segunda-feira, 3 de abril de 2017

Governo usa bilhões do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos para inflar o caixa







Direitos difusos são aqueles que pertencem à coletividade, a um grupo indeterminado de pessoas ligadas por uma circunstância, como consumidores afetados por um cartel ou indígenas que tiveram suas terras atingidas por barragens. As condenações por violações a esses direitos, no Brasil, resultam no pagamento de indenização ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. No entanto, o valor arrecadado, que deveria servir para a reparação dos danos, tem sido usado para a União para inflar a conta do superávit primário.


Kittichai Songprakob/123RF
Levantamento feito pela revista eletrônica Consultor Jurídico mostra que o Fundo recebeu R$ 1,9 bilhão nos últimos sete anos, mas menos de 3% disso foram aplicados nos fins determinados em lei. O dinheiro quase todo foi para os cofres da União, pela porta dos fundos.

Só em 2016, R$ 775 milhões chegaram ao Fundo. O dinheiro vem principalmente das multas aplicadas pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) a empresas condenadas por formação de cartel, tendo origem também em condenações em ações civis públicas de responsabilidade por danos ao meio-ambiente, ao consumidor e aos investidores no mercado de valores mobiliários, por exemplo.

O Fundo pertence ao Ministério da Justiça e é gerido pelo Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa de Direitos Difusos. Na lei, seu objetivo declarado é “a reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico, paisagístico, por infração à ordem econômica e a outros interesses difusos e coletivos”.

Essa “reparação” deveria ser feita por meio de projetos (selecionados a partir de editais). Em 2016, oito projetos foram escolhidos e receberam R$ 2,2 milhões (clique aqui para conhecê-los). Isso significa que, levando em conta a arrecadação total, só 0,3% da verba foi usada para os fins previstos na lei. Descontando ainda o dinheiro usado para a manutenção do conselho gestor do fundo, “sobraram” mais de R$ 770 milhões, que viraram superávit primário, o resultado de todas as receitas do governo antes do pagamento da dívida pública.

O ex-presidente do conselho gestor do Fundo Fabrício Missorino Lázaro conta o que é feito com esse dinheiro: os valores que não são aplicados nos projetos nem compõem os gastos de custeio da secretaria-executiva do conselho. Vão para o orçamento geral do Ministério da Justiça, “que detém autonomia tanto para a liberação de recursos ao Conselho como para o redirecionamento dos recursos não utilizados a outras pastas que compõem o ministério”. Ou seja, o Ministério da Justiça faz o que quiser com a quantia.


Valores do FDD (em milhões de reais)

AnoArrecadaçãoValor usado pelo Fundo
2010
30,8
7,9
2011
41,4
8,9
2012
57,0
5,5
2013
120,2
3,6
2014
192,3
6,3
2015
563,3
3,8
2016
775,0
2,4
2017*
117,6
indisponível
Total*
1.897,6
38,4
* Valor apurado em março de 2017.


O jurista Lenio Streck, ex-procurador de Justiça do Rio Grande do Sul, após analisar o levantamento dos números feito pela ConJur, afirma: “O Ministério da Justiça deve muitas explicações”. “Temos tantas controladorias, procuradorias, tribunais de contas de tudo que é tipo e mesmo assim dão o drible da vaca na lei”, reclama.

O professor de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo Fernando Facury Scaff explica que a “permissão” para não usar o dinheiro para os fins a que o fundo se destina está no tortuoso artigo 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000). Pela norma, o Poder Executivo pode represar a previsão de gastos a fim de que sejam cumpridas as metas de superávit primário. Assim, basta alegar que o dinheiro é necessário para cumprir as metas para destinar ao FDD uma quantia ínfima do que é arrecadado.


Portas dos fundos


Fabrício Lázaro afirma que o FDD não é o único fundo a não aplicar o dinheiro arrecadado nas ações previstas em lei, lembrando questão recentemente enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal em relação ao Fundo Penitenciário (Funpen). A corte proibiu o contingenciamento do dinheiro do fundo e obrigou o governo a usá-lo na melhoria do sistema carcerário, conforme manda a lei.

A decisão do Supremo é de setembro de 2015. Em dezembro de 2016, o presidente Michel Temer autorizou, em medida provisória, o primeiro descontingenciamento do dinheiro do Funpen. Mas em "políticas de redução da criminalidade", "inteligência policial" e outras atividades sem ligação direta com o sistema penitenciário.

E a lista de fundos é longa, com arrecadações variadas e missões que dificilmente ocupam seu orçamento, como é o caso do Fundo Nacional do Meio Ambiente, do Fundo Nacional dos Direitos da Mulher, do Fundo Nacional de Segurança Pública, do Fundo Nacional da Criança e do Adolescente e do Fundo Nacional Anti-Drogas.

Nesses casos, bem como no FDD, a Lei Orçamentária Anual já traz o valor a ser destinado ao fundo e apenas essa quantia chega à conta gerida pelo conselho responsável por aplicar o dinheiro para os fins previstos por lei. A maior parte da verba sequer chega à conta.

Teresa Liporace, gerente de projetos do Instituto de Defesa do Direito do Consumidor (Idec) e conselheira suplente do conselho gestor do Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, afirma que o contingenciamento é pauta constante das reuniões do conselho, mas não há nenhuma sinalização de mudanças. “Quando é solicitada liberação de parte dos recursos da Reserva de Contingência prevista no orçamento do FDD, a Secretaria de Orçamento Federal (vinculada ao Ministério do Planejamento) nega”, conta.


Juízes do próprio jogo


Pelo menos três vezes nos últimos sete anos o Fundo financiou projetos das próprias entidades que ocupam ou ocuparam cadeiras no conselho que decide onde aplicar as verbas. Juntas, elas abocanharam R$ 1,6 milhão.


Formação do Conselho
 

Gestor do FDD
Um representante da Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça (Presidente)
Um representante do Ministério do Meio Ambiente
Um representante do Ministério da Cultura
Um representante do Ministério da Saúde, vinculado à área de vigilância sanitária
Um representante do Ministério da Fazenda
Um representante do Cade
Um representante do MPF
Três representantes de entidades civis: 
- Fórum Nacional de Entidades Civis de Defesa do Consumidor;
- Instituto “O Direito Por Um Planeta Verde”; e
- Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor

O conselho é formado por representantes do Ministério Público Federal e das pastas da Justiça, Meio Ambiente, Cultura, Saúde e Fazenda. Além de um representante do Cade. O conselho gestor conta também com três cadeiras para representantes de entidades civis, atualmente ocupadas pelo Fórum Nacional de Entidades Civis de Defesa do Consumidor; pelo Instituto O Direito Por Um Planeta Verde; e pelo Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon). Os dois últimos têm em comum terem sido fundados e presididos pelo ministro Herman Benjamin, do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Superior Eleitoral.

