Atuação:
Consultoria multidisciplinar, onde desenvolvemos trabalhos nas seguintes áreas: fusão e aquisição e internacionalização de empresas, tributária, linhas de crédito nacionais e internacionais, inclusive para as áreas culturais e políticas públicas.
segunda-feira, 2 de outubro de 2017
A resistência da Estrela
Depois de sofrer por duas décadas
com a invasão dos produtos chineses, a marca ícone de brinquedos quer
recuperar seu brilho. Saiba como
No jogo: a flexibilidade na
produção é uma das estratégias do empresário Carlos Tilkian para reduzir
custos e fazer frente aos rivais asiáticos (Crédito: Karime
Xavier/Folhapress)
Instalado no sétimo andar de um prédio da zona oeste de São
Paulo, o pequeno show room guarda uma parte da história da indústria
brasileira de brinquedos. Nas prateleiras, produtos que povoaram os
sonhos de crianças de diversas gerações: Genius, Ferrorama, Falcon e
Susi, entre outros nomes que proporcionam ao visitante uma viagem no
tempo. Parte do escritório que abriga a sede da Estrela, a sala é apenas
um retrato do que foi a empresa, fundada em 1937, e que, até os anos
80, liderava com sobras as vendas do setor. Na década seguinte, essa
zona de conforto ficou para trás com a abertura do mercado e a invasão
dos produtos chineses, de baixo custo. Mas enquanto muitos dos seus
pares locais ficaram pelo caminho diante dessa reviravolta repentina, a
companhia conseguiu, a duras penas, resistir.
Depois de percorrer um longo e tortuoso caminho, a Estrela quer agora
recuperar o seu brilho. “Estamos cada vez mais fortes e preparados para
enfrentar a concorrência internacional”, diz Carlos Tilkian, presidente
e, desde 1996, acionista majoritário da companhia, com uma participação
de cerca de 33%. Ele assumiu o controle da empresa ao comprar a fatia
de Mario Adler, herdeiro de Siegfried Adler, fundador da fabricante. Na
época, Mario vinha tentando sair da operação, diante do cenário crítico
que se apresentava. “A Estrela é uma marca forte, icônica. Apesar dos
desafios, eu vi que a empresa tinha uma saída”, afirma Tilkian.
Essa retomada parece ter, enfim, um cenário mais propício para se
concretizar. Em 2016, o mercado de brinquedos movimentou R$ 6,1 bilhões
no País, um salto de 10% sobre 2015, segundo a Associação Brasileira dos
Fabricantes de Brinquedos (Abrinq). Para esse ano, a entidade prevê um
crescimento de 12%. “As famílias adiam a compra de um imóvel, a troca de
um carro, mas não deixam de presentear suas crianças”, diz Synésio
Batista, presidente da Abrinq. E, nesse contexto, as empresas locais
estão recuperando, gradualmente, sua participação. Se, em 1996, os
produtos chineses abocanharam 62% da receita, no ano passado, esse
índice ficou em 45%. A divisão das etapas da produção nos países do
Mercosul é um dos fatores que começam a contribuir para esse
reequilíbrio de forças. “As fabricantes brasileiras estão buscando
alternativas para tornarem seus produtos mais competitivos”, diz
Batista. Hoje, em média, um brinquedo produzido na China é 35% mais
barato que o seu equivalente fabricado no Brasil. De pai pra filho:
no portfólio da Estrela, o boneco Falcon, o jogo Genius e outros
produtos clássicos da marca convivem com novidades como o patinete
elétrico Dareway e o bicho de pelúcia da Peppa Pig (Crédito:Divulgação)
Reduzir essa lacuna é uma das prioridades da Estrela. Recentemente,
a empresa investiu em uma fábrica no Paraguai para substituir a
importação de brinquedos da China, que hoje representam 15% do seu
portfólio. Com a unidade, prevista para entrar em operação em
2018, o plano é aproveitar os benefícios da Lei de Maquila, que dá
isenções fiscais para quem importa matérias-primas e monta produtos no
país, destinados à exportação. A Estrela quer importar 60% dos insumos
da China, conforme permite a lei. Os 40% restantes dos componentes serão
fabricados nas unidades da empresa no Brasil, em Itapira (SP), Três
Pontas (MG) e Ribeirópolis (SE). “Nós construímos um modelo que nos dá
capacidade de produzir no Brasil e na China, de acordo com o momento do
câmbio”, diz Tilkian. “O projeto do Paraguai amplia essa flexibilidade.”
Para o empresário, a nova fábrica fortalece a retomada das
exportações, com foco inicial nos países do Mercosul. O governo
paraguaio cobra um imposto de 1% sobre o faturamento gerado nas vendas
de produtos para o exterior. Com a perspectiva de custos mais
competitivos, outra oportunidade é a fabricação de brinquedos mais
sofisticados e com melhores margens, que seriam inviáveis no modelo
atual da Estrela. Um primeiro teste nessa direção foi a montagem de 500
patinetes elétricos, batizados de Dareway. Vendido a R$ 1.999, o item é
uma novidade no portfólio da companhia, que conta com 550 itens.
Responsáveis por 70% do faturamento, os jogos, bonecas e linhas de massa
de modelar são os carros-chefe das ofertas, que incluem ainda, entre
outras categorias, bichos de pelúcia da Peppa Pig e de outros
personagens licenciados da Disney.
Para se adaptar às mudanças de hábito dos consumidores, a Estrela
também vem incorporando recursos digitais aos seus produtos
tradicionais. Jogos clássicos como Detetive e Banco Imobiliário já
contam, por exemplo, com o apoio de aplicativos. O radar inclui novos
produtos. Para o Natal, um dos principais lançamentos da marca será o
Selfmic. O brinquedo é um pau de selfie com microfone e um aplicativo de
karaokê, que dá a acesso a mais de 3 milhões de músicas e permite que a
criança compartilhe sua performance com amigos. O uso das redes sociais
para dialogar com o público é mais uma vertente da repaginação da
Estrela. Ela tem sido aplicada para inspirar o desenvolvimento de
produtos e para resgatar a força da marca, com o relançamento de
brinquedos que marcaram a infância de muitas pessoas. Nos últimos anos, a
emprea trouxe de volta ao mercado produtos como o Ferrorama e o Genius,
primeiro brinquedo eletrônico do Brasil. Em 2017, foi a vez do boneco
Falcon.
Nessa nova fase, apenas um fator tira o sono de Tilkian. Com R$ 355
milhões em tributos a pagar, a Estrela ainda espera a homologação da
Receita Federal para a sua adesão ao Refis da Copa. Excluindo esse
passivo fiscal, que contribuiu para o prejuízo de R$ 62,4 milhões em
2016, ele destaca o bom desempenho da companhia, que fechou o ano com
uma receita de R$ 141 milhões.
“Somos uma empresa com um Ebitda entre
18% e 25% nos últimos anos, o que para um negócio sazonal é bastante
saudável”, afirma o empresário, que, calejado com os maus momentos das
duas últimas décadas, faz uma projeção otimista. “Tenho certeza que
nossos próximos vinte anos serão muito mais fáceis.” Se depender da
determinação de Tilkian, o futuro da Estrela está garantido.
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