sábado, 18 de maio de 2024

Eles veem oportunidade na tragédia no RS

 

Alvarez & Marsal | LinkedIn


O capital se fortalece com as crises que ele mesmo fomenta.

Porto Alegre segue debaixo d'água, e o tamanho do estrago ainda é imensurável, mas o prefeito Sebastião Melo, do MDB, já anunciou o plano: irá contratar a consultoria Alvarez & Marsal para recuperar a cidade.

A história dessa contratação é tocante. “Um dos sócios dessa empresa é gaúcho, porto-alegrense. Ele se sensibilizou com o processo e nos procurou para ajudar”, disse Melo. A Alvarez & Marsal não irá cobrar pelo trabalho nos primeiros seis meses – mas o plano já prevê atividades para além do período gratuito.

A benevolência esconde o contexto. Vou começar pelo mais básico. A Alvarez & Marsal é uma consultoria que atua para recuperar aqueles casos quase impossíveis de crise corporativa. Empresas envolvidas em desastres ambientais, em grandes condenações e de reputação duvidosa.

Aqui no Brasil, por exemplo, atuou após os crimes ambientais de Mariana e Brumadinho e com empresas que foram investigadas pela operação Lava Jato, como o Grupo Odebrecht e as construtoras OAS e Queiroz Galvão. 

(O rol de clientes não impediu, no entanto, que Sergio Moro fosse contratado pela consultoria logo após deixar o ministério da Justiça de Bolsonaro, mas essa é outra história que você pode ler aqui.)

Nos EUA, a Alvarez & Marsal atuou na reestruturação de Nova Orleans depois do furacão Katrina em 2005 – uma tragédia que, devido à magnitude, tem sido bastante comparada com o que está acontecendo no Rio Grande do Sul. Na ocasião, 1,5 mil pessoas morreram e 80% da cidade ficou debaixo d'água, completamente colapsada. 

No domingo, o Fantástico fez uma reportagem em tom esperançoso mostrando como foi a recuperação de Nova Orleans – e o que os gaúchos podem aprender com ela. 

A história de superação da cidade pode ser, sim, lida com essa lente inspiradora. Mas a economia de recuperação de desastres tem um lado sombrio, e é a tempestade perfeita para os urubus da crise criarem novas fronteiras de acumulação de capital – e implantarem as reformas e medidas antipopulares que tanto desejam.

É o fenômeno descrito como capitalismo de desastre. O caso de Nova Orleans, por exemplo, é um dos exemplos analisados pela autora canadense Naomi Klein no seu livro "A doutrina do choque – a ascensão do capitalismo do desastre".

Esse conceito de "choque" vem do economista Milton Friedman, vencedor do Nobel de Economia em 1976 e um dos principais influenciadores da linha econômica liberal dos Chicago Boys. 

Friedman argumentava que só as crises econômicas poderiam produzir mudanças. Ou seja: o período após um trauma coletivo é o mais propício para reformas que, em outras ocasiões, dificilmente seriam aceitas. Privatizações radicais, por exemplo.

 

 Intercept Brasil

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