Em 2012, o Instituto O Direito Por Um Planeta Verde ganhou R$ 398 mil do fundo para tocar um projeto com uma descrição bastante complicada: “Divulgar o pagamento por serviços ambientais – PSA como um mecanismo de conservação ambiental; sistematizar experiências e avaliar o estado de implementação e a efetividade das sete normas estaduais que estabelecem o PSA no país (biodiversidade e retenção de carbono), aprovadas até o final de 2010 (AM, AC, ES, MG, SC, PR e SP), de forma a permitir uma avaliação crítica sobre a aplicação deste novo instrumento e, assim, contribuir para o aperfeiçoamento normativo em todas as esferas da federação”.

O caso não é exceção. O Idec, que também já teve assento no conselho gestor do fundo, conseguiu ter projetos financiados pelo FDD em 2015 e em 2011. No mais recente, obteve R$ 443 mil para criar uma “ferramenta web” de educação, informação e orientação ao consumidor. Já há seis anos, R$ 434 mil foram pagos para que a entidade desenvolvesse o projeto denominado “promoção da tutela do consumidor pelas agências reguladoras através da disseminação de informação e de direitos relacionados a produtos e serviços regulados aos cidadãos”.


Feliz aniversário


O próprio Cade, que é parte do conselho e responsável por angariar a maior parte da receita do fundo, já conseguiu R$ 405 mil para um projeto de comemoração dos 50 anos da entidade, em 2012. A finalidade era organizar a semana comemorativa pelo aniversário do Cade, “divulgando para a sociedade a importância do trabalho desenvolvido pela autarquia para a proteção do ambiente concorrencial e da ordem econômica, com vistas a garantir o adequado funcionamento dos diversos mercados”.

Representantes das entidades afirmam que, como as regras dos editais de seleção de projetos são claras, qualquer um dos entes participantes do conselho pode apresentar projetos e disputar com os outros interessados. Além disso, a prestação de contas de cada projeto é feita ao Fundo rigorosamente, sob pena de ter que devolver o dinheiro, contam.

“Para garantir que não haja qualquer conflito de interesse, é prática recorrente no Conselho do FDD que o proponente não seja relator nem vote projetos de seu interesse”, afirmou o Cade, por meio de sua assessoria de imprensa, à ConJur.

Sobre o projeto financiado, o Cade conta que, com o dinheiro, lançou uma campanha publicitária e um hotsite para disseminação da importância da proteção do ambiente concorrencial e da ordem econômica; promoveu uma cerimônia comemorativa e um seminário sobre defesa da concorrência, além de publicar o livro Cade 50 Anos, em formato impresso e digital, que registra a evolução da defesa da concorrência no Brasil.

O presidente do Instituto O Direito por um Planeta Verde, José Rubens Morato Leite, afirma que o estudo financiado com a verba do fundo serviu para dar subsídios para um marco regulatório nacional sobre o “pagamento por serviços ambientais”. Partes da pesquisa já foram publicadas e podem ser vistas no site do instituto. Além disso, conta, as análises dos dados levantados pela ONG foram usadas em diversos outros estudos.

Já Teresas Liporace, do Idec, afirma que a ONG quase não tem recursos oriundos de convênios com governo federal, porque a execução e o uso dos recursos são feitos por um sistema (Siconvi) que requer muito conhecimento específico e muitas horas de dedicação para operá-lo.

Ela explica o que foi feito nos dois projetos que foram financiados pelo FDD listados pela ConJur: O de 2011 “oportunizou ao Idec desenvolver e manter o banco de regulação, informando a todo o SNDC sobre a publicação de uma nova consulta pública e incentivando a participação dos seus membros com o envio de contribuições às agências reguladoras”.  Já o aprovado em 2015 teve a execução iniciada em janeiro de 2016, com término previsto para junho deste ano.  O principal produto será um portal com ferramentas de informação, orientação e autoconsulta, incluindo cursos gratuitos para o consumidor.


O ano do MP


Já 2016 parece ter sido o ano do Ministério Público no FDD. Projetos do MP em três estados ficaram com mais de metade do valor destinado a projetos pelo Fundo de Defesa dos Direitos Difusos. De R$ 1,9 milhão, R$ 384 mil foram para o Ministério Público da Bahia, em um projeto para “melhorar a prestação do serviço de fornecimento de água para os consumidores baianos”.

Outros R$ 347 mil aportaram no MP do Distrito Federal, para implantar o núcleo de geotecnologia na Secretaria de Perícias e Diligências. Já o Ministério Público do Acre ganhou R$ 271 mil para financiar “campanhas educativas para informar o consumidor sobre o consumo sustentável e a importância da alimentação saudável e do consumo seguro de alimentos”.

Antes de 2016, a última aparição de projetos do MP financiados pelo fundo havia sido em 2010, quando o MP-AC conseguiu ter outras duas ações selecionadas. O órgão recebeu R$ 195 mil para combater a poluição hídrica e R$ 146 mil garantir informação complementar sobre a fauna de mamíferos silvestres do estado a alunos de rede pública de Rio Branco.

Vale notar que o MP é o principal autor das ações civis públicas, de onde vem grande parte da arrecadação para o Fundo de Defesa de Direitos Difusos.


Projetos mais caros financiados pelo FDD, por ano


Ano
Valor solicitadoInteressadoDescrição do projeto
2016
R$ 384.000
Ministério Público da BahiaMelhorar a prestação do serviço de fornecimento de água para os consumidores baianos, no que tange a qualidade e continuidade do abastecimento.
2015
R$ 443.750
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor - IDECEstruturação de uma ferramenta web de educação, informação e orientação ao consumidor para contribuir para a redução da assimetria de informações nas relações de consumo.
2014
R$ 443.750
Instituto de Pesquisa Ecológicas – IPÊ/SPPromover a disseminação da cafeicultura orgânica através da implementação de ilhas de agrobiodiversidade (café com floresta) em assentamentos rurais da reforma agrária no Pontal do Paranapanema, Estado de São Paulo.
2013
R$ 443.379
Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do ConsumidorFortalecimento do Movimento Civil de Defesa dos Consumidores no Brasil.
2012
R$ 539.555
Secretaria de Governo do Mato Grosso do SulFormar brigadistas voluntários em técnicas de combate a incêndios florestais, fazer uma campanha educativa e fortalecer a Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Estado de Mato Grosso do Sul.
2011
R$ 588.091
Ecoa - Ecologia & Ação - MSPromover a Melhoria na Saúde dos Povos Indígenas do Vale do Javari.
2010
R$ 348.640
Casa Civil do Governo do Estado do Rio de JaneiroPreservação dos acervos das Casas de Detenção do Rio de Janeiro e Niterói existentes no Arquivo Público do Estado.


http://www.conjur.com.br/2017-mar-31/governo-usa-dinheiro-fundo-direitos-difusos-caixa

"Supremo não tem hesitado em derrogar tacitamente a Constituição Federal"

Basta ler o jornal para entender que o Supremo Tribunal Federal tornou-se o centro de qualquer decisão política importante no Brasil. E a corte tem usado isso para, pouco a pouco, mudar e abolir trechos da Constituição brasileira, mesmo que essa não seja sua função, afirma o jurista Carlos Blanco de Morais, professor catedrático de Direito Constitucional da Universidade de Lisboa, em Portugal.

