Caso o cálculo dos juros seja alterado pelo STF,
economistas se preocupam com insegurança jurídica
Por Infomoney
O plenário
Supremo Tribunal Federal (STF) deverá julgar nesta quarta-feira (27), o mérito
das liminares que foram concedidas recentemente por ministros da Corte que
alteram o cálculo dos juros sobre a dívida dos estados com a União, ao julgar a
reivindicação de três estados. Nas últimas semanas, Rio Grande do Sul,
Santa Catarina e Minas Gerais ganharam no Supremo liminares que permitem o
pagamento da dívida repactuada com a União com juros simples em vez de
compostos (juros sobre juros).
No caso
gaúcho, a liminar concedida pelo relator da ação, ministro Edson Fachin,
autoriza o estado a pagar a dívida com a União calculada por juros não
capitalizados e impede novas sanções por descumprimento de contrato, como o
bloqueio das contas até o julgamento do conteúdo da ação. A liminar para Santa
Catarina, concedida na semana passada pelo plenário do Supremo, permite que o
estado pague a dívida repactuada com a União usando também juros simples, e não
compostos. Com a decisão, o estado pode pagar as parcelas da dívida em valores
menores do que os exigidos pela União e sem sofrer sanções legais.
Os
governadores entraram no Supremo para alterar a correção das dívidas ao
enxergar brechas na regulamentação da lei complementar 148, que trocou o
indexador das dívidas por IPCA mais 4% ao ano ou pela Selic, o que for menor,
no lugar de IGP-DI mais juros de 6% a 9% ao ano. Os Estados argumentam que a
regulamentação, feita em decreto no fim de 2015, acabou penalizando-os, pois
houve aumento no estoque da dívida nem um momento em que sofrem com baixa
arrecadação em função da recessão econômica. Também apontam que não há no texto
menção direta ao cálculo com juros compostos, mas apenas a juros
acumulados.
Os
efeitos da possível mudança nas regras são vistos com desconfiança e temor por
muitos economistas. Conforme destaca a Rosenberg Consultores Associados, se o
STF der ganho de causa aos estados, além de ampliar significativamente a dívida
do governo (a estimativa do governo, que era de impacto de mais de R$ 300
bilhões, foi revisada pelo ministro Nelson Barbosa para R$ 402 bilhões), criará
uma insegurança jurídica enorme no país, cujos reflexos não estão nem perto de
serem contabilizados. Seria um enorme retrocesso e muito danoso à imagem do
país, afirmam os economistas da consultoria. "É fato que os Estados estão
em uma situação fiscal falimentar, mas uma saída simples como essa é totalmente
equivocada. Será necessária uma repactuação federativa, associada a
reformas amargas, para reequilibrar as finanças dos Estados. Temer já parece
estar a par dessa situação, tanto é que no áudio vazado, menciona um novo pacto
federativo", afirma a consultoria.
O Bank of
America Merrill Lynch reforça que a utilização de taxas de juros simples para
calcular a dívida dos estados com o governo federal piora a situação fiscal
global. Primeiro, porque aumenta o peso da dívida do governo federal, pois os
estados terão de fazer pagamentos em menores montantes da dívida e, em segundo
lugar, porque os estados teriam menos incentivo para poupar mais através de
resultados fiscais primários mais elevados, uma vez que o compromisso da dívida
seria agora menor. "Isso aumenta os riscos já decrescentes para a previsão
de um déficit primário de 1,5% do PIB em 2016", aponta o banco.
E não há
sinais de alívio: a situação fiscal dos estados vem se deteriorando e o risco
de se tornar um fardo para o resultado primário do setor público só aumenta,
alerta o Merrill Lynch. "Anteriormente, a economia estava crescendo e
contribuindo assim com o aumento das receitas fiscais; agora, estamos entrando
no segundo ano de recessão, esgotando significativamente o Estado e a Receita
Federal. Desde 2009, os governos estaduais ficaram aquém das suas metas fiscais
primários e até produziram um déficit em 2015 para 0,15% do PIB. Durante os
anos 1990 e o início dos anos 2000, os governos elevaram impostos e fizeram
privatizações a fim de sustentar os ajustes fiscais. No entanto, não há mais
espaço para aumentar os impostos em meio ao momento econômico em recessão. Além
disso, a carga tributária efetiva do Brasil em 33,5% do PIB está entre as mais
altas do mundo. A redução do consumo, que está reduzindo a arrecadação, deve
neutralizar um eventual aumento de impostos", avaliam os economistas do
BofA.
“Essa é
uma situação absurda que poderia custar uma fortuna para o país”, declarou
David Beker, economista-chefe e estrategista de renda fixa do banco americano,
à agência Bloomberg. “Num cenário dominado por notícias políticas, esquecemos
que principais problemas do Brasil ainda estão aí, e esse é um deles. É como um
esqueleto que foi esquecido no armário e agora está sendo trazido à luz do
dia”, destacou.
Possibilidades
A LCA Consultores destaca que não se descarta um pedido de vistas por algum
membro do Supremo que interromperia o julgamento. O objetivo seria esperar o
desfecho do impeachment e a posse de Michel Temer. Dessa forma, o futuro
ministro da Fazenda teria melhores de condições de fechar um acordo que
envolvesse algum alívio aos Estados e sem causar grandes prejuízos ao Tesouro. Temer
tem se preocupado com o assunto. Tanto que interlocutores do vice conversaram
nos últimos dias com ministros do Supremo sobre o impacto nas contas do governo
com a possível mudança no cálculo, relata reportagem de O Globo desta quarta.
Segundo o jornal, pelo menos dois ministros do STF foram procurados e receberam
argumentos sobre os efeitos da mudança. "Isso vai provocar um rombo para o
governo e vai afetar todas as dívidas das pessoas. Esse julgamento é muito
importante. O rombo seria de R$ 330 bilhões", afirmou um interlocutor do
vice-presidente.
Efeitos
bilionários
Em meio ao "efeito manada", o Ministério da Fazenda divulgou nota em
meados de abril afirmando que o governo federal poderá perder centenas de
bilhões com a decisão do STF de alterar o cálculo dos juros sobre a dívida
estaduais. “Recursos que deverão ser, ao fim, providos por toda a sociedade
brasileira”, diz nota do ministério. “Não bastassem os ganhos iniciais
decorrentes da renegociação realizada em 1997, a aplicação da lei nos termos
defendidos pela União, ou seja, com juros compostos, também propicia descontos
expressivos para todos os estados”, continua o documento.
A Fazenda
afirma que seria criada uma enorme distorção entre a remuneração da dívida da
União e as dívidas dos Estados, com a primeira sendo calculada a partir de
juros compostos e a segunda, com juros simples. "Essa diferença poderá
gerar, ao longo do tempo, custos ainda maiores para a União, prejudicando o
equilíbrio financeiro entre todos os entes federados. “Os dados divulgados pela
Fazenda apontam que o Rio de Janeiro apresentaria ter um ganho estimado com a
LC 148 de R$ 4,5 bilhões, enquanto São Paulo teria o maior ganho, de R$ 18,8
bilhões”, relata a pasta.
Para o
governo federal, o caminho para um alívio fiscal aos Estados passa pela
aprovação no Legislativo de proposta de alongamento da dívida que esses entes
possuem com a União, com impacto de até R$ 45,5 bilhões de 2016 a 2018. O
texto, que prevê uma série de contrapartidas de maior rigor fiscal para a
concessão de benefícios, foi enviado ao Congresso Nacional em março, mas sua
tramitação segue paralisada em meio à profunda crise política e ao andamento do
pedido de processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff no
Legislativo.
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