Bancos de montadoras querem aproveitar a queda da inadimplência para acelerar no financiamento de veículos. As apostas passam por taxas, prazo e prestação de serviços
Por Luiz Gustavo PACETE
Há pouco mais de dois meses na presidência da General Motors
do Brasil, o sorridente Santiago Chamorro afirma que o mercado
automobilístico brasileiro não está para brincadeiras. “A volatilidade
do câmbio, a alta dos juros e a inflação estão fazendo nossos clientes
pensarem duas vezes antes de adquirir um automóvel”, diz o executivo
colombiano, há duas décadas na companhia. Para superar esse percurso
acidentado, a GM está colocando um aditivo em seu braço financeiro.
Santiago Chamorro, presidente da General Motors: "65% de nossas
vendas são financiadas"
Após concluir o processo de aquisição da Ally Financial no Brasil,
iniciada em novembro de 2012, em uma negociação global que envolveu US$
4,2 bilhões, a General Motors reativou seu setor de financiamento e, por
meio do Banco Gmac, que possui mais de R$ 10 bilhões em ativos,
anunciou a criação da marca Chevrolet Serviços Financeiros. “Como 65% de
nossas vendas incluem financiamentos, é importante oferecer mais
atrativos para os clientes”, diz Chamorro. Isso será feito por meio do
“Plano Tranquilidade”, que permite entrada mínima de 30% do valor do
automóvel, parcelamento em até 36 meses e taxas de juro que podem chegar
a 0,79% ao mês.
O pacote inclui quatro revisões e manutenção básica até 40.000 km –
e de graça. Jaime Ardila, presidente da GM América do Sul, diz que a
estratégia é necessária, sobretudo nas categorias econômicas como é o
caso do Classic, com valor médio de R$ 25 mil e que 70% de suas vendas
são feitas via financiamento. “E sabemos que nesse segmento a oferta de
crédito é crítica.” Segundo Chamorro, as vendas totais devem crescer
0,5% neste ano. Já para 2014, a previsão é aumentar as vendas em 3%,
para 3,9 milhões de unidades, mantendo a participação atual de 17,5% do
mercado, atrás da Fiat e da Volkswagen.
Ele não revela quanto desse aumento deve contar com o apoio de seu
próprio banco, mas quem conhece o mercado sabe que será uma ajuda não
desprezível. A iniciativa da GM é o exemplo mais recente de um movimento
generalizado dos bancos ligados a montadoras. Os grandes concorrentes
varejistas do setor financeiro tiraram o pé do acelerador no
financiamento automotivo, devido às taxas elevadas de inadimplência, que
bateu recorde em maio de 2012 e chegou a 6,1% da carteira. Em agosto,
esse percentual havia recuado para 2%. Apesar da queda do calote, os bancões não esticaram a marcha nem pretendem fazê-lo tão cedo.
Na segunda-feira 21, ao anunciar os resultados do terceiro
trimestre, Luiz Carlos Angelotti, diretor de Relações com Investidores
do Bradesco, informou que o banco vai continuar reduzindo o crédito
automotivo e destinando mais recursos para compra de imóveis. No caso do
Itaú, a participação dos financiamentos vinculados a veículos no total
dos empréstimos recuou de 21% em 2010 para 11% em 2013, o menor
percentual desde a fusão com o Unibanco, em 2008. Ricardo Troster,
ex-economista-chefe da Febraban, explica que o recuo dos bancos de
varejo no crédito para compra de veículos abre caminho para os das
montadoras que contam com estruturas enxutas e menor preocupação com
margens.
Angel Martinez, do Banco Mercedes-Benz: "Vamos atrair clientes com as taxas menores, de 2013"
Com isso, conseguem mais agilidade na hora de oferecer crédito. “A
característica do financiamento de automóveis é de alto risco e, no
caso dos bancos de varejo, lidar com altas taxas de inadimplência deixa
de ser um bom negócio.” Nesse vácuo, os bancos das montadoras se
preparam para crescer no retrovisor. “A queda da inadimplência vem
reduzindo a rigidez na hora de conceder empréstimos”, diz Décio
Carbonari de Almeida, presidente do Banco Volkswagen e também da
Associação Nacional das Empresas Financeiras das Montadoras (Anef). Na
ponta do lápis, os números de agosto – os mais recentes disponíveis –
ainda mostram uma atitude cautelosa.
O total de empréstimos desses bancos, R$ 233,3 bilhões, era 4,7%
inferior em relação ao mesmo mês de 2012. No entanto, diz Carbonari, os
próximos dados a ser divulgados vão mostrar uma reversão nesse quadro.
Ele diz esperar que os números de dezembro mostrem um crescimento de 3%
em relação a 2012. Carbonari diz que o Banco Volkswagen vai abrir mão da
rentabilidade – algo impensável em um banco grande, principalmente se
tiver ações em bolsa – para garantir as vendas da montadora. A
instituição financeira vai oferecer empréstimos cobrando juros baixos,
em média de 1,1% ao mês, e alongar o prazo dos empréstimos para até 42
meses, acima do intervalo médio de 24 a 36 meses que a concorrência tem
praticado.
“Esses têm sido os principais atrativos para o comprador nos
últimos meses”, diz ele. Esses juros menores vêm sendo cobrados em 87%
dos empréstimos, o que contribuiu para o crescimento de 15,3% no
primeiro semestre. O banco concedeu R$ 4,8 bilhões em novos
financiamentos, contabilizando um total de R$ 22,8 bilhões. “Nossa meta é
repetir esse desempenho no acumulado do ano”, diz Carbonari. A Renault
pretende adotar uma estratégia semelhante para cumprir a meta de crescer
5% em 2013, ampliando a carteira de crédito de seu braço financeiro, o
RCI Brasil, para R$ 5 bilhões.
“O resultado da redução de taxas tem sido competitivo até agora”,
diz Dominique Signora, diretor-geral da RCI Brasil. “Vamos preservar os
resultados, ampliando os prazos de financiamento, que poderão chegar a
até 60 meses em alguns casos específicos”, diz ele. “Para segurar os
resultados deste ano, nosso foco será continuar com o pagamento de 24
meses ou, se for o caso, até 60 meses com uma taxa competitiva”, diz
Signora. Angel Martinez, diretor comercial do banco Mercedes-Benz, está
menos otimista. No acumulado até setembro, a carteira total de
empréstimos chegou a R$ 10 bilhões, avanço de 7,5% sobre o mesmo período
de 2012.
Décio Carbonari, do Banco VW: "Vamos cobrar juros de 1,1% ao mês e alongar os prazos"
Os novos financiamentos somam R$ 2,8 bilhões. No entanto, esse
avanço foi lastreado pelos veículos pesados da montadora alemã. Os
empréstimos para venda de caminhões e ônibus cresceram 8%, graças
principalmente à oferta de dinheiro barato do BNDES, por meio dos
programas estatais de financiamento à modernização das frotas de
caminhões. No caso dos automóveis, porém, os empréstimos encolheram 14%
nos nove primeiros meses do ano. “No total, esperamos fechar o ano com
pouco mais de R$ 3,5 bilhões em volume de crédito concedido, crescimento
de 2,5% em relação ao ano passado”, diz Martinez.
Segundo ele, as taxas cobradas atualmente no Finame, do BNDES,
estão ao redor de 4% ao ano, mas devem subir no início de 2014.
“Esperamos atrair compradores interessados nas taxas menores de 2013”,
diz ele. Para melhorar os resultados das vendas nos próximos 24 meses, o
banco está reestruturando a equipe, de olho no aumento de demanda
previsto para quando a montadora retomar a fabricação de automóveis no
País, em 2016. Para não ficar sem combustível, os bancos das montadoras trataram de reforçar o caixa com captações internacionais.
Nos últimos meses, os bancos da Volkswagen, da GM e o PSA Finance,
da Citroën e Peugeot, captaram R$ 1,5 bilhão no mercado externo,
aproveitando as taxas internacionais camaradas. “Isso fará toda a
diferença na hora de subsidiar taxas aos clientes”, diz o economista
Celso Grisi. Segundo Alan Ghani, economista e professor da Fundação
Instituto de Administração (FIA), os bancos de montadoras sanearam suas
carteiras de empréstimos e, nos últimos nove meses, lançaram os
empréstimos problemáticos como perda. “Isso vai permitir mais capacidade
de emprestar nos meses que restam de 2013.”
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