domingo, 10 de novembro de 2013

As duas rodas da fortuna


Inspirados nos europeus, os brasileiros entram na febre das bicicletas como alternativa de mobilidade urbana. Com isso, inauguram um novo nicho de mercado: o das bikes premium, com magrelas que chegam a valer até R$ 54 mil

Por Bruna BORELLI

Cansou de ficar parado no trânsito para ir e voltar do trabalho? Não quer encarar o transporte público? Pretende unir o útil ao saudável? Se sua resposta foi “sim” para as três perguntas, você deve aderir à nova febre entre os brasileiros enfurnados nas metrópoles: virar ciclista urbano. O fenômeno ganhou fôlego na última década e tem um interessante componente social. Quem tem pedalado mais é a classe AB, já que a C trocou a bicicleta pelo primeiro carro ou moto. E é mirando nesse novo “esportista” das ruas, com mais dinheiro no bolso, que o mercado nacional de bicicletas tem buscado diferenciais. 
 
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Aposta: atento ao mercado nacional, John Burke, CEO da americana Trek Bicycle Corporation,
esolveu abrir operação própria no País 
 
Dados da Abradibi, a entidade que representa o setor, estimam uma movimentação de R$ 3 bilhões para este ano. E boa parte desse montante se refere ao segmento premium. Feitas com materiais especiais como fibra de carbono, levíssima, com freios a disco, amortecedores e avançados equipamentos eletrônicos, essas bikes estão mais rápidas, mais leves e mais confortáveis. E mais caras. Para dar uma pedalada no modelo americano Trek Speed Concept 9.9, por exemplo, é preciso desembolsar R$ 54 mil – o equivalente a um carro médio zero-quilômetro, como o Peugeot 308 ou um Honda Fit. E há mercado para isso? Para o americano John Burke, sim. 
 
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Para abonados: a bike Trek Speed Concept 9.9, toda feita de carbono, é o modelo
mais caro da companhia e promete agradar aos consumidores
mais exigentes com R$ 54 mil no bolso
 
Ele vem a ser o CEO da Trek Bicycle Corporation, líder global na fabricação de bicicletas, que inaugurou operação própria – sem a intermediação de distribuidores locais – no País neste semestre. Otimista, ele quer investir no mercado nacional, que avalia como uma “Amsterdã dos anos 1970”. Herdeiro da empresa criada pelo pai, Richard, em 1976, Burke venderá aos brasileiros mais abastados vários modelos topo de linha, como o Speed Concept. “A bicicultura realmente está cada vez mais presente entre as classes mais altas”, diz Ana Lia de Castro, diretora-executiva da Abradibi. 
 
O sucesso da bicicleta entre os consumidores de renda mais elevada, segundo Burke, deve-se ao fato de que o equipamento ajuda na forma física e contribue para melhorar o meio ambiente e desafogar o trânsito das metrópoles. “Andar de bike virou algo ‘cool’”, afirma. Para Daniela Khauaja, especialista em mercado de alto padrão e professora de marketing da Espm, os ciclistas de grife se interessam pelo conceito porque o hábito também revela um aspecto comportamental. “Eles se sentem à frente do seu tempo”, diz ela, indicando ser este um ato transgressor em relação à classe econômica à qual pertencem. “Apesar de terem muito dinheiro, eles querem andar em um meio mais alternativo de transporte.”
 
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Executivos: três vezes por semana, Gustavo Filgueiras, CEO do grupo
Emiliano, sai com sua Specialized Tarmac, de R$ 6 mil,
para pedalar com amigos
 
Gustavo Filgueiras, CEO do hotel Emiliano, na capital paulista, é um bom exemplo disso. O executivo sai de casa às 6 horas da manhã, três vezes por semana, com a sua bike de competição Specialized Tarmac (avaliada em R$ 6 mil) para encontrar amigos na ponte Cidade Universitária. Juntos, eles pedalam de 30km por dia pela ciclovia que margeia o Rio Pinheiros. “Eu só evito vir ao trabalho de bicicleta porque as ruas até o hotel são estreitas e por conta da segurança”, diz. Para Burke, a segurança é um fator vital para que a febre das bikes se propague. Segundo ele, as pessoas já andam em São Paulo aos domingos, quando há faixas exclusivas e vigiadas. 

“Por que não adotar isso nos outros dias?”, questiona o empresário, que, mesmo faturando mais de US$ 900 milhões de receita anual, faz o percurso de 4 km até o trabalho pedalando. Em busca desse sentimento cool e transgressor, o mercado interno se movimenta. A brasileira Caloi, recém-adquirida pela canadense Dorel, deve trazer em breve quatro marcas de bicicleta de alta perfomance, com modelos que custam até R$ 35 mil. No segmento dos acessórios, diversas lojas têm aberto as portas para seduzir os neociclistas com bolsas, alforjes e prestando serviços. Em São Paulo, a loja Bike Bacana oferece bolsas laterais de ótimo acabamento que podem ser usadas também fora das bikes. 
 
