Maria Correia, 70, com José Arcas, 76, o namorado com quem ela divide a porção de pastel com Malzebier (foto: Kalinca Maki).
     
A funcionária pública aposentada Maria Ruiz Correia, 70, é mãe 
de três filhas e avó de duas netas – a mais jovem tem 19 anos e está 
prestes a iniciar a faculdade. “Sou uma vovó, mas não me sinto uma 
velhinha”, diz ela. E não é para se sentir mesmo. Maria considera que 
começou a curtir a vida para valer após os 50, quando terminou um 
casamento de quase 20 anos e se aposentou. “Queria viver intensamente”, 
afirma. Ela mudou de casa e começou a cursar faculdade da terceira 
idade, onde participou de palestras sobre saúde da mulher e sexualidade.
 Também realizou um antigo desejo: fazer aulas de canto. Nos últimos 
anos Maria fez cursos de fotografia, informática, jardinagem e 
paisagismo. Pelo menos uma fez por ano, faz uma viagem internacional. Já
 foi a Portugal, França, Itália e Espanha.
“Viajo sozinha e gosto de fazer meus próprios passeios, não dependo de ninguém”
 
Três vezes por semana, Maria faz musculação e alongamento em uma 
academia, “ótimas atividades para enrijecer os braços”. Aos finais de 
semana, se diverte com amigos em bares da Vila Mariana, bairro da zona 
sul paulistana onde mora. Há cinco meses, passou a dividir o prato 
predileto – porção de pastel com cerveja Malzbier – com o novo namorado,
 o aposentado José Arcas, de 76 anos. “Ele é muito romântico e sempre me
 surpreende com flores e carinhos”, diz ela.
Maria conversou com o Draft durante o 
Lab+60,
 um encontro que reuniu cerca de 500 pessoas para colocar em evidência a
 nova dinâmica social de quem tem mais de 60 anos. Organizado pela 
agência de marketing digital Garage e pela consultoria corporativa Via 
Gutenberg, teve patrocínio do Grupo Segurador Banco do Brasil, Mapfre e 
Plenitud, a marca de fraldas geriátricas da Kimberly Clark.
 

Selfie
 dos participantes do Lab 60+ (da esq. para a dir.) Maria Correia, 
Raimundo Moura, José Arcas e Renilda Moura (foto: divulgação).
 
Mulheres com blusas estampadas e homens de bermuda e camiseta eram 
figuras comuns no evento, que teve palestras sobre saúde, atividade 
física, programas culturais e consumo. Depois das apresentações, um 
grupo musical embalou o público com uma música que lembrava forró 
nordestino. Ninguém ficou parado. Foi também a hora de fazerem selfies e
 mostrarem intimidade com smartphones, apesar da idade. Mas, que idade? 
Terceira? Melhor? Idade de gente que continua trabalhando, se divertindo
 e tem agenda cheia. A faixa etária dos 60+ não é mais sinônimo de gente
 frágil que necessita de cuidados em tempo integral. A lógica é outra.
EM ÚLTIMA INSTÂNCIA, ESTAREMOS TODOS VIVOS
Aumento da renda, maior acesso à saúde, novos tratamento médicos e 
hábitos de vida saudáveis têm feito os brasileiros viverem mais e 
melhor. Há pouco o 
IBGE
 divulgou que a expectativa de vida no Brasil é de 74,9 anos – um 
aumento de 12,4 anos em comparação à média em 1980. Hoje, o país tem 
20,6 milhões de pessoas com mais de 60 anos (quando o IBGE considera 
alguém idoso), o que representa 10,8% do total da população. Em 2060, 
serão 58,4 milhões de idosos – cerca de um quarto da população 
brasileira.
 

Roni
 Ribeiro e Benjamin Rosenthal, da Gagarin, que pesquisa o público maduro
 para empresas desenvolverem e melhorarem seus produtos (foto: Kalinca Maki).
 
