O diretor de Relações Institucionais da J&F entregou ao MPF contratos e notas fiscais que teriam sido utilizados para dissimular propinas à cúpula do PMDB
São Paulo – O diretor de Relações Institucionais da
J&F, Ricardo Saud, entregou, como parte de sua delação premiada, ao
Ministério Público Federal, contratos e notas fiscais que teriam sido
utilizados para dissimular propinas à cúpula do PMDB.
Entre os documentos que, segundo o delator, são “frios” e
“fictícios”, estão números de notas fiscais emitidas pela JBS ao Ibope.
“Fazia pesquisa para eles (senadores) e pagava com essa propina. O
Ibope recebia propina. Nunca fez um serviço para nós”. O instituto
reagiu com veemência à denúncia do executivo da JBS sobre emissão de
notas fiscais frias.
O delator ainda relatou que o Ibope teria sugerido contratos
fraudulentos para justificar os repasses da JBS. “Inclusive, eles várias
vezes mandavam um contrato com um punhado de pesquisa e falaram:
arquiva isso aí direitinho, se amanhã ou depois, se acontecer alguma
coisa, você mostra isso aí. Eu falei: ‘ó, rapaz, agora quer me ensinar a
roubar dos outros?'” “Nunca fizeram pesquisa pra mim. Pegavam pesquisa
nacional e queria pôr no contrato da gente”, relatou.
Um dos anexos do acordo de colaboração da JBS com a
Procuradoria-Geral da República se refere a um pacotão de R$ 46 milhões
ao PMDB nas eleições de 2014, que, segundo os executivos, teriam sido
acertados entre o então ministro da Fazenda Guido Mantega e um dos donos
da JBS, Joesley Batista. Do total, R$ 35 milhões seriam destinados à
cúpula do PMDB no Senado.
Saud explica, inclusive, que informou, à época, o então
vice-presidente Michel Temer sobre os repasses. “Eu fui lá com o bilhete
que o Joesley anotou do que o Guido falou e falei: ‘ó,Temer, tá
iniciando a campanha, e o Joesley achou por bem pedir para vir falar com
o senhor que já tá iniciando assim, tá doando 35 milhões para o PMDB e
pelo que entendi não tá passando pelo senhor'”, relatou.
Segundo o delator, no caso de Renan Calheiros, parte das propinas
seriam utilizadas para “preparar” a eleição do peemedebista à
presidência do Senado e a outra parte teria como destino a campanha do
filho dele ao governo de Alagoas.
Os valores repassados ao atual líder do PMDB no Senado chegaram aos
R$ 9,9 milhões, de acordo com o delator. Parte deles, foi justificada
por meio de pagamentos ao Ibope.
“R$ 300 mil em 21/7/2014 para o Ibope, nota fiscal 14247 – Ibope
nacional. Fazia pesquisa pra eles e pagava com essa propina. o Ibope
recebia propina. nunca fez um serviço para nós”, relatou.
Outra empresa de comunicação que entra na lista de propinas da JBS é a
GPS Comunicação, para quem a JBS emitiu duas notas fiscais: uma delas
no valor de R$ 800 mil e outra no valor de R$ 900 mil.
Saud listou os pagamentos feitos a pedido de Renan Calheiros:
– “R$ 1 milhão ao diretório estadual do PMDB em Alagoas, ‘carimbado’ para Renan Filho”;
– “R$ 500 mil ao PMDB do Amapá, ‘por ordem do Rena'”;
– “R$ 300 mil ao PMDB de Sergipe, ‘por ordem de Renan Calheiros'”;
– “R$ 455 mil ao PMDB Nacional, ‘carimbados por Renan'”;
– e “R$ 300 mil para o PTdoB Nacional, ‘por ordem do Renan'”.
“Então, o que entendi disso aí, das conversas que a gente teve lá com
ele, que ele já estava jogando alguns senadores (…) para preparar a
eleição dele para a presidência do Senado. Assim como fez o Eduardo
Cunha também”, relatou Saud.
Renan ainda teria pedido R$ 4 milhões “em dinheiro vivo”, de acordo
com o diretor da J&F. Ele relatou que parte foi levada à casa do
senador, em Alagoas, e outra parte entregue ao diretório estadual do
PMDB.
Já Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) teria recebido R$ 3 milhões, para
campanha ao governo do Rio Grande do Norte, em 2014. Do total, R$ 1
milhão foi doado oficialmente ao PMDB Nacional, “em nome do Henrique” e
outra parte foi por meio de contratos de advocacia e de consultoria, e
termos firmados com o Ibope.