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De grife: bicicletas de marcas de luxo como a Dolce & Gabbana (à esq.), de roupas e acessórios,
e a Aston Martin, de automóveis, são as estrelas do setor
 
Há estabelecimentos que fazem o bike fit, o ajuste ergonométrico da magrela ao piloto. Quem também tem pego carona nesse movimento pró-bicicleta são as marcas de luxo. Maisons de alta costura, como Chanel, Gucci, Fendi e Hermès, e BMW, de automóveis, investem também no mercado de duas rodas. Para Daniela Khauaja, a estratégia serviria para expandir o portfólio. “É uma maneira de crescer dentro de um mesmo público-alvo”, afirma. Aqui, mais do que funcionalidade, são importantes o design e o DNA da grife refletidos na bicicleta. 
 
A italiana Dolce & Gabbana, por exemplo, lançou uma bike de US$ 2,2 mil com estampa de leopardo, um dos temas mais recorrentes de seus produtos. A Missoni também usou sua padronagem mais marcante, o zigue-zague multicolorido, para estampar sua versão duas rodas, de US$ 400. A Aston Martin, por sua vez, abusou do high-tech – afinal, é uma marca de inovação tecnológica – no lançamento da One-77, com computador de bordo e sistema Bluetooth, por US$ 40 mil. Inspiração, portanto, é o que não falta aos que desejam pedalar em grande estilo, como os europeus fazem desde sempre. 
 

Terrorismo fiscal


O mercado financeiro manipula o debate das contas públicas e joga contra o País. Não faz nenhum sentido. Ou faz?

Por Ana Paula RIBEIRO

Se um brasileiro desavisado retornasse ao País na semana passada, após um período de férias, levaria um susto ao ler os jornais. A impressão era de que as contas públicas caminhavam para um desastre sem precedentes em meio a um iminente rebaixamento da nota de classificação de risco do Brasil. Não é nada disso. Embora a situação fiscal esteja longe da ideal, tal análise é, na verdade, resultado de uma visão míope do mercado financeiro, que manipulou o debate nos últimos dias – possivelmente para ganhar dinheiro com a especulação. Perplexo, o governo federal mobilizou sua tropa de choque e reagiu ao terrorismo fiscal.
 
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Mantega: o ministro sabe que a situação fiscal não é a ideal, mas o País
não está à beira de um abismo
 
Um dos indicadores utilizados mundialmente para medir a sustentabilidade das contas públicas de um país é a relação entre a dívida bruta e o PIB. No Brasil, esse índice está em 58,75%, cerca de cinco pontos percentuais acima do registrado em 2010, mas em linha com os resultados que antecederam a elevação para a categoria grau de investimento, em 2008. O temor da perda da condição de país seguro, portanto, era tão injustificado que duas das maiores agências de avaliação de risco saíram em defesa do Brasil. Para Shelly Shetty, responsável na Fitch Ratings pela área de risco soberano da América Latina, a redução da nota brasileira não depende apenas da relação entre dívida e PIB. 
 
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Ataque especulativo: Augustin, secretário do Tesouro, vê que desconfianças
em relação à política fiscal são exageradas
 
Segundo ela, outros fatores também são levados em conta, como uma queda abrupta das reservas em moeda estrangeira. No caso brasileiro, o escudo de US$ 376 bilhões é uma importante blindagem contra crises. Shelly recomenda ainda mais investimentos e menos inflação. “Vejo como positivo o ciclo de aperto monetário do Banco Central, que pode melhorar a ancoragem das expectativas de inflação”, diz a executiva. Já a Standard & Poor’s, única agência a colocar a nota do Brasil em perspectiva negativa, em junho, avisou que provavelmente nenhuma mudança ocorrerá no curto prazo, uma vez que o costume é esperar até 24 meses para ver quais medidas serão tomadas para reverter a expectativa de rebaixamento. 
 
“O Brasil teve uma melhora na última década e está sendo subestimado”, afirmou Lisa Schineller, diretora da S&P, que minimizou a possibilidade de o País ser rebaixado a curto prazo, como pretendem certos veículos de comunicação, como o Financial Times, um dos arautos do terrorismo fiscal. Ciente de que a situação fiscal pode atrapalhar a credibilidade do governo, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) emprestará menos recursos em 2014, concentrando seus esforços em infraestrutura e reduzindo, assim, a necessidade de aportes por parte do Tesouro Nacional. 
 