Um estudo da consultoria paulista de geomarketing Escopo apontou que o
 consumo entre as pessoas com mais de 50 anos foi de quase 1 trilhão de 
reais em 2013. Desse montante, 135 bilhões de reais foram gastos em 
alimentos e bebidas, 64 bilhões em carros, 49 bilhões em artigos de 
vestuário, 24 bilhões em produtos de higiene e beleza. Ao todo, essa 
fatia foi responsável por 34% do consumo total da população, e esse 
número deve crescer para 44% em 2018.
Não é o caso de esperar. Hoje, os mais velhos já são um público 
consumidor relevante. Conversamos com alguns empreendedores que estão 
aproveitando esse mercado e criando novos negócios em torno dele.
Roni Ribeiro, 39, e Benjamin Rosenthal, 43, passam o dia conversando 
com pessoas maduras. Não que eles sejam psicólogos ou médicos geriatras –
 embora também acumulem conhecimento nessas áreas. São empreendedores e o
 motivo de tanto bate papo é conhecer seus hábitos sociais e de consumo 
para ajudar grandes empresas a desenvolverem ou aprimorarem produtos e 
serviços para os consumidores mais experientes. Eles são fundadores da 
Gagarin,
 empresa focada em pesquisa de mercado com pessoas acima de 45 anos e 
que tem como clientes empresas farmacêuticas, de cosméticos, planos de 
saúde e do mercado financeiro. Roni conta mais:
 
“Hoje é comum ver pessoas com 60 anos que trabalham, têm 
vida social ativa e estão no ápice de seu poder econômico. As empresas 
estão começando a entender isso”
 
Os dois sócios acreditam, por exemplo, que em breve o mercado de 
educação terá mais espaço para este público. Pessoas perto dos 60 anos 
estão iniciando novas carreiras em áreas que lhe dão prazer, como um 
engenheiro que começa a estudar filosofia. Por outro lado, também é 
comum profissionais experientes deixarem o mercado corporativo para 
empreender. “As universidades terão que olhar esse público com mais 
atenção”, acredita Rosenthal.
As pesquisas da Gagarin costumam durar de dois a oito meses, o tempo 
depende do objetivo do cliente: reformular uma embalagem para que seja 
mais aderente à mão do idoso ou criar um novo serviço de private bank, 
por exemplo. Para obter informações, a empresa faz entrevistas 
presenciais (conforme as respostas ficam homogêneas, as informações 
passam a ser validadas) e conversa com especialistas como médicos 
geriatras e pesquisadores em antropologia e etnografia.
Ao entregar os resultados aos clientes, Roni e Benjamin costumam 
esclarecer alguns mitos sobre a terceira idade. Por exemplo, a solidão. É
 comum achar que os mais velhos se sintam sós e, nesse caso, cuidar dos 
netos seria uma ocupação gratificante. “Não é bem por aí”, diz 
Rosenthal.
“Eles querem curtir os netos, mas sem a obrigação de serem responsáveis pela educação”
 
Na verdade, prossegue ele, muitos idosos querem ter sua própria 
agenda e não gostam de depender de ninguém – e nem que alguém dependa 
deles. Por outro lado, os mais velhos de fato se preocupam em deixar uma
 herança para os familiares. Além disso, pensam em qual será o legado 
após a morte e, por isso, muitos transferem recursos a entidades ligadas
 a causas sociais e empreendedoras. “É uma forma de se manterem vivos 
por meio de seus ideais”, acredita Rosenthal.
SMARTPHONE PARA TODOS
O 
Instituto de Artes Interativas,
 também conhecido como iai?, é uma escola de cursos livres focada em 
tecnologias móveis. Fundado em 2009 pelo engenheiro paulista Lucas 
Longo, 40, oferece cursos de programação, design e segurança de dados 
com ênfase em smartphones e tablets. Em 2011, Lucas percebeu que alguns 
clientes mais velhos procuravam o instituto para aprender funções mais 
básicas dos aparelhos.
 

Lucas
 Longo, do Instituto de Artes Interativas, abriu cursos rápidos 
específicos para ensinar os mais velhos a usarem smartphones iOS e 
Android (foto: Kalinca Maki).
 