O STF é uma corte constitucional sem paralelo entre as demais, disse, em entrevista à revista eletrônica Consultor Jurídico. E o jurista é claro ao analisar a movimentação recente do tribunal: “O Supremo não tem hesitado em derrogar tacitamente a Constituição”.

Blanco de Morais dá alguns exemplos. Quando a corte declarou constitucional a equiparação da união entre duas pessoas do mesmo sexo à união estável, “produziu uma mutação constitucional que não se amparou na letra da Constituição”.

O professor critica ainda o controle de constitucionalidade de projetos de lei, especialmente quando feito em decisões monocráticas, por meio de mandados de segurança. "O STF autoinvestiu-se de imenso poder de travagem de emendas que possam afetar os seus próprios poderes."

Mas nada acontece sem suas contrapartidas, especialmente na disputa por espaços. “Sendo um tribunal de alto nível e com uma maioria de magistrados de grande saber e ponderação, será de questionar qual o preço a pagar por uma corte constitucional que se tornou a mais poderosa do mundo à custa do enfraquecimento dos demais poderes e de uma certa  nominalização da Constituição”, provoca Blanco de Morais.


Leia a entrevista:


ConJur — O senhor disse que o STF brasileiro é a corte constitucional mais poderosa do mundo. O que quis dizer com isso?
Carlos Blanco de Morais — O STF é uma corte constitucional sem paralelo entre as demais. O Supremo não tem hesitado em derrogar tacitamente a Constituição através de mutações constitucionais de natureza jurisprudencial, como decorre da ADPF 132 e ADI 4.277, sobre a união homoafetiva.

ConJur — Por quê?
Blanco de Morais — O STF produziu uma mutação constitucional que não se amparou na letra da Constituição, não se fundou numa interpretação conforme tecnicamente correta, como decorre do voto do ministro Gilmar Mendes, nem revelou grande consistência sob um ponto de vista jurídico-dogmático — os princípios constitucionais não derrogam regras com o mesmo valor, por força do principio da especialidade.

A consagração da mesma solução por via de uma emenda constitucional teria sido a solução mais harmônica com a Lei Fundamental. O resultado não deve ser criticado, mas eventualmente o meio, que abre precedentes para outras mutações mais problemáticas que possam afetar os poderes do Estado ou direitos de liberdade, como o direito à vida.

ConJur — Depois ainda houve a equiparação da união estável ao casamento.
Blanco de Morais — Pareceu-me incompreensível, já agora, que o Conselho Nacional de Justiça, um órgão administrativo, tenha legislado materialmente “de fato”, admitindo a validade do casamento entre pessoas do mesmo sexo sem que houvesse reação judicial. Se em Portugal o Conselho Superior da Magistratura, ao qual pertenci, tivesse tomado a mesma atitude haveria um terremoto político com apelos imediatos à renúncia dos membros. Seguramente que a sua decisão seria cassada pelo tribunal competente.

ConJur — Na mesma palestra, o senhor falou do controle de constitucionalidade de emendas constitucionais.
Blanco de Morais — No que concerne ao exercício do próprio poder de emenda constitucional que alguns qualificam de poder constituinte derivado, o STF já julgou a inconstitucionalidade de diversas emendas — por exemplo, a Emenda 41/2003 — com base na violação de direito adquirido. Mas, sem amparo explícito na Constituição, algumas decisões monocráticas do STF ensaiaram uma espécie de controle preventivo de emendas constitucionais em formação. Veja o que ocorreu no Mandado de Segurança 20.257, no qual foi admitido que os parlamentares poderiam impetrar mandado desta natureza que impedisse a tramitação, no Congresso, de processos de emenda constitucionais que não observassem cláusulas pétreas — interpretadas de forma elástica. O STF autoinvestiu-se, assim, de um imenso poder de travagem de emendas que possam afetar os seus próprios poderes.

ConJur Isso é visto também no controle de omissões legislativas?
Blanco de Morais — O STF assumiu poderes substitutivos ao legislador quando há omissões em matéria de direitos fundamentais, por exemplo, ao interpretar os mandados de injunção 712-8 e 708. O Supremo mandou aplicar aos servidores públicos a lei da greve dos trabalhadores do setor privado, com alterações introduzidas pelo próprio STF. Criou-se, na linha de pensamento de Levi do Amaral, uma verdadeira medida provisória do Judiciário. Paralelamente, o STF criou, através das súmulas vinculantes de natureza mais inovadora, por exemplo, no caso da lei das algemas, verdadeiras normas primárias com eficácia análoga à da lei. Alguns juízes do STF não se refrearam em alterar a lei, mediante decisão monocrática, como no caso do HC 124.306, quando o ministro Luís Roberto Barroso se substituiu ao Congresso, descriminalizando o aborto que ocorra até ao terceiro mês de gestação, prazo que fixou discricionariamente como se tratasse de um legislador do Congresso Nacional.

ConJur A defesa de alguns ministros é de que o Supremo é um tribunal também político, por ter o papel de interpretar a Constituição.
Blanco de Morais — No próprio exercício da função política, o STF regulamentou o rito do processo de impeachment. Por outro lado, mediante decisão monocrática de um ministro, que depois foi revogada pelo Plenário, tentou destituir o presidente do Senado. O Supremo, também por força do efeito vinculante das suas decisões em controle abstrato, condiciona e orienta a ação dos tribunais comuns e superintende a administração pública. Mediante reclamação, o STF pode cassar sentenças e invalidar atos administrativos que se afastem do fundamento determinante das suas decisões.

ConJur — Isso quer dizer que o Supremo virou um superpoder?
Blanco de Morais — Como revelou o “caso dos precatórios”, o STF pode até substituir-se a Deus e à dogmática jurídica, julgando normas inconstitucionais e depois repô-las em vigor quando se percebeu a existência de certos efeitos indesejáveis. Sendo um tribunal de alto nível e com uma maioria de magistrados de grande saber e ponderação, será de questionar qual o preço a pagar por uma corte constitucional que se tornou a mais poderosa do mundo à custa do enfraquecimento dos demais poderes e de uma certa  nominalização da Constituição. Algum “diálogo” com o Congresso, mediante a aprovação de leis e emendas que procedam ao overruling de algumas decisões do STF e algum self restraint num período delicado da vida nacional ajudariam a poupar o STF da fogueira das tensões políticas.

ConJur Na época da crise de Portugal, o Tribunal Constitucional acabou conhecido por ter produzido uma "jurisprudência de crise", que teve repercussões até no Brasil. O que o senhor acha desse tipo de interferência da corte constitucional em matéria econômica? Quais foram os resultados dessas intervenções?
Blanco de Morais — O Tribunal Constitucional, não tendo sido ativista, exibiu poder, tomou consciência do fato de que teria a última palavra sobre a validade das políticas públicas do legislador e transformou-se num ramo do poder “moderador”, partilhando-o com o presidente da República. Mas esse ciclo aparentemente terminou.