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Sem crise: ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann rechaça ideia
de condução equivocada da política fiscal
 
É por iniciativas como essa que um superávit primário abaixo da meta não pode ser considerado como o Armagedon. Com os abatimentos possíveis, como os que descontam os gastos referentes a investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a economia para o pagamento de juros da dívida deveria ser de 2,3% do PIB em 2013. A expectativa de alguns analistas é que fique um pouco abaixo, em torno de 1,7% do PIB, já considerando as receitas extras provenientes do leilão do Campo de Libra, de R$ 15 bilhões, e do parcelamento de dívidas de empresas com a Receita. Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, sustenta que a piora em 2013 é pontual. 
 
“É um exagero considerar que o comportamento fiscal deste ano irá se repetir nos próximos exercícios”, diz. “Não é possível extrapolar para o futuro uma condição atípica.” Outro ponto a ser observado é que as desonerações tributárias, como a redução do IPI de automóveis, podem ajudar a acelerar a economia. O economista do banco Brasil Plural, Rafael Ihara, lembra que um PIB maior contribui para uma melhora fiscal ao elevar a arrecadação e reduzir a necessidade de estímulos fiscais. 
 
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Além da dívida: Shelly, da Fitch, diz que outros itens são avaliados
antes de definir um rating, como as reservas internacionais
 
“Mas é importante que o governo adote um novo discurso, mostrando que as promessas de redução dos gastos serão cumpridas”, diz ele. Até mesmo o Fundo Monetário Internacional (FMI), cuja cartilha ortodoxa está em desuso, acredita que é provável uma trajetória sustentável da relação entre dívida e PIB. Em estudo divulgado no mês passado, o organismo internacional traçou cenários considerando superávits primários de 3,1%, 2% e 1%. Na maior parte deles, não há sinal vermelho para o País. 
 
ATAQUE ESPECULATIVO Incomodada com o jogo pessimista do mercado, a presidente Dilma Rousseff convocou, além do ministro Mantega, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, para defender o governo. Gleisi rechaçou, na semana passada, a ideia de uma crise fiscal. Augustin, por seu turno, também não vê razões para desconfianças exageradas e considera um “ataque especulativo” a reação negativa ao déficit de R$ 9 bilhões registrado em setembro. Além dos discursos, Dilma cobrou medidas concretas para melhorar as contas públicas. 
 
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Giro menor: rotatividade do trabalhador gera custos
com o seguro-desemprego, mas pode ser combatida
com melhor processo de seleção, diz Almeida, da Protege
 
“A situação fiscal do Brasil não está fora de controle, mas é preciso fazer o dever de casa e retomar a redução da trajetória de queda da dívida”, diz Luciano Rostagno, estrategista-chefe do banco Mizuho. Uma iniciativa que deverá contribuir para a redução dos gastos públicos é a mudança na forma de conceder o seguro-desemprego e o abono salarial. Esses dois benefícios devem consumir entre R$ 45 bilhões e R$ 47 bilhões em 2013, um crescimento de quase 20% em relação ao ano anterior. Para conter e reduzir esses gastos, incompatíveis com uma situação de quase pleno emprego, começou a valer em novembro a regra que obriga o trabalhador a buscar um curso de reciclagem após ser demitido pela segunda vez em um prazo de dez anos. 
 
O treinamento é ministrado em dias úteis e com duração de cerca de quatro horas diárias. Pode parecer pouco, mas essa medida evita uma fraude comum, que é o trabalhador ser demitido e, no período em que recebe o seguro, arrumar um emprego informal. Outras mudanças em estudo estão sendo negociadas com as centrais sindicais, que se reuniram com o ministro Mantega na terça-feira 5. O desafio é enorme e envolve o setor privado. O vice-presidente de gestão de Gente do Grupo Pão de Açúcar, Antonio Salvador, reconhece que há uma cultura presente em certos grupos de pessoas que consideram ser possível trabalhar um curto espaço de tempo e depois, ao ser demitido, viver alguns meses à custa do seguro-desemprego. 
 
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Para evitar esse tipo de comportamento, a saída da companhia foi aprimorar seu sistema de seleção de pessoal. “É preciso trabalhar na fonte e refinar o tipo de funcionário que se deseja”, diz Salvador. Os programas de treinamento, que custam à empresa mais de R$ 50 milhões ao ano, também contribuem para reduzir a rotatividade e, assim, o número de funcionários desestimulados e mais propensos a serem demitidos. A rotatividade no grupo é de 35%, abaixo da média do setor, em torno de 50% ao ano. “Com nossas iniciativas, acreditamos que é possível melhorar o índice em 5% em 2014”, afirma. Outro setor que também sofre com o vai e vem de funcionários é o de segurança. 
 
