Novo
dono da companhia aérea portuguesa, Neeleman é um veterano do setor,
conhecido pela sua religiosidade e por seu déficit de atenção
Após
anos de idas e vindas, a privatização da companhia aérea portuguesa TAP
finalmente chegou ao fim. Nesta quinta-feira 11, o governo português
anunciou sua venda para um consórcio formado por David Neeleman e o
grupo Barraqueiro, especializado em transporte. Pela proposta, os novos
donos deterão 61% da TAP, em troca de 350 milhões de euros em
investimentos na empresa, além da compra de 53 novas aeronaves.
Neeleman
já é um veterano do setor. Em seu currículo, consta a criação de quatro
companhias aéreas: as americanas Morris Air e JetBlue; a canadense
WestJet Airlines; e a brasileira Azul. Em comum, as empresas nasceram
com foco na aviação regional, com uma forte política de descontos nas
tarifas, boa prestação de serviços e pontualidade.
Algumas
facetas do empresário já são conhecidas dos brasileiros. A primeira e
mais óbvia é a sua dupla cidadania. Filho de pais americanos, Neeleman
nasceu no Brasil, em outubro de 1959, na época em que seu pai Gary, era
correspondente da agência de notícias United Press International (UPI). A
família só retornou aos Estados Unidos, quando David tinha cinco anos.
Foi, justamente, sua dupla cidadania que lhe permitiu, décadas depois,
fundar a Azul, já que a legislação brasileira proíbe que estrangeiros
controlem empresas de aviação.
Todos iguais
Outro
lado conhecido de Neeleman é a sua religiosidade. Mórmon, o empresário é
um ativo membro de sua igreja. Com 19 anos, retornou ao País em uma
missão religiosa. Pelas suas contas, batizou cerca de 200 brasileiros.
Além disso, já doou milhares de dólares para obras de caridade e para
ajudar mórmons pobres a estudar e progredir. Para Neeleman, sua
experiência missionária o levou a pôr de lado as diferenças de classe e a
enxergar as pessoas. “Ser missionário me ensinou a tratar todos por
igual”, afirmou, certa vez, a Jeff Benedict, autor de um livro sobre
empresários mórmons. “Eu tenho desdém por pessoas que se sentem
superiores às outras.”
A preocupação em humanizar os
relacionamentos foi estendida às suas empresas. Em uma palestra sobre
gestão, em 2010, Neeleman afirmou que todos, na Azul, tinham a mesma
importância para ele – do funcionário que limpava o banheiro, até o
comandante de um vôo. Por isso, manter os funcionários motivados é tão
importante, para ele, quanto deixar os clientes satisfeitos. Na ocasião,
declarou que “empregados felizes são os melhores”, e que a empresa deve
se esforçar para que eles a considerem o “melhor lugar” em que já
trabalharam.
Déficit ou superávit?
Neeleman
também é um assumido e orgulhoso portador de déficit de atenção. O
distúrbio torna a pessoa hiperativa, propensa a esquecer facilmente as
coisas e a ser irrequieta. Para ele, porém, o déficit traz mais
benefícios do que males. Em entrevista a uma publicação especializada no
tema, a ADDitude Magazine, declarou que sua mente hiperativa o leva a
buscar, toda hora, formas de melhorar os serviços que presta. O medo de
perder o “lado positivo” do déficit de atenção o levou a recusar
tratamentos, a ponto de declarar, certa vez, que, se houvesse uma pílula
que o tornasse “normal”, ele não a tomaria. Para atenuar os efeitos
negativos do distúrbio, o empresário adotou rotinas como colocar suas
coisas sempre no mesmo lugar.
Trabalhador incansável, checa
e-mails a todo instante, dorme cerca de quatro horas por noite e
telefona para executivos de madrugada. Na época em que dirigia a
JetBlue, recebia um e-mail, em seu antigo aparelho BlackBerry, toda vez
que um avião da companhia decolava ou pousava – um procedimento que
ocorria 162 vezes por dia. No começo da Azul, recebia quatro relatórios
diários do call center, a fim de detectar eventuais problemas e agir
imediatamente.
Um de seus vice-presidentes na JetBlue declarou
certa vez, ao americano USA Today, que trabalhar com Neeleman era
“desafiador, porque ele quer estar em todos os lugares ao mesmo tempo”.
Devido ao seu déficit de atenção, o empresário descarregava idéias a
todo instante sobre a equipe e corria para implementá-las, temendo
esquecer-se e perder a oportunidade de melhorar algo.
Quem o
conhece, porém, sabe que outra característica de quem sofre de distúrbio
de atenção é que só pode se concentrar em uma coisa por vez. E o
próprio Neeleman admite que, neste caso, tem a sorte de focar naquilo de
que mais gosta: aviação. Agora, essa hiperatividade vai entrar em campo
para resgatar a problemática TAP, a companhia portuguesa que tenta
sobreviver à gestão estatal. Os executivos da empresa podem se preparar:
os telefonemas de madrugada do novo dono vão começar.
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