até você conseguir amigos com quem possa dividir tudo. Pela minha
experiência e a de todos os estudantes estrangeiros que conheço, no fim o
que faz você gostar do lugar são as pessoas. Então você precisa dar um
tempo para elas.”
Camilla Costa
(Editado)
(Editado)
(BBC Brasil – 04/03/2013)