O gerente corporativo de recursos humanos da Protege, Jorge Tavares de Almeida, aposta num processo seletivo mais rigoroso como solução para a rotatividade, que chega a 30%. Além disso, o candidato fica sabendo que a chance de promoção é grande dentro da empresa. “O trabalhador precisa se sentir valorizado”, afirma Tavares. Para mudar esse comportamento, é preciso que o governo convença as centrais sindicais de que uma mudança nas regras do seguro-desemprego é necessária tanto quanto o combate a projetos no Congresso Nacional, que podem onerar os cofres públicos em mais de R$ 60 bilhões. O mais grave deles é o chamado Orçamento Impositivo, que obriga o Tesouro a bancar qualquer proposta dos deputados e senadores – tendo ou não recursos em caixa. Ao que parece, alguns parlamentares gostaram do jogo do terrorismo fiscal.
 
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Cinco anos depois, Itaú Unibanco continua no topo


Fusão entre Itaú e Unibanco completa cinco anos com lucros em alta e a liderança entre os bancos privados. O bolo ficou mais saboroso, mas a fatia de mercado diminuiu

Por Natália FLACH e Ana Paula RIBEIRO

O fim de semana de Finados de 2008 não foi de descanso para os banqueiros Roberto Setubal e Pedro Moreira Salles. Depois de três semanas de intensas negociações, eles passaram o sábado e o domingo revisando um contrato cuja divulgação iria sacudir o mercado no dia seguinte. O documento de 14 páginas selou a maior fusão do sistema financeiro do País, criando o Itaú Unibanco. O gigante, que nasceu com R$ 509 bilhões em ativos, buscava tanto enfrentar a crise externa quanto fazer frente ao crescimento do espanhol Santander, que acabara de adquirir o holandês ABN Amro. 
 
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Esse casamento inesperado entre dois dos três maiores bancos privados nacionais garantiu ao Itaú Unibanco o lugar mais alto do pódio do setor, até então ocupado pelo Banco do Brasil, que era seguido de longe pelo Bradesco. Durante algum tempo, o novo banco superou o BB como a maior instituição financeira brasileira em ativos, mas o BB reagiu e recuperou o posto (hoje detém R$ 1,2 trilhão). Qual o balanço dessa operação, passados cinco anos? Há vários pontos positivos. O Itaú Unibanco continua no topo do ranking do setor financeiro privado, uma posição difícil de se manter sem perder o foco nos resultados para os acionistas. 
 
Nesse aspecto, o banco esbanja saúde e dá um show de gestão: foi sete vezes campeão setorial no anuário AS MELHORES DA DINHEIRO, incluindo as duas últimas edições, 2012 e 2013. Houve um crescimento de 192% nos ativos, para R$ 990 bilhões, e a volta à rentabilidade superior à da concorrência. Os lucros continuam gordos, acima dos R$ 14 bilhões por ano. No terceiro trimestre deste ano, o banco divulgou um lucro líquido ajustado de R$ 4,02 bilhões, acima dos prognósticos do mercado e com um crescimento de 17,9% em relação ao mesmo período de 2012. Segundo Francisco Kops, analista do banco de investimentos J. Safra, isso fez o retorno sobre o patrimônio líquido médio anualizado atingir 20,9%, depois de seis trimestres abaixo desse patamar. 
 
“Estávamos com saudades dessas rentabilidades”, escreveu Kops em seu relatório, divulgado no dia 30 de outubro. O analista mantém o otimismo. Para ele, a atual estratégia tem permitido ao Itaú Unibanco superar as expectativas do mercado em seu resultado financeiro líquido. “A inadimplência e os custos de crédito vêm se mantendo em patamares bem abaixo dos previstos anteriormente, devendo levar a revisões de lucro para cima pelo mercado, especialmente para 2014”, escreveu ele. Mário Pierry, analista-chefe do Deutsche Bank, tem uma avaliação parecida. Para ele, o Itaú Unibanco deverá manter a trajetória de redução de custos e também um crescimento acelerado de atividades que permitem ganhos com tarifas. 
 
Depois de cinco anos costurando a maior fusão do sistema financeiro, o banco está começando a colher os melhores frutos dessa operação. O mercado bancário está cada vez mais competitivo e, ao apagar as velas do quinto aniversário da fusão, Setubal e Moreira Salles terão de se contentar com uma fatia mais fina do bolo – ao menos por enquanto. Segundo dados do Banco Central (BC), a participação do Itaú Unibanco no total de ativos encolheu de 23% para 18%. Em termos de rede de agências, mesmo que a cifra tenha crescido de 3.646 para 3.881, o percentual emagreceu de 23% para 17%. Essa perda de mercado ocorreu durante um dos períodos mais vigorosos do crédito brasileiro. 
 
