Evento deve reunir entre 180.000 e 200.000 pessoas em uma área de 150.000 metros no centro de exposições São Paulo Expo
Para aqueles que não estão dispostos a passar o dia andando com roupas
pretas invocando a voz rouca de Darth Vader, ou com o corpo inteiro
pintado de verde para criar um Hulk não tão incrível assim, a Comic Con
Experience, que acontece a partir desta quinta-feira em São Paulo, pode parecer apenas uma estranha reunião de geeks com obsessões por quadrinhos e filmes
de ficção científica. Mas os quatro dias de evento têm se mostrado um
negócio cada dia mais promissor para a indústria do entretenimento no
país.
A Comic Con deve reunir entre 180.000 e 200.000 pessoas em
uma área de 150.000 metros no centro de exposições São Paulo Expo. Com
um público desse tamanho, a Comic Con é a oportunidade ideal para
estúdios, quadrinistas e marcas promoverem seus produtos. Este ano,
entre os 150 expositores da feira, estarão os famosos estúdios
americanos Warner, Disney, Sony e Universal, o canal HBO e o serviço de
streaming de vídeos Netflix. Para atrair o público, esses expositores
promovem palestras com a participação de atores como Natalie Dormer (Game of Thrones e Jogos Vorazes), Neil Patrick Harris (How I met your Mother), Vin Diesel (Triplo X e Velozes e Furiosos) e Milla Jovovich (Resident Evil).
O evento também conta com um espaço para os quadrinhos. No
espaço Artists’ Alley, mais de 460 artistas lançam e vendem suas HQs
durante os quatro dias. Nomes consagrados do mundo dos quadrinhos também
marcam presença com palestras e autógrafos. Entre eles estão o
americano Frank Miller (autor de Batman: O cavaleiro das Trevas), o escocês Frank Quitely (de HQs como Novos X-Men e Batman & Robin) e o americano Arthur Adams (co-criador de histórias com ícones como Batman, Superman, Homem-Aranha, X-Men, Hulk e Godzilla).
A Comic Con também atrai um público disposto a comprar
roupas e acessórios e produtos colecionáveis de super heróis. “No ano
passado tivemos um espaço de 50 metros quadrados no evento e ficamos
impressionados. Nunca tínhamos vendido tantas camisetas em um único dia.
Assim que o evento terminou, já fechamos o contrato para participar
este ano”, diz Filipe Rossetti da fabricante de camisetas Piticas.
Inspirado na tradicional Comic Con de San Diego, na
Califórnia, o evento no Brasil em sua terceira edição já está entre os
três maiores do mundo – juntamente com San Diego e Nova York. O sucesso
brasileiro, os organizadores do evento, está no fato deles serem geeks
assumidos que há anos frequentam Comic Cons organizadas no exterior.
“Os eventos que existiam no Brasil até então eram nichados, ou sobre
quadrinhos ou sobre filmes. A gente viu que dava pra unir consumo e
público”, diz Ivan Costa, um dos sócios do evento brasileiro.
Os sete sócios do evento do Brasil vêm de três companhias: o
site de cultura pop Omelete, a agência de quadrinistas Chiaroscuro
Studios (da qual Costa faz parte) e a distribuidora de produtos
colecionáveis PiziiToys. “Nós criamos a Comic Con que nós gostaríamos de
participar”, diz Marcelo Forlani, um dos criadores do Omelete.
O rápido desenvolvimento da Comic Con no Brasil também está
ligado ao fato de no país a indústria do entretenimento faturar quase 36
bilhões de dólares no país ( mais de 118 bi de reais), segundo a
consultoria PWC. Os filmes hollywoodianos têm no Brasil uma de suas
maiores bilheterias. Este ano, por exemplo, nos filmes Batman vs Superman e Capitão América: Guerra Civil,
o Brasil esteve entre os cinco maiores países em faturamento. De acordo
com estudo da PWC, o mercado aqui deve crescer mais do que no restante
do mundo entre 2016 e 2020 – 6,4% ao ano até 2020, chegando a 48,7
bilhões de dólares.
Comic Cons pelo mundo
Índia, Filipinas e até a Romênia estão na lista de locais
onde hoje existem eventos que carregam o nome Comic Con. Este ano, até o
Vale do Silício teve sua primeira edição, criada pelo co-fundador da
Apple Steve Wozniak, em San Jose, na California.