Muitos ganhavam os dispositivos de filhos ou netos e as dúvidas iam 
desde como tirar fotos e acessar a internet até como criar arquivos de 
planilhas. “Os próprios familiares poderiam ensinar”, diz Lucas. “Mas 
faltava paciência, pois o que é intuitivo para um jovem pode não ser 
para uma pessoa com mais de 50 anos.” Foi aí que o empreendedor enxergou
 uma oportunidade de negócio e criou os cursos “iPhone para todos” e 
“Android para todos”, para quem tem mais de meio século de vida.
Em média, o valor do curso é de 1.200 reais e as aulas são 
particulares, com duração de quatro horas, em duas sessões. Na primeira 
etapa, o professor ensina conceitos, como o funcionamento dos serviços 
em nuvem. Depois, é hora de aprender na prática a configurar e-mail, 
conversar por chat, tirar fotos e acessar redes sociais. “Uma dúvida bem
 comum é o que fazer caso esqueça a senha do e-mail”, diz Lucas.
Em 2014, os clientes acima de 50 anos representarão 5% do faturamento
 da empresa, estimado em 3 milhões de reais. Lucas acredita que essa 
participação vá crescer, acompanhando a popularização dos smartphones. 
Segundo a consultoria de tecnologia de informação 
IDC,
 em 2013 foram vendidos 35,6 milhões de smartphones no Brasil, colocando
 o em quarto lugar no ranking mundial. Nos EUA, segundo levantamento da 
consultoria Forrester Research, os gastos de pessoas entre 50 a 64 anos 
representaram 40% do mercado de produtos tecnológicos.
 
Nos últimos anos, algumas empresas desenvolveram aplicativos exclusivos para idosos, como o 
Pillboxie, que lembra a hora de tomar remédios. E há novidades a caminho, como a rede social 
Stitch,
 que visa conectar pessoas com mais de 50 anos para amizades ou 
relacionamentos amorosos. O site ainda está em fase de testes, 
disponível apenas para cidades dos EUA e da Austrália.
 
CURAR PARA FORTALECER, FORTALECER PARA CURAR
O médico ortopedista Benjamin Apter, que não revela a idade, pratica 
esportes desde a infância. Hoje, seus preferidos são surf e skate. Com 
1,70m de altura e 68 quilos, exibe uma condição física invejável a 
muitos jovens. Benjamin tem um grande estímulo para manter a forma: é 
fundador da 
B-Active, a
 rede paulistana de academias terapêuticas que oferece musculação, 
pilates e fisioterapia para o público maduro. “Cerca de 80% dos nossos 
clientes tem mais de 60 anos”, diz.
 
O B-Active tem o conceito de ser um ambiente mais “médico” do que 
“fitness”: 80% dos 50 professores são fisioterapeutas que acompanham os 
alunos em atividades para tratar lesões musculares e nas articulações. 
“Mas a questão estética também entra em cena, pois muitos clientes 
querem ter um corpo mais magro e saudável.”

Benjamin Apter, o médico ortopedista que fundou uma academia terapêutica para o público acima dos 60.
 
Benjamim decidiu criar a academia quando atendia idosos e atletas em 
uma clínica de ortopedia. Ele recomendava aos pacientes exercícios de 
musculação no pós-operatório mas, poucos meses após a alta, eles 
voltavam ao consultório com as mesmas queixas de antes. Foi quando 
vislumbrou a oportunidade:
“Percebi que as academias convencionais não estavam 
preparadas para tratar lesões ortopédicas. Enxerguei um nicho de mercado
 promissor”
 
Na mesma época, Benjamin fez pós-graduação no departamento de 
geriatria da Universidade de São Paulo (USP) para conhecer melhor a 
fisiologia do idoso. Também fez MBA em economia e marketing, para 
aprender a gerir uma empresa. Era o início da B-Active, fundada em 2004 
com outros dois sócios, os médicos Ari Radu Halpern e Nelson Wolosker.
Os aparelhos da B-Active foram fabricados quase artesanalmente. Os 
sócios buscaram projetos de equipamentos já testados por grupos médicos 
em centros de pesquisa de universidades de diversos países. Depois, 
terceirizavam a fabricação aqui no Brasil. “Começamos com seis 
equipamentos, hoje temos 60”, conta Benjamin.
As mensalidades variam de acordo com a frequência do aluno, que 
precisa marcar as aulas com antecedência. O pacote com duas aulas 
semanais sai por cerca de 350 reais ao mês. A empresa também oferece 
serviços avulsos, como um programa de massagens para reduzir gordura 
visceral e localizada. Este ano, a B-Active deve faturar cerca de 6 
milhões de reais – um crescimento de 10 %.
No ano passado, a B-Active iniciou a expansão por franquias. Além das
 unidades próprias, localizadas em Higienópolis e Perdizes, abriu 
franquias no Ibirapuera, em Moema e no Jardim Anália Franco. Em março de
 2015, será a vez de inaugurar uma unidade em Campinas. “O próximo passo
 será chegar a outras capitais brasileiras”, conta Benjamin. Ou seja, 
mais “velhinhos” saudáveis e fortes estão por vir. Seu negócio está 
preparado para recebê-los?