Para Zeina Latif, flexibilização na política
monetária iniciará logo
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Por Zeina Latif*
Pelos
sinais emitidos pelo Banco Central, está chegando a hora de iniciar uma
flexibilização na política monetária. O Copom não precisa esperar a inflação
chegar mais perto da meta para dar início ao corte de juros. Fosse um BC sem
reputação, talvez fosse necessário aguardar, afinal a inflação está próxima de
9%, acima do teto de 6,5%. Não é o caso. As expectativas inflacionárias dos
analistas e as embutidas nos preços de ativos reduziram de forma satisfatória,
indicando a confiança no compromisso e na capacidade do BC de entregar inflação
na meta.
Quanto à
capacidade de entrega, o que se discute não é a qualificação técnica dos
membros do Copom (foto), que é inquestionável, mas a possibilidade real de
estar em curso uma mudança do regime fiscal que aumente o poder da política
monetária. No quadro anterior, havia o temor de uma espiral inflacionária de
origem fiscal que o BC não conseguiria evitar. Isso mudou.
Sabemos
que a política monetária tem baixa eficácia no Brasil – exigindo taxas de juros
elevadas – em função de fatores como a alta segmentação do mercado de crédito
(metade tem taxas subsidiadas, o que compromete o canal de crédito da política
monetária) e a indexação formal e informal ainda presente na economia. Um
exemplo desse último ponto é o mercado de trabalho. Mesmo com taxas de
desemprego recordes, os salários dos segmentos sindicalizados não recuam em
termos reais. Além de ser ruim para a inflação, é algo que aumenta o
desemprego.
Além
disso, a estrutura produtiva fragilizada pelo chamado custo-Brasil significa
uma oferta agregada menos flexível, o que torna a economia mais vulnerável a
choques inflacionários. A legislação causa tamanho custo trabalhista na
comparação mundial e insegurança jurídica que, diante de um aumento de demanda,
o empresário, por exemplo, pode preferir elevar seus preços a contratar mais
mão de obra e aumentar a oferta de bens e serviços.
Apesar de
todas essas questões, que parecem tornar os cortes de juros sempre arriscados,
há possivelmente um espaço para isso agora. A taxa real de juros (descontada a
expectativa inflacionária) está subindo, em função da queda das expectativas
inflacionárias, enquanto o quadro econômico é ainda muito grave: o crédito
secou e não há sinais de retomada; a saúde financeira das empresas é
preocupante, o que significa risco não desprezível de quebra; e o desemprego
poderá subir bastante, pois muitas companhias ainda estão cortando custos e
ajustando o quadro de empregados.
Não estão
descartadas novas leituras negativas do PIB trimestral. O ciclo de ajuste do
setor real não está completo e há o efeito da política monetária restritiva
ainda se materializando, enquanto a economia mundial desacelera, influenciado a
dinâmica econômica do país. Pode até ser que ocorra um aumento marginal do
investimento, uma vez que houve queda muito expressiva e algumas empresas
buscam compensar a depreciação de suas máquinas e equipamentos. Ciclo de
investimento já é outra conversa. Não há espaço para isso.
Se o
fundo do poço pode não ser sólido o suficiente, o que dirá a volta do
crescimento. O BC esperar um pouco mais para cortar os juros, de forma a
acelerar a convergência da inflação à meta, talvez não seja a decisão mais
sábia no momento. Seria prudente o BC considerar o todo (equilíbrio
geral, no jargão dos economistas), e não apenas a parte que lhe cabe
(equilíbrio parcial), pois o primeiro afeta o segundo. Um quadro econômico mais
frágil do que o esperado pode significar perda de confiança dos agentes
econômicos, um ambiente político difícil e mais destruição de crescimento
potencial, com encolhimento da oferta. Com tudo isso, o poder da política
monetária de controlar a inflação seria afetado, apesar de todas as boas
intenções.
A agenda
fiscal não parece um constrangimento ao BC no momento. Passado o impeachment, o
governo se volta novamente para a agenda econômica. Procuram aumentar o diálogo
com o Congresso e com a sociedade e parecem mais atentos a eventos que possam
atrapalhar a credibilidade. Parecem ter aprendido a lição com os desdobramentos
do ajuste do funcionalismo e o acordo frouxo da dívida dos Estados. Quem ficou
de fora, agora reclama. Pensando os próximos meses, é possível afirmar que é
mais garantida a aprovação de reformas fiscais do que a retomada efetiva da
economia.
O início
do ciclo de corte de juros, em condições adequadas, poderá ter efeito simbólico
importante, além do impacto usual na economia que contribui para a volta
cíclica do crescimento. Seria o selo de qualidade do BC para política econômica
e um sinal de que a agenda fiscal está bem encaminhada.
Um Banco Central que
aguarda a aprovação de reformas para iniciar a flexibilização monetária pode acabar
alimentando o ceticismo dos agentes econômicos. Ora, se nem a autoridade
monetária confia no ajuste fiscal, por qual razão os agentes econômicos o
fariam?
O
movimento do BC poderá ser importante sinal para investidores estrangeiros
voltarem a olhar as oportunidades no Brasil, para o mercado de crédito iniciar
sua normalização e para empresários repensarem planos de demissão, produção e
investimento. Um impulso extra para a volta da confiança, ingrediente essencial
para a retomada da atividade econômica. Claro que isso só é válido porque é um
BC com credibilidade.
*Economista-chefe
da XP Investimentos.
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