domingo, 7 de abril de 2013

A DISPUTA PELA IMIGRAÇÃO QUALIFICADA

 

                            

Emergentes buscam espaço na ‘disputa por cérebros’. No Brasil, a demanda por engenheiros qualificados levanta questões sobre a dificuldade de conseguir vistos de trabalho no país. A burocracia do país ainda é considerada um obstáculo para empresas locais e internacionais.

A migração de profissionais altamente qualificados ficou conhecida como “fuga de cérebros” – já que, em geral, eles deixavam países em desenvolvimento para aumentar o valor da força de trabalho das nações mais ricas.

Mas atualmente, para os governos dos países em desenvolvimento, a perda de cérebros é um fator cada vez maior de preocupação, na medida em que o crescimento econômico exige maiores contingentes de profissionais com todos os níveis de qualificação.

“Se o tipo de habilidades requeridas pelo novo momento econômico destes países muda, é mais difícil depender do treinamento doméstico. Leva tempo – muitas vezes anos – para treinar pessoas que trabalhem em profissões de alta qualificação”, diz o correspondente de economia do Serviço Mundial da BBC, Andrew Walker.

Por conta disso, os Brics e outros países do Leste Europeu e da Ásia começam a adotar políticas de atração de profissionais estrangeiros em paralelo a programas que buscam trazer de volta os talentos perdidos.

No Brasil, a demanda por engenheiros qualificados em todos os setores – especialmente ligados à exploração de petróleo, após a descoberta do pré-sal – também levanta questões sobre a dificuldade de conseguir vistos de trabalho no país.

Em entrevista à BBC Brasil, o presidente do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), Luis Alberto Moreno, disse que os países latino-americanos carecem de mão de obra qualificada e devem estimular a imigração de estrangeiros para alavancar o crescimento econômico.

Em 2012, cerca de 73 mil estrangeiros obtiveram vistos temporários ou permanentes para trabalhar no Brasil, mas a burocracia do país ainda é considerada um obstáculo para empresas locais e internacionais.

Atualmente, cerca de 214 milhões de pessoas são migrantes internacionais, vivendo e trabalhando em países estrangeiros.

Dentro desse contingente, os migrantes altamente qualificados são uma minoria cada vez mais considerada como um “trunfo” para países desenvolvidos, onde o envelhecimento da população causa preocupações com a reposição da força de trabalho.

O movimento é provavelmente mais conhecido em relação aos profissionais de saúde que, de acordo com a OCDE, estão em falta em todo o mundo há mais de dez anos.

Mas recentemente, a disputa por estrangeiros também engloba outros grupos de profissionais, especialmente nos setores de tecnologia da informação e de engenharia.

“As profissões de STEM (ciência, tecnologia, matemáticas e engenharias, na sigla em inglês) são as mais procuradas internacionalmente no momento”, afirma Thomas Liebig, analista da Divisão Internacional de Migração da OCDE, à BBC Brasil.

“Os países precisam desses profissionais para subir mais degraus na escada de talentos e levar suas economias para o próximo nível”, acrescenta Liebig.

“Se você tem este tipo de profissionais, eles ajudam a garantir que as pessoas com menor qualificação também terão empregos, porque contratá-los garante que as grandes empresas poderão expandir sua produção. É o que se chama de efeito circular.”

Migração reversa

Nos últimos anos, China e Índia, os dois maiores exportadores de talentos do mundo, desenvolveram programas que priorizam a atração de seus próprios cidadãos e descendentes de volta para o país, como profissionais no topo da cadeia ou empreendedores.

Impossibilitado de oferecer salários competitivos, o governo da África do Sul criou um programa para aproveitar a “diáspora” de talentos para treinar os profissionais que ficaram no país.

Especialistas em TI indianos que foram trabalhar no Vale do Silício, na Califórnia, também ajudaram a criar uma indústria de serviços de computação em franco crescimento na Índia. A cidade de Bangalore, no sul do país, ganhou o nome de “Vale do Silício indiano”.

Na contramão dessa abordagem, países como Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Grã-Bretanha – alguns dos destinos mais tradicionais para imigrantes qualificados – se tornaram mais seletivos.

Na Grã-Bretanha e em outros membros da União Europeia, o grande fluxo de imigrantes qualificados gerou protestos de setores que temem pelo aumento do desemprego entre nativos, especialmente após a crise econômica.

Na prática, o aumento da seletividade significa a adoção de políticas para garantir que, cada vez mais, os profissionais estrangeiros já cheguem ao país com ofertas de emprego e sejam encaminhados a regiões onde a demanda por profissionais altamente qualificados é maior – geralmente mais longe das capitais.

O risco para estes países é a perda de talentos na medida em que nações fora do eixo e menos atingidos pelo revés econômico oferecem condições mais atraentes para os profissionais.

De acordo com a OCDE, os países asiáticos fornecedores de mão de obra qualificada tendem a absorver nos próximos anos cada vez mais os seus talentos.

Integração cultural é desafio para profissionais imigrantes

“O que eu mais gosto de viver e trabalhar no Brasil é que consigo me identificar com a mentalidade dos meus amigos locais. Todos nós somos de países em desenvolvimento, então temos uma compreensão mútua das culturas dos nossos países. Se eu digo para alguém na Europa que chineses comem carne de cachorro, por exemplo, eles ficaram enojados, mas no Brasil, eles só dizem: ‘Ah, é uma cultura diferente’. Fiquei muito surpreso.

Mas é muito difícil encontrar emprego e conseguir um visto de trabalho aqui. Muitos de meus colegas estrangeiros (da universidade brasileira) queriam ficar para trabalhar, mas muito poucos conseguiram por causa da competição com estudantes locais. Estudantes brasileiros geralmente passam dois ou três anos estagiando em empresas locais e eles também falam muitas línguas.

A burocracia é um dos obstáculos aqui. Eu ainda tenho que resolver a situação do meu visto de trabalho. Minha empresa chinesa pediu à sua distribuidora brasileira para me ajudar a conseguir um visto me contratando diretamente. Senão, eu teria que viajar de volta para a China a cada três meses porque minha empresa não está registrada no Brasil como negócio local.

Meu conselho aos profissionais migrantes que vem ao Brasil é que, primeiramente, falem a língua. Em segundo lugar, leva tempo para fazer bons amigos. Os brasileiros em geral são muito amigáveis e hospitaleiros, então é fácil fazer amigos, mas é preciso muito mais tempo até você conseguir amigos com quem possa dividir tudo. Pela minha experiência e a de todos os estudantes estrangeiros que conheço, no fim o que faz você gostar do lugar são as pessoas. Então você precisa dar um tempo para elas.”

Camilla Costa
(Editado)
(BBC Brasil – 04/03/2013)

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