Em setembro de 2008, os então três maiores bancos estatais – BB, Caixa Econômica Federal e a paulista Nossa Caixa – respondiam por cerca de 30% dos créditos, segundo o BC. Em junho deste ano, essa fatia quase dobrou, para 51%, graças ao estímulo dos bancos estatais, sem contar o BNDES. Nesse período, o total de empréstimos concedidos no Brasil cresceu 109%. Mesmo assim, à avaliação do mercado ainda é muito positiva para o Itaú Unibanco: sua ação mantém-se entre as preferidas dos investidores e seu valor em bolsa disparou. Segundo o sistema de análise de dados Economática, imediatamente após a fusão, em dinheiro de hoje (valores corrigidos pelo IPCA), o Itaú Unibanco valia R$ 130 bilhões na bolsa. 
 
Na quinta-feira 7, essa cifra havia avançado para R$ 159,3 bilhões, uma alta de 62,7%. É suficiente para garantir ao Itaú Unibanco a maior capitalização do setor no País, superando a do BB e a do Bradesco. Em comparação, no mesmo período, o valor do Bradesco avançou 44,7%, para R$ 139,7 bilhões. O Banco do Brasil cresceu 68,9% na bolsa, para R$ 81,2 bilhões. Para recuperar o terreno perdido, os bancos privados apostam em uma concessão mais robusta de empréstimos, depois de uma fase de conservadorismo que permitiu o avanço dos concorrentes públicos. A carteira do Bradesco dobrou de tamanho nos últimos cinco anos, para R$ 412,5 bilhões. 
 
“O crédito foi o carro-chefe, crescemos 100% nesse período e foi com qualidade”, afirma Luiz Carlos Angelotti, diretor-executivo da instituição. Na falta de bons concorrentes para comprar, o banco investiu no crescimento orgânico e abriu 1.450 agências, ampliando sua rede para 4.697 pontos de atendimento, e investiu R$ 22 bilhões em tecnologia e infraestrutura. O Itaú Unibanco – que também não fez novas aquisições, mas fez importantes parcerias estratégicas com a seguradora Porto Seguro e o banco mineiro BMG – continua se esforçando para crescer. A carteira de créditos cresceu 9,9% neste ano, para R$ 481 bilhões. 
 
A ordem é manter a inadimplência sob controle. “Acertamos em trocar riscos maiores por riscos menores, mesmo que isso implique menores spreads (margens de ganho)”, afirmou Rogério Calderón, diretor de controladoria do Itaú Unibanco, em conferência com analistas em 30 de outubro. Em outra frente, o banco insiste em reduzir gastos. Esse processo é conduzido pela consultoria Galeazzi, conhecida no mercado por sua disposição para enxugar estruturas e cortar pessoal. Ao divulgar os resultados do terceiro trimestre, Rogério Calderón informou que o banco havia dispensado três mil pessoas nos últimos 12 meses. 
 
“É um resultado da rotatividade natural dos funcionários”, disse Calderón. Em junho, o banco tinha 117,3 mil trabalhadores, uma fatia de 19% dos bancários, um ponto percentual acima do número pós-fusão, em 2008. A próxima medida deverá ser a transferência da Garantec, seguradora líder em garantia estendida. Ela pode sair do escopo do Itaú Unibanco e passar para a Porto Seguro, seguradora na qual o banco possui participação de 30%. Procurado, o Itaú Unibanco não concedeu entrevista. 
 
QUEM VEIO, QUEM FOI – Nos últimos cinco anos, diversos bancos saíram de cena, enquanto outros se tornaram protagonistas. Na contramão do mercado, Cruzeiro do Sul e Rural são exemplos de bancos que sumiram no mapa. Em comum, as duas instituições eram de menor porte e tiveram problemas de gestão. Ambas sofreram processo de liquidação extrajudicial pelo Banco Central. Entre os bancos que mais cresceram no período está o BTG Pactual, com quase R$ 125 bilhões em ativos. A instituição não existia em 2008, mas o BTG, que comprou o UBS Pactual, teve um salto de 506% em seu tamanho, de acordo com dados do Banco Central. 
 
Outro banco que chama a atenção é o BMG, especializado em consignado. O seu trunfo sempre foi a rede de correspondentes e agentes de crédito que vendiam as operações dessa modalidade a funcionários públicos. O avanço em ativos foi de 262% em cinco anos. Mas crescer tanto, e de forma alavancada, começou a sufocar a instituição, que nem sempre conseguia captar recursos com custos adequados. A saída foi encontrada no ano passado com a parceria com o Itaú Unibanco. O BMG fica com 30% do que é originado nessa nova empresa e o Itaú Unibanco, com os restantes 70%. Isso ajudou a melhorar a geração de novos créditos, que chegaram a R$ 4,2 bilhões no primeiro semestre do ano, recorde para o banco. “Já tínhamos posição de liderança e a parceria fez com que a nossa originação dobrasse”, afirma o diretor de Relações com Investidores do BMG, Danilo Herculano. O Itaú Unibanco, de seu lado, garantiu presença no pujante mercado de empréstimos consignados.
 

