A paciência, que já não era de Jó, se extenuou. Não dá mais
para evitar o assunto: a informação jurídica dos jornais tem sido
imprecisa e indutora de equívocos. E nós com isso? Vou tentar explicar.
Falta de conhecimento não é motivo de vergonha, nem de crítica.
Ignorância é uma coisa boa, ter dúvida é excelente. Mas, a partir do
momento em que a formação de opinião está em jogo, o discurso
tecnicamente impreciso pode se tornar um problema grande. Os
jornais estão aí para, entre outras coisas, dar elementos aos leitores,
para que eles possam pensar e formar a sua própria opinião.
Colunistas e jornalistas criam seus textos para tentar direcionar este
processo. Não se pode querer acreditar que um jornal seja neutro. Dá
para sentir direcionamento em maior ou menor intensidade.
Direcionar faz parte do discurso humano. Os jornais estão presos a
diversas correntes, às vezes políticas, às vezes financeiras, às vezes
puramente egoísticas. Acabam direcionando. OK, isso será eternamente
negado. Mas que direcionam, direcionam. Para perceber isso, basta
escolher o seu colunista preferido e – atenção, o passo seguinte pode
estragar a sua adoração – procurar a sua biografia no Google. Você entenderá um pouco melhor o porquê de ele escrever o que escreve.
O problema central do tema deste post não é o direcionamento
dos jornais. Colocado este assunto à parte, a questão aqui é: a
informação técnica errada. Mais precisamente, a informação jurídica
imprecisa, que provavelmente se origina de um desconhecimento jurídico. E veja: para eu escrever sobre isso aqui, é porque a coisa está grave. Que
os redatores, jornalistas e colunistas não se sintam ofendidos se eu
disser que os erros são falta de preparo e de conhecimento. Pior seria
se os equívocos fosse propositais, não é?
O fato a dar atenção é que uma informação jurídica precisa
é uma questão de responsabilidade para com a função de informar, de
opinar e de ajudar na formação da opinião dos leitores. Uma questão
fundamental, aliás. Do contrário, o leitor vai ler um monte de fantasias
sobre o direito, e não o direito como ele é. Além de tudo, muita gente
pode acabar pautando o seu comportamento com base no que pensa ser
lícito, por ter lido nos jornais textos cheios de erros técnicos, sem
nem passar pela sua cabeça a possibilidade de estar sendo mal orientado.
Por exemplo, o leitor “leigo” pode sair de uma leitura de jornal
achando que a polícia é proibida de usar a força, que uma licitação pode
ter apenas um “concorrente” e uma propriedade privada pode ser invadida
por gente que não tem onde morar, sem a menor possibilidade de
reintegração de posse. Pode achar que arquiteto é advogado, e que
advogado é juiz, e que juiz é médico, e que médico é… Enfim. Você
entendeu.
Não sou adepto do “título”. O único título que vale realmente muito,
para mim, é o de eleitor. Então, não se trata de dizer quem pode falar o
quê. Fora das especificações profissionais como, por exemplo, o
advogado peticionar em juízo e o médico dar diagnóstico, penso que seja
bom um grau de interdisciplinaridade na vida. Mas, por favor: que seja
dada a informação correta.
Gustavo D’Andrea é advogado, mestre em Ciências (Psicologia) pela FFCLRP-USP e doutorando em Ciências (Enfermagem Psiquiátrica) pela EERP-USP. Mantém o blog Forense Contemporâneo desde 2005 e criou a Forensepédia.