Fernando Donasci / Reuters
Lula: desde março de 2014, os investigadores miram uma sistemática
criada por um núcleo político, que envolvia PT, PMDB e PP, e um cartel
das maiores empreiteiras do país
Ricardo Brandt, do Estadão Conteúdo
São Paulo - A primeira denúncia criminal contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apresentada nesta quarta-feira, 14, pelo Ministério Público
Federal, em Curitiba, revela a tese que será usada nas acusações
formais que imputarão ao petista envolvimento direto no crime de
organização criminosa da força-tarefa da Operação Lava Jato.
"Nesse esquema criminoso, Lula dominava toda a estrutura por ele
montada, com plenos poderes para decidir sobre sua prática, interrupção e
circunstâncias", registram os procuradores da República, na denúncia
por corrupção passiva e lavagem de dinheiro contra o ex-presidente, a
sua mulher, Marisa Letícia, e outros seis acusados.
Alvo de críticas, em especial da defesa, a forma como foi divulgada em
entrevista coletiva a primeira denuncia contra Lula - e a ampla
explanação sobre o contexto da estrutura criminosa montada no governo
federal, que teria vitimado a Petrobras - foi montada pelos 13
procuradores da República de Curitiba, com acompanhamento direto do
procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
A peça acusatória resume o papel de Lula como suposto mandante da
organização criminosa, para contextualizar os crimes alvos da Lava Jato.
Desde março de 2014, os investigadores miram uma sistemática criada por
um núcleo político, que envolvia PT, PMDB e PP, e um cartel das maiores
empreiteiras do país para lotear cargos na Petrobras e arrecadar fundos
por meio de pagamentos de propinas - que variavam de 1% a 3% dos
contratos, um prejuízo de mais de R$ 40 milhões.
Nela os procuradores apontaram pelo menos 14 conjuntos de elementos
probatórios usados para formar a convicção de que a empreiteira OAS
pagou R$ 87 milhões de corrupção em contratos da Petrobras, que
beneficiaram Lula de três formas. Pela cooptação de partidos aliados -
PMDB e PP - por meio do loteamentos de cargos na estatal para
arrecadação de propinas, pelo uso do esquema para formação de "caixa"
ilícito para financiamento das campanhas e para o enriquecimento
ilícito.
A última perna desse tripé que justifica a sistematização do loteamento
de cargos para levantamento de propinas é o alvo dessa primeira denúncia
criminal da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Nela, Lula e Marisa são acusados por corrupção passiva e lavagem de
dinheiro na propriedade e reforma do tríplex do Edifício Solaris, no
Guarujá (SP), e no custeio do armazenamento de bens do ex-presidente
pela OAS.
De acordo com a denúncia, R$ 3,7 milhões foram propinas usadas em
benefício próprio. O restante, usado para financiamento do esquema de
"governabilidade corrompida e perpetuação criminosa no poder".
"Resumidamente, Lula capitaneou e se beneficiou desse grande e poderoso
esquema criminoso. Beneficiou-se de forma econômica e direta, pois
recebeu propinas decorrentes de ilicitudes praticadas por empreiteiras
em detrimento da Administração Pública Federal, notadamente da
Petrobrás", sustenta o MPF, na denúncia.
"No entanto, seu maior benefício foi na seara política, uma vez que,
permitindo que fossem desviados bilhões de reais em propinas, para o PT e
para os demais partidos de sua base de apoio, especialmente PP e PMDB,
tornou-se politicamente forte o bastante para ver a aprovação da maioria
dos projetos de seu interesse perante as Casas Legislativas e propiciar
a permanência no poder de seu partido mediante a injeção de propinas em
campanhas eleitorais."
Esquema único
Na tese usada pela Procuradoria para indicar o papel de mando de Lula, a
denúncia diz que "a ânsia de ganhar rapidamente o máximo de apoio no
Congresso e o desejo de perpetuar o PT no Poder - não só no Executivo
federal como em outros níveis de governo em que as campanhas seriam
alimentadas com dinheiro criminoso - moveram Lula, auxiliado por José
Dirceu, na orquestração de uma sofisticada estrutura ilícita de compra
de apoio parlamentar".
"A contextualização do suposto esquema criminoso, que abre a denúncia,
indica que Lula será acusado não só de ser o 'maestro' do esquema de
cartel e propinas na Petrobras, mas como artífice de uma 'macro
corrupção' que unirá outros casos de corrupção - já com sentença
proferida - no governo federal, como os de desvios via Ministério do
Planejamento, alvo da Operação Custo Brasil, dos desvios nas obras da
Usina de Angra 3 na Eletronuclear, alvo da Lava Jato no Rio, e nos
contratos de publicidade da Caixa Econômica Federal, da Lava Jato em
Brasília".
"A arrecadação de propinas, assentada na distribuição de cargos
públicos, permitiu o direcionamento de vantagens indevidas a agentes e
partidos políticos, funcionários públicos, operadores financeiros e
empresários, dando origem a um esquema criminoso revelado, parte na ação
penal relativa ao 'Mensalão' e parte nas ações penais da Operação Lava
Jato."
"Para que a engrenagem criminosa funcionasse na forma antes descrita -
obter e manter a governabilidade corrompida, enriquecer ilicitamente
seus participantes e financiar a permanência no poder - Lula comandou e
coordenou, por meio de dinheiro público desviado, embutido em lucros
ilegais cada vez mais altos por parte de empresários corruptores, o
concurso de vontades de agentes integrantes de 4 núcleos principais do esquema descrito: empresarial, dos funcionários públicos, político e dos operadores financeiros".
Defesa
O advogado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de sua esposa
Marisa Letícia, Cristiano Zanin Martins, disse nesta quarta-feira, 14,
que a denúncia contra seus clientes vem de um histórico que mostra uma
"perseguição" contra o ex-presidente e tenta tirá-lo do cenário político
de 2018.
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