ConJur — Moderador em que sentido?
Blanco de Morais — Como a Constituição não prevê um estado de necessidade financeira, o Tribunal passou a assumir o domínio da definição de exceção financeira, a estabelecer os critérios da sua admissibilidade e até a fixar as regras sobre a sua duração, criando a cláusula da transitoriedade temporalmente delimitada. Com base nestes critérios, associados às medidas de valor da igualdade, proporcionalidade e tutela da confiança, o Tribunal vetou importantes reformas do governo, que a dado passo quase ficou à sua mercê. Só que, finalizada a exceção financeira e mudado o ciclo político, o Tribunal cessou também, por ora, as suas funções transitórias ou excepcionais de poder moderador supletivo.

ConJur A conduta do Tribunal foi correta?
Carlos Blanco de Morais — De modo geral, o Tribunal Constitucional censurou, e bem, algumas medidas mal concebidas juridicamente, dotadas de um rigor desnecessário, mal calibradas no plano da sua conformidade com os critérios da igualdade e necessidade, e inaceitáveis à luz da tutela da confiança — figura próxima ao direito adquirido brasileiro. Algumas medidas partiam de uma lógica financista estreita, muito típica em Portugal, nos termos da qual, perante exigências de equilíbrio nas contas públicas, a Constituição deve considerar-se como que tacitamente suspensa, por força de um estado de necessidade implícito.

ConJur — Como isso foi resolvido?
Blanco de Morais — Encontrava-me então na Presidência da República e intervi na preparação de diversos pedidos de controle dessas leis sobre as quais o Presidente tinha dúvidas. Pesa ainda o fato de a maioria governatista ser da mesma linha política da maioria presidencial. O fato é que o cancelamento de diversas reformas juridicamente mal preparadas, entre elas as da segurança social e da legislação trabalhista, não significou o “apocalipse” como o então governo supunha, e o Executivo, a contragosto, encontrou outras receitas para equilibrar as contas.

ConJur Qual foi o resultado?
Carlos Blanco de Morais — O outro lado da moeda foi um Tribunal Constitucional silenciosamente altivo, um pouco envaidecido pelo apoio popular recebido, apaixonado pelas suas fórmulas jurisprudenciais e disputando com o presidente um certo poder “moderador”. Os atores políticos transferiram para o Tribunal suas divergências sobre a austeridade, colocando nas mãos dos juízes a possibilidade de ter uma palavra decisiva sobre a necessidade ou não de um novo resgate financeiro internacional. O Tribunal Constitucional ganhou uma aversão silente ao Governo e andou no fio da navalha.

ConJur — Por que o senhor diz que o ciclo se encerrou?
Blanco de Morais —A situação alterou-se com a mudança do governo, a mudança do presidente da República — o novo titular não tem recorrido por ora ao Tribunal Constitucional — e com mudanças no próprio Tribunal Constitucional, incluindo a do seu presidente. Houve um “resfriamento” de um órgão jurisdicional que se encontrava um pouco superaquecido.

ConJur E como impedir que isso se repita?
Blanco de Morais — Uma nova crise financeira exigiria outra atitude diversa da que envolveu os protagonistas da crise de 2012-2014: um governo que preparasse melhor as leis de rigor financeiro e um tribunal mais humilde e aberto a ouvir as razões da maioria. Faltam vias processuais de interlocução e vontade de comunicação. A Justiça Constitucional portuguesa é um bocadinho hermética e nem sempre sensível e coerente no tema das realidades econômico-financeiras.

ConJur — Uma das teses do professor Gomes Canotilho diz que, com a globalização, a Economia deixou o Direito em segundo plano. Diz ele que os memorandos de entendimento entre bancos, os acordos bilaterais e as zonas de livre comércio hoje são mais fortes que os direitos fundamentais garantidos nas constituições nacionais. O senhor corrobora essa análise?
Blanco de Morais — A globalização econômica é a guarda avançada de um projeto de globalização política e jurídica universal sem rosto e isento de controle público. Projeto que, sob o pretexto do livre comércio, da fluidez de capitais como motor do desenvolvimento, da vantagem dos produtos baratos e da celeridade das migrações de mão de obra, serve mais aos interesses dos grandes conglomerados financeiros e dos grupos políticos fechados e ultraminoritários transnacionais que lideram essa dinâmica do que favorece os direitos sociais e políticos das pessoas que têm sido afetadas pelos danos colaterais do fenômeno.

ConJur — Os efeitos, então, foram ruins?
Blanco de Morais — Os grandes escândalos de corrupção e manipulação de mercado, a nível nacional e transnacional, que envolvem conluios entre o poder político e as altas esferas do mundo econômico refletem o nível de captura a que a política e o direito chegaram por parte do poder econômico-financeiro. Se o modelo de mercado livre é seguramente o melhor sistema econômico, o atual paradigma de capitalismo financista especulativo e por vezes predador compromete e corrompe o êxito desse modelo.

ConJur O senhor concorda com essa tese?
Carlos Blanco de Morais — Concordo, em grande parte ,com o postulado que a globalização impôs o império do poder financeiro, sobre o político. Um poder financeiro transnacional que age como um super-Estado inorgânico, sem controle efetivo, onde a separação de poderes está ausente. Um poder que nos estados em dificuldade desvitaliza a democracia, pois, independente da opção dos eleitores, os eleitos terão de executar uma política imposta por credores internacionais com prerrogativas absolutistas. Um poder, finalmente, que desvitaliza a soberania e a autodeterminação dos estados em disporem deles próprios.

ConJur — Vê solução?
Blanco de Morais — A globalização política e o federalismo europeu, caminhando em pequenos passos, em que o universo bancário e o financeiro configuram uma ponta de lança de mudanças feitas de costas voltadas para a vontade dos povos, constituem o “veneno da madrugada” da nossa liberdade, da livre iniciativa econômica privada em um quadro concorrencial, das empresas nacionais, dos nossos direitos individuais, da democracia e da autodeterminação das nações.

Os Estados devem, sem prejuízo da cooperação internacional, focar-se nos seus cidadãos mais esquecidos e ignorados por uma prosperidade concentrada numa minoria, bem como nas empresas nacionais afetadas por uma concorrência desregulada potenciada por produtos oriundos de novos mercados onde se pratica o dumping social. A reação nacionalista e protecionista gerada nos tempos recentes, pese alguma incerteza política criada, resulta ser compreensível e tem alguns elementos positivos.

ConJur Os tribunais constitucionais podem dialogar e discutir soluções com membros dos outros poderes?
Carlos Blanco de Morais — Entendo a questão sinônimo de uma relação dialógica mais fluida entre poderes por meio de procedimentos apropriados. Atualmente essa relação está entorpecida, mas ganharia se fosse mais natural e flexível, sob pena de se travar um diálogo de surdos, com uma tensão política desnecessária, como o que ocorreu na relação entre o Tribunal Constitucional e a maioria governista portuguesa durante o ribombar da crise financeira. Vias processuais adequadas deveriam permitir alguma abordagem alternativa em certos problemas que uma análise puramente exegética ou axiológica no plano jurídico não admite ou se mostra deficitária.

