Insegurança jurídica
Critérios para liminares em ações de comércio internacional gera debate
Ao abrir o seminário Os desafios da judicialização da defesa da concorrência, da regulação e do comércio internacional,
o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado
Coelho, afirmou que "o desenvolvimento do país passa por duas balizas
essenciais: a segurança jurídica e a defesa da concorrência”,
No
entanto, durante o evento promovido pela OAB em parceria com o Centro de
Estudos de Direito Econômico e Social (Cedes) um debate sobre a
existência de critérios uniformes para a concessão de liminares nas
ações de comércio internacional e defesa da concorrência, mostra que
ainda há muita insegurança sobre o tema.
Renato Rodrigues Vieira,
procurador-geral federal, foi o primeiro a expor. “A concessão de tais
liminares envolve diretamente questionamentos das decisões colegiadas
das agências reguladoras, dentro da discricionariedade técnica que
abarca tais feitos. Normalmente, a litigância é demorada e desgastante,
dentro de um cenário marcado por certa insegurança jurídica”, explicou.
O
procurador também apresentou resultados de algumas decisões de mérito
nessas ações. “Em primeira instância, há 68% de confirmação das decisões
dos órgãos reguladores, enquanto 83% dos processos têm trânsito em
julgado. Há uma certa padronização da confirmação, com cerca de 74%
delas proferidas pelo Conselho Administrativo de Defesa do Consumidor. O
número médio de mudança de status das decisões, que marca a insegurança
jurídica já apontada, é bastante alto no Brasil. Notadamente a Aneel e o
Cade têm mais reformas que os demais órgãos reguladores”, indicou.
Em
seguida, foi a vez da apresentação de José Marcos Lunardelli,
desembargador federal do Tribunal Regional Federal da 3ª Região e
representante da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).
“Falta conscientização sobre os ônus e bônus do litígio, o que considero
nascedouro da questão. É necessário, em certos setores, adotar total
cautela para não impedir o debate jurídico, mas evitar conceder
liminares que produzam efeitos colaterais diretos na livre
concorrência”, alertou.
O advogado e professor da Fundação Getulio
Vargas, Caio Mário da Silva Pereira Neto, fechou o painel. Ele chamou
atenção para o elevado número de liminares e lembrou que a maior parte
das decisões provisórias é concedida em processos punitivos nos quais,
invariavelmente, há incidência de multa na decisão.
Falta de especialização
A falta de especialização já havia sido destacada por Ricardo Villas
Bôas Cueva, ministro do Superior Tribunal de Justiça, na abertura do
evento. “Os tribunais têm aplicado mecanismos de controle cada vez mais
intensos e substantivos. No Brasil, tanto juristas como economistas
criticam a falta de especialização do Poder Judiciário para lidar com
essas questões”, criticou.
Cueva também falou sobre a atuação do
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). “No Brasil a
autarquia de defesa da concorrência é independente, principalmente em
suas decisões. No entanto, suas decisões administrativas são passíveis
de controle jurisdicional. De modo geral, este controle limita-se à
legalidade, mas há casos de analise do mérito”, prosseguiu.
Por
fim, o ministro apontou que o Cade se esforça continuadamente para
manter um alto grau de transparência à luz da Lei do Processo
Administrativo e da Lei dos Atos Administrativos. “Desde 2004, por
exemplo, as sessões são transmitidas ao vivo pela internet”, concluiu.
Experiência internacional
O seminário contou ainda com um painel que debateu a experiência entre
nações de judicializar demandas ligadas ao tema. Moderaram as atividades
o presidente do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social
(Cedes), João Grandino Rodas, e o presidente da Comissão de Defesa da
Concorrência da OAB Nacional, Tulio do Egito Coelho.
O primeiro
debatedor foi o juiz da Corte Internacional de Comércio dos Estados
Unidos, Mark Barnett. Em sua atuação na Jornada de Doha, ele conta ter
percebido uma mudança no posicionamento do Brasil nas negociações.
"O país passou de alvo a usuário das medidas antidumping [aquelas
tomadas para proteger o mercado interno]. Essa experiência possibilitou a
reunião de tantos agentes importantes do Direito aqui neste evento,
hipótese que não vejo ser possível em Washington, por exemplo”, apontou.
Barnett
também abordou a questão aduaneira. “A Corte Internacional, neste
sentido, trouxe notável progresso à questão das aduanas. Os tributos de
entrada e saída de produtos nos Estados Unidos correspondem a 10% da
receita da nação, o é expressivo. Os litígios aduaneiros normalmente
resultam em grande volume de trabalho para os tribunais, o que justifica
a criação do Tribunal Especializado das Aduanas em meu país”,
completou.
Stephen Leach, presidente do Tribunal de Comércio
Internacional do Canadá, falou em seguida. “O contato entre as esferas
pública e privada é salutar no Canadá. As empresas precisam ter certeza e
eficiência em suas ações, então essa experiência foi levada ao
tribunal. O comércio é igual a trabalho e emprego, por isso deve ter
posição prioritária. Acesso à justiça e transparência permitem que as
empresas funcionem”, introduziu.
Leach explicou que seu tribunal
pode agir em patamar superior dentro da jurisdição canadense, mas sob
certos limites. “Os casos são parecidos com aqueles do cenário
norte-americano. Minha corte trabalha com recursos especiais. Ou seja,
decidimos por exemplo se o mercado foi alvo de dumping ou truste. Causas
complicadíssimas, de impacto na economia nacional e na geração de
empregos. Somos um tribunal semijudicial e por isso com caráter
flexível, o que nos coloca num patamar de rapidez na resolução de
conflitos. Em um montante de aproximadamente 65 casos anuais, 1,04% das
apelações são vitoriosas”, disse.
Por último, falou o
representante português da Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), Pedro Caro de Souza, que fez uma análise comparativa
dos tribunais de concorrência. “Reino Unido, Canadá e Austrália têm
tribunais especializados, ao ponto que França, México e Estados Unidos
têm sistemas híbridos, e, por fim, Alemanha e Brasil mantêm tribunais
generalistas. Neles dividem-se os modelos judicial bifurcado,
administrativo bifurcado e administrativo integrado. Então, essas cortes
são divididas entre as que têm papel de decisão original, de recurso
total ou de recurso administrativo”, enumerou. Com informações da Assessoria de
Imprensa da OAB.
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