Após aumento de imposto, empresa ameaça produzir seu xarope de refrigerante em outro país e é investigada pela Receita Federal. Entenda:
São Paulo – A Coca-Cola
decidiu subir o tom para pressionar o governo brasileiro a voltar atrás
numa decisão que, na prática, aumentou a carga de impostos paga pela
companhia no país.
A empresa agora ameaça produzir seu xarope de refrigerante em outro país da região, segundo informações do jornal Folha de S.Paulo.
Hoje ele é produzido na Zona Franca de Manaus. Isso porque, em junho, o
governo mudou a cobrança do IPI, o que reduziu os créditos tributários
recebidos pela companhia.
A mudança na regra foi a seguinte: o xarope de refrigerante passou a
pagar uma alíquota de 4% de IPI, contra os 20% que eram cobrados
anteriormente. Aparentemente, portanto, é uma redução no imposto.
Porém, muitas companhias do setor, em especial as grandes, produzem
esse xarope na Zona Franca de Manaus, com isenção de tributos. Então, os
20% de IPI que seriam cobrados dessas companhias na verdade tornavam-se
créditos para elas.
A empresa não pagava os 20% porque está na Zona Franca de Manaus. Mas
na hora que o xarope sai de Manaus para as engarrafadoras que estão em
outros Estados, elas ganhavam um crédito de 20%. Com a nova regra, o
desconto passou a ser de 4%.
A pressão da Coca-Cola e de outras grandes empresas do setor,
reunidas na Abir (Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes)
é para que o governo Temer aumente o IPI para pelo menos 15%. Caso
contrário, as companhias ameaçam fechar 15 mil postos de trabalho na
Zona Franca de Manaus.
Porém, há mais questões em jogo. Pequenas fabricantes de
refrigerantes denunciam que, além do crédito recebido, a Coca-Cola e
outras grandes superfaturam o produto que sai da Zona Franca, aumentando
ainda mais a distorção (leia mais no link abaixo).
Material divulgado pela Afrebras (Associação dos Fabricantes de
Refrigerantes do Brasil) afirma que o preço do concentrado produzido em
Manaus “chega a ser 20 vezes maior que o insumo produzido nos demais
estados”.
A renúncia fiscal das multinacionais de concentrado localizadas na
Zona Franca de Manaus foi de 9,1 bilhões de reais em 2016, diz a
entidade.
O caso é investigado pela Receita Federal. De acordo com a Folha, na
investigação, executivos da Coca-Cola precisam explicar por que a
fabricante vende o quilo do concentrado por cerca de R$ 200 no mercado
interno se exporta o produto por aproximadamente R$ 20.
Em nota, a Abir afirma que a redução do IPI “impacta profundamente o
setor” e que “nada justifica a ausência de diálogo com o setor”. Segundo
a entidade, a mudança “ameaça os investimentos e mesmo a operação de
diversas indústrias na Zona Franca de Manaus”.
“Em 2017, a indústria brasileira de refrigerantes e de bebidas não
alcoólicas tornou-se responsável por pelo recolhimento de R$ 10 bilhões
em impostos federais, estaduais e municipais e emprega direta e
indiretamente mais de 1,6 milhão de brasileiros. Na Zona Franca de
Manaus o setor investiu não só nos processos produtivos, mas também em
toda uma cadeia econômica sustentável na Amazônia e em programas sociais
e culturais da Região Norte”, completa o texto.
Em entrevista a EXAME, o vice-presidente de relações
corporativas da companhia, Pedro Rios, afirmou que a multinacional
permanecerá no país e continuará a atuar na Zona Franca de Manaus, mesmo
que as condições tributárias permaneçam as mesmas.
“A afirmação de que ameaçamos sair do Brasil e da Zona Franca de
Manaus não é verdadeira”, disse Rios (leia mais no link abaixo).
Refrigerante e filé mignon
Essa não é uma briga nova. Em março deste ano, o Carf (Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais) julgou procedente um pedido da
Fazenda Nacional sobre o caso.
Uma nota no site da Receita Federal afirma
o seguinte: “(…) a prática que vem sendo adotada por grandes empresas
do setor é a de se aproveitarem de benefícios fiscais oriundos de
insumos de baixo valor agregado. Dentre os insumos que geram créditos os
para fabricantes de bebidas, incluem-se até mesmo substâncias que são
adquiridas no centro do país e passam por simples reacondicionamento em
Manaus”.
Também não é primeira vez que o governo tenta mexer no IPI do xarope
de refrigerante, que já foi alvo da então presidente Dilma Rousseff, em
2013.
A celeuma expõe ainda um problema antigo, que é o dos benefícios
fiscais. Só em 2018 a União vai abrir mão de R$ 283,4 bilhões por causa
de benefícios fiscais. Na lista dos produtos agraciados com um desconto
nos impostos estão itens como salmão, caviar, filé mignon e todos os
tipos de queijo.
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