Emprego em óleo e gás sente crise no grupo X

Derrocada da EBX reforçou clima de cautela gerado por corte de investimentos da Petrobrás
 
 
A crise no Grupo EBX, do empresário Eike Batista, reforçou o momento de ajuste no mercado de óleo e gás no Rio de Janeiro, pois veio na esteira do freio dos investimentos da Petrobrás, que também afetou o emprego no setor. O quadro atual, segundo especialistas, é de um mercado mais equilibrado, com salários mais ou menos estagnados depois das fortes altas recentes.

"A turma da OGX vai sobrar um pouco no mercado e os salários subirão menos", diz Joseph Teperman, sócio da consultoria Flow Executive Finders, especializada em recrutamento. A consultoria não registra queda de salários. Na média, um diretor de negócios do setor ganha entre R$ 35 mil e R$ 45 mil mensais, segundo a Flow.

Outro efeito é uma pressa menor em contratar. Segundo a consultoria Michael Page, o tempo médio dos processos seletivos do setor passou de 45 a 50 dias para 100 dias.

Apesar da estagnação, Bruno Stefani, gerente da divisão de óleo e gás da Michael Page, não credita o cenário de ajuste à crise da empresa de Eike. A restrição nos investimentos da Petrobrás tem um efeito bem maior. A derrocada do Grupo EBX seria mais simbólica.

"No início, quando a gente recrutava muito para o grupo, quando se falava de uma empresa do Eike, o cara levantava logo a mão e dizia que queria trabalhar. Tinha uma imagem de empreendedorismo. Ele mexeu muito, porque pagava bem e vendia bem. Hoje é o inverso", diz Stefani.

Médio prazo. Esse cenário tende a ser pontual. Para Stefani, o mercado de petróleo e gás vai se recuperar no médio prazo, principalmente a partir de 2015. O impulso virá da consolidação dos investimentos na Petrobrás no pré-sal.

Ex-funcionários lamentam o insucesso de Eike. "Se ele conseguisse desenvolver (os projetos), seria excelente para o País. As empresas dele geraram muitos empregos. O projeto do Porto do Açu, na visão de engenharia, é muito bonito", avalia o engenheiro Alexandre Gerszt, que deixou a OSX e foi contratado por outro estaleiro.

Outro engenheiro, que entrou na OSX como estagiário, quando a empresa foi criada, em março de 2010, e trabalhou lá até junho último, demonstra sentimento semelhante. Segundo ele, no auge da empresa, quando diversos projetos eram tocados, "todo mundo vestia a camisa".

"Todo mundo tinha o desejo que todos os planos se concretizassem. Todo mundo era muito motivado, porque eram projetos enormes, que iam melhorar a infraestrutura do País, gerar desenvolvimento, empregar milhares de pessoas", diz o engenheiro, sob condição do anonimato. / COLABOROU VINÍCIUS NEDER

Embraer surge como líder global do mercado de jato regional

A liderança da brasileira se dá porque o mercado está encolhendo à medida que as companhias aéreas optam por aviões maiores

Christiana Sciaudone, da
Divulgação
E190-E2

E190-E2, da Embraer: a Embraer se beneficia de ser capaz de financiar atualizações para a linha E2 com fluxo de caixa de sua unidade de defesa e de suas divisões de jatos comerciais

São Paulo - A Embraer SA, pioneira na construção de jatos regionais, está surgindo como líder global de um mercado que está encolhendo à medida que as companhias aéreas optam por aviões maiores.

A Bombardier Inc., concorrente da Embraer que começou a vender os aviões duas décadas atrás, está focando no desenvolvimento de um modelo maior para as operações principais com jato das transportadoras e não chegou a um acordo regional nos EUA neste ano. O novo lançamento da Mitsubishi Aircraft Corp. enfrenta um segundo atraso e não estará pronto até 2017.

O resultado é um cenário mais claro para a Embraer em meio a uma desaceleração dos pedidos por jatos regionais no setor para menos da metade do pico de 408, em 2007.

A Embraer, com sede em São José dos Campos, deve começar a embarcar modelos E2 atualizados em 2018, com uma tecnologia mais nova que a da Bombardier e uma herança que a Mitsubishi não pode igualar.

“Com o E2 proposto, a Embraer está mais próxima de ser a principal -- ou melhor, a dominante -- produtora de jatos regionais, porque a Mitsubishi está atrasada, atrasada, atrasada”, disse Cai Von Rumohr, analista da Cowen Securities LLC em Boston, por telefone.