ConJur — Que tipo de vias processuais?
Blanco de Morais — No Brasil audiências públicas esclareceram os ministros do Supremo Tribunal Federal sobre questões tecnicamente  complexas, como a saúde. Portugal poderia também promover mecanismos de diálogo institucional: audiências com peritos, mesmo que não necessariamente públicas, e amicus curiae. Também sugiro a possibilidade de, em controle abstrato, as partes, em certas circunstâncias que envolvam temas muito especializados, como finanças, saúde, seguridade social, poderem solicitar um contraditório oral. Isso evitará um tribunal enclausurado numa torre de marfim e vulnerável ao discurso “fiat lex pereat mundi” [faça-se justiça, ainda que o mundo pereça] que assoma alguns, felizmente poucos, constitucionalistas e juízes dentro e fora do Tribunal.

ConJur Um regime parlamentarista funcionaria no Brasil?
Blanco de Morais — Neste ponto sigo Sartori, que considerou que o parlamentarismo no Brasil não funcionaria, de todo em todo. A governabilidade no parlamentarismo depende ou da redução drástica no número de partidos representados no Parlamento que garanta um bipolarismo e governos maioritários estáveis (Reino Unido, Canadá, Espanha até 2015) ou um multipartidarismo limitado numa sociedade pouco conflitual e propensa a compromissos naturais (países escandinavos e, até certo ponto, a Alemanha e a Áustria).

No Brasil não existe uma coisa nem outra. A sociedade é conflitual e os compromissos são frágeis, voláteis e ligados a transações que envolvem, por vezes, interesses e lugares. Por outro lado, o Brasil tem um sistema eleitoral proporcional para a Câmara de Deputados que tende a dispersar ad infinitum a representação, havendo poucos países do mundo com mais de 30 partidos representados na câmara de deputados e 18 no Senado, exceto a Índia.

ConJur O Brasil passa por uma discussão sobre seu sistema de governo. A ideia mais aceita é copiar o modelo português, de semipresidencialismo. Esse sistema funcionaria no Brasil?
Blanco de Morais — O semipresidencialismo seria um desastre no Brasil. Em coabitação, ou seja, quando a maioria política que elege o Presidente fosse diferente da maioria parlamentar que sustenta o governo, teríamos, na versão do semipresidencialismo português aplicado ao Brasil, um presidente atuando como contrapoder permanente em relação ao primeiro-ministro, vetando, ameaçando dissolver e desestabilizando através da palavra. Se fosse copiado o modelo francês, em que o presidente preside simultaneamente a um conselho de ministros formado por um partido rival do seu, teríamos um cenário que relembra o filme Dormindo com o Inimigo, com Julia Roberts.

ConJur — Em que sentido?
Blanco de Morais — Alguém imagina o presidente Lula presidindo o governo de um primeiro-ministro Aécio Neves? Ou um presidente Alckmin chefiando um conselho de ministros de uma primeira-ministra Marina Silva? Haveria a mais completa ingovernabilidade. O Brasil ganharia em reformar, apenas, o seu presidencialismo de coalizão, reduzindo o poder presidencial, estabelecendo mais freios e contrapesos parlamentares e de entidades independentes e disciplinando o alcance normativo das decisões do poder judicial na esfera do controlo de constitucionalidade.

ConJur — Dá para culpar o sistema partidário pela crise política que o Brasil enfrenta?
Blanco de Morais — O sistema partidário não é estruturado. A par do PT que é um partido de massas centralizado e rígido, os restantes grandes partidos (PMDB e PSDB) são pouco centralizados e dominados por lideranças regionais muito personalizadas. Existem, por outro lado muitos partidos que surgem e se extinguem em torno de interesses e de personalidades, sem ideologia definida nem garantia de organização e democraticidade interna, tornando o sistema partidário instável. Essa instabilidade é agravada pela facilidade com que dissidentes podem abandonar uma legenda e criar outra.

ConJur — É um sistema que inviabiliza o governo?
Blanco de Morais — Como seria possível a um governo sobreviver e manter uma política coerente suportado por tantas bancadas tão instáveis, com partidos e congressistas transacionando a toda a hora o seu apoio parlamentar por vantagens setoriais e regionais? Se um presidente da República, no atual contexto de presidencialismo de coalizão, pode amanhecer de um dia para o outro sem maioria parlamentar, pois a sua subsistência em funções ou a execução das suas políticas não depende dessa maioria, o mesmo já não se passa com o governo no sistema parlamentar, onde a sobrevivência do Executivo depende da confiança política do Parlamento num quadro mínimo de estabilidade.

ConJur Como funcionaria eventual governo parlamentarista?
Carlos Blanco de Morais — Um hipotético governo brasileiro em um sistema parlamentarista despenderia uma boa parte das suas energias, não conduzindo a política do País, mas negociando a sua sobrevivência e a viabilização das suas políticas mais elementares junto de base aliada fragmentada e pouco fiável, ficando sujeito a todo o tipo de pressões. Caso perdesse, de um dia para o outro, a maioria e não solucionasse rapidamente o problema, ficaria sujeito a ser demitido com uma moção de censura ao virar da esquina, por um concerto negativo das oposições. A sucessão de governos, as transações a todos os níveis, a incapacidade de garantir a coerência de reformas políticas e a ingovernabilidade criaram em Itália e Portugal ciclos políticos marcados por uma média de um governo por ano. No Brasil, dada a quantidade de partidos existentes a instabilidade poderia ser ainda mais grave.

ConJur — Há ainda os problemas de legitimidade do Congresso.
Blanco de Morais — Centrar nele o fulcro do poder e base de sustentação do governo, como ocorre no parlamentarismo, poderia criar problemas de legitimidade evitáveis. Na verdade, apenas um parlamentarismo como no Reino Unido poderia, em tese, funcionar em um Estado como o Brasil, que carece de Executivo forte. Mas, para isso, seria necessário fomentar um quadro partidário bipolar (com bipartidarismo ou multipartidarismo formado por alianças de poucos partidos interdependentes).

ConJur Mas isso não dependeria de reforma legislativa?
Blanco de Morais — Isso implicaria uma reforma eleitoral radical que introduzisse o voto distrital, ou um sistema proporcional com pequenos círculos, quociente alto e cláusula barreira apta a reduzir radicalmente o número de partidos atualmente representados. É duvidoso, contudo, que os grandes partidos queiram abdicar do seu modelo de liderança regionalmente descentralizada e os pequenos e médios partidos pretendam cometer eutanásia, subscrevendo uma emenda constitucional que consagrasse esse tipo de reforma.

ConJur O senhor disse que “no presidencialismo, o Executivo não depende do Parlamento para subsistir”, mas o fato de os dois presidentes cassados que tivemos em 30 anos de democracia terem baixíssimo apoio no Legislativo não mostra que nosso modelo depende sim do Congresso? Muito se falou em "parlamentarismo branco" durante o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
Blanco de Morais — É preciso ter cuidado com a categorização científica dos sistemas políticos. O sistema político brasileiro não é um parlamentarismo, mesmo atípico, porque o presidente é eleito por sufrágio universal, dispõe de relevantes poderes, dirige o Executivo sem primeiro-ministro, não tem de gozar da confiança política do Congresso para se manter em funções e o Legislativo não pode ser dissolvido antecipadamente. Uma zebra sem cascos, sem listras e com asas não é uma zebra.