O primeiro encontro com o nome aconteceu entre um grupo de
fãs e profissionais de quadrinhos em 1968 em um hotel em Birmingham, na
Inglaterra. Alguns anos depois o formato chegou a San Diego e reuniu, em
sua primeira edição, pouco mais de 300 pessoas. Hoje, há pelo menos 50
edições espalhadas pelo mundo que carregam o nome. Apesar disso, nenhum
desses eventos é afiliado da Comic-Con de San Diego, realizada na cidade
há 42 anos. A edição de San Diego detém os direitos da marca Comic-Com,
com hífen. Já o nome Comic Con sem hífen é de domínio público e
qualquer um pode usá-lo.
A maioria difere do evento em San Diego em um ponto
principal: enquanto o evento original permanece sendo organizado por um
pequeno grupo sem fins lucrativos, os demais têm receitas milionárias. O
caso mais famoso é do grupo ReedPOP, responsável pela Comic Con de Nova
York, Déli, Bangalore, Viena e Paris. Apenas com estes eventos, a
companhia tem um faturamento estimado de 50 milhões de dólares por ano.
Apesar de não ter fins lucrativos, o evento de San Diego
gera um impacto econômico de 150 milhões de dólares na cidade. Em média,
cada um dos 130.000 participantes anuais gasta 600 dólares apenas no
evento, totalizando 78 milhões de dólares.
“O evento se tornou tão grande que não tem mais para onde
crescer em San Diego. Os hotéis ficam sempre lotados, os ingressos
acabam em minutos. Estúdios e empresas realizam eventos gratuitos e
paralelos à Comic Con pela cidade e muita gente que não consegue o
ingresso vem para aproveitar essas outras atividades”, diz Rob
Salkowitz, autor do livro Comic-Con and the Business of Pop Culture.
Originalmente um evento para fãs de quadrinhos, a Comic Con
começou a angariar mais fãs no início dos anos 2000, quando Hollywood
iniciou a grande produção de filmes baseados em quadrinhos, como o X-Men e Homem Aranha.
Hoje, a indústria dos quadrinhos vive seu melhor momento em
20 anos — as vendas físicas e digitais passaram de 1 bilhão de dólares
no ano passado, crescendo 31% desde 2011. A popularidade das HQs ainda é
alimentada pelo sucesso das adaptações para o cinema. Entre os títulos
lançados este ano, Capitão América: Guerra Civil teve uma bilheteria de mais de 1,15 bilhões de dólares; Batman vs Superman arrecadou 873 milhões de dólares e Esquadrão Suicida teve receita de 746 milhões de dólares.
A dependência de todo um mercado em torno desses filmes
levanta dúvidas sobre até onde sua expansão é sustentável. “Essa
dependência [dos filmes] existe há quase 20 anos. Temos uma nova geração
de consumidores vindo e os filmes parecem estar perdendo a qualidade em
roteiro, são cópias atrás de cópias de uma mesma história. Se isso
continuar, as pessoas vão parar de acompanhá-los”, diz Salkowitz.
“O mercado dos quadrinhos está mais forte do que nunca. Mas
se os filmes falharem, alguns grandes eventos falharão em fazer o
dinheiro que esperam. Não será possível atrair 150.000 pessoas por ano
para uma Comic Con”, completa.
Qualquer sinal de que os filmes hollywoodianos já não tem a
mesma eficiência em atrair o público afetaria em cheio a Comic Con
brasileira, que tem como uma de suas atrações principais os atores
americanos. “O mercado brasileiro ficou muito tempo só consumindo o que
vinha de fora, faltava um incentivo para a produção. Isso aos poucos
está mudando, prova disso é a série brasileira 3%, que estreou no
Netflix”, diz Forlani, do site Omelete.
Para tentar fomentar o mercado nacional, a Comic Con realiza
uma conferência nos dias 30 de novembro e 1 de dezembro. Com o nome
CCXP Unlock o evento para 150 pessoas tem palestras sobre
empreendedorismo no mercado de entretenimento com, por exemplo,
produtores da Warner Bros, da série Supernatural e do filme 300. “A
Comic Con ajudou a nos entender mais o potencial do mercado, quem é o
nosso público. O CCXP Unlock quer ajudar a profissionalizar mais o
mercado”, diz Ivan Costa.
Empolgados com o sucesso da Comic Con em São Paulo, os
organizadores vão realizar em abril de 2017 uma edição do evento em
Recife. “Será um teste. Estamos olhando vários mercados interessantes na
América Latina”, diz Costa.
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