O
otimismo exagerado de que será possível evitar as piores consequências
das mudanças climáticas é a principal barreira para uma ação decisiva
contra elas, aponta a pesquisa “Social Intelligence for Climate Action”
(Inteligência Social para a Ação Climática, em tradução livre) realizada
pela consultoria Capgemini, em parceria com a empresa de tecnologia
Dassault Systemes e a startup de análise de dados Bloom.
O
levantamento, feito a partir de coletas de dados nas redes sociais,
também apontou outras quatro barreiras relevantes: falta de informação,
medo de consequências ruins das ações ambientais, delegação de
autoridade e falta de esperança.
A
pesquisa foi feita com dados da internet em língua inglesa, por meio de
plataformas como Facebook, Instagram, TikTok, YouTube e X (antigo
Twitter). A ideia foi chegar ao máximo de países e regiões do globo e
captar os sentimentos e o vocabulário utilizados pelas pessoas para
falar sobre o tema. Foram analisados mais de 480 milhões de ações e
engajamentos, de 330 milhões de pessoas, em 14 milhões de documentos
agregados sobre as mudanças climáticas.
Entre as principais
descobertas, estão as de que as preocupações ambientais aparecem em
diversos países – embora, pelas limitações da pesquisa, as nações de
língua inglesa tenham aparecido mais. Também foi indicado que o grupo
mais jovem a participar, entre 16 e 34 anos, é o mais engajado no tema, e
que as pessoas estão prestando atenção na comunicação das empresas.
Atualmente,
a grande maioria das pessoas confia nas companhias – apenas 3% acredita
que elas comunicam demais sobre sustentabilidade sem causar um impacto
realmente positivo. É necessário que haja honestidade, para evitar que
essa parcela venha a aumentar. Por outro lado, cerca de 30% das
interações sobre as mudanças climáticas são negativas, porcentual
considerado alto e que demonstra que o tema também sofre com a
polarização.
Cinco barreiras
Nos
posts, a principal conclusão foi a identificação das cinco barreiras,
com destaque para o otimismo exagerado. “É um otimismo até por falta de
informação, impensado, quando você está cego e não vê a realidade”,
avalia Emanuel Queiroz, diretor de sustentabilidade da Capgemini no
Brasil.
O relatório cita o perigo do “greenwashing”, quando as
empresas vendem como sustentável uma ação ou produto que não tem efeito
ou é prejudicial; o tecno-otimismo, uma aposta de que novas tecnologias
irão solucionar o problema, e a utilização de ideias antigas em vez de
buscar novas soluções.
Na sequência, a própria falta de
informações aparece como uma barreira relevante, que leva à falta de
confiança e causa a sensação de falta de poder entre as pessoas.
“A
situação é agravada pelos principais afetados pela crise climática
muitas vezes não terem como fazer sua voz chegar ao mundo todo”, afirma
Queiroz. Segundo ele, como os mais afetados são principalmente os mais
pobres e moradores de países considerados periféricos, muitas vezes eles
não falam línguas como o inglês e suas histórias são mais difíceis de
serem compartilhadas.
O
medo de consequências ruins das ações ambientais é outro obstáculo para
a ação. Mais regulações podem complicar o mercado para pequenas e
médias empresas, e trabalhadores de setores como os de produção de
combustíveis fósseis podem perder os empregos – assim, se torna
necessário um plano que garanta recolocação profissional e que as
necessidades básicas desses indivíduos e suas famílias sejam atendidas.
A
delegação de autoridade é uma atitude na qual os cidadãos deixam apenas
a cargo das empresas e governos tomarem atitudes para conter a crise
climática. Contudo, a participação das pessoas comuns também é possível e
necessária para evitar as piores consequências. “O poder individual
menor é potencializado pelo poder coletivo”, cita Queiroz, destacando os
boicotes como uma forma de ação. Outras, como protestos e ações
judiciais, também são possíveis.
or fim, a falta de esperança leva
a pensamentos como “para que agir, se será impossível evitar?”. Assim
como seu “oposto”, o otimismo exagerado, a solução é fornecer
informações corretas para demonstrar que ainda há possibilidade de
evitar o pior. “Uma via é abrir fóruns de discussão, desde que baseado
em dados reais, em informações concretas”, diz Queiroz. Ele menciona
ainda que, apesar do otimismo aparecer mais na crise climática, a falta
de esperança predomina ao se tratar da erradicação da pobreza.
Empresas
Outro
estudo da Capgemini, o Climate Tech, lançado em abril, aponta que a
maioria das empresas ainda não vê a pauta ambiental como uma chance de
investimento, e sim como um gasto. Apenas 21% dos executivos concordam
com a afirmação de que “os argumentos econômicos a favor da
sustentabilidade são claros”, e para 53%, as iniciativas de
sustentabilidade são um encargo financeiro que tem de ser suportado para
fazer negócios, ao comentar sobre o hidrogênio verde.
Apenas
11% das organizações foram classificadas como sustentáveis, mas dentre
estas, a margem de lucro líquido foi 9% maior em comparação com a média,
e 83% tiveram receitas mais elevadas por empregado em comparação com a
média. “Temos que apresentar business cases que fogem dos tradicionais”,
comenta Queiroz. Ele alerta que o custo de uma empresa não se preocupar
com a sustentabilidade, no futuro, é ir à falência.
“Hoje, as
empresas não aplicam a sustentabilidade na estratégia de crescimento
como um todo, tem apenas iniciativas no marketing, na comunicação com a
sociedade. Enquanto não levar como um pilar da estratégia de
crescimento, não vai trazer retorno”, projeta o especialista da
Capgemini.
A melhor estratégia para conseguir isso é entranhar a
sustentabilidade na cultura da empresa, desde os mais altos cargos, que
devem ter suas remunerações e bônus atrelados ao resultado alcançado no
tema, até o operacional. Contratar funcionários com habilidades
relacionadas a temas ambientais é um passo, assim como treinar os que já
estão na empresa. Criar um portal colaborativo ajuda.
A pesquisa
“Social Intelligence for Climate Action” aponta ainda outras ações
possíveis: transmitir as mensagens corporativas de forma eficiente e sem
greenwashing, lidar também com as ações sociais, e assumir
responsabilidades. “Não adianta um setor empurrar a responsabilidade
para outro”, adverte Queiroz. Mesmo para as empresas brasileiras, há
oportunidades – o Brasil pode ser um grande solucionador de questões
ambientais e climáticas, devido aos seus recursos naturais e expertise
no assunto.