Defesas
O Ibope se manifestou por meio de nota. “É com indignação que o Ibope
Inteligência tomou conhecimento da acusação de que emitiu notas fiscais
falsas para a JBS como parte de pagamento de propina sem contrapartida
de bens ou serviços, conforme consta no Termo de Pré-Acordo de
Colaboração Premiada assinado por Joesley Mendonça Batista, Wesley
Mendonça Batista e Ricardo Saud com a Procuradoria-Geral da União”.
“Sobre esse fato, o Ibope Inteligência esclarece que nunca emitiu
notas fiscais falsas, nem recebeu qualquer tipo de propina das empresas
do grupo JBS ou de qualquer outra empresa.
Entretanto, o Ibope Inteligência confirma que todas as notas fiscais
mencionadas no Termo de Pré-Acordo de Colaboração Premiada são
verdadeiras, foram devidamente contabilizadas e estão registradas na
Secretaria Municipal da Fazenda da Prefeitura de São Paulo”.
“Após o conhecimento da acusação, foram verificadas todas as notas
fiscais de serviços constantes na delação envolvendo o Ibope
Inteligência e empresas do grupo JBS. Deste modo, após um minucioso
levantamento, o Ibope Inteligência confirma o recebimento de R$
2.834.705,43 como pagamento de serviços de pesquisa prestados para
empresas do grupo JBS”.
“No entanto, cabe esclarecer de forma muito transparente que do
montante acima mencionado, R$ 1.440.597,49 foram pagos para a realização
de pesquisas eleitorais em Campo Grande, em 2012, e também para os
estados de Alagoas, Goiás e Rio Grande do Norte, em 2014. Todas essas
pesquisas foram devidamente executadas, entregues e pagas pela JBS S/A e
J&F Investimentos S/A.
Já os R$ 1.394.107,94 restantes referem-se a pesquisas de mercado,
tais como recall de comunicação da Friboi; tracking de imagem da Friboi;
e perfil e hábitos de consumidores nas lojas da Swift, entre outros,
contratados pelos profissionais de pesquisa e de marketing da JBS S/A.
Inclusive, uma das notas fiscais mencionada no Termo de Pré-Acordo de
Colaboração Premiada foi emitida para a Flora Distribuidora de Produtos
de Higiene e Limpeza, uma das empresas do grupo. Pesquisa essa sobre
consumo de fixador para cabelos, também executada e entregue”.
“O Ibope Inteligência repudia veementemente a negligência dos
delatores que, além de faltarem com a verdade ao afirmarem que as notas
fiscais são falsas, misturaram em seus depoimentos pesquisas eleitorais
realizadas para políticos, com pesquisas sobre assuntos estratégicos das
empresas do grupo, encomendadas por suas equipes de marketing e
pesquisa”.
“Diante disso, para seguir com a transparência que faz parte de nosso
trabalho nestes mais de 75 anos, disponibilizamos, para a consulta de
todos os brasileiros, o relatório com todas as notas fiscais mencionadas
no Termo de Pré-Acordo de Colaboração Premiada, com a descrição dos
serviços encomendados, realizados e entregues desde 2011 para a JBS S/A,
J&F Investimentos S/A e Flora Distribuidora de Produtos de Higiene e
Limpeza”.
“Por fim, o Ibope Inteligência reitera que não é verdadeira a
informação de que emitiu notas fiscais falsas e tampouco recebeu
qualquer tipo de propina das empresas JBS S/A, J&F Investimentos S/A
ou quaisquer outras empresas.
Estamos à inteira disposição para esclarecer dúvidas sobre esse
lamentável ato de negligência e para colaborar com o Ministério Público
com o fornecimento de documentos que comprovam a lisura de nossa
atuação”.
A assessoria de imprensa do presidente Michel Temer afirmou que “o
PMDB somente recebeu recursos oficiais” e declarados ao Tribunal
Superior Eleitoral (TSE). “O presidente foi informado dos depósitos na
conta do partido, sem nenhuma ilegalidade”.
Por meio de sua Assessoria de Imprensa, o senador Renan Calheiros
afirmou que o delator (Ricardo Saud) tenta confundir informações
verdadeiras, como a contratação do Ibope, com referências a propinas.
“Jamais tratei de propina com quem quer que seja. Essa referência é
fantasiosa.”
A reportagem entrou em contato com a defesa de Henrique Eduardo
Alves, mas não obteve resposta até a o publicação desta matéria. O
espaço está aberto para manifestação.
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