Publicado por Canal Ciências Criminais -
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Por Denis Caramigo
Ouve-se, constantemente, falar em assédio sexual, mas poucas pessoas sabem, realmente, o que este tipo penal estabelece.
Talvez
por influência da mídia, principalmente a televisiva, as pessoas acham
que qualquer importunação de cunho sexual se enquadra no crime, aqui,
comentado.
Já escrevi, em outras oportunidades, sobre o crime de
estupro e a contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor,
recomendando, assim, a leitura de tais temas para melhor compreensão não
só dessas infrações penais, como, também, do crime que aqui comentamos.
Para que possamos entender a tipicidade do crime de assédio sexual, vejamos a disposição do caput do artigo 216-A do Código Penal:
Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função.
Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos.
Entendo
que o dispositivo desse crime retrata, de forma cristalina, a
legalidade taxativa (ou falta dela) penal, gerando, assim, muitas
controvérsias jurídicas na sua aplicação fática, tendo em vista que sua
redação não ajuda em nada para a segurança jurídica no mundo real.
Uma pergunta importantíssima que surge é: Constranger alguém a quê?
Não
existe determinação do objeto, deixando, dessa forma, uma lacuna enorme
para interpretação extensiva, ferindo o princípio da legalidade que
impera no direito penal.
O constrangimento estabelecido no
dispositivo jamais pode ser deduzido, suposto ou, pior, adivinhado,
pois, sendo assim, a insegurança jurídica será gerada de acordo com a
subjetividade de cada um.
A conduta que tipifica o crime, como já
observamos, é constranger alguém, o que significa, além de forçar,
coagir, obrigar, compelir, incomodar, tolher a liberdade, cercear,
embaraçar a pessoa da vítima, o que pode ser feito por palavras
(oralmente ou por escrito), gestos etc.
Mais uma vez chamo a atenção para a falha do legislador quando não estabeleceu a legalidade taxativa do objeto: […] constranger alguém […] A QUÊ?”.
Como se não bastasse, as expressões “vantagem ou favorecimento sexual” são indeterminadas e vagas, deixando, assim, interpretações subjetivas infindáveis, ferindo, também, o princípio já comentado.
Total
falta de técnica legislativa que deixa o tipo penal sem definição
específica e aplicação séria, apenas, no mundo hipotético, sem nenhum
respeito ao princípio da legalidade que rege o direito penal.
Apenas
para fiel cumprimento da explicação do tema, o princípio da legalidade
traduz que somente pode se considerar infração penal (crime ou
contravenção) determinada conduta se prevista em lei. O mesmo pode-se
dizer sobre a existência da pena.
Tal disposição encontra-se garantida constitucionalmente no art. 5º, XXXIX:
“Não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”.
Assim, impede-se a utilização de aplicação in pejus
das normas penais como fonte criadora de infrações e respectivas
sanções, ou seja, é vedada a utilização da analogia para a definição de
delitos ou aplicação de penas.
Crítica feita, analisemos quem pode cometer e sofrer o assédio sexual.
O
sujeito ativo do crime é qualquer pessoa que ocupe posição superior ou
tenha ascendência, na relação laborativa, sobre a vítima. Já o sujeito
passivo, deve ser o subordinado ou empregado de menor escalão.
Percebam que necessariamente deve haver uma relação laborativa
entre os sujeitos (ativo e passivo), caso contrário o crime de assédio
não se tipificará (fato atípico), sendo, portanto, a conduta enquadrada
em outra tipicidade penal (quando prevista).
Importante destacar
que quando o código “fala” em “superior hierárquico” refere-se ao
funcionário de maior autoridade na estrutura administrativa pública,
civil ou militar.
Na esfera particular (setor privado) o termo utilizado é “ascendência”, existente nas relações de emprego.
Como
já dito e muito importante ser reiterado, é indispensável que haja a
referida superioridade decorrente de uma relação administrativa ou de
uma ascendência própria de cunho trabalhista.
Não existe assédio sexual fora da relação de cunho laboral.
Assim
sendo, a título de exemplo, podem ser sujeitos ativos do crime o
superior hierárquico, de direito administrativo, ou empregadores,
patrões, chefes de serviço…
Figuram como sujeitos passivos do delito o subordinado administrativo ou o empregado.
Ainda
que existam (poucas) decisões reconhecendo o assédio sexual com pessoas
do mesmo nível hierárquico, não é o entendimento que prevalece.
Não
existe a forma culposa (por imperícia, imprudência e/ou negligência) no
crime de assédio sexual sendo, portanto, o dolo (consciência e vontade
de produzir o resultado), com o fim de obter alguma vantagem ou
favorecimento de cunho sexual, o elemento subjetivo.
Por fim, o sexo da pessoa que comete e/ou sofre a conduta lesiva é irrelevante.
O crime pode ser cometido por homem x mulher; mulher x homem; homem x homem e mulher x mulher.
Como
em qualquer estudo o tema deve ser melhor aprofundado, porém, neste
breve esboço tentamos passar, de forma clara e objetiva, que só existe o
crime de assédio sexual, única e exclusivamente, por meio de uma
relação laborativa.
Denis Caramigo
– Advogado criminalista. Consultor jurídico. Membro da Comissão do
Acadêmico de Direito da OAB/SP. Colunista e orientador jurídico do
projeto Prodigs – Ação Pró-dignidade sexual. Palestrante.
Fonte: Canal Ciências Criminais
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