Ele classifica os recibos de depósitos americanos da Embraer como “neutro” e não cobre a Mitsubishi ou a Bombardier.

A Embraer está se posicionando para sobreviver ao abalo com a atualização do E2, anunciada neste ano, que adiciona motores melhorados e um novo desenho de asa para seus E-jets.
Extremamente competitivos


“O plano de negócios do E2 foi baseado em expectativas muito sólidas, conservadoras até”, dos pedidos, disse o CEO da Embraer, Frederico Curado, em teleconferência com analistas, na semana passada. “Os aviões serão extremamente, extremamente competitivos”.

A Bombardier disse que não está abandonando o mercado de jatos regionais e que está trabalhando em seu CSeries, um futuro rival dos modelos menores da Boeing Co. e da Airbus SAS. A Mitsubishi disse que o MRJ se beneficiará do uso 20 por cento reduzido de combustível com seus novos motores em relação aos aviões regionais existentes.

Um aumento de cinco vezes dos preços do combustível de avião desde 1994, para US$ 2,80 o galão, está ajudando a empurrar as companhias aéreas na direção de aviões maiores, com os quais elas possam dividir o custo com mais passageiros, e longe dos modelos regionais, antes adotados por sua combinação de velocidade e habilidade de usar aeroportos menores de uma forma melhor que os modelos da Boeing Co. e da Airbus SAS, as maiores fabricantes de aviões do mundo.

A margem operacional consolidada da Embraer no terceiro trimestre caiu para 5,9 por cento, contra 7,2 por cento um ano antes, segundo dados compilados pela Bloomberg.

A pressão ocorre por ter uma cesta de pedidos mais inclinada para os modelos E-175, menores e de margens mais baixas, do que para o E-190, além de crescimento lento das vendas, disse Darryl Genovesi, analista da UBS AG em Nova York. A margem operacional da Bombardier caiu para 4,58 por cento no terceiro trimestre, contra 5,15 por cento um ano antes.

Ao mesmo tempo, a Embraer se beneficia de ser capaz de financiar atualizações para a linha E2 com fluxo de caixa de sua unidade de defesa e de suas divisões de jatos comerciais, disse Genovesi. George Ferguson, analista sênior de transporte aéreo da Bloomberg Industries em Skillman, Nova Jersey, disse que as dificuldades da Bombardier para encontrar compradores para um novo modelo como o CSeries, que pode transportar até 160 passageiros, mostram as vantagens da Embraer em lançar os jatos E2 atualizados.

“A Bombardier está aprendendo que só porque você está oferecendo algo em um espaço que tem 8 mil pedidos não quer dizer que as pessoas queiram isso”, disse Ferguson. “Isso dá à Embraer uma vantagem, porque ela já tem um monte de operadores”.

O PERIGO DA INFLAÇÃO ALTA, MESMO ESTABILIZADA


A safra de números nada edificantes sobre a economia brasileira continua, com o índice de inflação de outubro, medida pelo IPCA, de 0,57%, em aceleração diante do 0,35% do mês anterior. Já em base anualizada, nos últimos 12 meses, houve uma estabilização próxima aos 6% — 5,84%, pouco menos que os 5,86% de setembro.


Por trás das inevitáveis declarações de otimismo de autoridades econômicas, há um cenário no mínimo incômodo, pois crescem os temores diante da política fiscal. Não só devido ao déficit primário recorde de setembro — R$ 9,08 bilhões —, mas também pela descrença em que os gastos de custeio deixem de se expandir numa velocidade superior à da receita, influenciada por um ritmo lento de crescimento da produção. Sem considerar as desonerações, corretas em si, mas que, isoladamente, e por serem tópicas, não têm conseguido tirar a economia de uma faixa medíocre de expansão — ao redor dos 2,5%, estima-se. Crescimento baixo, desconfiança no front fiscal e inflação “engessada” na proximidade dos 6% — a meio ponto do teto da meta, cujo centro, 4,5%, é que deve ser perseguido, algo que o governo Dilma deixou de lado — não estimulam otimismo.


Compreende-se que surjam análises negativas na imprensa internacional, como a expectativa, publicada pelo inglês “Financial Times", de analistas do Barclays em São Paulo, de que o Brasil poderá ser o primeiro país dos quatro grandes do grupo Brics a perder o “grau de investimento” das agências de avaliação de risco. Na S&P, o viés do país já é de baixa. Atentas ao mau humor com as perspectivas da economia, autoridades se movimentam para dissipar o clima.


