O conceito de Estado Tampão surgiu nos meios diplomáticos da Europa por volta do século XVII, sendo utilizado para definir territórios normalmente neutros localizados entre as fronteiras de duas potências que competiam entre si,
atuando como uma garantia contra a expansão territorial ou até mesmo
fazendo o contrário e impedindo a anexação de dois reinos capazes de
competir com outras potências.
A Europa, sem dúvidas, foi o continente que contou com o maior número de Estados nesta condição,
seja como uma tentativa de garantir a estabilidade territorial, seja
como uma forma de impedir a expansão territorial das potências
conflitantes após a queda de um monarca ou a união de duas dinastias.
Áustria, Andorra, Armênia, Transilvânia, Bélgica, Mongólia, o Tibete, as nações do sudeste asiático foram todos considerados Estados Tampões em algum período de sua existência, havendo pouca autonomia geopolítica e diplomática para essas nações.
A América latina também teve algumas regiões consideradas Estados Tampão, sendo o caso do Uruguai o mais reconhecido, por atuar como barreira entre o império luso–brasileiro e a Argentina.
Com a evolução do cenário político internacional após o fim da Guerra Fria,
houve um constante aumento da integração entre as nações. O surgimento
dos blocos econômicos e o incremento das dinâmicas inerentes as
diferentes etapas da globalização, as grandes migrações internacionais e
o aumento do comércio exterior fizeram com que o conceito de Estado Tampão caísse praticamente no esquecimento. Tanto que a União Europeia negligenciou o papel realizado por grande parte das nações do leste europeu ao longo da história em relação ao avanço da OTAN[1] na área de interesse da antiga União Soviética e foi aos poucos expandindo o Blocomediante a adesão de países como Bulgária, Romênia, Estônia, Letônia, Lituânia, Hungria, até chegar à Ucrânia.
A reação da Rússia foi exatamente à mesma que se produz ao retirar um tampão de um barril cheio de pólvora. A OTAN foi se aproximando aos poucos do território da potência que um dia foi usada como justificativa para sua criação, sendo considerado para muitos um enorme erro o avanço do bloco europeu para a zona de influência da Rússia e ainda continuar com a intenção de expandir a mesma para outras nações, como Armênia, Geórgia e Azerbaijão[2], sem estabelecer uma linha de diálogo clara e precisa com Moscou e se aproximando de outras regiões conflitivas como o Irã.
Sombras de uma esquecida Guerra Fria começaram rapidamente a se projetar no horizonte e a adesão da região da Crimeia para o território russo só aumentou as tensões. Tanques voltaram a marchar pelo continente europeu e tropas foram mobilizadas.
Apesar da situação, a Europa não demonstra querer voltar a definir Estados Tampão
ou estabelecer regiões limítrofes para sua expansão. Não fala em uma
área neutral, muito menos tenta voltar atrás em suas decisões. A Rússia, por outro lado, defende sua posição e volta a se armar, anunciando a instalação de 40 mísseis de longo alcance novos e letais.
Voltou-se a uma era instável no panorama internacional, onde ecoam termos tais como heartland e rimland, sem saber ao certo, devido às novas linhas que cobrem o mapa, onde começa um e termina o outro.
Enquanto a situação não se define, parte da Europa
sucumbe perante a crise financeira, a crise dos refugiados e
imigrantes, a falta de liquidez e a redução da economia mundial. A outra
parte, considerada “mais rica”, não consegue avançar nas negociações com osEUA no Acordo de Livre Comércio, nem com o MERCOSUL, seja pelo ônus econômico com qual devem arcar devido a parte empobrecida, ou pela própria falta de direcionamento claro da União.
Do outro lado do mundo, a “nova grande potência”, a China, se mantém estrategicamente neutra no referente às tensões entre a Rússia e a União Europeia, embora as tensões locais ao sul do país com países vizinhos aliados da OTAN comecem a incomodar, principalmente a questão marítima entre China, Malásia, Indonésia e Filipinas.
A sensação que paira é que no auge da globalização e da multipolaridade internacional a assimetria existente entre as nações foi negligenciada, e ao retirar o primeiro tampão, o vazamento foi drenando o sistema internacional por inteiro.
Agora, cabe aos líderes mundiais restaurar o equilíbrio e buscar alternativas viáveis para evitar o conflito, ou que o mesmo seja terceirizado para outras regiões externas ao foco do problema, como aconteceu na primeira Guerra Fria.
Para isso, a participação das nações e Estados localizados em regiões de tensão é de vital importância. Nesse sentido, os Estados Tampões
não somente parecem ser necessários como também devem ser bem
articulados e, de certa forma, mantida sua condição neutra, ainda dentro
da dinâmica globalizada, pois a vazão provocada ao retirar um desses
Estados não somente desequilibra a região, como também nos indica
profundas mudanças no panorama internacional, onde não existe uma
definição de lados como na Era Bipolar, mas sim uma
série de pequenas peças que suportam o equilíbrio de todo o sistema, uma
tênue linha que separa as influências territoriais, culturais, as
negociações sul-sul, as norte-sul.
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Imagem “Heartland and Rimland” (Fonte):
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Fontes Consultadas:
[1] Ver OTAN:
[2] Ver:
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