O Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Tesouro americano
alertaram ontem para os graves riscos que os EUA e o mundo terão de
encarar se o Congresso não aumentar o teto da dívida americana. A
diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, disse que a interrupção
parcial das atividades do governo "já é ruim o suficiente", mas que um
fracasso em elevar o nível do endividamento "seria muito pior", podendo
afetar seriamente não apenas a economia dos EUA, mas toda a economia
global. Evitar esse desfecho, segundo ela, é uma missão urgente. Em
estudo divulgado ontem, o Tesouro diz que um eventual calote dos EUA
pode provocar uma crise financeira que "ecoaria" os eventos de 2008,
quando o Lehman Brothers quebrou, ou até algo pior.
Num tom dramático, o documento do governo dos EUA lembra que o país
nunca deu um calote em suas obrigações, e que o dólar e os títulos do
Tesouro estão no centro do sistema financeiro internacional. "Um calote
seria inédito e tem o potencial para ser catastrófico: os mercados de
crédito poderiam ficar congelados, o valor do dólar poderia mergulhar,
os juros poderiam disparar e impactos negativos poderiam reverberar pelo
mundo", afirma o relatório, que coloca mais pressão sobre a oposição
republicana na Câmara dos Deputados, cuja intransigência levou à
suspensão parcial de alguns serviços públicos a partir da terça-feira, o
chamado "shutdown".
O Tesouro americano diz que a mera discussão política que crie a
perspectiva de um calote pode ser perturbadora para os mercados
financeiros e as famílias e empresas americanas. Como exemplo, cita o
impasse em torno da dívida ocorrido em 2011, "quando a confiança de
consumidores e empresários caiu com força, os mercados financeiros
tiveram momentos de estresse e o crescimento do emprego se desacelerou".
Naquele momento, a dívida americana foi rebaixada pela agência de
classificação de risco Standard & Poor's (S&P), o mercado de
ações despencou, medidas de volatilidade deram um salto e spreads de
risco de crédito tiveram grande aumento. "Esses efeitos nos mercados
financeiros continuaram por meses", afirma o Tesouro, destacando que as
dúvidas sobre se os EUA pagariam ou não as suas obrigações afetaram o
crescimento da economia.
Uma questão adicional a ser considerada no atual cenário, segundo o
Tesouro, é que algumas atividades do governo estão paradas. Se o
"shutdown" se prolongar, a economia pode se enfraquecer, tornando a
situação ainda mais adversa aos efeitos do impasse sobre o teto da
dívida do que antes da suspensão de alguns serviços públicos, diz o
relatório.
Em discurso na Universidade George Washington, Lagarde disse que os
EUA são a economia avançada em que há sinais mais claros de recuperação.
"Famílias estão em melhor forma, o setor imobiliário parece melhor e o
motor do setor privado está ganhando força outra vez", afirmou Lagarde,
notando, contudo, que o crescimento neste ano ainda vai ser "muito
baixo", inferior a 2%, justamente devido ao ajuste fiscal exagerado.
Para ela, "isso deve ser aliviado em 2014, quando o crescimento deve ser
1 ponto percentual maior." Na semana que vem, o FMI atualizará as suas
estimativas para a economia global. Em julho, o FMI projetava expansão
para os EUA de 1,7% neste ano e de 2,7% no ano que vem.
Lagarde disse que, na questão fiscal, os Estados Unidos precisam ao
mesmo tempo "desacelerar e se apressar", o que significa menos ajuste
fiscal hoje, para não afetar a recuperação, e mais amanhã, para
enfrentar aumentos de despesas que ocorrerão no longo prazo. "No meio
desse desafio fiscal, a atual incerteza política sobre o Orçamento e o
teto da dívida não ajuda", afirmou Lagarde. Ela disse ver sinais de
esperança nas economias avançadas, embora o panorama global continue
contido. Além dos sinais de retomada nos EUA, a zona do euro deixou para
trás seis trimestres seguidos de recessão e as políticas de estímulo à
economia no Japão parecem estar funcionando, ressaltou. Segundo Lagarde,
porém, a zona do euro e o Japão precisam persistir em reformas
estruturais, para melhorar as perspectivas de crescimento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário