A PagSeguro, processadora de operações com cartões controlada pelo UOL, conseguiu crescer num mercado dominado por gigantes — mas a concorrência acordou
São Paulo – Até alguns anos atrás, poucos setores eram tão hostis ao surgimento de novas empresas quanto o de cartões.
O mercado de processamento de operações com cartões é dominado por
duas- gigantes, que, por sua vez, são controladas pelos maiores bancos
do país. A Cielo, cujos maiores acionistas são Bradesco e Banco do
Brasil, é a líder. A Rede, do Itaú, vem em segundo lugar. Ambas têm
margens de lucro elevadas, superiores a 30% ao ano.
Suas maquininhas estão espalhadas pelas principais lojas do país, e
as duas empresas têm capital de sobra para investir em marketing e novas
tecnologias — e, se for o caso, derrubar preços para ganhar clientes.
Para completar, até 2010 havia uma reserva de mercado: os cartões da
bandeira Visa só podiam ser usados nas maquininhas da Cielo; os da
Mastercard, nas da Rede. Montar um negócio do zero para concorrer com
essas companhias parecia loucura — mas foi exatamente isso que uma
empresa de internet, o UOL, decidiu fazer. Em 2007, lançou a processadora PagSeguro, que tinha tudo para dar errado, mas deu certo.
O modelo de negócios da Cielo e da Rede é, essencialmente, voltado
para grandes empresas, que pagam um aluguel mensal para ter as
maquininhas de cartões em suas lojas e uma taxa variável sobre cada
venda. Mas esse sistema acaba custando caro demais para muitos pequenos
empresários e trabalhadores autônomos. Pagar um aluguel mensal pode não
compensar para quem recebe boa parte dos pagamentos em dinheiro, como
taxistas e donos de food truck. “Sabíamos que tínhamos de chegar a esses
clientes para continuar crescendo, só não sabíamos como fazer isso”,
diz um executivo do setor de cartões.
Fundada como uma processadora de pagamentos online,
a PagSeguro criou um modelo em 2013: em vez de aluguel, os clientes
compram a maquininha (que custa de 118 a 838 reais, e o valor pode ser
parcelado) e pagam uma taxa por venda. Com o custo fixo menor para os
pequenos clientes (já que não pagam aluguel), a maquininha colou. A
empresa também vende cartões pré-pagos que podem ser usados para fazer e
receber pagamentos por quem não tem conta em banco.
Com isso e pesados investimentos em marketing, a empresa conseguiu
cerca de 500 000 clientes (além de 250 000 no segmento online), segundo
estimativas da consultoria Boanerges, especializada no setor de cartões
(a PagSeguro não divulga números nem deu entrevista). Analistas
acreditam que ela fature menos de um décimo da Cielo, cujas receitas
alcançaram 12 bilhões de reais em 2016, mas o potencial de crescimento
levou a PagSeguro a se preparar para abrir o capital — de acordo com
executivos do mercado financeiro, o banco Goldman Sachs foi contratado
para assessorá-la.
Uma pesquisa do banco UBS, que ouviu 505 varejistas de 2015 a 2017,
mostra que mais empresários estão usando a Moderninha, nome do principal
serviço da PagSeguro: o percentual passou de 1% para 5% nesse período, a
maior expansão entre as empresas pesquisadas. “Não vemos a PagSeguro
roubando espaço da Cielo e da Rede, mas desbravando um novo mercado em
que o principal concorrente é o pagamento em dinheiro”, diz Frederic de
Mariz, diretor executivo de análise de empresas financeiras do UBS.
Mais concorrência
Diante do novo cenário, os concorrentes
resolveram se mexer. Cielo e Rede passaram a vender um pacote com um
valor fixo mensal, que cobre os custos da maquininha e das taxas de
transação e oferece sistemas de controle de recebimentos. O Santander,
dono da processadora Getnet, lançou a máquina Vermelhinha, que pode ser
usada por profissionais liberais (a tradicional só pode ser utilizada
por empresas com CNPJ).
Os clientes da Vermelhinha pagam uma mensalidade menor, mas a taxa
por transação é maior do que a dos usuários da Getnet, e têm acesso a
serviços financeiros, como antecipação de recebíveis. A startup Stone,
que foi fundada em 2014 e comprou em 2016 a operação brasileira da
processadora americana Elavon, uma das maiores do mundo, decidiu criar
dois modelos: é possível alugar a maquininha, como no sistema
tradicional da Cielo e da Rede, ou comprá-la.
A PagSeguro já sofre com o aumento da concorrência. Depois de liderar
o mercado de pagamentos online, com 60% de participação, a empresa
perdeu espaço para a brasileira MundiPagg, que tem entre seus clientes
as varejistas B2W e Ponto Frio, e para a holandesa Adyen, que opera com
os aplicativos iFood e Uber e com o serviço de distribuição de filmes
Netflix, por exemplo.
Como opera num segmento instável por natureza, a PagSeguro tem de
lidar com a rotatividade dos clientes — pequenos varejistas que quebram,
taxistas que migram para o Uber, gente que desiste quando a maquininha
quebra. Por isso, o modelo de negócios só se mantém de pé com fortes
investimentos em marketing, necessários para atrair novos clientes e
compensar os que se vão. Segundo executivos do setor, isso faz a margem
de lucro da PagSeguro ser, necessariamente, muito menor do que a das
grandes do setor.
Além do aumento da concorrência, outro risco para a PagSeguro é ver
as empresas que são suas clientes crescer e precisar de outros serviços
bancários, como crédito e seguro. Caso a abertura de capital saia, a
PagSeguro terá mais dinheiro para fazer frente aos desafios de um
mercado ainda bastante concentrado. Mas, desta vez, os concorrentes
parecem estar mais atentos.
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