
17/10/2025 - 7:30
Em um ambiente de inflação fora da meta e preocupações sobre o ambiente fiscal, o mercado tem precificado remunerações historicamente altas para títulos como o Tesouro IPCA+. Nesse cenário, os títulos atrelados à inflação com vencimento em 2029 tiveram suas máximas históricas, pagando IPCA+8%. Ou seja a inflação mais um prêmio de 8% ao ano, uma oportunidade considerada rara pelo mercado.
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Além disso, os dados de rentabilidade mostrados no site do Tesouro Nacional mostram também outras opções com uma rentabilidade acima de IPCA+7%. Veja abaixo alguns exemplos de títulos:
Camilla Dolle, head de renda Fixa da XP, explica que são ‘raríssimos’ os casos em que os títulos ficaram acima de IPCA+7,5%, e acima de IPCA+8% é uma situação ainda menos usual.
“Não é sustentável a gente manter esse patamar por tanto tempo e a gente vem mantendo já há muito tempo. Esse patamar acima de 8% não deva durar muito”, analisa.
Nesse contexto, a especialista considera que o momento atual representa uma janela atrativa, uma nova oportunidade para entrar, caso o título se enquadre no perfil de risco do investidor e ele possua espaço no portfólio para títulos atrelados à inflação.
Almeida, da Suno, comenta que para essa janela de oportunidades se encerrar seriam necessários ‘três ingredientes principais’:
- Sinalização fiscal confiável
- Ancoragem das expectativas de inflação
- Melhora do cenário externo
No primeiro ponto, talvez o mais relevante, seria de um governo mostrando um compromisso claro com o controle de gastos que convença o mercado, com um plano crível e com corte de gastos – algo que o especialista acredita que não vai ocorrer.
Sobre inflação, avalia que precisaria de uma ancoragem para o horizonte relevante da política monetária, que é o primeiro trimestre de 2027.
“Sobre a melhora do cenário externo, seria um ciclo de queda de juros nos Estados Unidos. Uma resolução dessa guerra comercial e o acordo entre Brasil e Estados Unidos se concretizando com uma leitura positiva para nosso país. Mas eu não enxergo uma resolução desses três fatores em um curto prazo. Então, é possível que essa janela de oportunidades ainda seguirá aberta, mas não necessariamente com taxas superiores a 8%”, explica.
Nesse contexto, a expectativa é de que os títulos do Tesouro sigam altamente atrativos, mas com taxas mais ‘comportadas’, entre IPCA+7% e IPCA+7,5% – ainda com uma rentabilidade historicamente alta.
O que explica a taxa de prêmio atual?
Os juros atuais decorrem de uma exigência de um prêmio de risco maior por parte do mercado por conta da percepção de risco mais acentuada, tanto vindo dos fatores geopolíticos do cenário externo – com conflitos – quanto domésticos, com as contas públicas gerando grandes incertezas.
“O mercado tem uma percepção de deterioração da saúde fiscal do Brasil. Há dúvidas crescentes sobre a capacidade do governo em cumprir as metas fiscais estipuladas no arcabouço e estabilizar a trajetória da dívida pública em relação ao PIB”, explica Guilherme Almeida, Head de Renda Fixa da Suno Research.
As discussões sobre o orçamento de 2026 aumentam a percepção de que há uma pressão muito grande por conta do aumento de gastos públicos sem uma contrapartida clara de corte de gastos ou até mesmo de receitas – o que funciona como um catalisador positivo para os títulos, dado que o mercado pressiona a curva e exige um prêmio de risco maior para os títulos de renda fixa atrelados à inflação.
Cuidados ao investir no Tesouro IPCA+
Especialistas frisam que apesar de serem investimentos considerados atrativos, é importante relembrar que são títulos desenhados para serem carregados até o vencimento – comprá-los e vendê-los no mercado podem gerar prejuízos.
Além disso, destacam o fato de, há anos, existir a marcação mercado destes investimentos – ajuste diário do valor desses papéis com base nos preços praticados no mercado, refletindo oscilações nas taxas de juros e na inflação, podendo fazer com que a cotação varie tanto ou mais do que investimentos em renda variável, a depender do contexto.
“Quem comprou a taxas mais baixas vê o título desvalorizando, o que também não deve ser necessariamente uma razão para resgatar esses títulos. Por isso que é tão importante entender o mecanismo dos títulos de renda fixa. Mas a nossa visão aqui não muda, continuamos vendo sim um ambiente positivo para títulos atrelados à inflação de até cerca de 5 a 6 anos de duration. Por conta destes juros reais mais altos pré-fixados, aumentamos aumentou recentemente a recomendação de alocação por conta dessa expectativa de redução de juros, principalmente a partir do ano que vem”, diz Dolle, da XP.

Almeida, da Suno, chama atenção para o fato de que muitos investidores são atraídos pela rentabilidade e acabam negligenciando outros fatores que são mais importantes do que a rentabilidade em si.
“Quando a gente fala em um título de renda fixa, existem ali os riscos inerentes a qualquer título, o risco de crédito, o risco de liquidez, o risco de mercado, enfim. Quando a gente fala de risco de crédito, aqui a gente está tratando de um título público, então o risco de crédito é mínimo, quase que inexistente. Afinal de contas, quem está emitindo o título é o Tesouro Nacional e no fim do dia ele pode simplesmente emitir dinheiro e emitir moeda e pagar aos seus credores”, explica.
“A gente sabe os efeitos negativos que isso gera na economia, vira inflação, mas essa é a percepção que o mercado tem. Então o risco de crédito é considerado ali o menor risco do mercado brasileiro, os títulos públicos, mas a gente tem alguns fatores principalmente associados ao risco de mercado e ao risco de liquidez”, acrescenta.
“Para quem que seria adequado essa exposição ao IPCA+? Para aquele investidor que não tenha uma dependência da liquidez, ou seja, o dinheiro aportado nesses títulos não pode ser o da reserva de emergência desse investidor”, afirma Almeida.
Ou seja, o especialista frisa que a compra só deve ser feita por investidores que pretendam carregar os títulos até seu vencimento.
“O investidor ideal é aquele que tem um objetivo claro para esse dinheiro e que pode deixar o recurso investido até a data de vencimento do título. Aqui a gente tá falando 2029, por exemplo, então deixar até 2029 ou 2040, caso seja o vencimento escolhido. Esse é o perfil de quem está poupando para objetivos de médio e longo prazo.”
Janeta de oportunidade rara
Um levantamento da Quantum Finance mostra que os títulos com vencimento em 2029 tiveram apenas 30% dos seus dias de negociação com rentabilidade igual ou acima de IPCA+7%.
Já os títulos Tesouro IPCA+ que vencem em 2035 possuem apenas 11,8% dos dias de negociação com rentabilidade igual ou acima de IPCA+7%. Para com vencimento em 2045, essa porcentagem cai ainda para 8% dos dias de negociação.
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