ConJur — Mas o baixo apoio que os presidentes derrubados tinham no Congresso pode ser uma explicação, não?
Blanco de Morais — O impeachment não derivou do fato de esses dois presidentes terem baixíssimo apoio no Congresso, mas sim por terem, supostamente, cometido crimes de responsabilidade. Os processos de impeachment não substituíram as moções de censura próprias do parlamentarismo, já que envolveram a necessidade de por termo a condutas presidenciais que, alegadamente, fomentavam ou encobriam práticas criminais muito graves que, em tese, punham em causa o Estado de Direito. No caso de Dilma Rousseff, as pedaladas constituíram um crime menor que serviu de pretexto para afastar quem dirigia um sistema cujos colaboradores acobertariam, alegadamente, a prática de ilícitos muito mais sérios.

ConJur O que acha do cumprimento da pena a partir da condenação em segunda instância?
Carlos Blanco de Morais — Concordo em absoluto com essa fórmula que evita um abuso do direito à presunção de inocência propiciando quadros de impunidade em que que, arguidos com forte probabilidade de culpabilidade, podem sair do país ou manter uma vida indecorosa confiando no arrastamento dos julgamentos no tempo. Tenho, ainda assim, reservas em relação à interpretação feita pelo STF que configurou criativamente essa possibilidade. O princípio poderia, salvo melhor opinião, ser introduzido com vantagem por emenda.


 http://www.conjur.com.br/2017-abr-02/entrevista-carlos-blanco-morais-professor-universidade-lisboa

Por que a desigualdade está caindo na China


Trio de pesquisadores percebeu que a desigualdade chinesa estacionou em 2010 e pode estar diminuindo - e tenta entender o que está acontecendo



São Paulo – Não há precedentes na história da humanidade para o que aconteceu na China desde que ela se abriu para o mundo.

O país cresceu acima de 6% todos os anos desde o final dos anos 70, com taxas que às vezes superavam dois dígitos, e tirou da pobreza 700 milhões de chineses (tornando muitos outros milionários).

A alta da desigualdade não passou despercebida, mas parecia um preço modesto a ser pago pela melhora geral das condições de vida.

Mas agora, um novo estudo mostra que o país talvez esteja ficando menos, e não mais, desigual nos últimos anos.

Os autores são Yue Wang e Ravi Kanbur, da Universidade de Cornell, e Xiaobo Zhang, da Universidade de Pequim.

Explorando complexos bancos de dados oficiais sobre as províncias e pesquisas domiciliares nacionais, o trio criou estimativas de desigualdade para 6 momentos nos 20 anos entre 1995 e 2014.

O método tem seus limites, já que pesquisas domiciliares costumam subestimar a renda dos mais ricos.

Na China, eles têm um motivo extra para se preocupar, já que o governo tem promovido uma cruzada anticorrupção e anti-ostentação.

Mas ainda que os números não sejam exatos, a tendência encontrada é clara para várias medidas de desigualdade.

O coeficiente de Gini chinês, por exemplo, saltou de 0,349 em 1995 para 0,533 em 2010, mas caiu para 0,495 em 2014 (nesta medida, 0 representa igualdade perfeita e 1 representa desigualdade total).

A conclusão: “uma avaliação cuidadosa das melhores fontes de dados parece sugerir que a desigualdade atingiu um platô, com o ponto de virada por volta de ou logo antes de 2010”.

Para entender as razões para o fenômeno, os pesquisadores olharam para algumas divisões ainda fortes na sociedade chinesa: entre o mundo rural e o mundo urbano e entre as diferentes regiões.

Uma hipótese é que décadas de migração do campo para as cidades levaram a um grande contingente de trabalhadores que já recebem os salários urbanos, que são mais altos.

Além disso, a migração teria tornado o mercado de trabalho rural mais apertado, e os trabalhadores do campo remanescentes já teriam maior poder de barganha para pedir salários maiores.

É exatamente o que previa uma famosa teoria do economista Simon Kuznets, vencedor do Nobel em 1971.

Vale lembrar que o salário médio por hora de um trabalhador chinês do setor industrial triplicou entre 2005 e 2016 e já supera o do seu equivalente no Brasil, de acordo com a consultoria Euromonitor.

Outros fatores citados pelo estudo são os grandes investimentos públicos na infraestrutura das áreas mais atrasadas, além de novos programas de seguridade social e transferência de renda.

Tudo isso é parte de um esforço declarado do governo chinês para mudar o modelo de crescimento do país e depender menos de poupança e investimento pesado e mais de consumo e inovação.

Ninguém espera que a China volte a crescer no mesmo ritmo do passado, o que é natural depois de um certo nível de desenvolvimento.

E se o bolo não cresce tanto, importa que a divisão seja mais justa – afinal, a China não é uma democracia e a estabilidade do governo vem não só da repressão, mas do discurso de que a vida da população vai continuar melhorando.

O governo Trump já acabou?


Com divergências crescentes entre os republicanos, o presidente americano enfrentará cada vez mais dificuldade para fazer a "América grande novamente"

 





Entre ataques à imprensa e loas a Vladimir Putin, Donald Trump tinha um plano de voo quando assumiu a presidência dos Estados Unidos, em janeiro. Porém, 70 dias depois, a fuselagem da nave Trump está em frangalhos. A mais fragorosa derrota foi no dia 24 de março, quando o presidente falhou em conquistar votos republicanos para o projeto que substituiria o programa de acesso à saúde Obamacare.

A aprovação do novo projeto era fundamental para os planos de Trump. A troca faria a União reduzir o déficit orçamentário em 337 bilhões de dólares no período entre 2017 e 2026. Os desembolsos seriam reduzidos em 1,2 trilhão de dólares no período, segundo dados da Comissão Orçamentária do Congresso.

Essa redução daria ao governo uma gordura financeira para continuar com o restante do plano: passar um orçamento austero, com fundos de emergência alocados para a construção do muro na fronteira sul com o México; depois, aprovar uma reforma tributária, que cortaria taxas principalmente para empresas, de 35% para 15%; e promover uma repatriação de divisas a custos baixos.

De acordo com análises feitas pelo Comitê para um Orçamento Federal Responsável, a reforma tributária adicionaria incríveis 5 trilhões de dólares à dívida americana em 10 anos — principalmente porque o presidente planeja cortar as taxas para os mais ricos e mudaria as alíquotas básicas de incidência dos impostos. Por esse motivo, era necessário ter aquela gordura, que viria, além do corte de custos com o Obamacare, com a imposição de tarifas alfandegárias para produtos fabricados fora dos Estados Unidos e a repatriação de divisas — temas primordiais na consolidação do plano de Trump.

O ponto alto seria o prometido investimento de 1 trilhão de dólares em infraestrutura. Este projeto, em que Trump esperava contar com o apoio de democratas, previa a construção de uma comissão bipartidária para um plano de infraestrutura criado em comum acordo e que resolveria um problema criticado pelos dois lados do espectro político: a estrutura logística do país, que está defasada frente às economias mais agressivas do planeta.

