Rodolfo Burher/Reuters
O executivo Marcelo Odebrecht, exemplo do que não fazer: milhares de
funcionários, do baixo ao alto escalão de empresas, tiveram de assistir a
pelo menos uma palestra sobre como combater a corrupção em 2015
Naiana Oscar e Renée Pereira, do Estadão Conteúdo
São Paulo - As fotos de alguns dos maiores empresários e executivos do país sendo levados para a carceragem da Polícia Federal têm aparecido na maioria dos treinamentos internos que tentam estancar desvios de conduta no dia a dia das corporações.
No ano passado, milhares de funcionários, do baixo ao alto escalão de
empresas brasileiras, tiveram de assistir a pelo menos uma palestra
sobre como combater a corrupção.
Marcelo Odebrecht,
ex-presidente da maior empreiteira do país, e Otávio Marques de
Azevedo, da Andrade Gutierrez, apareceram em algumas delas para ilustrar
o capítulo 'por que não fazer'.
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Catequizar os funcionários é uma das primeiras tarefas das equipes de
"compliance", o mais novo departamento de algumas das maiores companhias
do país.
Essa área, que já integrava a estrutura de multinacionais, é responsável
por investigar e conter iniciativas fraudulentas nas empresas,
especialmente no relacionamento com o poder público.
Nos últimos dois anos, o que tem se visto é uma verdadeira corrida dos grupos nacionais para criar essa estrutura internamente.
Uma pesquisa da consultoria Deloitte com 103 empresas mostra que, no ano
passado, 65% dos entrevistados afirmaram já ter um programa de
compliance. Em 2013, o porcentual era de 30%.
"Para atender à demanda por esse tipo de serviço, nosso time teve um
acréscimo de 50% em dois anos", diz Ronaldo Fragoso, sócio-líder de
consultoria em gestão de riscos da Deloitte. A empresa tem 400
profissionais dedicados à investigação.
Dois acontecimentos estão por trás do interesse súbito das companhias
por ser e parecer decentes: a Operação Lava Jato da Polícia Federal -
que investiga esquema bilionário de desvio e lavagem de dinheiro
envolvendo Petrobrás, empreiteiras e políticos - e a Lei Anticorrupção,
em vigor desde 2014.
A lei responsabiliza a empresa por atos de corrupção praticados por
funcionários e fornecedores, com punições que incluem multa de até 20%
do faturamento da companhia.
Mas o texto indica também que as sanções podem ser amenizadas se a
empresa provar que adota mecanismos para inibir a corrupção, como
treinamento, investigações internas e canais de denúncia.
Se ficar comprovada a eficácia dos programas, a multa pode ser reduzida a zero, em alguns casos.
"O prejuízo financeiro e de imagem é inacreditável e empresários estão
começando a entender isso", diz o sócio da PwC, Jerri Ribeiro,
especialista em compliance.
"O aprendizado dos últimos 12 meses é de que a corrupção pode destruir uma empresa ou acabar com seus planos de crescimento."
A Petrobras sabe bem disso. No centro das investigações da Lava Jato, a
empresa montou uma das maiores e mais caras estruturas de compliance de
que se tem notícia no país.
Cerca de 1 mil funcionários são alvo da investigação interna que já
levou à demissão de 17 deles entre janeiro e setembro de 2015. Outros 61
foram suspensos e 94 receberam advertências.
As empreiteiras que caíram com a petroleira no emaranhado da Lava Jato
também se viram obrigadas a criar estruturas de combate à corrupção.
A Camargo Corrêa anunciou há duas semanas um programa de delação
interna, para incentivar os 15 mil colaboradores e ex-funcionários a
denunciarem atos ilícitos relacionados à operação da Polícia Federal.
A iniciativa, batizada de Programa Interno de Incentivo à Colaboração
(PIIC), é parte do acordo de leniência que a construtora firmou com o
Ministério Público Federal e com o Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade) e que inclui o ressarcimento de R$ 804 milhões.
Para tocar a área de compliance, a empresa contratou, em julho do ano passado, o executivo Flávio Rímoli, ex-Embraer.
Criar um canal de denúncias, como o da Camargo, é uma das primeiras medidas adotadas pelas equipes.
"O grande desafio, no entanto, é cultural", diz Shin Jae Kim, sócia do
escritório Tozzini Freire responsável pela área de compliance desde
2007.
"A mudança de hábito passa obrigatoriamente pela conscientização dos
sócios e dos principais executivos. São eles que vão liderar esse
processo."
Por isso, os especialistas em medidas anticorrupção definiram como
"desastrosa" a declaração de Marcelo Odebrecht à CPI da Petrobras em
setembro de 2015, quando ele chamou os delatores de "dedos-duros".
Herdeiro da maior construtora do país, Marcelo disse que, em casa,
quando as duas filhas brigavam, levava bronca a que dedurou e não a que
fez a coisa errada. Fontes afirmam que a Odebrecht também está
reforçando a área de compliance. A empresa não comentou.
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