Caos e desordem
São Paulo – A próxima década no mundo promete ser bagunçada. É o que prevê a edição 2015 do “The Decade Ahead”, um estudo produzido a cada cinco anos desde 1996 pela Stratfor Global Intelligence, consultoria dedicada a assuntos geopolíticos.
Nele, dezenas de especialistas investigam as tendências futuras para o
cenário internacional nas diferentes regiões do planeta e fazem
previsões arrepiantes sobre como estará costurado o panorama político e
econômico global em 2025.
Na visão da consultoria, enquanto a União Europeia
deve começar a operar de forma fragmentada, a crise entre Rússia e
Ucrânia continuará no centro das atenções no âmbito mundial. A Turquia, por sua vez, surgirá como potência regional, já que acabará se envolvendo nos conflitos que acontecem à sua porta.
Na Ásia, a China
segue no papel de potência econômica, mas não será mais uma força
catalisadora de crescimento. Tal posição, enxerga a Stratfor, será
assumida por ao menos 16 países. No que diz respeito às forças
militares, veremos a ascensão do Japão como líder dominante no leste.
“Será um mundo confuso, com mudanças de liderança em muitas regiões”, prevê a consultoria. O que não deve mudar é o poder Estados Unidos, que estará mais maduro, será menos visível e bem menos utilizado na próxima década.
Vale lembrar que nestes quase vinte anos de previsões, a consultoria
teve acertos e erros. “Antecipamos a inabilidade da Europa em sobreviver
a crise econômica e o envolvimento dos EUA na guerra jihadista”, lembra
a Stratfor. “Mas falhamos em não prever o 11 de setembro e, ainda mais
importante, qual seria a intensidade da resposta americana”.
EXAME.com vasculhou a análise da consultoria e expõe aqui algumas de
suas previsões mais alarmantes. Resta aguardar para conferir quais delas
se tornarão realidade.
Os Estados Unidos mais discreto
De acordo com a Stratfor, os Estados Unidos seguirão firme como
potência econômica, política e militar. Contudo, o país irá interferir
menos no contexto internacional que nos últimos anos. “As experiências
do passado irão fazer com que o país seja mais cauteloso quanto ao seu
envolvimento econômico e militar no resto do mundo”.
Na visão da consultoria, os EUA enfrentarão ameaças estratégias de
maneira mais proporcional, “mas não assumirão o papel de socorrista que
exerceu nos últimos anos”.
O colapso da Rússia
“É improvável que a Rússia sobreviva da forma como conhecemos”, diz a
consultoria. Até hoje, o país foi incapaz de conseguir usar as receitas
obtidas no setor de energia para transformar a sua economia em
autossustentável, fato que a deixa ainda mais vulnerável.
E é ai que mora o perigo, analisa a Stratfor: o governo não irá
conseguir manter a sua estrutura nacional e regiões menores do país
podem vir a formar alianças para sobreviver. Como resultado, a
influência de Moscou deve murchar, abrindo um vácuo de poder. “E o que
existirá neste vácuo serão pequenos fragmentos da Federação Russa”.
Uma nova crise nuclear começa a se delinear
O enfraquecimento da Rússia trará à tona um problema ainda mais grave
do ponto de vista internacional. Segundo a Stratfor, o país conta com um
poderoso arsenal nuclear, distribuído em diferentes partes de seu
território, mas o declínio do poder de Moscou deixará uma pergunta: quem
irá controlar todos estes mísseis?
Novamente deve entrar em cena o poder de interferência dos Estados
Unidos, mas a consultoria alerta que será praticamente impossível
monitorar todo o arsenal. “Os EUA terão de aceitar a ameaça que isso
pode representar ou tentar criar um ambiente de estabilidade econômica
nas regiões envolvidas para minimizar estas ameaças ao longo do tempo”.
Polônia entra na primeira divisão
No meio de uma confusão de crises econômicas e políticas, a Polônia
virá a galope para assumir sua posição entre os países mais influentes
na Europa.
Na visão da consultoria, a Polônia observou um impressionante
crescimento econômico nos últimos anos, com a vantagem de que, embora
sua população também venha a retrair, esta retração não acontecerá no
mesmo ritmo de outros países europeus.
Mas a Stratfor vê mais transformações na Polônia: o país deve se
consolidar como uma espécie de líder de uma coalizão mobilizada contra a
Rússia e, em um segundo momento, esta aliança poderá influenciar o
redesenho das fronteiras russas.
