domingo, 17 de novembro de 2013

Editorial: A indústria se mexe


A Confederação Nacional da Indústria (CNI) quer reabrir as negociações de um acordo de livre-comércio com os Estados Unidos, informou esta Folha

Uma das mais relevantes associações do setor da economia mais afeito ao protecionismo volta a sugerir que o Brasil descongele as tratativas com os EUA, em hibernação há quase dez anos, desde o colapso da negociação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas).

Volta a defender, ressalte-se, pois em 2007 a CNI procurava relançar o debate da abertura comercial. A crise de 2008, a decorrente baixa do comércio mundial, as irrupções de protecionismo e a grande valorização do real tornaram inviável a rediscussão de acordos. 

A ojeriza dos governos petistas ao livre-comércio, sua preferência por acordos politizados pela noção "Sul-Sul" e a paralisia das negociações multilaterais, na Organização Mundial do Comércio (OMC), acabaram por praticamente suprimir do debate público brasileiro a questão comercial. 

No entanto, mesmo nesses anos hostis à abertura de mercados, progrediram as negociações bilaterais.
Grandes empresas transnacionais continuaram a distribuir suas unidades produtivas baseadas em ponderações de custos, garantias legais e fluxo de capitais. Tais condições, porém, tornam-se mais ou menos favoráveis a depender das adesões a acordos bilaterais. 

EUA, Europa e países do Sudeste Asiático relegaram a um plano inferior as discussões da Rodada Doha, as negociações iniciadas em 2001 no âmbito da OMC. 

Não foi apenas reação à paralisia nas conversações. As economias mais produtivas pretendem desviar o comércio do restante do mundo para seus blocos. Mais que ampliar o volume de trocas, trata-se de barrar o acesso de terceiros países, em geral menos eficientes, que vão perdendo lugar nas cadeias multinacionais de produção. 

Até a indústria brasileira percebe a gravidade da situação. A única iniciativa comercial relevante em que está engajado o Brasil é a negociação com a União Europeia, por meio do Mercosul. Mas o acordo é emperrado pelo governo argentino, ainda mais obtuso que o do Brasil em matéria de promoção de eficiência e de realismo na política econômica internacional. 

Em resposta às movimentações da CNI, o governo brasileiro diz que "o assunto não está em discussão". Seria mais cabível dizer que não dispõe de política comercial digna de nome, assim como não tem planos razoáveis de médio e longo prazo nas áreas fiscal, monetária e de desenvolvimento. 

Os industriais perceberam que é de seu interesse tentar influenciar a integração econômica, sem o que o Brasil terminará escanteado dos setores mais avançados da economia mundial. 

Talvez seja demais esperar que o governo brasileiro também leve um choque de realidade.

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