Eles têm pouca idade e experiência, mas estão antenados às demandas de um consumidor que busca mais do que a escritura de um imóvel. Saiba quem são os herdeiros e os novatos que estão reinventando o mercado imobiliário
Quem olha pela primeira vez para o paulistano Alexandre Lafer
Frankel dificilmente o identifica como um empresário bem-sucedido da
construção civil, um setor dominado por homens de cabelos brancos, terno
e gravata. Mas as aparências enganam. Dono da incorporadora Vitacon,
sempre usando roupa ao estilo esporte-fino, com camisa polo, calças
jeans e sapatênis, Frankel incorpora um novo estilo de gestão no mercado
imobiliário. Ele aposentou o carro há 12 anos. Prefere bicicleta,
aplicativos como Uber e Cabify ou até a velha carona. “Não consigo mais
me imaginar tendo um carro próprio”, afirmou o empresário à DINHEIRO, na
sede da empresa, em São Paulo. “Isso me traz paz de espírito.”
Esse modo de vida está diretamente relacionado ao seu negócio. Aos 40
anos, ele simboliza uma geração que está mudando a cara do mercado
imobiliário, trazendo conceitos novos e buscando corresponder às
demandas dos consumidores das grandes cidades brasileiras. Com
apenas oito anos de existência, a empresa caminha para ser a terceira
maior construtora da capital paulista neste ano, atrás apenas de
gigantes como Cyrela e MRV. Entre janeiro e outubro deste ano, a
Vitacon lançou empreendimentos no valor geral de vendas de R$ 525
milhões, e pretende atingir R$ 700 milhões, até dezembro. Já entregou 45
prédios e tem 11 em desenvolvimento.
Tome o exemplo de um empreendimento da incorporadora Vitacon na rua
Capote Valente, próximo da avenida Rebouças, no bairro de Pinheiros, em
São Paulo. Nos 31 dias de outubro, as 400 unidades do projeto foram
vendidas, com previsão de entrega para 2019. “Alguns interessados me
procuraram para saber se tinha alguma forma de comprar, mas não sobrou
nada”, disse Frankel. Mas quem observa o perfil do lançamento com uma
visão tradicional do mercado não entenderá como uma empresa iniciante
pode estar desbancando gigantes com décadas de atuação e com ações
negociadas na bolsa de valores. Os menores apartamentos do projeto
possuem 32 m² de área. O conceito é trocar espaço interno dos
apartamentos por serviços nas áreas comuns dos prédios.
No empreendimento em Pinheiros, que é uma nova referência para a
empresa, há espaço para coworking, carro compartilhado, lounge, cozinha
comunitária e até uma horta urbana. Na cobertura, ao lado da piscina ao
ar livre, uma arquibancada permite aos moradores observarem a cidade de
cima. Com tudo isso, a falta de espaço interno é compensada por serviços
compartilhados. De fato, o custo por espaço nas unidades da empresa
costuma ficar acima da média de cada região, e nos bairros mais nobres
supera os R$ 10 mil por metro quadrado. A última inovação da empresa são
os apartamentos de 10 m², que serão vendidos por R$ 99 mil, em um
prédio no bairro de Santa Cecília, no Centro de São Paulo. “Isso só foi
possível por causa da evolução da tecnologia de compactação”, diz
Frankel.
Cada centímetro conta. Há sofá-cama, uma parede com espelho que vira
mesa e um degrau que serve para guardar tênis. Definitivamente, não é
para tem um espaço privado entre as suas prioridades para viver bem. A
filosofia desses projetos é baseada no fato de que as pessoas estão mais
preocupadas em morar próximas do trabalho, de estações de metrô e em
regiões mais nobres da cidade do que em ter uma sala de estar grande.
“Somos contra os prédios beges, padronizados. Na cidade inteira, todos
parecem iguais”, afirma Frankel. “Não vendemos tijolos, mas tempo de
vida. Fundei a Vitacon pensando não só em soluções de moradia, mas para
resolver problemas de trânsito.”
