Em sua palestra no seminário "A nova Lei
Anticorrupção e seus impactos nas empresas" realizado em São Paulo no
dia 25 de Agosto de 2014 pelo jornal Valor Econômico, o ministro-chefe
da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, afirmou que a
regulamentação da Lei 12.846 – conhecida como Lei Anticorrupção – está
pronta e foi enviada à Casa Civil, faltando apenas a sua promulgação
pela Presidente da República.
Disse o Ministro Hage que a
regulamentação visará principalmente a determinar quais os principais
elementos que deverão ser atendidos pelos programas de compliance das
empresas, e que vai seguir padrões internacionais – que, imaginamos,
sejam basicamente aqueles do “US Sentencing Guidelines” dos Estados
Unidos. Afirmou também que a Lei Anticorrupção é autoaplicável, não
sendo necessária a regulamentação para imposição das penalidades
previstas. Comentou o Controlador Federal que a ausência de aplicação
da Lei se deve ao fato de não haver surgido nenhum caso concreto até o
momento: "Esperamos que continue assim, que não tenhamos que aplicar
nenhuma dessas penas. Espero que a lei cumpra seu papel e desconfio que
já esteja cumprindo pelo número de eventos realizados país afora para
discutir essa questão.[i]"
Em que pese a simpatia que temos pelo
otimismo demonstrado pelo Ministro – e também por profissionais do setor
privado presentes no evento, dizendo que “a lei já pegou” – temos que
ser mais realistas e conservadores. A corrupção no Brasil é endêmica,
arraigada na cultura popular e nos modos de fazer negócios e política em
nosso país. Compliance ainda é visto como matéria alienígena, trazida
ao país por empresas multinacionais, mas que serve apenas como nuvem de
fumaça para a manutenção do status quo. Soa ingênuo pensar que a publicação da Lei 12.846 encerrou a corrupção brasileira.
A mudança cultural[ii]
é um processo complexo, que deve partir de força transformadora. Embora
seja possível que a mudança surja da conscientização popular[iii],
confiar papel tão importante como reduzir drasticamente a corrupção no
Brasil à sociedade civil torna incerta a realização, que é tão
importante ao país. Mais efetiva é a mudança cultural partir da
liderança[iv]
de uma organização. Com a nova orientação partindo daqueles que detêm o
poder hierárquico, os recursos para implantação e a capacidade de
controle do cumprimento e de aplicação de penalidades em caso de
descumprimento, as chances de sucesso da mudança de paradigma é muito
mais provável.
A ausência de regulamentação por parte do
Poder Executivo, depois de mais 13 meses de vigência e 7 meses de
eficácia da Lei 12.846, é um péssimo sinal quanto ao interesse do
governo brasileiro pela redução da corrupção em nosso país. Comenta-se
oficiosamente que a CGU submeteu a minuta do decreto regulamentar
mencionada pelo Ministro Hage à Casa Civil em Janeiro de 2014, mas que o
mesmo somente seria assinado pela Presidente da República e publicado
no Diário Oficial da União após a conclusão das eleições federais.
O setor privado brasileiro tem feito um
belíssimo trabalho na divulgação da Lei Anticorrupção, com elogiável
envolvimento da imprensa, executivos, advogados, consultores e entidades
de treinamentos. Contudo, aqueles que são apegados à velha cultura –
proveniente da leitura epicurista do “jeitinho brasileiro” – têm na
ausência do ato do Poder Executivo a prova de que a Lei é feita “para
não pegar”[v]. A falta de real comprometimento do governo brasileiro com o combate à corrupção é uma ameaça ao progresso do Brasil.
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