Um antigo e recorrente expediente ganhou status de arma fatal do
governo Bolsonaro. O Decreto-lei passou a ser a fórmula usual de Messias
impor suas vontades em um “modus operandi” bem peculiar de governar.
Ele emite mais de um decreto, em média, por dia. Já foram 157 atos. É um
recorde quase absoluto desde a promulgação da Constituição em 1988.
Somente o deposto ex-presidente Collor ombreia com ele nesse quesito. A
tática é contestada seguidamente no Congresso e, em alguns casos, até
mesmo no Supremo Tribunal.
O expediente do decreto como instrumento de decisão resvala no
autoritarismo. Ao “canetar” deliberações, sem a necessária promulgação
do Legislativo, o mandatário está indicando que não deseja discutir o
assunto. Não aceita sugestões, nem reparações, ao que quer fazer. Há
razões evidentes para essa saída escolhida por Bolsonaro. Com uma base
parlamentar frágil, negociações capengas e pouca interlocução com
opositores, ele tenta fugir da armadilha que criou para si ao adotar uma
postura belicosa em relação aos políticos.
Logo que assumiu falou em ruptura com o que considerava a
“velha política”. Não apresentou nada de novo. Ao contrário.
Distanciou-se, como se isso o blindasse de “experiências negativas”.
Embora tenha passado 28 anos atuando diretamente no Parlamento, o
presidente sempre pareceu considerar aquela Casa um antro de venais
fisiológicos, adeptos do toma lá, dá cá. Vendeu essa imagem
insistentemente nas redes de seguidores digitais. Provocou os aliados a
tomarem as ruas para protestar contra a instituição.
Confrontou os partidos. Fez o diabo e isolou-se. No momento existem
33 propostas tramitando para sustar de maneira parcial ou integral os
três decretos de armas que colocou em vigor. Dezenas de outros recursos
procuram limitar a voracidade com que Bolsonaro recorre aos decretos. Na
contabilidade da semana passada, já chegava a 117 pedidos de suspensão
de medidas do governo. No STF, sete ações questionam a legalidade das
“canetadas”. O risco iminente é de uma paralisia do Executivo.
Das duas uma: ou o mandatário volta atrás na estratégia de emitir
normas sem consultar o Congresso e pacifica as relações ou sofrerá
graves sanções, já em adiantado em estágio de analise. Para se ter uma
ideia do exagero da prática até aqui, o presidente editou ao menos 45
decretos sobre organização, remanejamento ou extinção de cargos
comissionados. Produziu outros 17 decretos para promulgar acordos
internacionais, como o tratado de extradição entre Brasil e Israel.
Colocou sua “Bic” para funcionar como nunca e quis assim dá um drible na
harmonia entre poderes. Certamente não deverá acabar bem essa aventura.
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