“A Polônia ainda se beneficiará da parceria com os Estados Unidos”,
prevê a consultoria, “e sempre que uma potência global se relaciona com
um parceiro estratégico, é de seu interesse que a economia deste
parceiro seja a mais vigorosa possível”.
Ou seja...
As "novas Europas"
De acordo com a Stratfor, a União Europeia deve desmantelar nos
próximos anos e é possível que surjam quatro pequenos blocos de países
unidos entre si na defesa de seus interesses: Europa Ocidental, Leste
Europeu, Escandinávia e outro composto pelas ilhas britânicas.
Isto porque, segundo a consultoria, nenhuma política do bloco serve
para toda a Europa. Como resultado, “o que beneficia uma parte, traz
prejuízos para outras”. Neste movimento, o surgimento de ondas
nacionalistas deve contribuir ainda mais para esta fragmentação.
“A União Europeia poderá sobreviver de alguma maneira, mas a economia
europeia, suas relações políticas e militares serão governadas por
relações bilaterais ou multilaterais de pequeno porte”, prevê a
consultoria.
Turquia assume as rédeas no Oriente Médio
Enquanto seus vizinhos enfrentam ameaças de grupos jihadistas e
movimentos insurgentes, a Turquia será forçada a olhar para o sul de sua
fronteira. Seu envolvimento, contudo, se dará lentamente e será da
menor intensidade possível. “A Turquia não conseguirá suportar anos de
caos em suas fronteiras e não haverá outro país para carregar este
fardo”, diz a consultoria.
A Stratfor leva ainda a força da Turquia para além do Oriente Médio e
em direção ao Mar Negro: com o enfraquecimento da Rússia, os turcos irão
investir esforços comerciais e políticos nesta região. Além disso,
espera-se que o país aumente sua concentração nos Balcãs.
Mas antes que isso tudo possa acontecer, lembra a Stratfor, é preciso
que a Turquia arrume a sua casa para encontrar o equilíbrio,
especialmente por conta do fato de que, ao mesmo tempo em que é um país
secular, é também um país muçulmano.
A China terá problemas
O vigoroso crescimento chinês finalmente começa a dar sinais de
normalização, prevê a Stratfor. O problema, daqui pra frente, será como a
China irá lidar com as consequências políticas e sociais desta
normalização, uma vez que, depois de anos investindo na sua região
costeira, o país terá de expandir seus investimentos em infraestrutura
para o interior.
Este movimento de transferência de riqueza deve fazer surgir um
sentimento de descontentamento nas cidades costeiras e que pode vir a se
tornar uma rebelião contra Pequim. Para manter o controle sobre a
situação, o Partido deve se tornar ainda mais opressor no cenário
interno, aumentando a centralização política econômica e incentivando o
sentimento nacionalista.
China perde posto de potência econômica para 16 outros países
Com a diminuição do ritmo de crescimento econômico na China,
fabricantes de todo o mundo devem levar seus investimentos para outros
16 países nos quais ainda será possível obter salários ainda mais baixos
para a mão de obra e outras vantagens. Entre eles, cita a Stratfor, está o México, a Nicarágua, o Peru, além de países africanos como Uganda, Quênia e Etiópia.
Japão e China na disputa no Mar do Sul da China
Levando em conta previsões de que a Rússia estará enfraquecida nos
próximos anos e que a China se tornará cada vez mais nacionalista, a
Strartfor prevê que o país pode tentar abocanhar o controle de áreas
marítimas que um dia foram de interesse russo no Mar do Sul da China.
E é aqui que nasce outro problema: o Japão dificilmente deixará que
seus vizinhos chineses aumentem a influência marítima na região.
A China tem o poder para construir uma grande frota naval. Contudo,
lembra a Stratfor, tem pouca experiência em disputas navais e poucos
comandantes capazes de desafiar marinhas tradicionais, como os Estados
Unidos e o próprio Japão.
Japão se tornará uma potência naval
Nesta disputa marítima entre Japão e China, a Stratfor lembra que os
japoneses tem toda a condição de construir uma marinha maior que a dos
chineses, além de ter uma tradição naval respeitável. “O Japão irá
aumentar seu poderio naval”, prevê a consultoria.
E fará isso não apenas para lidar com disputas com a China, mas também
para assegurar a estabilidade de suas importações, uma vez que é
altamente dependente da importação de materiais do Oriente Médio e do
sudeste asiático.
Atualmente, contudo, conta com os Estados Unidos na mediação destas
relações. Com a diminuição da interferência americana no contexto
internacional, caberá ao Japão assumir as rédeas de seus interesses.
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