O
alto custo é considerado um dos principais empecilhos para que as
empresas resolvam suas diferenças em um processo arbitral. Diante desse
quadro, não demorou aparecer empresas de financiamento como alternativa
para as companhias com limites orçamentários. E, como tudo é negócio, a
possibilidade de ganho financeiro é a força por trás dessa
relação. Prática comum no exterior, a modalidade começa a aparecer no
Brasil.
Financiamentos de arbitragem (e também de contenciosos) é
um negócio como outro qualquer, estabelecido para gerar lucros. Empresa
privadas, que atuam à semelhança de qualquer instituição financeira,
investem em casos de demandantes com grande potencial de lucro, em troca
de uma comissão sobre a indenização que derivar da arbitragem ou do
contencioso.
Embora o objetivo dessas empresas privadas seja
apenas o lucro, isso não fica explícito em seu marketing. Ao contrário,
em seus sites essas empresas se promovem com frases tais como “Promova
os direitos jurídicos globalmente”, “Acesse a Justiça sem custos”,
“Ganhe retornos extraordinários”.
Eufemismos à parte, a
legitimidade do sistema é questionada na Inglaterra. Lá, todo o processo
é sigiloso e não se sabe, realmente, quem está bancando o demandante.
Também não é possível saber se a empresa financiadora tem algum tipo de
ligação com o árbitro escolhido para decidir o caso. Já houve um
movimento, na Inglaterra, para regulamentar e obrigar as partes a
revelar as informações sobre o financiamento, mas isso nunca foi para a
frente.
Avaliação dos riscos
Como se trata de um investimento de risco, o financiamento só é aceito
caso seja identificada uma boa chance de vitória da parte que busca o
aporte. Para isso, os agentes financeiros contam uma equipe, além de
ajuda de consultorias especializadas, para estudar cada caso
detalhadamente.
Antes de tomar uma decisão de investimento, as
empresas levam em consideração: 1) o valor e a complexidade da demanda;
2) o valor do investimento; 3) a probabilidade de sucesso da demanda; 4)
se existem outras partes interessadas na demanda; 5) a jurisdição em
que a arbitragem será realizada; 6) a instituição arbitral que
administra o caso; 7) facilidade de execução da decisão da arbitragem.
O
valor mínimo da indenização também é um fator na tomada de decisão. Tem
de ser de pelo menos US$ 20 milhões. Para potenciais indenizações
abaixo desse valor, existe um outro sistema, chamado "crowdfunding"
(financiamento pelo povo). Isso significa que o financiamento é feito
por investidores particulares, reunidos em sites que promovem esse tipo
de atividade.
Possibilidade de lucro
"Se o cliente não ganha o processo arbitral e não obtém uma compensação
econômica, a empresa não ganha nada e perde o investimento", explica Narghis Torres,
CEO da LexFinance, empresa de financiamento de arbitragem que atua no
Brasil desde o início do ano. Em troca do financiamento, ele conta que a
companhia cobra uma porcentagem dos ganhos. O executivo ressalta
que não se trata de um empréstimo, mas de investimento.
A advogada Vânia Wongtschowski Kleiman,
do Wongtschowski & Zanotta advogados conta que a taxa de sucesso
cobrado pelos investidores no exterior varia normalmente de 15% a 50% do
valor que a parte receberá. No entanto, segundo ela, há outra forma de
cobrança feita por quem financia. "Há casos em que é negociado um
múltiplo do valor investido, independentemente do valor que a parte irá
receber", diz.
Essas instituições podem investir, por exemplo, US$
1 milhão em um processo de indenização de US$ 20 milhões, para lucrar
US$ 3 milhões — um lucro dificilmente obtido em qualquer investimento no
mercado financeiro em curto ou médio prazo.
Crescimento no Brasil
Um das empresas que presta consultoria e assessoria em arbitragem é a
Hill Internacional, que possui escritórios em mais de uma centena de
países. De acordo com Marcello Guimarães, vice-presidente
de Óleo e Gás da Hill Internacional, há cerca de 30 arbitragens no
Brasil que contam com financiadores e a tendência é crescer.
Ele
aponta que, além da crise econômica que passa o Brasil, as Olimpíadas no
Rio de Janeiro em 2016 e o desencadeamento da operação "lava jato"
estão colaborando para o crescimento da arbitragem no país.
"O
centro de arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá é a que mais
cresce no mundo. Há uma grande demanda mas o custo da arbitragem é alto e
hoje a situação econômica não é favorável. Por isso o mercado criou uma
alternativa que é esse financiamento da arbitragem por agentes
financeiros", diz.
Visão semelhante tem Paulo Macedo,
especialista em arbitragem do L.O. Baptista-SVMFA. De acordo com ele,
esse fenômeno ainda é novo no Brasil e tem sido bastante discutido desde
o início do ano devido a crise. Para Macedo, a iniciativa é positiva.
"Isso possibilita, entre outras coisas, um equilíbrio entre as forças
numa disputa. O fato de uma empresa estar em dificuldade econômica deixa
de ser um fator que fortaleça a outra parte. No Judiciário isso é
comum. O fator econômico torna uma parte mais forte que outra. Esses
fundos, ao financiarem a arbitragem, reequilibram a questão", explica.
O
financiamento de arbitragem não se resume ao pagamentos dos custos.
Todas as despesas relativas aos procedimentos (por exemplo, honorários
de árbitros, advogados e peritos) podem ser pagas pelos investidores. De
acordo com a advogada Vânia Wongtschowski, em outros países o
financiamento de arbitragem pode ser até mesmo durante o procedimento
arbitral, seja para pagar as despesas já efetuadas, seja para financiar
as despesas que ainda faltam.
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