A delação dos reis da carne, donos do JBS, pode decretar o fim do governo de Michel Temer.
José Batista Sobrinho ajudou a construir Brasília. Em 1957, seu
açougue fornecia carne para os refeitórios dos operários que trabalhavam
na construção da capital modernista do Brasil. Agora, seus dois filhos
mais novos, Wesley e Joesley, estão pondo o lugar abaixo. No comando da
empresa fundada pelo pai, rebatizada de JBS em sua homenagem, os dois
irmãos estão no centro de um escândalo capaz de fazer com que um
presidente brasileiro deixe o cargo antes do tempo pela segunda vez em
um ano.
A JBS é a maior exportadora de carne bovina do mundo. Suas receitas,
que eram de R$ 3,9 bilhões em 2006, chegaram a R$ 170 bilhões no ano
passado, impulsionadas pelo apetite da China e pelo entusiasmo do Brasil
por suas “campeãs nacionais”. Entre 2007 e 2015, o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) injetou mais de R$ 8 bilhões
em aportes e empréstimos nas empresas dos irmãos Batista. A maior parte
desses recursos foi utilizada na aquisição de concorrentes, entre as
quais se incluem empresas americanas, como Swift e Pilgrim’s Pride. A
holding da família, a J&F, também procurou se diversificar, e hoje é
dona, entre outras, da Alpargatas, fabricante das sandálias Havaianas.
Enquanto a JBS comprava empresas, Wesley e Joesley compravam
políticos. De R$ 20 milhões em 2006, as doações eleitorais declaradas da
JBS passaram para quase R$ 400 milhões em 2014, quando a empresa foi a
maior doadora da campanha. Nos últimos dez anos, os dois irmãos apoiaram
financeiramente 1.829 candidatos a cargos eletivos.
Com tanta generosidade, ajudaram a eleger um terço do Congresso
atual. Na grande maioria dos casos, as doações eram ilegais. Wesley e
Joesley confessaram que quase todos os recursos doados oficialmente,
além dos milhões distribuídos por baixo do pano, representavam propinas
pagas a políticos para que eles atuassem em favor dos interesses da
J&F.
No ano passado, as empresas dos Batista foram incluídas em cinco
investigações criminais. A mais recente delas tem como foco os negócios
da J&F com o BNDES, que financiou a expansão do grupo a mando de
políticos que depois teriam embolsado parte dos recursos
disponibilizados pelo banco.
Para salvar suas empresas, e a si mesmos, Wesley e Joesley propuseram
um acordo de delação premiada aos procuradores que investigam o
metastático escândalo de corrupção centrado na Petrobrás. Foi o melhor
negócio que a dupla fez até hoje. Em troca de provas de crimes cometidos
por importantes figuras políticas – incluindo, possivelmente, o
presidente Michel Temer – os dois obtiveram imunidade quase total. Ao
contrário de Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo Odebrecht, não
passarão nem um dia na cadeia ou em prisão domiciliar. Livre para deixar
o Brasil, Joesley já se mudou para o suntuoso apartamento que tem em
Nova York. Ele e o irmão terão de pagar uma multa de R$ 110 milhões cada
um – valor que não deve doer muito em seus bolsos bilionários.
Perigos
Os reis da carne não estão totalmente a salvo. É possível que a JBS
venha a ser investigada por corrupção nos EUA; e os americanos que
investiram em títulos da empresa podem processá-la judicialmente. Além
disso, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) investiga a JBS pela
prática do crime de “insider trading”.
Semanas antes dos detalhes da delação dos irmãos Batista vazarem para
a imprensa, em 17 de maio, os controladores da JBS venderam mais de R$
300 milhões em ações da empresa; e, no mesmo dia, horas antes da notícia
cair como uma bomba no mercado, a J&F comprou grande quantidade de
dólares. Wesley e Joesley negam ter manipulado o mercado. Aparentemente,
foram abençoados com o mesmo tino comercial do pai
(The Economist,
29/5/17)
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