Este era o arcabouço básico do governo: retirar tarifas como forma de incentivos para o bom funcionamento das empresas nacionais, impor severas taxas sobre produtos importados para aumentar a demanda interna e investir em infraestrutura para que a cadeia local pudesse suprir a demanda.

De acordo com a visão de Stephen Bannon, ex-presidente do site de notícias conservador Breitbart e um dos principais conselheiros de campanha e de governo do presidente, este seria o terreno fértil de um “nacionalismo econômico”, apoiado por outros membros do governo, como Wilbur Ross, secretário de Comércio, e Peter Navarro, diretor do Conselho Nacional de Comércio.

Além dos incentivos fiscais e investimentos estruturais, o cancelamento de acordos de comércio, a desregulamentação ambiental e a restrição à entrada de imigrantes seriam todos pontos que favoreceriam a vida daqueles que Trump chamou de “os americanos esquecidos”.

O problema, como vai ficando claro a cada dia, é que o plano infalível de Trump é amadorístico. Encontra, de um lado, oposição da Justiça, que vem considerando suas políticas de imigração ilegais; de outro, do Congresso, que não embarcou em suas frágeis ideias para um futuro dourado. Desta forma, uma pergunta vem ganhando força entre os analistas americanos: o governo Trump já acabou?


A queda


A coisa começou a complicar no último dia 24 de março: divergências entre os republicanos de diferentes facções, principalmente os mais moderados e os mais conservadores, mostraram que havia sido precipitada a decisão de Trump e do presidente da Câmara dos Deputados, o republicano Paul Ryan, de levar o projeto de substituição do Obamacare ao plenário da Casa sem maiores discussões internas. Os moderados ficaram preocupados que o plano tiraria a cobertura de saúde de cerca de 24 milhões de habitantes e os conservadores preferiram abandonar qualquer proposta de mudança a aprovar uma que não era radicalmente diferente daquela do ex-presidente Barack Obama.


Pior: a derrota deixou claro que Republicanos estão descrentes da capacidade de Ryan como líder político. A Casa Branca, segundo a imprensa americana, passa por brigas internas e tem um ambiente “tóxico e distraído”, com diversos centros de poder conflitantes culpando uns aos outros por uma série de reveses crescentes. Os conselheiros mais altos brigam entre si sobre como lidar com uma série de reportagens negativas; o partido enfrenta julgamento de seus membros sobre as prioridades legislativas do governo; e até doadores de campanha estão descontentes com os caminhos da gestão.

A essa altura de sua administração, o presidente Obama já havia aprovado o pacote de 787 bilhões de dólares em estímulos para a economia, que acabava de vir do crash imobiliário de 2008, e se reunia com membros do legislativo para trabalhar nas primeiras ideias do que viria a ser o Obamacare.

A resposta aos problemas veio bem ao estilo Trump. Ele afirma que os relatos de discussões em sua equipe são “fake news” e, esta semana, ameaçou republicanos conservadores, bem como democratas, afirmando que o governo federal os enfrentaria nas eleições legislativas que acontecem no ano que vem, quando um terço do Congresso será trocado. “Os conservadores irão arruinar toda a agenda política republicana se eles não entrarem no time. E rápido. Temos que lutar contra eles e os democratas em 2018”, escreveu o presidente em sua conta no Twitter.

O grupo já deixou claro que está disposto a se opor às propostas mais frágeis do presidente. E há pouca margem para Trump negociar com os conservadores sem perder apoio entre republicanos moderados. Os conservadores republicanos ocupam somente 32 das 435 cadeiras na Câmara, o que não é uma margem preocupante, já que republicanos têm 241 cadeiras, ante 194 dos democratas, uma diferença de 47 votos. O real problema está no Senado: os republicanos têm 52 senadores, ante 48 democratas. Uma diferença de apenas 4 votos em que o apoio de conservadores pode salvar projetos que já passaram pela Câmara.

“Trump até poderia influenciar seus eleitores contra esses políticos, mas eles vêm de distritos eleitorais igualmente conservadores e homogêneos. Ronald Reagan era muito bom em exercer esse tipo de pressão. Mas poderia Trump fazer isso de maneira efetiva?”, questiona Richard Hall, cientista político da Universidade de Michigan especialista no Congresso americano.



Há solução?


“Os republicanos não têm plano B. Não conseguiram aprovar a lei que substituiria o Obamacare, e agora o partido precisa aprovar uma reforma tributária que venha acompanhada de um forte imposto alfandegário para equilibrar as contas”, afirma a economista Monica de Bolle, pesquisadora do Instituto Peterson de Economia Internacional e colunista de EXAME Hoje. Trocar a legislação tributária do país é consenso entre os republicanos, mas a imposição de uma forte tarifa sobre produtos importados não é. Esse novo impasse do partido pode significar uma nova derrota na tentativa de aprovação da lei, o que poria, de fato, fim ao plano inicial de Trump.

Essa incerteza, claro, já foi lida pelos mercados, que foram afetadas pela falta de coesão do governo nos últimos 10 dias. Quem mais perdeu foram as ações dos bancos, grandes beneficiados por um possível corte de taxas — o Goldman Sachs perdeu 7,42% do valor de mercado em março.

Para Monica de Bolle, Trump deve, no máximo, conseguir aprovar um corte nos impostos como foi feito durante a Era Bush, focando em alívios fiscais e deduções. Mas uma grande reforma do sistema tributário é prevista para continuar na gaveta. Se isso acontecer, as principais propostas do governo estarão acabadas: não haverá cortes de taxas significativos, nem substituição do Obamacare, um plano massivo de investimento em infraestrutura será alvo de forte escrutínio e não há sinal de que a justiça acatará os decretos anti-imigração.

Para a sorte de Trump, as mentiras que ele contou sobre a economia durante a campanha era realmente mentiras. O desemprego está em apenas 4,7%, menor taxa desde a época pré-crise de 2008. A economia expandiu 1,6% em 2016, após um aumento de 2,1% no último trimestre do ano, impulsionada por uma alta de 3,5% nos gastos dos consumidores, que contam como dois terços do PIB.

A economia, portanto, está nos trilhos — não graças a Trump, como ele insiste em dizer — o que tem evitado níveis de aprovação cataclísmicos. A média das pesquisas do site RealClearPolitics mostra que 52,6% desaprovam o governo Trump. São 11,5 pontos percentuais a mais do no início do governo, mas ainda assim é muito perto da média de oposição histórica a Trump. 

Como político em campanha, Trump agia como se as regras de Washington não se aplicassem a ele. E foi beneficiado por isso. Como presidente, Trump se depara com uma máquina pública que envolve muito mais interesses individuais do que aqueles encontrados na iniciativa privada. Ele se vê enjaulado pelas mesmas regras políticas que desdenhou durante todo o ano passado, e tem sofrido por ter montado um time de empresários e banqueiros sem experiência em articulação política.

Trump prometeu o mundo em 100 dias, mas 70 já se passaram e o mundo parece um gigantesco ponto de interrogação.

sexta-feira, 31 de março de 2017

Aloysio Nunes participará de reunião do Mercosul sobre Venezuela


O ministro das Relações Exteriores do Brasil discutirá, como definiu a Argentina, a "grave situação institucional" da Venezuela,

 





Brasília – O ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes, participará neste sábado em Buenos Aires de uma reunião de chanceleres convocada pelo Mercosul para discutir a situação venezuelana, informaram nesta sexta-feira à Agência Efe fontes oficiais.