O ministro da Fazenda, Guido Mantega, já admite que o superávit primário não chegará aos prometidos 2,3% do PIB, mas diz que os números melhorarão até o final do ano. Porém, muito em função de receitas extraordinárias — os R$ 15 bilhões do bônus de assinatura do contrato de exploração de Libra, eventuais dividendos de empresas públicas, etc.


Para complicar o quadro, a maior pressão no crescimento dos gastos em custeio vem da área social — Previdência e seguro-desemprego, este numa alta em contradição com um mercado de trabalho ainda aquecido. É difícil conter estas despesas — por serem compulsórias e também por motivos político-eleitorais.

Cai, então, mais uma vez sobre o Banco Central a responsabilidade de, por meio de novo aperto na política monetária (juros), tentar quebrar o engessamento da inflação na faixa dos 6%, para impedir que os mecanismos de indexação piorem ainda mais as coisas. E, como se aproxima o ano eleitoral, também chega a hora de saber o tamanho da real autonomia do BC.


(Fonte: O Globo)


Governo corta verbas e fiscalização perde força

 

 

 

O impacto das mudanças atingiu atividades de resgate de trabalhadores em situação análoga à de escravos, combate a desmatamento e a fraudes

LEONÊNCIO NOSSA / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo
 
A máquina de fiscalização do governo freou em áreas sensíveis da administração. Nos primeiros dois anos e dez meses do mandato da presidente Dilma Rousseff, órgãos de controle perderam o fôlego principalmente por cortes no orçamento e trocas de políticas de gestão.

As mudanças atingiram atividades de resgate de trabalhadores em situação análoga à de escravos, combate a desmatamento, a fraudes no mercado financeiro e ações contra irregularidades em energia e telefonia.

Um dos órgãos que ganharam visibilidade no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o grupo móvel de combate ao trabalho escravo diminuiu as visitas às propriedades rurais. Foram 342 inspeções em 2011, 255 no ano passado e 185 neste ano. Os fiscais do trabalho resgataram de janeiro para cá 1.137 pessoas em situações precárias. No ano passado, foram 2.750 resgates. Os números ainda foram maiores em 2011: 2.491 resgates. Em 2010, 2.628 pessoas foram retiradas de propriedades nos grotões.

Na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia do Ministério da Fazenda responsável pela fiscalização do mercado de ações, a falta de impressoras ilustra a diminuição das atividades. Dos 90 equipamentos na sede do órgão no Rio, 50 estão sucateados. Lá, a falta de pessoal é outro problema. 

Atualmente, 600 pessoas trabalham no órgão - 20% a menos que em 2010. No primeiro semestre deste ano, a CVM realizou 27 operações, número inferior ao mesmo período do ano passado, quando foram 35 ações. 

Um funcionário da comissão ouvido pelo Estado afirma que o problema não se resume à corte de orçamento, mas também ao planejamento e à falta de pessoal, especialmente de nível médio. Nos últimos quatro anos, a evasão de funcionários chegou a 20,9%.

A diminuição de operações foi acompanhada pela redução de multas. No primeiro semestre deste ano, o órgão aplicou 92 multas. Ainda não há estimativa da soma anual. Nos 12 meses do ano passado, foram aplicadas 438. Dificilmente 2013 terminará como em 2011, quando a comissão efetuou 1.525 multas.

O Ministério do Planejamento contingenciou, neste ano, R$ 26,6 bilhões. No ano passado, o contingenciamento foi de R$ 25,3 bilhões.

Assessores do governo ressaltam que eventuais problemas no conjunto da máquina de fiscalização não podem ser creditados apenas a corte orçamentários. Eles dizem que o problema deve ser dividido com os ministros das pastas, que têm a responsabilidade de distribuir o orçamento em seu dia a dia. 

Em nota, o Planejamento ressalta que "o orçamento de cada ministério é global". "Cabe a cada pasta decidir como aplicar o seu orçamento, não cabendo ao órgão central definir previamente a realização das dotações orçamentárias", destaca.

O freio na fiscalização atingiu ainda agências nacionais reguladoras Aneel (energia elétrica) e Anatel (telecomunicações). Desde 2009, a Aneel não registra mais de mil notificações no setor, o que era constante até aquele ano. Em 2012, a agência fez 951 notificações. De janeiro a julho deste ano, foram 558. 

Nos relatórios semestrais divulgados pelo órgão, não há número de vistorias, mas se sabe que as queixas e denúncias têm aumentado na área. A Anatel também apresentou queda nas atividades de fiscalização nos dois primeiros anos do governo Dilma. 

A atuação dos fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama) foi uma das que registraram maior porcentual de queda. O órgão deverá terminar 2013 com o número mais baixo de autos de infração dos últimos 11 anos. De janeiro até agora, foram 10 mil autuações, quase a metade do registrado nos anos anteriores.