quinta-feira, 31 de julho de 2014

Bancos se calam sobre política após episódio com Santander


Representantes de seis bancos, corretoras e fundos brasileiros e estrangeiros dizem que já não estão dispostos a comentar publicamente sobre política

Cristiane Lucchesi e Ney Hayashi e Francisco Marcelino, da
Jennifer Polixenni Brankin/Getty Images
Mulher faz gesto de silêncio, tocando o dedo na boca
Silêncio: representantes pediram que identidades e nomes das empresas não fossem revelados

Com ralis das ações de empresas brasileiras toda vez que a presidente Dilma Rousseff perde apoio nas pesquisas, as eleições de outubro são o único assunto discutido no mercado – isto é, a portas fechadas.

Representantes de seis bancos, corretoras e fundos brasileiros e estrangeiros dizem que já não estão dispostos a comentar publicamente sobre política, e alguns mencionam o risco de retaliação do governo.

Todos pediram que as suas identidades e os nomes das suas empresas não fossem revelados.

Na semana passada, o pedido de desculpa público do Banco Santander Brasil por dizer que a economia poderia piorar se as chances de Dilma de ser reeleita aumentassem desencadeou discussões privadas em pelo menos dois grandes bancos sobre o que seus analistas poderiam dizer, segundo duas fontes do setor. 

Em 28 de julho, Dilma disse aos jornalistas que o Brasil não deveria “aceitar nenhum nível de interferência institucional de nenhum membro do sistema financeiro na atividade eleitoral e política”.

A reação do governo e o pedido de desculpa do Santander “é mais um sinal de que não estamos num rumo bom”, disse Wagner Salaverry, que ajuda a gerenciar cerca de R$ 15 bilhões (US$ 6,7 bilhões) na Quantitas Gestão de Recursos, em entrevista por telefone, de Porto Alegre.

“Dados de pesquisas que eram favoráveis a candidatos de oposição fazem os investidores comprar mais ações. O investidor está pensando isso mesmo. Se isso vai contra o que o governo pensa, paciência”.

A assessoria de imprensa do Palácio do Planalto não respondeu a um pedido de comentários. 

A assessoria de imprensa da campanha de Dilma e a associação bancária do país, a Febraban, não quiseram comentar.


Viés político


O Santander se desculpou por uma nota para clientes que relacionava a perspectiva econômica às eleições, publicada no seu site em 25 de julho e posteriormente removida. 

O banco disse que a nota não refletia sua posição e que violava uma diretriz de que as análises econômicas enviadas a clientes não devem conter um viés político. 

Sua assessoria de imprensa indicou à Bloomberg News o comunicado quando foi consultada por e-mail sobre sua resposta aos comentários feitos por Dilma no dia 28 de julho.

O presidente do Santander, Emilio Botín, disse hoje aos jornalistas no Rio de Janeiro que o banco “tomou todas as medidas internas imagináveis” contra o funcionário ou os funcionários responsáveis pelo relatório, de acordo com um funcionário do Santander na coletiva de imprensa, que solicitou o anonimato, conforme as regras da companhia.

As pesquisas de opinião pública mostram que a liderança de Dilma antes da votação em outubro está diminuindo à medida que a inflação acelera e o crescimento diminui. 

Os mercados acionários tiveram um rali depois que uma pesquisa do Datafolha mostrou, neste mês, que a reeleição de Dilma não está garantida. 

O índice Ibovespa ganhou 27 por cento desde meados de março, o maior ganho entre os 20 maiores indicadores acionários do mundo.


Sem aberturas


As empresas têm se abstido de arrecadar capital ou tomar decisões sobre investimentos até depois de outubro, porque as futuras políticas do governo dependerão de quem ganhe as eleições, disse Rogério Freitas, sócio do hedge fund Teórica Investimentos.

Não houve aberturas de capital no Brasil neste ano, o começo de ano mais lento desde, pelo menos, 2004, quando a Bloomberg começou a compilar dados sobre as ofertas de ações no País.

“Para que a gente tenha novas ofertas, precisa ter uma mudança de governo”, disse Freitas em entrevista por telefone, de São Paulo.

“Se a oposição ganha, a bolsa dispara, e só aí a gente deve ver empresas começando a pensar de novo em voltar para o mercado”.

Tony Volpon, analista da Nomura Securities International em Nova York, disse que os pesquisadores não deveriam reprimir seus comentários devido a preocupações políticas.

“Você, analista, deve falar em política, porque faz parte do que você tem que fazer”, disse Volpon, em uma entrevista. “Mas tudo tem que ser baseado em análise”.

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