Marco Antônio Carvalho
Mais de dez reclamações foram registradas
diariamente nos juizados de aeroportos paulistas neste ano; queixas
tendem a aumentar em período de final de ano
A falta de assistência de companhias aéreas é o principal motivo de
reclamações de passageiros nos juizados especiais instalados nos
aeroportos de Cumbica, em Guarulhos, e em Congonhas, São Paulo, os dois
mais movimentados do País. Insatisfações dessa natureza são responsáveis
por mais de 40% do total de 3.857 queixas registradas até agora em
2014; a média de queixas é similar à do ano passado.
São mais de 10 reclamações por dia nesse ano nos juizados paulistas
que funcionam nos aeroportos e que, caso não atinjam uma conciliação,
serão transformadas em processos judiciais. Falta de assistência é o
termo utilizado pelo Poder Judiciário e engloba casos de ausência de
atendimento diversos das companhias a passageiros que se sentiram
prejudicados por problemas no voo e que não receberam pronta resposta.
Reclamações sobre falta de informação e atraso de voos aparecem na
sequência dos fatos mais recorrentes registrados nos juizados, com 33% e
10%, respectivamente. Com a aproximação do final do ano e um maior
fluxo de viagens, as ocorrências tendem a aumentar, especialmente de
consumidores protestando contra voos que não decolam no horário marcado.
Instalados em 2010 em dois aeroportos de São Paulo e em dois do Rio
de Janeiro, os juizados têm como principal objetivo auxiliar na
conciliação entre passageiros e companhias, evitando a necessidade de
processos judiciais para resolução dos conflitos.
Em 24% dos casos neste ano, os juizados em São Paulo conseguiram
firmar um acordo entre as partes. O porcentual de acordos obtidos é o
maior dos últimos três anos. Em 2012, a conciliação entre passageiros e
companhias só foi atingida em 4,6% dos casos; no ano seguinte, a
porcentagem foi de 9,2%.
“O que a gente implementou foi uma espécie de facilitação da
interlocução entre os funcionários da empresa e os passageiros. As
empresas têm interesse que depois a reclamação não vire processo porque
haverá um custo”, disse a juíza Mônica Soares Machado Alves Ferreira,
coordenadora dos juizados nos aeroportos de Guarulhos e Congonhas.
Esses aeroportos são os dois com maiores fluxo de passageiros em todo
o País. Em Cumbica, passaram mais de 35 milhões de pessoas em 2013 e,
em Congonhas, mais de 15 milhões. Com um fluxo maior, Cumbica registra
até oito vezes mais reclamações e processos do que o aeroporto
localizado na capital. Nesse ano, das 3.857 queixas, 3.338 partiram do
juizado em Guarulhos.
Outros alvos de protesto por parte dos consumidores são problemas com
bagagens, overbooking e cancelamento de voos. Em muitos casos, no
entanto, nem sequer é preciso buscar conciliação e a atuação do juizado
se resume a orientar o passageiro sobre como proceder diante do problema
encontrado; em 2014, foram mais de 11 orientações por dia em São Paulo.
Hoje, essas estruturas estão presentes também nos aeroportos de
Confins, em Minas Gerais, em Cuiabá e em Brasília. Juizados temporários
foram montados em todas as 12 sedes da Copa do Mundo de futebol, mas
tiveram as atividades encerradas após o término da competição em julho.
Em São Paulo, os juizados funcionam de forma temporária, com renovações
periódicas do Tribunal de Justiça no Estado para continuar em
funcionamento.
Para o conselheiro do Conselho Nacional de Justiça Paulo Teixeira,
que autuou nos juizados durante a Copa do Mundo, as estruturas têm muita
importância para os consumidores. “Não é interessante você ter de se
deslocar para uma estrutura judiciária que não seja no aeroporto para
resolver uma demanda relacionada à sua situação no próprio aeroporto. O
objetivo do CNJ é fazer com que essas estruturas possam funcionar
sistematicamente”, disse Teixeira.
Impotência. Quando o advogado Arthur Mendes, de 35
anos, decidiu cancelar antecipadamente as passagens aéreas que havia
comprado para sua mulher e suas duas filhas, o objetivo era evitar
problemas com a companhia aérea e conseguir o reembolso dos valores dos
bilhetes. A tentativa de conseguir de volta o dinheiro, no entanto,
transformou-se em uma novela que se arrasta há mais de dois meses sem
perspectiva de desfecho.
O advogado viajou para os Estados Unidos com a família, mas sua
mulher e as filhas decidiram ficar por mais tempo além do previsto, o
que o fez cancelar as passagens. “A palavra que pode resumir meu
sentimento é impotência. A companhia aérea vai empurrando a gente com a
barriga, vai enrolando. Não tive nenhum retorno efetivo e já tem mais de
dois meses”, disse.
Mendes, que costuma viajar de avião pelo menos duas vezes por mês,
diz também já estar acostumado a outros problemas com as companhias e os
aeroportos. “Viajo bastante por conta de trabalho. Já estou acostumado
com atraso de voo, problema em avião, troca de aeronave, esse tipo de
coisa. A gente estranha quando o voo sai na hora”, disse.
O mesmo sentimento é compartilhado pelo administrador de empresa
Carlos Nobre, de 45 anos. Recentemente, Nobre se viu vítima da falta de
assistência de uma companhia aérea que o contatou para informar que o
voo inicialmente previsto para o período noturno do dia marcado havia
sido alterado para às 7h30 da manhã. Após reclamações e dores de cabeça,
dois dias antes do voo ele conseguiu ser realocado para o horário
original.
“Sempre vou para o aeroporto com a certeza absoluta que o voo vai
atrasar. Já estou predisposto a esperar e raramente isso não acontece. O
que era exceção, agora é regra”, disse o administrador de empresas que
viaja de avião uma vez por mês.
Meteorologia e infraestrutura. Para a Associação
Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), menos da metade dos problemas
apontados pelos consumidores é de responsabilidade das companhias. Na
maioria dos casos de atrasos e cancelamentos de voos, segundo a Abear,
estão ligados a fatores como infraestrutura aeroportuária ou
meteorologia.
“Atrasos e cancelamentos somaram cerca de 40% das manifestações [a
Procons dos estados] e, quando não estavam relacionadas a questões
meteorológicas, estavam ligadas às obras de reforma dos aeroportos para a
Copa do Mundo”, informou em nota ao Estado. A entidade representa as
cinco maiores companhias aéreas brasileiras: Tam, Gol, Avianca, Azul e
Trip.
O número de mais de oito mil reclamações a Procons brasileiros
representa, de acordo com a Associação, apenas uma manifestação a cada
10 mil passageiros embarcados. A Abear reforçou que “a relação com o
consumidor é uma das premissas do setor aéreo, tanto que vem aprimorando
seus indicadores no atendimento a reclamações.” A Associação
acrescentou ainda que está se preparando para o período de final de ano
com remanejamento de escalas de pessoal e manutenção programada das
aeronaves “para garantir que tripulações, agentes em solo e também a
frota estejam totalmente a postos durante o período.”
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