O empresário da Vitacon tem se destacado dessa nova geração de
empreendedores pelo porte que a sua empresa atingiu em tão pouco tempo.
Mas ele está longe de ser o único. Os representantes desa nova onda
trazem uma nova visão para o mercado, em comparação com os construtores
mais conhecidos, controladores de empresas com décadas de atuação, como
MRV, Cyrela, Rossi Residencial, Tecnisa, Gafisa, Eztec e Helbor, entre
as que possuem ações negociadas na B3. Um dos sobrenomes destacados
dessa nova leva de empreendedores demonstra uma clara mudança
geracional. A Huma Desenvolvimento Imobiliário foi fundada em 2011 por
Rafael Rossi, hoje com 37 anos, um dos trigêmeos de João Rossi, fundador
da Rossi Residencial.
O conceito dos seus projetos também privilegia a boa localização em
detrimento dos grandes espaços. O objetivo da empresa é focar nas
unidades entre 45 m² e 65 m² de área construída, com um cuidado com a
sustentabilidade, bastante luz e ventilação natural, e uma boa
integração com a cidade. Uma das marcas de seus empreendimentos é o
recuo no andar térreo em relação à rua, para criar um jardim aberto. E
se destaca pelo cuidado arquitetônico, como no recente Huma Klabin, na
região da Chácara Klabin, em São Paulo. São duas torres interligadas por
um poço de elevador, com um jogo de vazios e concreto, num estilo que
lembra o brutalismo paulistano do consagrado arquiteto Paulo Mendes da
Rocha. Outras obras estão de andamento no bairro do Itaim. “Sem dúvida,
esses empreendimentos dão uma nova cara para toda a região.”
A nova geração de líderes da indústria da construção não se limita em
propor apartamentos nanicos e moderninhos no entorno de estações de
metrô. O curitibano Alfredo Gulin Neto, hoje com 30 anos, assumiu em
2015 o comando da AG7, construtora fundada pelo pai, Alfredo Gulin
Filho, com a proposta de sofisticar seus projetos, em vez de
simplificar. É sob seu comando que está sendo construído o edifício mais
luxuoso da capital paranaense, batizado de Ícaro, que ficará pronto em
fevereiro de 2019 com apartamentos de R$ 12 milhões. “Antigamente, na
época em que meu pai fez dinheiro no mercado da construção, o negócio
era empilhar tijolo e vender apartamentos, sem dar muita atenção aos
detalhes”, afirma Gulin Neto. “Hoje, esse modelo não funciona mais. O
que dá certo é criar uma marca, lapidar a reputação, entregar um
propósito para o projeto”, acrescenta o empresário, que fechará o ano
com R$ 70 milhões em faturamento. Neste ano, ele entregou o edifício
Mandala, vencedor do 20º Prêmio Master Imobiliário, uma espécie de Oscar
do setor, pela inovação de seu projeto e arquitetura. Para 2018, a AG7
projeta superar a marca de R$ 100 milhões em receita.
A consolidação dos jovens empreendedores na construção civil começou a
ocorrer de forma mais intensa com a ascensão ao mercado de consumo dos
novos clientes, pertencentes às chamadas Geração Y e Millenials,
nascidos após a década de 1980. Tanto é que Gulin Neto diz ter sofrido
uma certa resistência de seu pai em algumas de suas ideias. “Como meu
pai apanhou mais com as crises brasileiras nas últimas décadas, é mais
avesso ao risco, naturalmente”, reconhece. Mas ele acabou convencendo.
Para projetar o Ícaro, contratou o renomado arquiteto Arthur Casas e
ajudou a definir algumas características inéditas no mercado imobiliário
local, como sacadas e janelas monumentais. “A maior sofisticação de
nossos projetos gerou um aumento significativo do valor do metro
quadrado, que passou de R$ 11 mil, em média, para algo entre R$ 15 mil e
R$ 16 mil, atualmente. São fatores que se tornam determinantes no
sucesso do empreendimento.”