A reunião foi convocada com caráter de urgência pela Argentina, que exerce durante este semestre a presidência rotativa do bloco, para discutir o que qualificou de “grave situação institucional” da Venezuela.

A crise venezuelana se agravou na última quarta-feira, quando a Corte Suprema de Justiça (TSJ) decidiu assumir as competências da Assembleia Nacional (AN, parlamento), de maioria opositora, devido à persistência do “desacato”, um status que o Poder Judiciário impôs à câmara pelo descumprimento de várias sentenças.

A Venezuela era membro pleno do Mercosul até dezembro do ano passado, quando foi suspensa por Argentina, Brasil, Uruguai e Paraguai, os membros fundadores do bloco, pois após quatro anos nessa condição ainda não tinha se adaptado à legislação interna.

O governo brasileiro reagiu com rigor frente à decisão do TSJ e, em comunicado divulgado na quinta-feira, expressou seu “repúdio” à “clara ruptura da ordem constitucional”.

No comunicado, o governo acrescentou que “o pleno respeito ao princípio da independência dos poderes é essencial para a democracia” e que as decisões do tribunal venezuelano “violam esse princípio e alimentam a radicalização política do país”.


China e UE reafirmam acordo climático após recuo de Trump


Presidente dos Estados Unidos começou a reverter as medidas adotadas por Barack Obama para cortar as emissões de gases de efeito estufa nos EUA





Pequim / Oslo – Nações lideradas pela China e pela União Europeia fizeram coro a favor de um plano global para conter a mudança climática nesta quarta-feira, um dia após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, começar a reverter as medidas adotadas por seu antecessor, Barack Obama, para cortar profundamente as emissões de gases de efeito estufa nos EUA.

O decreto assinado por Trump na terça-feira, cumprindo uma promessa de campanha para fortalecer a indústria carvoeira norte-americana, atinge o coração do Acordo de Paris de 2015, um pacto internacional concebido para conter o aumento das temperaturas no mundo, que em 2016 bateram recordes pelo terceiro ano seguido.

Muitos países reagiram ao plano de Trump com desânimo e um tom desafiador, dizendo que a grande mudança nos investimentos – dos combustíveis fósseis a formas de energia limpa, como a eólica e a solar – está em andamento, com benefícios que vão da poluição ambiental menor a mais empregos.

O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lu Kang, cujo governo trabalhou de perto com a gestão Obama na questão da mudança climática, disse que todos os países deveriam “andar de acordo com os tempos”.

“Não importa quais sejam as políticas de outros países para a mudança climática, como país em desenvolvimento grande e responsável a determinação, as metas e as ações políticas da China não irão mudar quanto ao tratamento da mudança climática.”

O Comissário Europeu para o Clima, Miguel Arias Canete, disse: “Vemos o Acordo de Paris e a transição para uma economia mais moderna, mais inovadora, como o motor do crescimento do emprego, das oportunidades de investimento e da prosperidade econômica”.

O alvo principal de Trump é o Plano de Energia Limpa de Obama, que exige que os Estados norte-americanos reduzam as emissões de carbono das usinas de energia.

Esse um um ponto chave no compromisso assumido pelos EUA no pacto parisiense: reduzir as emissões entre 26 a 28 por cento abaixo dos níveis de 2005 até 2025.

Trump não disse se vai retirar seu país do Acordo de Paris, firmado por quase 200 nações visando um rompimento com os combustíveis fósseis ainda neste século como cerne dos esforços para limitar as ondas de calor, as inundações, as secas e a elevação do nível dos mares.

O temor é que menos ações dos EUA – o segundo maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, só atrás da China – levem outras nações a reduzir suas metas. Até agora o pacto só foi ratificado por 141 delas, de Estados-ilhas do Oceano Pacífico a produtores da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep).

O Acordo de Paris permite que cada país estabeleça suas próprias metas para conter os gases de efeito estufa e não prevê sanções aos transgressores. Trump chegou a classificar o aquecimento global como uma farsa, mas também disse ter a mente aberta a respeito do pacto acertado na capital francesa.

Ainda assim, sua guinada deve minar um dos pilares do acordo, o de que todos os planos nacionais, que devem ser apresentados a cada cinco anos neste século, têm que ser ainda mais robustos e refletir “a maior ambição possível”.

China chama EUA de “esgoísta” por querer reviver carvão


Decisão de Donald Trump de retroceder nas regulações ambientais do governo Obama corroem os compromissos de redução de emissões de gases efeito estufa






São Paulo – A China está absolutamente perplexa com a decisão do governo americano de reverter os regulamentos ambientais da era Obama e resolver investir novamente nas poluentes usinas a carvão.

As medidas de Donald Trump para retroceder no Plano de Energia Limpa corroem os compromissos de redução de emissões de gases efeito estufa assumidos no histórico Acordo de Paris, após anos de negociações climáticas.

Em um editorial altamente crítico à reviravolta nas intenções americanas, o tabloide chinês The Global Times afirma que o que os EUA estão fazendo prejudica os esforços de outros países no combate às mudanças climáticas e crava: “a opinião ocidental deve continuar a pressionar a administração de Trump. O egoísmo político de Washington deve ser desencorajado”.

O carvão sempre foi central no desenvolvimento da China, mas, nos últimos anos, o país tem feito grandes avanços na adoção de energia renovável e no sentido de fechar sua minas de carvão, responsáveis pela péssima qualidade do ar na região.

Enquanto isso, Trump caminha na direção oposta, e tem elogiado o retorno de carvão, apesar de toda a evidência do crescimento das energias renováveis e até mesmo a realidade da mudança climática.

O editorial também destaca que Pequim se sente desconfortável com a perspectiva de assumir a liderança da luta contra a mudança climática global e não poderia preencher o vácuo deixado pelos EUA.

“A China continuará a ser o maior país em desenvolvimento do mundo por um longo tempo. Como se pode esperar que o país sacrifique seu próprio espaço de desenvolvimento para as potências desenvolvidas do ocidente?”

De fato, a negligência de Trump com o acordo de Paris prejudica a reputação dos EUA, ao passo que cria uma oportunidade para a China preencher a vaga deixada e assumir um papel de liderança maior na luta contra as mudanças climáticas e envolver-se mais na cooperação bilateral e na governança global.

Porém, como observa o jornal britânico The Guardian, a retórica de Pequim muitas vezes supera seus compromissos de reduzir as emissões e, não se pode esquecer que o país também consome mais carvão do que o resto do mundo combinado, embora esse uso tenha se estabilizado nos últimos anos.

“A China não é o tipo de líder em termos de mudanças climáticas que atrairá outros países”, disse ao jornal Lauri Myllyvirta, do Greenpeace, com sede em Pequim. “O governo chinês só vai se comprometer com metas que é muito confortável entregar e ele precisa trabalhar com outros grandes países. A China não vai atacar por conta própria.”