quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Eike Batista, esse poço de sinceridade


Riscos de não existência de petróleo nos poços da OGX estão claramente explicados no prospecto de abertura de capital da empresa

Por Cláudio GRADILONE

 O mundo começou a acabar para o ex-bilionário Eike Batista no início de julho, quando um fato relevante da OGX Petróleo, sua principal empresa, informou que os três poços petrolíferos do campo Tubarão Azul não eram economicamente viáveis. Em bom português, depois de adiar sucessivamente a entrega do petróleo prometido, a empresa de Batista declarou oficialmente que não tinha óleo com qualidade suficiente para merecer ser explorado. “Não existe, no momento, tecnologia capaz de viabilizar economicamente o desenvolvimento dos campos de Tubarão Tigre, Tubarão Gato e Tubarão Areia”, informou a empresa.

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"Quem mergulhou de cabeça no mar de petróleo prometido pela OGX não prestou atenção em que a própria empresa advertia dos riscos de sua operação."

A reação do mercado foi a pior possível. As ações caíram 29%, de R$ 0,79 para R$ 0,56, e nunca voltaram ao patamar anterior. Batista começou a ser ofendido em prosa e verso nas redes sociais e fóruns de discussão sobre o mercado de capitais. Como, depois de cinco anos da abertura de capital que movimentou R$ 6,7 bilhões, a maior promessa de um empresário que parecia ter o toque de Midas se revelara tão falha? Como um processo que envolveu todos os bancos de investimento relevantes do Brasil – UBS Pactual, Credit Suisse, Itaú BBA, Citibank, só para listar alguns – se mostrara tão falho? Como foi possível enganar tanta gente?
 
No entanto, Batista não enganou ninguém. Quem mergulhou de cabeça no mar de petróleo prometido pela OGX não prestou atenção em que a própria empresa advertia dos riscos de sua operação. O prospecto de lançamento das ações, um pesado documento de 588 páginas, era claro quando dizia que a OGX poderia ser, literalmente, um furo n’água. Está lá, na página 80:
 
“Nossas estimativas de potenciais recursos de petróleo e gás natural envolvem um grau considerável de incerteza, que poderia afetar de modo adverso nossa capacidade de gerar receita.”
 
“Um risco inerente aos recursos potenciais estimados é a possibilidade de que nenhum poço seja considerado como recurso potencial economicamente viável.”
 
“Revisões, em nossas previsões, que indiquem uma redução em nossas estimativas de potenciais recursos poderão ocasionar, no futuro, uma redução nos níveis das projeções previstas, o que poderia acarretar um efeito adverso relevante em nossos resultados de operações e em nossa situação financeira.”
 
Ninguém discute que a transparência das comunicações da OGX com o mercado deva ser questionada. Nos seus tempos áureos, Eike foi apelidado de “Senhor Fato Relevante”, dado o excesso de comunicados informando metas de produção. Há razões para desconfiar que a OGX demorou mais do que seria correto para informar que o petróleo não era viável. No dia três de julho, dois dias após a divulgação do fato relevante, a Comissão de Valores Mobiliários passou a investigar a OGX e outras empresas do grupo.
 
Não é possível condenar Batista antecipadamente, assim como não é possível absolve-lo a priori. No entanto, que não se diga que os investidores não sabiam dos riscos que estavam correndo. Se preferiram não acreditar, paciência. “Caveat emptor” – literalmente “cuide-se, comprador” é o ditado mais velho do mercado financeiro, mas nem por isso deixa de ser válido.


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