sábado, 5 de outubro de 2013

Cadê o bom senso?


Greves por polpudos reajustes salariais mostram que os sindicatos de trabalhadores ainda não entenderam que a situação econômica mudou

Por Luís Artur NOGUEIRA

No dia 20 de setembro, uma sexta-feira, os ânimos se exaltaram na porta da sede do Bradesco, na Cidade de Deus, em Osasco (SP). Um grupo ligado ao sindicato dos bancários estacionou caminhões de som nas entradas do complexo financeiro, impedindo o ingresso dos funcionários e o cumprimento da jornada de trabalho. Foi preciso que o banco acionasse a Justiça para que o direito de ir e vir, uma das garantias individuais da Constituição, fosse respeitado. Era apenas o segundo dia daquela que se tornaria a maior greve em 20 anos – o movimento continuava até o fechamento desta edição. Ao contrário do que vinha ocorrendo nos últimos anos, em que predominavam o bom senso e o diálogo, banqueiros e bancários mantiveram-se irredutíveis em suas posições.


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Marcha sem rumo: bancários protestam no Recife (PE) por ganhos irreais
 
 
Os empresários propuseram a reposição da inflação e os trabalhadores queriam 6% a mais, além de outros itens, como três salários e mais um bônus de R$ 5,5 mil de participação nos lucros. “O piso salarial da categoria subiu mais de 75% nos últimos sete anos e os salários foram reajustados em 58%, ante uma inflação medida pelo INPC de 42%”, diz, em nota, a Federação Nacional dos Bancos (Fenaban). 
 
“Continuamos abertos a negociações.” A greve por generosos reajustes salariais não é uma exclusividade dos bancários. Os funcionários dos Correios, cuja federação nacional também é ligada à CUT, cruzaram os braços em 17 de setembro. Na lista de reivindicações, um utópico aumento real de 15%.
 
No entanto, parte dos sindicatos, incluindo São Paulo e Rio de Janeiro, já concordou com um reajuste nominal de 8% – menos de 2% em termos reais. “A moderação no mercado de trabalho neste ano tirou poder de barganha dos sindicatos”, diz Fábio Romão, especialista em mercado de trabalho da LCA Consultores. “Além disso, a inflação alta dificulta as negociações, que partem de um patamar inicial muito elevado.” A LCA estima que o rendimento médio real dos brasileiros crescerá apenas 1,5% neste ano, ante 4,1% em 2012.A tendência de acordos em torno de ganhos mais modestos também é comprovada por um levantamento feito pelo Dieese, que analisou 328 negociações realizadas no primeiro semestre.
 
A quantidade de categorias que conseguiram ganhos reais diminuiu em relação ao ano anterior, e quase 10% tiveram reajustes abaixo da inflação (leia quadro acima). “Na média, 2013 está sendo um ano de resultados mais tímidos”, diz José Silvestre Prado de Oliveira, coordenador de relações sindicais do Dieese. O endurecimento nas negociações entre patrões e empregados reflete uma nova situação econômica, na qual o crescimento esperado para o País não se concretizou e a inflação acabou superando as estimativas. Até o ano passado, os empresários eram mais suscetíveis aos pleitos dos sindicatos, pois vislumbravam uma expansão dos negócios. Além disso, num quadro de pleno emprego, a prioridade era reter os talentos, ainda que para isso fosse necessário pagar reajustes acima dos ganhos de produtividade. 
 
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A mudança do cenário econômico, aliada aos protestos sociais no meio do ano, gerou uma série de greves País afora, a exemplo do que ocorre com os bancários. Nos últimos meses, professores, petroleiros, motoristas de ônibus, aeroportuários e caminhoneiros, entre outras categorias, cruzaram os braços. No Rio de Janeiro, os docentes estão parados desde o dia 8 de agosto. Esse fenômeno vem crescendo no governo da presidenta Dilma Rousseff, que contabiliza 554 paralisações em 2011 e 873 em 2012, contra uma média anual de 369 greves nos dois mandatos do ex-presidente Lula. 
 
Com a experiência acumulada em décadas de negociações salariais, o consultor trabalhista Drausio Rangel recomenda “bom senso” aos trabalhadores diante de uma situação mais “apertada” das empresas. “No Brasil, o que é caro não é o trabalhador, é o custo do emprego”, diz Rangel, que, no mês passado, conseguiu convencer os metalúrgicos ligados à CUT a aceitar um ganho real de 1,82%, inferior aos 2% concedidos em 2012. A próxima etapa envolverá os sindicatos filiados à Força Sindical, que faz oposição ao governo Dilma.
 

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