segunda-feira, 18 de julho de 2016

Fomento à inovação: visões do Brasil e da Austrália




Processo complexo e burocracia são barreiras a vencer nos dois países


Por Jamile Sabatini Marques*




O impacto da inovação em um país pode ser demonstrado de diversas maneiras, desde sua capacidade de movimentar a economia com a geração de novos empregos ou até pela sua habilidade de estimular o mercado a criar negócios inéditos. Mas como o apoio financeiro concedido às empresas de tecnologia pode contribuir para o desenvolvimento econômico baseado no conhecimento? 

Foi com essa dúvida que, em 2015, embarquei em um voo para o outro lado do mundo, mais precisamente, em Brisbane, Austrália, para ter o privilégio de ser orientada por Tan Yigitcanlar, autor do conceito KBUD [Desenvolvimento Urbano Baseado no Conhecimento], em minha tese de doutorado na Queensland University of Technology (QUT), em cooperação com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Como pode observar, o foco da viagem estava no especialista e não somente no país em que ele está baseado. Estar em outro local me permitiu realizar comparativos com as duas economias sobre as visões das empresas de tecnologia brasileiras e australianas em relação ao fomento à inovação. Mas antes de chegar aos resultados do estudo, quero voltar a 2013, no meu primeiro ano na diretoria de Inovação e Fomento da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES), quando formulamos uma pesquisa para medir o quanto as empresas de tecnologia conheciam sobre os recursos para fomento direcionados à inovação existentes no mercado. Para espanto de investidores como governo e bancos, quase a metade (44%) das associadas não conhecem o suficiente as fontes para inovação e fomento disponíveis para o setor no país.

Em minha pesquisa, parti do ponto de que, dentro do framework de KBUD criado por Yigitcanlar, no segmento econômico, ele considerava quatro importantes pilares: Conhecimento, Criatividade, Inovação e Competitividade, mas ainda não incluía o Fomento/Incentivo como base para que haja desenvolvimento baseado no conhecimento. Para contextualizar a importância de inserir o conceito neste framework e sugerir um modelo de fomento às empresas de base tecnológica como estratégia para a promoção do desenvolvimento urbano baseado no conhecimento, submeti algumas companhias australianas ao mesmo questionário feito no Brasil em 2013. No total, 75 responderam. 

Dentre essas, 36,5% afirmaram não ter conhecimento dos recursos de fomento disponíveis para inovação. A maioria (54,4%) afirmou nunca ter se beneficiado desse tipo de recurso. Entre as empresas que tentaram, mas não conseguiram, a maioria entre as australianas e brasileiras aponta o mesmo motivo: processo complexo (47,1%) e burocracia (40,4%). 

Preferencialmente, as empresas no Brasil (77%) e Austrália (62,7%) buscam incentivos à inovação para aplicação em P&D. Entre as linhas de fomento que as australianas gostariam de ter mais informações e se manter atualizadas encontram-se as voltadas a Incentivos Fiscais para Pesquisa e Desenvolvimento (56,5%); Programas para Empreendedores (54,8%) e Fundos de Capacitação (25,8%). Entre as empresas brasileiras de tecnologia, o interesse maior ficou no BNDES (72%); FINEP (66,8%) e Fundos para Pesquisa (44,9%).

No estudo também tive a oportunidade de entrevistar representantes do governo e de entidades representativas do setor de tecnologia nos dois países. No caso da Austrália, a principal questão está na necessidade de promover uma cultura de incentivo à inovação. O país voltou a desenvolver programas de fomento à inovação em 2009, depois de 15 anos sem uma política específica voltada ao tema. A transparência também foi uma necessidade apresentada, pois não estão claros os critérios para participar de certos programas. Das 400 melhores universidades do mundo, 20 estão na Austrália. O compartilhamento dos espaços físicos e laboratórios das universidades com as empresas foi apontado como um fator relevante para incentivar a inovação. Também citaram a necessidade de criação de mais parques tecnológicos e incubadoras. Segundo os entrevistados, esse problema é a razão pela qual o país vem perdendo empreendedores para Estados Unidos, Canadá e Inglaterra.

No Brasil, pouco se mede sobre o impacto do fomento à inovação, porém em pesquisas anteriores realizadas junto às empresas que receberam recurso público para inovar, o governo obteve o retorno deste incentivo no primeiro ano de programa. As empresas cresceram e algumas passaram a exportar, geraram empregos e melhoraram os benefícios oferecidos para os seus funcionários, tendo como resultado o desenvolvimento econômico baseado no conhecimento. A falta de conhecimento das companhias sobre os benefícios disponíveis demonstra, claramente, a necessidade de divulgação das gestoras de recursos financeiros para estimular e atrair as empresas para adoção desses instrumentos de apoio que poderão ajudar o Brasil a se tornar mais competitivo e deslumbrar novos mercados por meio da inovação e, consequentemente, gerar desenvolvimento econômico.

Enfim, há uma tendência de países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) de fomentar a inovação por meio de incentivos fiscais, o qual acaba sendo mais rápido, menos burocrático e mais democrático. Essa seria uma aposta bem acertada do governo brasileiro para elevar os resultados quando tratamos de apoio à inovação, mas o país ainda precisa melhorar nesse quesito, trazendo uma legislação mais clara e simples para que as empresas se beneficiem desses instrumentos. 

*Diretora de Inovação e Fomento da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES). 

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