MENOS É MAIS
Há, de fato, uma série de fatores que
impulsiona o sucesso dos empreendimentos dessa nova geração. Um delas é o
alto preço dos terrenos em cidades grandes, como São Paulo, que
tornaram os apartamentos espaçosos um luxo para poucos. Nesse cenário,
as pessoas parecem mais interessadas em pagar por outros benefícios. Uma
pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha, em agosto deste ano,
apontou que oito em cada dez moradores da capital paulista preferem
abrir mão de viver num imóvel espaçoso para estar numa boa localização.
Em 2008, apenas 22% das unidades residenciais possuíam menos de 50 m² de
área.
Neste ano, já representam 51% dos lançamentos, segundo a Empresa
Brasileira de Estudos de Patrimônio (Embraesp). Com isso, a área média
útil caiu de 45,3 m², em 2008, para 35,1 m², neste ano. Quando empresas
como Vitacon e Huma começaram a atuar, o foco estava nos jovens
executivos, solteiros. Mas agora percebem uma mudança geral do
público.“Nos diziam que éramos uma empresa de nicho”, afirma
Frankel.“Agora, como estamos entre as maiores em lançamentos, não dá
mais para dizer isso. O nosso conceito é o novo padrão.” A média etária
do cliente da Vitacon tem 38 anos, segundo a empresa. Metade dos
compradores são solteiros e o restante são pequenas famílias. O núcleo
familiar está mudando, diz. Há, por exemplo, casas com filhos rotativos,
que alternam o tempo com o pai e com a mãe.
O problema desses desejos é que mudam de acordo com o tempo.
As pessoas trocam de trabalho com mais rapidez, aumentam e diminuem o
tamanho de suas famílias. Com isso, o tão famoso sonho da casa
própria, um desejo comum a quase todo brasileiro, vai dando lugar à
vontade de viver bem, nem que for por aluguel. Por isso, a revolução dos
empreendedores não está apenas nas incorporadoras. Uma companhia, como a
startup QuintoAndar, está fazendo sucesso ao facilitar a locação por
parte das pessoas. “Não faz mais sentido as pessoas ficarem décadas
pagando um apartamento, com as taxas de juros tão altas, e depois
precisarem trocar de moradia, quando mudar de emprego”, diz o mineiro
Gabriel Braga, CEO e confundador do QuintoAndar. A empresa surgiu de uma
ideia do empresário de 35 anos e o seu colega da Universidade Stanford,
na Califórnia, o conterrâneo André Penha, de 37 anos.
Ambos sofreram com as dificuldades de alugar um apartamento quando
mudaram de suas cidades, e agora querem facilitar para pessoas de perfil
parecido. A ideia é controlar toda a cadeia do aluguel. O proprietário
anuncia o seu imóvel no QuintoAndar, obedecendo a padrões de informações
detalhadas e fotos produzidas por profissional contratado pela empresa.
Por sua vez, o inquilino aluga sem precisar de fiador. O QuintoAndar
garante o pagamento dos aluguéis, mediante a comprovação de renda. Uma
apólice de seguro-fiança da BNP Paribas garante o pagamento por até 30
meses. Todo o processo é realizado pela internet e requer apenas a
assinatura digital dos envolvidos, sem a necessidade de idas ao
cartório.
A startup ganha dinheiro como uma imobiliária, cobrando um percentual
de 8% do valor da locação. “O proprietário ganha porque consegue alugar
mais rápido e tem uma renda de 6% a 20% maior com isso”, diz Braga.
“Ganhamos dinheiro por resolver um problema real das pessoas.” O modelo
já atraiu R$ 70 milhões de investidores, quase todos eles com passagens
pela Stanford, a grande formadora de talentos do Vale do Silício. Esse
valor deve ajudar a empresa, que atua nas regiões de São Paulo e
Campinas, a ampliar a sua abrangência e, além disso, se manter na ponta
das inovações. A nova geração tem agora esse desafio, de continuar
antecipando tendências e criar inovações. Até que as próximas invenções
no estilo de morar mudem de novo o mercado.
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