Por Antonio Machado
Onde foi que o Brasil errou? Provavelmente, no gasto público sem a
aferição do resultado e sem controle pela sociedade do que se fez e se
faz com os dinheiros com função social.
Onde erramos?
Sabe aquele misto de exclamação e pergunta “onde foi que errei?!” – o
clássico desabafo diante das frustrações da vida? Pois é...
Aplica-se
a este momento do país, em que jovens ocupam escolas em alguns estados
para protestar contra a proposta saneadora do gasto público, a PEC do
Teto, e a medida provisória que muda o currículo do ensino médio. Eles
defendem o indefensável, já que a educação é uma das causas profundas,
talvez a maior, de nosso atraso secular.
Onde foi que o Brasil errou?
Provavelmente, no gasto público sem a aferição do resultado e sem
controle pela sociedade do que se fez e se faz com ele, como indica a
relação entre a carga tributária e o Índice de Desenvolvimento Humano,
IDH, indicador das Nações Unidas que avalia a qualidade dos bens e
serviços prestados pelo Estado.
A correlação entre carga de impostos e
IDH é alta, conforme estudo de junho último do Simprofaz.
Na América
Latina, países como Chile, em que os impostos totalizam 21,3% do PIB,
Argentina (29%), México (11%), Peru (17,4%), Equador (16,9%), todos têm
IDH superior ao do Brasil, cuja carga tributária é de 33,8% do PIB.
Em
geral, países com IDH semelhante ao nosso, 0,718 (quanto mais perto de
1, maior a qualidade de vida), têm metade da carga de tributos praticada
aqui.
Essa já é uma medida robusta do flagrante de desperdícios no
país, justificando o freio de arrumação que deve resultar da PEC do
Teto, ao limitar a expansão do gasto federal à inflação do ano anterior.
A rigor, não haverá corte, mas avaliação e transparência em muito maior
escala sobre a aplicação dos dinheiros com função social.
Tome-se a educação.
É
razoável que alunos invadam escolas alegando temer a eventual redução
do custeio do ensino público e a perda da qualidade curricular? Não, não
é, mesmo assumindo que tais invasões envolvem poucos alunos - cerca de
20 a 30 em escolas com mil a três mil estudantes -, mobilizados por
grêmios estudantis operados por partidos e sindicatos de professores e
de funcionários. Aos fatos.
O gasto público com educação cresce desde
2000 e já representa 19% do total das despesas do governo, segundo nota
da analista Natália Sarellas, do blog Economia de Serviços. Na média da
OCDE, entidade que reúne os países desenvolvidos e alguns emergentes,
tal fração é de 13%. A questão, portanto, é o que se faz com o dinheiro,
mas os alunos engajados na onda de invasões não questionam coisa
alguma.
Disparates da educação
Os governos federal, estaduais e municipais não gastam pouco com
educação, mas gastam de modo desigual em relação às prioridades. O gasto
público por aluno do ensino superior é quatro vezes maior que o do
ensino fundamental - a maior disparidade entre os países da OCDE e
parceiros.
As universidades públicas absorvem o grosso da verba da
educação pública, mas é a rede particular que mais recebe alunos de
graduação – 75% das matrículas em 2015, graças ao FIES.
O gasto em educação é também sem foco no que se faz necessário.
Os
cursos mais essenciais para as novas demandas, envolvendo ciência,
tecnologia, engenharia e matemática, STEM, no acrônimo em inglês,
continuam com elevada evasão, embora a taxa de ingresso por 10 mil
habitantes, de 8,5% a 12,3% em 2010, até fosse maior que a da OCDE.
Essas taxas chegaram, ao fim dos cursos, reduzidas, respectivamente, a
3% e a 5,2%. E o viés continua desfavorável, apesar do aumento das
verbas.
Juventude manipulada...
A proposta do governo para alçar a qualidade do ensino médio prevê
três matérias obrigatórias, matemática, português e inglês, o resto
sendo modulado conforme o interesse dos alunos, além da gradativa
expansão para período integral das aulas. A discussão está aberta.
O
que não se pode é manipular politicamente adolescentes, como se o
reforma fosse desnecessária.
Ainda que não seja o que se propôs, como
está não pode ficar. Nossa escolaridade média em 2000 era um pouco acima
da dos EUA, Canadá e Austrália em 1900, segundo outra análise do blog
Economia de Serviços, de Anaely Machado.
Aqui o tempo médio de
escolaridade é de quase oito anos, contra 13 nos EUA e Coréia do Sul.
Isso sugere que não se chegará a dez anos de estudos até 2040, abaixo da
marca dos demais países do BRICS.
...e o futuro ameaçado
Então, estamos assim com a educação: se gasta muito tanto em termo
absoluto como relativo, paga-se mal aos professores e os estudantes
aprendem pouco. E isso quando ficam até o fim de cada ciclo letivo.
No
ranking do PISA, o Programa Internacional de Avaliação de Alunos da
OCDE, espécie de Enem aplicado em 37 países, somos o penúltimo.
É uma
tragédia com efeitos mais duradouros que o banzé fiscal das últimas
três décadas. E é mais trágico quando se assiste no mundo desenvolvido e
mesmo na China ao viés de substituição de gente por máquinas cada vez
mais autônomas e inteligentes. O tempo para indulgências acabou. E como
ficamos? Ocupando escola é que não dá.
Decisões promissoras
Se o acúmulo de erros não permite distrações num mundo sem chance
para quem aposta no futuro (como se dizia do Brasil) e descuida do
presente, decisões surpreendentes nos últimos dias parecem denotar algo
promissor. A PEC do Teto passou com duas votações expressivas na Câmara,
por exemplo, algo incomum até nos governos Lula e FHC.
O STF,
normalmente absurdamente lento, rejeitou a desaposentação e autorizou o
corte de salário de funcionário público em greve. Em manifestações
pontuais, ministros do STF também criticaram juízes e procuradores
lenientes com a invasão de escolas.
E, ainda não muito visível,
percebe-se uma movimentação de parlamentares, em especial na Câmara,
para resgatar a agenda perdida de reformas envolvendo a modernização e
(sobretudo) a simplificação da microeconomia, campo vastíssimo de
oportunidades para promover crescimento e emprego.
Não é certo que
tal disposição prospere. Mas seria injusto ignora-la, até porque a
história ilustra que progressos reais aconteceram, no mundo, quase
sempre em situações limite. Estamos neste ponto
(Cidade Biz, )
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