quarta-feira, 7 de março de 2018

Por que o protecionismo atravanca o progresso

 

 




Por João Luiz Mauad, publicado pelo Instituto Liberal

“Aqueles que dizem que a teoria e a prática são dois domínios não relacionados, ou são tolos em teoria ou desonestos na prática.” Ayn Rand.

Desculpem se volto ao assunto, mas Trump e suas políticas comerciais malucas não me deixam alternativa. O presidente americano prometeu ontem impor tarifas de 25% sobre as importações de aço dos Estados Unidos. Estas tarifas recairiam sobre as exportações de vários países, inclusive o Brasil, cujo governo já prometeu formalizar uma queixa técnica perante a OMC.

Pelo Twitter, Trump, histriônico e dramático, como de hábito, disse o seguinte, sobre a decisão (apud Rodrigo Constantino):

“Nós devemos proteger nosso país e nossos trabalhadores. Nossa indústria de aço está em mau estado. SE VOCÊ NÃO TEM AÇO, VOCÊ NÃO TEM UM PAÍS”.

É óbvio que se trata de uma grande besteira. A indústria do aço é muito importante para os Estados Unidos, e afeta a vida de todos os cidadãos: infraestrutura, construção civil, eletrodomésticos, automóveis, etc.. São necessidades praticamente infinitas. Todas as indústrias consumidoras de aço nessa lista (bem como seus consumidores) serão afetadas negativamente pelo aumento do preço da matéria prima. Estamos falando de cerca de 5,4 milhões de trabalhadores afetados, e centenas de milhões de consumidores. Como pode o presidente desprezar os efeitos negativos de sua medida sobre tanta gente?

A coisa se torna ainda mais indesculpável quando se olha para as experiências recentes, especialmente para as tarifas sobre o aço impostas por G. W. Bush, em 2002. Aqueles impostos permitiram que a indústria siderúrgica aumentasse o preço do aço doméstico, sem que houvesse, contudo, um impacto positivo no emprego. No entanto, as indústrias consumidoras não tiveram a mesma sorte. De acordo com estimativas, 200 mil pessoas perderam seus empregos nas indústrias que utilizavam o aço como matéria prima, nos anos seguintes.  Isso representa mais trabalhadores do que há em toda a indústria siderúrgica, cujos empregos as tarifas pretendiam proteger.

De acordo com a USITC, outra conseqüência das tarifas impostas por Bush foi a dificuldade de obtenção de aço nas qualidades e quantidades desejadas, o que acabou deslocando algumas indústrias de peças semi-acabadas para o exterior, de onde exportavam para os EUA sem pagar as tarifas do aço bruto.

O economista Mark J. Perry, analisando a perda de U$300 bilhões da bolsa americana (S&P 500 Index) somente ontem, depois da divulgação da decisão de Trump, vai direto ao cerne da questão:

“A matemática do protecionismo é bastante simples e bastante feia: os benefícios das tarifas para as empresas protegidas … (medida em termos de empregos, lucros ou valor de mercado adquirido) são sempre menoresdo que os custos impostos ao resto das empresas nacionais em outras indústrias (em termos de empregos, lucros ou valor de mercado perdido). A reação do mercado hoje às tarifas de Trump sobre aço e alumínio diz praticamente tudo o que você precisa saber sobre os males e os custos do protecionismo. Se houvesse mesmo uma possibilidade remota de que o protecionismo pudesse de algum modo gerar benefícios líquidos para a economia dos EUA, os mercados não teriam perdido $ 300 bilhões em valor em um dia. Portanto, a reação significativamente negativa de hoje no mercado de ações sugere que existe uma probabilidade zero de que as tarifas de aço e alumínio terão efeitos econômicos positivos líquidos, e uma certeza de 100% que terão efeitos negativos líquidos.”

Mas o protecionismo gera ainda outro efeito esperado (de longo prazo) bastante perverso, de que Perry não falou. Ele interfere negativamente no processo de destruição criadora. A América não se transformou na potência que é mantendo mão de obra ocupada em indústrias cuja produção pode ser feita fora. Ao contrário, aquele país vem se beneficiando das vantagens comparativas para consolidar-se na liderança de setores muito mais lucrativos, para os quais vastas quantidades de mão-de-obra se deslocaram nos últimos anos, graças à possibilidade de comprar produtos menos sofisticados no exterior.

Não seria exagero dizer que a indústria pesada é parte do passado nos EUA.  Ela deveria ser deixada a cargo de países tecnologicamente menos sofisticados mesmo. O negócio dos EUA é alta tecnologia, bioquímica, micro-biologia, indústria farmacêutica, robótica, nanotecnologia, informática, serviços financeiros.

O que Trump faz com essas medidas extemporâneas é atrasar a economia do país. Ou alguém acha que os EUA são o que são por causa das indústrias siderúrgicas? Não, meus caros, a vantagem comparativa – e competitiva – dos americanos está no conhecimento, na inovação, na alta tecnologia. Não é à toa que eles ganham a maioria dos Prêmios Nobel. Mas parece que Mr. Trump e sua trupe nunca leram Schumpeter, Ricardo, Friedman, Smith, Mises ou mesmo algum livro de introdução à economia (economics 101), e continuam vivendo no mundo mercantilista de 300 anos atrás. Seus fãs costumam dizer que Trump não precisa da teoria, pois aprendeu na prática. Ou que a teoria na prática é outra. A esses, eu respondo com a frase de Ayn Rand, na epígrafe.

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