Depois de mais de
três anos de investigações da Lava Jato, operação que levou à prisão
grandes empresários e políticos de renome e lança agora suspeitas sobre a
conduta do presidente Michel Temer, não teve o mesmo impacto no mercado
de capitais – um dos setores mais dinâmicos da economia. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) iniciou 17 apurações
relacionadas direta ou indiretamente ao caso, mas nenhuma foi concluída
até o momento – uma dezena contra a Petrobras e o restante contra a
JBS.
Diferentemente da esfera criminal no
Ministério Público Federal, dos cartéis investigados pelo Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e da conduta de servidores sob
escrutínio da Controladoria-Geral da União (CGU), a CVM analisa se a Petrobras e a JBS enganaram investidores, impondo prejuízos ao mercado como um todo.
A lentidão da autarquia pode provocar
um dos maiores prejuízos da história do mercado de capitais no país. A
Petrobras é questionada sobre repassar informações equivocadas e dados
inflados ao mercado, a partir dos quais investidores compraram ações
apostando na empresa. Como possui ações negociadas na Bolsa de Nova
York, a postura da companhia culminou não apenas em processos
administrativos na CVM, mas também na abertura de uma class action nos
Estados Unidos por um grupo de investidores que aponta prejuízos
causados pela gestão da estatal.
A situação gerou um desafio
institucional para o mercado e seu regulador. Uma decisão favorável aos
acionistas nos EUA levará fatalmente a uma migração para a bolsa
norte-americana, uma vez que lá é maior a sensação de proteção judicial
em caso de problemas – movimento que esvaziaria a B3 brasileira.
“O impacto de um julgamento nos EUA antes daqui é terrível. É a mesma coisa que chegar ao investidor e dizer: ‘se você quer investir em companhias brasileiras, compre títulos fora do país, não compre no Brasil, pois aqui você estará totalmente desprotegido’”, disse a advogada Érica Gorga, perita na class action envolvendo a Petrobras e professora da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV (EAESP). “Os grandes fundos vão preferir investir em outras economias emergentes, e não aqui.”
A correlação com o mercado americano
também está presente no caso da JBS. A CVM enfrenta o teste de avaliar a
venda de ações por controladores da JBS durante o período em que eles
negociaram um acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da
República (PGR). A companhia tinha o interesse de abrir o capital na
Bolsa de Valores de Nova York (NYSE), onde mora atualmente o empresário Joesley
Batista, responsável por gravar conversas com o presidente Michel Temer
e com o deputado federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Nos diálogos, o
auxiliar presidencial manifesta o plano de nomear integrantes da CVM
alinhados aos interesses do empresário.
Os casos embutem o cumprimento de
dois princípios basilares do mercado de capitais: a transparência das
empresas listadas em Bolsa e o grau de confiança que os investidores
podem ter sobre os negócios realizados ali.
Nenhum outro gestor ou político
nacional sofre pressão maior sobre este tema que o presidente da CVM,
Leonardo Pereira, cujo mandato pode terminar em julho sem que os casos
da Lava Jato sejam julgados pela autarquia. A eventual migração de
investidores para outra jurisdição em busca de maior segurança jurídica
seria um duro golpe na reputação da CVM. O paradigma quebrado pela JBS
também indica o alcance da cooperação da comissão com outros órgãos
investigadores.
https://jota.info/especiais/lava-jato-poe-credibilidade-da-cvm-em-xeque-25052017
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