O que até recentemente reduzia a capacidade de setores mais atrasados tecnologicamente de competir pode tornar-se mortal no futuro próximo.
Mais da metade dos setores industriais está tão atrasada com relação à
adoção de tecnologias digitais – responsáveis por um enorme salto de
produtividade e competitividade do setor manufatureiro no resto do mundo
– que, se nada fizer para mudar o quadro com presteza, acabará excluída
da que vem sendo chamada de quarta revolução industrial. Perderá não
apenas o mercado internacional, que sempre lhe foi difícil de conquistar
e manter, mas até o doméstico. Sua sobrevivência está condicionada à
sua capacidade de ganhar competitividade, por meio de inovação e novas
tecnologias, o que exige investimentos e capacidade gerencial.
Este é o quadro sobre o estado de boa parte da indústria brasileira
traçado pela própria entidade representativa do setor, a Confederação
Nacional da Indústria (CNI), em seu mais recente documento sobre o
tema, Oportunidades para Indústria 4.0: aspectos da demanda e oferta no Brasil, cujas principais conclusões foram mostradas em reportagem do Estado.
O que vem sendo chamado de Indústria 4.0 é o emprego do conjunto de
recursos propiciados por tecnologias de robótica, inteligência
artificial e outros, que vem possibilitando grandes ganhos de
produtividade e de competitividade em todo o mundo.
Os setores mais atrasados tecnologicamente precisam com urgência de
investimentos, “pois não terão competitividade principalmente em relação
aos países que competem diretamente com o Brasil”, adverte o gerente
executivo de Política Industrial da CNI, João Emílio Gonçalves. São
setores que tradicionalmente apresentam baixos índices de inovação,
exportam pouco e têm, em média, produtividade inferior à média mundial.
O que até recentemente lhes reduzia a capacidade de competir pode
tornar-se mortal no futuro próximo. E esse futuro chegará depressa. “A
mudança tecnológica é grande e vai ocorrer muito mais rápido do que
outras revoluções”, observa Gonçalves. Há setores da indústria
brasileira bastante avançados em termos de competitividade em escala
mundial – como a indústria extrativista, de alimentos e bebidas e de
celulose e papel –, mas também esses precisam manter-se atentos à
evolução da concorrência externa.
Houve tempos em que, diante de desafios como os atuais, a indústria
correu para os gabinetes ministeriais em troca de medidas de apoio, em
geral baseadas em incentivos fiscais, créditos subsidiados e
sobretaxação de similares importados. Muitas vezes foi atendida. Mas, do
ponto de vista das políticas públicas, também para a indústria os
tempos mudaram.
A crise fiscal, o acatamento pela Organização Mundial do Comércio
(OMC) de queixas de competidores externos contra medidas protecionistas
tomadas pelo Brasil e, agora, a nova revolução industrial trazem
desafios que exigem respostas rápidas. Não se trata mais de discutir
incentivos fiscais, benefícios adicionais para este ou aquele setor. É,
como adverte a CNI, uma questão nova que afeta toda a indústria
nacional, que exige medidas inovadoras. Assegurar a competitividade da
indústria é essencial para o crescimento da economia.
Há, decerto, setores acostumados à generosa proteção do Estado
brasileiro que continuam a demandar a manutenção dos benefícios de que
gozaram até o passado recente – em alguns casos, até o ano passado. É o
caso da indústria automobilística, que foi beneficiada pelo programa
Inovar-Auto (condenado em vários pontos pela OMC) e aguarda o novo
programa de incentivos, chamado Rota 2030.
Dirigentes internacionais de montadoras instaladas no Brasil chegaram
a ameaçar com o fechamento de suas unidades no País caso o novo
programa não seja aprovado. Há resistência dentro do governo ao
programa, que prevê incentivos na forma de créditos fiscais para
empresas que comprovem a intenção de investir em pesquisa e
desenvolvimento no País.
Políticas creditícias e tributárias que sejam benéficas para todos – e
não para alguns segmentos escolhidos pelo governo – e um efetivo
programa de educação, capacitação e formação profissional de jovens
seriam muito mais úteis para o País (O Estado de S.Paulo, 14/2/18)
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